Acórdão nº 0801711-94.2021.8.14.0037 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Público, 11-12-2023

Data de Julgamento11 Dezembro 2023
Órgão2ª Turma de Direito Público
Ano2023
Número do processo0801711-94.2021.8.14.0037
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoObrigação de Fazer / Não Fazer

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0801711-94.2021.8.14.0037

APELANTE: ESTADO DO PARÁ

APELADO: MUNICIPIO DE ORIXIMINA, ESTADO DO PARÁ, RAFAEL ARAUJO LOPES, ROSILENE ARAUJO

RELATOR(A): Desembargadora LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS DE USO CONTÍNUO PARA TRATAMENTO DE SAÚDE. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA ESTADUAL E ILEGITIMIDADES PASSIVA DO ESTADO DO PARÁ REJEITADAS. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. HIPOSSUFICIÊNCIA FINANCEIRA DA PARTE AUTORA. SENTENÇA QUE DETERMINOU QUE O ESTADO DO PARÁ PRESTE O INDISPENSÁVEL TRATAMENTO DE SAÚDE REQUERIDO NA EXORDIAL. RECURSO SONHECIDO E NÃO PROVIDO. SENTENÇA MANTIDA NA SUA INTEGRALIDADE.

ACÓRDÃO



Vistos, relatados e aprovados em Plenário Virtual os autos acima identificados, ACÓRDAM os Excelentíssimos Desembargadores que integram a 2ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade, no sentido de conhecer e negar provimento ao recurso, na conformidade do Relatório e Voto que passam a integrar o presente Acórdão.


Participaram do julgamento os Excelentíssimos Desembargadores José Maria Teixeira do Rosário (Presidente), Luzia Nadja Guimarães Nascimento (Relatora) e Luiz Gonzaga da Costa Neto (Membro).


Belém, em data e hora registrados no sistema.


Desa. LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO

Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível contra sentença prolatada pelo douto Juízo da Vara Única da Comarca de Oriximiná (ID 11257007 – fls. 1/12) que, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer Cumulada com Pedido de Tutela Antecipada Inaudita Altera Pars ajuizada pela Defensoria Pública do Estado do Pará em favor de Rafael Araújo Lopes, menor, e em desfavor do Município de Oriximiná e do Estado do Pará, julgou procedente o pedido da parte autora, condenando-os ao cumprimento da obrigação de fazer descrita na petição inicial.

Dos autos se extrai (ID 11256977 – fls. 1/13), que o paciente Rafael Araújo Lopes, menor, é portador de Poliartrite Crônica, CID 10.M08.0, doença inflamatória sistêmica, associado a sintomas sistêmicos de Angioedema. Informa que, diante da não resposta ao tratamento com Prednisona, Azatioprina e Metotrexato, lhe foi prescrito fazer uso do medicamento Etanercepte 50mg – Injetável, o que possibilitaria melhora do quadro clínico apresentado.

Em razão da indisponibilidade na Farmácia Básica do Município, buscou atendimento na rede particular, sendo-lhe informado que o custo do medicamento importa o valor de R$ 11.000,00 (onze mil reais). Assim, diante das tentativas frustradas e da demora excessiva do Poder Público, a Defensoria Pública ajuizou a presente ação visando assegurar ao paciente o direito à saúde, diante da sua hipossuficiência financeira, haja vista tratar-se de fármaco de alto custo.

O Juízo de origem deferiu parcialmente a tutela de urgência para o fim de impor aos réus, o dever de forma solidária, no prazo de 10 (dez) dias, de disponibilizarem ao autor a medicação de uso contínuo ETANERCEPTE 50mg INJETÁVEL, sob pena de multa de R$ 200,00 (duzentos reais) por dia de atraso até o valor inicialmente limitado de R$ 6.000,00 (seis mil reais), sem prejuízo de eventual majoração. (ID 11256984 – fls. 1/2).

Tanto o Estado do Pará quanto o Município de Oriximiná apresentaram contestação em ID’s 11256988 – fls. 1/14 e 11256996 – fls. 1/10, argumentando, preliminarmente, a incompetência do juízo, sendo de responsabilidade exclusiva da União o financiamento do medicamento requerido. Assim sendo, evidenciada a impossibilidade de processamento do feito perante a justiça comum estadual. No mérito, apontam 1) A responsabilidade exclusiva da União em relação ao medicamento postulado, eis que classificado como componente especializado do Gr upo 1ª de responsabilidade exclusiva da União, devendo ser aplicado o Tema 793 do STF. 2) A inexistência de solidariedade diante da diversidade das obrigações dos entes federativos. Necessidade de fixação do ressarcimento pela união em razão dos custos observados pelo Estado do Pará. 3) a impossibilidade de condenação da fazenda pública em custas e despesas processuais. Ao final, postulam a total improcedência do pedido.

Réplica à contestação em ID 11257001 – fls.1/13.

