Acórdão nº 0800941-59.2022.8.14.0072 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 3ª Turma de Direito Penal, 30-10-2023

Data de Julgamento30 Outubro 2023
Órgão3ª Turma de Direito Penal
Ano2023
Número do processo0800941-59.2022.8.14.0072
Classe processualRECURSO EM SENTIDO ESTRITO
AssuntoRecurso

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) - 0800941-59.2022.8.14.0072

RECORRENTE: GILMAR DOS SANTOS MOREIRA

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ

RELATOR(A): Desembargadora EVA DO AMARAL COELHO

EMENTA

PROCESSO Nº 0800941-59.2022.8.14.0072

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO

3ª TURMA DE DIREITO PENAL

RECORRENTE(S): GILMAR DOS SANTOS MOREIRA

RECORRIDO(AS): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL

RELATOR(A): DES(A) EVA DO AMARAL COELHO

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO DOLOSO TENTADO. IMPRONÚNCIA. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS MÍNIMOS DE AUTORIA DELITIVA. NÃO ACOLHIMENTO. COMPETÊNCIA DO JÚRI POPULAR. APLICAÇÃO DO “IN DUBIO PRO SOCIETATE”. REVOGAÇÃO DE PRISÃO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADES. PEDIDO NÃO ACOLHIDO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componentes da 3ª Turma de Direito Penal, por unanimidade, conhecer do recurso e, no mérito, negar-lhe provimento, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Sala das Sessões do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, aos ____ (__________) dias do mês de ____________ de 2023.

Julgamento presidido pelo(a) Excelentíssimo(a) Senhor(a) Desembargador(a) ____________________.

EVA DO AMARAL COELHO

Desembargadora Relatora

Datado e assinado eletronicamente

RELATÓRIO

PROCESSO Nº 0800941-59.2022.8.14.0072

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO

3ª TURMA DE DIREITO PENAL

RECORRENTE(S): GILMAR DOS SANTOS MOREIRA

RECORRIDO(AS): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL

RELATOR(A): DES(A) EVA DO AMARAL COELHO

RELATÓRIO

Cuida-se de Recurso em Sentido Estrito interposto por GILMAR DOS SANTOS MOREIRA contra sentença de pronúncia prolatada pelo Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Medicilândia, o qual reconheceu a existência de prova de materialidade e indícios de autoria do crime constante dos artigos 121, §1º, IV, VI, c/c §2º-A, I, 7º, III e §14, II, todos do Código Penal, devendo a recorrente ser submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri.

Em suas razões pugnou pela impronúncia em razão da insuficiência de indícios suficientes de autoria, e por consequência requereu a revogação de sua prisão preventiva, e, subsidiariamente, a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão.

Em contrarrazões, o Ministério Público opinou pela manutenção da decisão de primeiro grau.

Nesta Instância revisora, o Órgão Ministerial manifestou-se pelo improvimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

VOTO

Conheço do recurso, eis que preenchidos os pressupostos para sua admissibilidade.

O recorrente pugna pela sua impronúncia, haja vista conjunto probante deficiente.

Vale ressaltar que na fase da pronúncia, o magistrado não avalia profundamente o conjunto probatório até então produzido, tendo em vista que se trata de mero juízo de admissibilidade, no qual somente se impõe o exame da existência da materialidade do crime e de indícios suficientes da autoria, uma vez que compete ao Conselho de Sentença a análise meritória do fato.

Sobre tema assemelhado ao que se debate nesta insurgência, colaciona-se a ementa do Acórdão da 5ª Turma do STJ, do qual se depreende que o magistrado está impossibilitado de proceder a grandes incursões no mérito da causa por ocasião da prolação da sentença de pronúncia, “in verbis”:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRONÚNCIA POR HOMICÍDIO TENTADO. RECONHECIMENTO DE LEGÍTIMA DEFESA. AUSÊNCIA DE PROVA INCONTESTÁVEL. IN DUBIO PRO SOCIETATE. ACÓRDÃO RECORRIDO EMBASADO EM PREMISSAS FÁTICAS. REVISÃO. SÚMULA 07/STJ. I - A pronúncia é decisão interlocutória mista, que julga admissível a acusação, remetendo o caso à apreciação do Tribunal do Júri. Encerra, portanto, simples juízo de admissibilidade da acusação, não se exigindo a certeza da autoria do crime, mas apenas a existência de indícios suficientes e prova da materialidade, imperando, nessa fase final da formação da culpa, o brocardo in dubio pro societate. II - Afastar a conclusão das instâncias de origem, quanto a não estar efetivamente demonstrada a excludente de ilicitude, implica o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, o que é inadmissível na via do Recurso Especial, a teor da Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça. III - Agravo Regimental improvido. (STJ – AgRg na AREsp 405,488/SC – Relatora: Ministra Regina Helena Costa – Órgão Julgador: Quinta Turma – Julgamento: 06/05/2014 – Publicação: DJe 12/05/2014).

Assim, constituindo-se a pronúncia como um mero juízo de admissibilidade da acusação e embora o magistrado deva expor as razões do seu convencimento, nos estritos termos do artigo 413, § 1º, do Código de Processo Penal e em observância ao disposto no artigo 93, inciso IX, da Lei Fundamental, lhe é vedado externar um juízo de certeza acerca das teses defensivas.

