Acórdão nº 0800996-58.2021.8.14.0035 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Público, 30-10-2023

Data de Julgamento30 Outubro 2023
Órgão1ª Turma de Direito Público
Ano2023
Número do processo0800996-58.2021.8.14.0035
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoAbono Pecuniário (Art. 78 Lei 8.112/1990)

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0800996-58.2021.8.14.0035

APELANTE: ORDENIRA DOS SANTOS FREITAS

APELADO: MUNICIPIO DE OBIDOS

RELATOR(A): Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

EMENTA

AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA DE PARCELAS DO PISO SALARIAL DO MAGISTÉRIO. ALEGAÇÃO DE IRREGULARIDADE EM ACORDO FIRMADO PELO MUNICÍPIO E SERVIDORES. IMPROCEDÊNCIA. É POSSÍVEL RELATIVIZAR A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE NOS CASOS EM QUE SE BUSCA A EFICIÊNCIA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS. ACORDO DE PAGAMENTO DO PISO SALARIAL INSTITUÍDO POR LEI. AUTOAPLICABILIDADE DA LEI FEDERAL Nº 11.738/2008. DIREITO QUE POSSUI PREVISÃO CONSTITUCIONAL. VENCIMENTO INICIAL QUE NÃO DEVE SER INFERIOR AO PISO SALARIAL DO MAGISTÉRIO. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO PELO STF NA ADI Nº 4.167/DF. DECISÃO MONOCRÁTICA MANTIDA. AGRAVO INTERNO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componentes da Primeira Turma de Direito Público, por unanimidade de votos, CONHECER O AGRAVO INTERNO, NEGANDO-LHE PROVIMENTO, tudo nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Belém (Pa), data de registro do sistema.

EZILDA PASTANA MUTRAN

Desembargadora do TJ/Pa

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo Interno, interposto pelo Município de Óbidos, com fulcro no art. 1.021, do Código de Processo Civil, contra decisão monocrática proferida por esta relatora, nos autos da Apelação Cível.

O (a) autor (a) ingressou com ação relatando que é professor (a) e seu salário não estava de acordo com a Lei Municipal. 4150 de 11/06/2011, que estabeleceu o piso municipal do magistério durante os anos de 2013 a 2015, tendo realizado acordo entre a categoria e o Prefeito Municipal, que reconheceu a dívida e efetuou parcelamento de 10 x (dez vezes) durante o ano de 2016. Ocorre que o Prefeito adimpliu 6 parcelas, restando o pagamento de 4 parcelas da dívida referente aos meses de setembro, outubro, novembro e dezembro de 2016. Requer sua correção e a cobrança dos valores pretéritos. Requereu a concessão da tutela de urgência.

O Município apresentou impugnação a execução.

O Juízo de primeiro grau julgou extinto sem resolução de mérito o processo, nos termos do art. 783 do CPC, uma vez que o título não se mostraria líquido.

Foram opostos embargos de declaração que não foram acolhidos pelo Juízo de origem.

Nas razões do recurso de apelação o recorrente suscita que o título em questão seria líquido, certo e exigível, fazendo jus a procedência da ação.

Foram apresentadas contrarrazões pugnando pelo desprovimento do recurso.

Coube-me a relatoria do feito por distribuição.

Instado a se manifestar, o Ministério Público não apresentou manifestação por entender ausente o interesse público.

Em decisão monocrática, conheci e neguei provimento ao recurso de Apelação.

Contra esta Decisão, o Município de Óbidos interpôs o presente Agravo Interno, alegando a ausência de jurisprudência que permita ao Ente Municipal firmar acordo extrajudicial com servidores, sem a existência de lei que autorize ao gestor celebrar contratos dessa natureza, ocasionando na violação do princípio da legalidade, defendendo que a Ação deve ser julgada improcedente. Desse modo, requer o conhecimento e provimento do Agravo Interno.