Sobreveio a sentença (ID 297746 – fls. 1/6), cujo dispositivo abaixo transcrevo:

“Posto isso, e por tudo mais que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido nos termos propostos pelo menor R.A.L representado por Rosilene Araújo, em desfavor do MUNICÍPIO DE ORIXIMINÁ e do ESTADO DO PARÁ, para determinar em definitivo que ambos os requeridos, caso ainda não o tenham feito, forneçam o medicamento ETANERCEPTE 50mg INJETÁVEL, necessário ao restabelecimento da saúde da paciente, o que faço também confirmando os termos da decisão interlocutória ao ID 45427916 que concedeu a antecipação de tutela no presente caso, e, por conseguinte, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO EXTINTO O PRESENTE PROCESSO COM A RESOLUÇÃO DE SEU MÉRITO.

Sentença não sujeita ao duplo grau de jurisdição - art. 496, § 4º, II do CPC.

Sem honorários advocatícios nem custas processuais.

Ressalto que eventual descumprimento da medida liminar que tenha ensejado aplicação de multa, deverá ser apurado em fase de execução.

Havendo recurso, certifique-se a tempestividade, intime-se a parte apelada, e remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Pará.

Após o trânsito em julgado arquivem-se os autos.

Publique-se. Registre-se e Intimem-se.”

Irresignado, o Estado do Pará apelou da decisão (ID 11257010 – fls. 1/16), apresentando, em razões recursais, os mesmos argumentos trazidos na peça de Contestação.

Contrarrazões apresentadas em ID 11257014 – fls. 1/6.

Instado, o Ministério Público apresentou parecer pelo conhecimento e pelo não provimento da apelação (ID 12601983 – fls. 1/6)

É o relatório que submeto a julgamento em Plenário Virtual.

VOTO

Tempestivo e adequado, conheço do recurso e passo à análise.

Tratam os autos de Ação de Obrigação de Fazer Cumulada com Pedido de Tutela Antecipada Inaudita Altera Pars com o objetivo de que o Estado do Pará e o Município de Oriximiná forneçam ao requerente o medicamento necessário ao tratamento médico, conforme diagnóstico e prescrição do médico especialista.

Quanto às preliminares de ilegitimidade passiva do Estado e incompetência absoluta do Juízo, entendo que merecem rejeição, senão vejamos.

O Estado sustenta que a competência para processamento e julgamento do feito seria da Justiça Federal e, ainda, a ilegitimidade passiva, considerando que a obrigação no fornecimento do fármaco em questão seria da União.

O art. 23, inciso II, da Constituição da República, estabelece a competência concorrente da União, Estados e Municípios no que tange a saúdee assistência pública, razão pela qual a responsabilidade, entre os integrantes do sistema, é solidária.

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito-Federal e dos Municípios:

[...]

II- cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência.

Daí, constata-se que a Constituição da República aponta no sentido da responsabilidade solidária dos entes federados, justamente como forma de facilitar o acesso aos serviços, ampliando os meios do administrado exigir que o Poder Público torne efetivo o direito social à saúde, estabelecido como direito fundamental, conforme art. 6º da Carta Magna.

Com efeito, a saúde é direito de todos e dever do Estado sendo certo que a responsabilidade pela prestação dos serviços é de todos os entes Federados, que devem atuar conjuntamente, em regime de colaboração e cooperação.

Nesse sentido, a saúde compete solidariamente à União, Estados, Distrito Federal e Municípios, podendo o cidadão acionar, com a devida prescrição médica, qualquer desses entes Federados, conjunta, ou isoladamente, para fins de fornecimento de medicamentos ou realização de tratamento médico.

A par disso, poderá a parte buscar assistência médica em qualquer dos entes, sendo imposto a cada um deles suprir eventual impossibilidade de fornecimento do outro, uma vez que se trata de dever constitucional, conjunto e solidário, não podendo o ente municipal se eximir da responsabilidade de fornecer o tratamento médico solicitado.

Cabe destacar a possibilidade de compensação de gastos entre os gestores do SUS, eis que está prevista no artigo 35, inciso VII, da Lei nº. 8.080/1990, senão vejamos:

Art. 35. Para o estabelecimento de valores a serem transferidos a Estados, Distrito Federal e Municípios, será utilizada a combinação dos seguintes critérios, segundo análise técnica de programas e projetos: (...)

VII - ressarcimento do atendimento a serviços prestados para outras esferas de governo. (...)

Neste sentido, é o entendimento jurisprudencial:

ADMINISTRATIVO. DIREITO A SAÚDE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS PELO FUNCIONAMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. INEXISTÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO ESTADO. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CERCEAMENTO DE DEFESA. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. 1. A presente divergência (legitimidade passiva do Estado para integrar a lide e legitimidade ativa do Ministério Público, que pretende o fornecimento de medicamentos à menor cuja provedora não dispõe de recursos para custear o tratamento médico) não guarda similitude com a matéria submetida ao procedimento do art. 543-C do CPC no REsp 1.102.457/RJ. 2. O funcionamento do Sistema Único de Saúde é de responsabilidade solidária da União, dos Estados e dos Municípios, de modo que qualquer um desses entes tem legitimidade ad causam para figurar no polo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso a medicamentos para tratamento de problema de saúde. Precedentes. 3. O Ministério Público possui legitimidade...

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