No caso em apreciação, a materialidade está comprovada por meio do IPL juntado ao feito, especialmente pela apreensão da arma utilizada no delito (canivete), pelo exame de lesão corporal da vítima CLEIDIANE PINHEIRO, e pela prova oral angariada no decorrer do inquérito policial e da instrução processual.

No que se refere a autoria da conduta delituosa em apuração contra a vítima CLEIDIANE PINHEIRO, esta acha-se também demonstrada pelos indícios coletados em sede policial, bem como dos depoimentos das testemunhas arroladas pela acusação, falecendo a argumentação de que não há nos autos elementos mínimos de sua participação no evento criminoso, a fim de submetê-lo a julgamento pelo júri popular.

Os elementos de convicção conflitam com suas asserções, ou seja, de que não tentou contra a vida da ofendida, contudo, não traz aos autos uma única prova capaz de rebater ou colocar em dúvida a tese defendida pelo Ministério Público.

Ademais, para o reconhecimento da ausência de “animus necandi”, é indispensável que os elementos de provas produzidas se apresentem de forma clara e inconteste, o que não restou verificado nos autos e nem sequer foi arguido e fundamentado pela defesa.

Ressalte-se por oportuno, que eventuais incongruências em laudos periciais, provas testemunhais, ou qualquer outro meio probatório, deverão merecer análise pelo Conselho de Sentença, sob pena de se invadir a competência constitucional do referido órgão, prevista no artigo 5º, XXXVIII, “C” e “D”, da Carta Constitucional.

Resta claro que há neste feito, elementos mínimos de convicção indicando que o recorrente em tese, é o autor do delito em análise.

Nesse cenário, impõe-se reconhecer o acerto da decisão impugnada, que, diante das circunstâncias fáticas que envolveram a tentativa de morte da ofendida, permitiu a submissão do recorrente a julgamento perante o Tribunal do Júri, pois é certo que a absolvição na primeira fase só pode já ocorrer se a acusação não conseguir reunir elementos mínimos de convicção, o que não se verifica na espécie.

Acerca do assunto, os Tribunais pelo país afora, firmaram entendimento que, em crimes dolosos, havendo indícios mínimos que apontem para o elemento subjetivo descrito, tal qual o “animus necandi”, cabe ao Tribunal do Júri definir se os fatos, as provas e as circunstâncias do caso autorizam a condenação do pronunciado por homicídio doloso consumado ou tentado ou se, em realidade, trata-se de hipótese de crime culposo ou mesmo de inocorrência de conduta delituosa, conforme se extrai dos arestos abaixo:

“RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – MOMICÍDIO DOLOSO – DESCLASSIFICAÇÃO PARA HOMICÍDIO CULPOSO – DÚVIDA DO ANIMUS NECANDI A SER DIRIMIDA PELO TRIBUNAL DO JÚRI. É cediço que, para a pronúncia, é suficiente a prova da materialidade do delito e existência de indícios da autoria e, existindo indícios acerca da ocorrência de dolo eventual, a questão deverá ser dirimida pelo Tribunal do Júri, competente para julgar os delitos dolosos contra a vida, não se mostrando possível, diante da complexidade demonstrada nos autos, que o juiz singular, na fase de pronúncia, possa optar pela escolha de uma das teses apresentadas pela acusação e defesa.” (Processo 0005786-13.2014.8.13.0514 – TJMG – 1ª Câmara Criminal – Relator: Des. Kárin Emmerich – publicação: 01/11/2017 – julgamento: 24/10/2017) (negritos nossos)

“E M E N T A – RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO POR MOTIVO FÚTIL (ART. 121, §2º, II, DO CP) – PRETENSÃO DEFENSIVA DE DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO PARA LESÃO CORPORAL (ART.129, CAPUT, CP) – IMPOSSIBILIDADE - DÚVIDA ACERCA DO ANIMUS NECANDI DEVE SER DIRIMIDA NO TRIBUNAL DO JÚRI EM OBSERVÂNCIA DO PRINCIPIO IN DUBIO PRO SOCIETATE – PRETENSÃO SUBSIDIÁRIA DE AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA DE MOTIVO FÚTIL – IMPOSSIBILIDADE - RECURSO IMPROVIDO. Sendo a decisão de pronúncia apenas um juízo de admissibilidade da acusação, sem qualquer valoração acerca do mérito da causa, cuja análise, por expressa previsão processual e constitucional, é do Conselho de Sentença (Tribunal do Júri) prevalece o princípio do in dubio pro societate, no sentido de que, na dúvida acerca do fato típico, antijurídico e culpável, deve-se assegurar o julgamento do mérito pelo Tribunal Popular (art. 5º, XXXVIII, da Lei Maior e art. 413, §1º, do CPP). Não estando presentes circunstâncias que excluam de plano a presença do animus necandi, não é possível a desclassificação do delito de tentativa de homicídio para lesão corporal leve. Quanto ao afastamento das qualificadoras, tem-se que se na pronúncia não restar manifestadamente improcedentes e de todo descabidas, deverão igualmente serem submetidas à apreciação do Júri.” (RSE 0000045-18.2015.8.12.0018 – TJMS – 1ª Câmara Criminal – Relator: Des. Lúcio R. da Silveira – julgamento: 02/05/2019 – publicação: 06/05/2019) (negritos meus)

Portanto, plenamente admissível concluir que as provas constantes nos autos impliquem na pronúncia do ora recorrente. Além disso, a absolvição e a consequente impronúncia pretendida pela Defesa neste momento, afastaria o julgamento da questão pelo Tribunal Popular, em...

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