Não foram apresentadas contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço o Agravo Interno e passo a proferir voto sob os seguintes fundamentos.

O cerne do recurso diz respeito a legalidade no acordo firmado entre o Município de Óbidos e os servidores profissionais do magistério, no qual houve o parcelamento em 10X (dez vezes) da dívida referente ao piso salarial do magistério, sendo pago 6 parcelas pelo agravante, restando o pagamento de 4 parcelas que levaram a parte autora a ajuizar Ação de Cobrança.

De acordo com a Ata de reunião juntada aos autos, a gestão do Município de Óbidos se comprometeu a pagar aos servidores salário com reajuste de 11,36% concedido pelo Governo Federal através da lei que instituiu o piso salarial do Magistério (Lei nº 11.738/2008), na reunião ficou acordado que o pagamento seria realizado em 10 parcelas a serem pagas a partir de março de 2016.

Pois bem, sabe-se que os atos praticados pelos gestores públicos devem observar os princípios da administração pública, expressos no caput do art. 37 da Constituição Federal, sendo um deles o princípio da legalidade que obriga os administradores públicos a agirem com previa previsão legal.

Com efeito, é possível relativizar a aplicação do princípio da legalidade quando a administração pública adota solução que melhor atende ao interesse público, sobretudo nos casos em que os acordos buscam a eficiência na prestação de serviços públicos, como é o caso dos autos, tendo em vista, que o acordo celebrado entre as partes objetiva o pagamento de verbas salariais devidas aos profissionais da educação pública do Município.

Esse é o entendimento seguido pela jurisprudência pátria:

EMENTA: REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO MONITÓRIA. COBRANÇA DE DÍVIDA NÃO ADIMPLIDA DECORRENTE DO ABASTECIMENTO DE ÁGUA E ESGOTO PARA O MUNICÍPIO DE LUIS GOMES/RN. ACORDO EXTRAJUDICIAL REALIZADO NO DECORRER DO FEITO. SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA. AVENÇA QUE ATENDEU AOS DITAMES LEGAIS E AO INTERESSE PÚBLICO. PRIMAZIA DOS PRINCÍPIOS DA EFICIÊNCIA E DA COOPERAÇÃO. MANUTENÇÃO DO DECISUM QUE SE IMPÕE. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DA REMESSA NECESSÁRIA. (destacado) (TJ-RN - REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL: 08004669420208205120, Relator: MARTHA DANYELLE SANT ANNA COSTA BARBOSA, Data de Julgamento: 02/03/2023, Terceira Câmara Cível, Data de Publicação: 02/03/2023)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SENTENÇA QUE HOMOLOGOU O ACORDO CELEBRADO ENTRE AS PARTES. INSURGÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO, ATUANTE COMO FISCAL DA LEI. ALEGADA AUSÊNCIA DE LEGISLAÇÃO MUNICIPAL AUTORIZADORA E VANTAJOSIDADE À MUNICIPALIDADE. PLEITO DE REVOGAÇÃO DA HOMOLOGAÇÃO DO ACORDO APONTADO COMO IRREGULAR. PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE DO INTERESSE PÚBLICO. RELATIVIZAÇÃO. UTILIZAÇÃO, PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, DE MECANISMOS PRIVADOS DE RESOLUÇÃO DE LITÍGIOS ADMITIDA EM DETERMINADOS CASOS. CONSTATAÇÃO, PELA PRÓPRIA MUNICIPALIDADE, DA VANTAJOSIDADE DO ACORDO CELEBRADO. AÇÃO DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA QUE PROTELARIA A SATISFAÇÃO DA OBRIGAÇÃO IMPOSTA PELO JUÍZO, AUMENTANDO O VALOR E TRAZENDO MAIORES PREJUÍZOS AOS COFRES PÚBLICOS. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO À ORDEM CRONOLÓGICA DE PAGAMENTO DOS CREDORES COMPROVADA PELO ENTE PÚBLICO. VALOR DO DÉBITO QUE SE ENQUADRA NO LIMITE PARA PAGAMENTO POR RPV. REDUÇÃO DE GASTOS PÚBLICOS. MAIOR CELERIDADE NO PAGAMENTO DA DÍVIDA. INEXISTÊNCIA DE ÓBICE À HOMOLOGAÇÃO DO ACORDO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (destacado) (TJ-SC - APL: 03000778820178240003, Relator: Cid Goulart, Data de Julgamento: 15/08/2023, Segunda Câmara de Direito Público)

