Acórdão nº 0800881-39.2018.8.14.0133 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Público, 21-08-2023

Data de Julgamento21 Agosto 2023
Órgão1ª Turma de Direito Público
Year2023
Número do processo0800881-39.2018.8.14.0133
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoAcidente de Trânsito

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0800881-39.2018.8.14.0133

APELANTE: RAIMUNDO VERISSIMO DOS SANTOS

APELADO: GUAMA - TRATAMENTO DE RESIDUOS LTDA, REVITA ENGENHARIA S.A., VEGA VALORIZACAO DE RESIDUOS S.A. - VVR, SOLVI PARTICIPACOES S/A.

RELATOR(A): Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. EXTINÇÃO DO FEITO SOB O FUNDAMENTO DE LITISPENDENCIA COM A AÇÃO COLETIVA. AMBAS AS AÇÕES PRETENDEM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA MODIFICADA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. A propositura de Ação Coletiva não obsta o ingresso de pedidos individuais em ações. O sistema processual vigente no Brasil admite a coexistência de ação coletiva e ação individual, inexistindo litispendência entre elas.

2. Sentença modificada. Recurso conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Cível.

ACORDAM os Exmos. Desembargadores que integram a egrégia 1ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade de votos, conhecer do recurso, concedendo-lhe provimento, nos termos do voto da relatora.

Belém (Pa), data de registro no sistema.

Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de APELAÇÃO CÍVEL, interposto por RAIMUNDO VERÍSSIMO DOS SANTOS, em face de sentença prolatada pelo MM. Juízo de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Marituba que, nos autos da AÇÃO DE COBRANÇA Nº 0800881-39.2018.814.0133 ajuizada em face do GUAMÁ – TRATAMENTO DE RESÍDUOS LTDA E OUTROS, julgou extinto o processo sem resolução do mérito por litispendência.

O autor ingressou com Ação de Danos Morais alegando que vive nas intermediações de Marituba onde se localiza a central de Tratamento e processamento de Resíduos Sólidos sendo constantemente prejudicado com o mau cheiro, reduzindo sua qualidade de vida e causando prejuízos a sua saúde. Requer indenização por danos morais em face das empresas que administram o empreendimento.

O Juízo de primeiro grau exarou sentença entendendo que já existe uma ação coletiva e extinguiu por litispendência.

O autor, inconformado, ingressou com recurso de apelação alegando que não é possível esse reconhecimento de ofícios pelo magistrado, afirmou ainda não se tratar de litispendência pois busca danos morais individuais e não coletivos. Requer a reforma da sentença para procedimento regular do feito.

O Ministério Público de 2º grau pugnou pelo CONHECIMENTO e PROVIMENTO DO RECURSO, considerando que a propositura de ação coletiva não obsta a possibilidade de ações individuais.

Coube-me a relatoria do feito.

É o relatório.

VOTO

Presentes os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação interposto.

O cerne da questão se resume na análise de possível litispendência com a ação 0800-524.93.2017.814.0133 que requer a condenação das empresas em danos morais coletivos com a ação em estudo, cujo autor alega morar nas proximidades do “lixão de Marituba” e ingressa com ação requerendo a condenação em danos morais.

Em análise minuciosa dos casos apresentados, verifico que assiste razão ao recorrente, pelas razões que passo a expor.

Inicialmente, é importante mencionar que o ajuizamento de Ação Coletiva não obsta o ajuizamento de possíveis ações individuais, pois conforme a Constituição Federal de 88, em cláusula pétrea, art. 5, XXXV “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito”.

Nesse entendimento o STJ se manifestou em julgamento de recurso:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AÇÃO INDIVIDUAL. CONVIVÊNCIA HARMÔNICA. RISCO DE DECISÕES CONFLITANTES. AUSÊNCIA. SÚMULA N. 83/STJ. CONEXÃO. REQUISITOS. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. DECISÃO MANTIDA. 1. Conforme o entendimento desta Corte, "a demanda coletiva para defesa de interesses de uma categoria convive de forma harmônica com ação individual para defesa desses mesmos interesses de forma particularizada, consoante o disposto no art. 104 do CDC" ( AgRg no REsp 1360502/RS, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/04/2013, DJe 29/04/2013). 2. Como também decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, "a ausência de pedido do autor da ação individual para que esta fique suspensa até o julgamento da ação coletiva, consoante autoriza o art. 104 do CDC, afasta a projeção de efeitos da ação coletiva na ação individual, de modo que cada uma das ações terá desfecho independente, não havendo que se falar em risco de decisões conflitantes a ensejar a reunião dos feitos" ( AgInt no AREsp 655.388/RO, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 17/11/2016, DJe 07/12/2016). 3. O recurso especial não comporta exame de questões que impliquem revolvimento do contexto fático-probatório dos autos (Súmula n. 7/STJ). 4. No caso concreto, a reforma do acórdão recorrido, que entendeu ausentes os requisitos da conexão, demandaria revolvimento do conjunto fático-probatório, vedado em sede de recurso especial. 5. Agravo interno a que se nega provimento.

(STJ - AgInt no REsp: 1612933 RO 2014/0182028-7, Relator: Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Data de Julgamento: 23/09/2019, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/09/2019)”

O ajuizamento de ação individual mesmo que exista uma ação coletiva pode impor a suspensão da ação até o julgamento da ação coletiva, mas não pode impedir o acesso ao Judiciário, conforme entendimento do STJ:

RECURSO REPETITIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL.
REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA.
ART. 543-C DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AÇÃO COLETIVA. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica, nos termos da Lei nº 11.738/08. SUSTAÇÃO DE ANDAMENTO DE AÇÕES INDIVIDUAIS. POSSIBILIDADE.
1. Segundo precedentes deste Superior Tribunal, "ajuizada ação coletiva atinente a macrolide geradora de processos multitudinários, suspendem-se as ações individuais, no aguardo do julgamento da ação coletiva". (v.g.: REsp 1110549/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, Segunda Seção, julgado em 28/10/2009, DJe 14/12/2009).
2. Este STJ também compreende que o posicionamento exarado no referido REsp 1.110.549/RS, "não nega vigência aos aos arts. 103 e 104 do Código de Defesa do Consumidor; com os quais se harmoniza, atualizando-lhes a interpretação extraída da potencialidade desses dispositivos legais ante a diretriz legal resultante do disposto no art. 543-C do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei dos Recursos Repetitivos (Lei n. 11.672, de 8.5.2008)".
3. Recurso Especial conhecido, mas não provido.
(REsp 1353801/RS, Rel.
Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/08/2013, DJe 23/08/2013)

Pelo exposto, e na esteira do parecer ministerial, CONHEÇO DA APELAÇÃO CÍVEL, CONCEDO-LHE PROVIMENTO, para manter modificar a decisão de primeiro grau, nos termos da fundamentação lançada, devendo retornar ao Juízo para regular processamento.

É como voto.

P.R.I.

Servirá a presente decisão como mandado/ofício, nos termos da Portaria n°3731/2015-GP.

Belém (Pa),data de registro no sistema.

Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

Relatora

Belém, 29/08/2023

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