Nessa linha de entendimento, verifico que não há irregularidade no acordo firmado entre o gestor municipal e os servidores profissionais do magistério, pois, conforme já discutido na decisão recorrida, o piso salarial do profissional do magistério, é verba de natureza alimentar estabelecida pela ADCT em seu art. 60, inciso III, alínea e; possuindo previsão constitucional no art. 206, inciso VIII da CF.

Outrossim, como bem pontuado na sentença de primeiro grau não há necessidade de lei autorizativa para celebração de acordo administrativo entre o Município e seus servidores, uma vez que tal exigência somente é cabível em caso de acordo judicial, à luz do que dispõe o art. 37 e 167, VIII, da Constituição Federal de 1988.

Nesse sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. REAJUSTE DE 28,86%. TRANSAÇÃO EXTRAJUDICIAL. HOMOLOGAÇÃO. DESNECESSIDADE. AGRAVO INTERNO DO PARTICULAR A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Esta Corte consagrou entendimento de que a transação administrativa relativa ao pagamento do reajuste de 28,86%, nos termos da Medida Provisória 1.704/1998, prescinde da participação de Advogado e de homologação judicial para sua validade quando inexistente demanda individual entre o Servidor e a Administração Pública. Ademais, eventual discussão acerca da validade da transação em sede de embargos do devedor, é desinfluente ao deslinde da demanda, pois prevalecendo o acordo administrativo, fulminada restou a execução de título judicial (REsp. 1.311.984/RS, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 5.9.2014). 2. Agravo Interno do Particular a que se nega provimento. (AgInt nos EDcl no REsp 1513012/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 29/04/2019, DJe 08/05/2019)

Frise-se ainda, que o objeto do acordo provém da Lei Federal nº 11.738/2008, que possui autoaplicabilidade, sendo determinado valor mínimo de remuneração mensal visando a valorização dos profissionais da educação, declarada constitucional pelo STF na ADI nº 4.167/DF.

Dessa forma, partindo do entendimento pacificado pelo Supremo Tribunal Federal na ADI nº 4.167/DF, no sentido de que o vencimento inicial das carreiras do magistério público da educação básica deve corresponder ao piso salarial do magistério, sendo vedado a fixação de vencimento básico inferior ao determinado pela Lei Federal e pela Constituição Federal, não há que falar em ilegalidade no presente caso, uma vez que, o acordo visa o cumprimento do que determina a lei.

O posicionamento deste E. TJPA segue nesse sentido. Leia-se:

MANDADO DE SEGURANÇA. PISO SALARIAL. REMESSA NECESSÁRIA. PISO NACIONAL SALARIAL DOS PROFESSORES DA EDUCAÇÃO PÚBLICA. LEI FEDERAL N° 11.738/2008. OBRIGATORIEDADE DO REAJUSTE. JULGAMENTO DA ADI 4167/DF. SENTENÇA CONFIRMADA EM REMESSA NECESSÁRIA. (destacado) (TJ-PA, 2ª Turma de Direito Público, Relator: Des. Mairton Marques Carneiro, processo nº 0816791-87.2018.8.14.0301, julgado: 14/09/2022)

Pela análise das razões do Agravo Interno, depreende-se que o Agravante não apresenta nenhum fato novo que possibilite a modificação da decisão, uma vez que tão...

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