Acórdão nº 0801915-94.2017.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Tribunal Pleno, 26-04-2023

Data de Julgamento26 Abril 2023
ÓrgãoTribunal Pleno
Ano2023
Número do processo0801915-94.2017.8.14.0000
Classe processualDIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
AssuntoInconstitucionalidade Material

DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (95) - 0801915-94.2017.8.14.0000

RECORRENTE: ASSOCIAÇÃO DOS FABRICANTES DE ÁGUA DO ESTADO DO PARÁ - AFAEPA

RECORRIDO: GOVERNADOR DO ESTADO DO PARÁ, ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO PARÁ - ALEPA

RELATOR(A): Desembargador ROBERTO GONÇALVES DE MOURA

EMENTA

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MERCADO DE ÁGUA. LEI ESTADUAL QUE EXIGE A ADEQUAÇÃO DOS GARRAFÕES DE ÁGUA ADICIONADA DE SAIS À ESPECIFICAÇÕES DETALHADAS PREVISTAS NA LEI. RESTRIÇÃO À COMERCIALIZAÇÃO E CIRCULAÇÃO DE GARRAFÕES RETORNÁVEIS NÃO JUSTIFICADA. OFENSA AO DIREITO DO CONSUMIDOR E À LIVRE CONCORRÊNCIA, ALÉM DE PODER VIR A PROPORCIONAR TRATAMENTO DIFERENCIADO DO MERCADO NACIONAL. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTIGOS 4º, 6º E 7º DA LEI ESTADUAL Nº 8.461/2017 COM EFEITOS EX TUNC E ERGA OMNES. DECISÃO UNÂNIME.

ACÓRDÃO

Acordam os Excelentíssimos Desembargadores integrantes do Órgão Pleno do TJ/PA, à unanimidade de votos, julgar procedente o pedido de inconstitucionalidade dos artigos 4º, 6º e 7º da Lei Estadual nº 8.461/2017, com efeito "ex tunc" e "erga omnes", tudo nos termos do voto relator.

Sessão Ordinária do Pleno do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, realizada no dia vinte e seis de abril de 2023.

Sessão presidida pela Excelentíssima Senhora Desembargadora Maria de Nazaré Silva Gouveia dos Santos.

Belém/PA, 26 de abril de 2023.

Desembargador ROBERTO GONÇALVES DE MOURA

Relator

RELATÓRIO

RELATÓRIO

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR ROBERTO GONÇALVES DE MOURA (RELATOR):

Cuida-se de Ação Direta de Inconstitucionalidade, com pedido de liminar, movida pela Associação dos Fabricantes de Água do Estado do Pará - Afaepa, com o escopo de impugnar materialmente o teor dos arts. 4º, 6º e 7º da Lei Estadual nº 8.461/2017, por ofensa ao disposto no art. 34, § 1º, da Constituição do Estado do Pará e, por conseguinte, ao art. 37, II, da Constituição Federal de 1988, além de sustentar a inconstitucionalidade formal da referida lei.

Em suas razões (id. 255292), a requerente expõe os fatos informando que, em 05 de janeiro de 2017, a Assembleia Legislativa do Estado do Pará editou a Lei nº 8.461, posteriormente sancionada e promulgada pelo Chefe do Executivo, para estabelecer modelos diferenciados de garrafões para envase e venda ao consumidor de água adicionada de sais, comercialmente registradas e autorizadas, sendo que a mencionada lei possui o propósito de diferenciar a água mineral da água adicionada de sais, pelo que assim estabelece:

“Lei 8.461/2017

Art. 4º As embalagens retornáveis destinadas ao envase das águas adicionadas de sais devem seguir os seguintes parâmetros:

I - a volumetria das embalagens retornáveis das águas aditivas de sais será livre, desde que não vedadas por lei. (Redação do inciso dada pela Lei Nº 8516 DE 26/07/2017).

II - as embalagens retornáveis das águas adicionadas de sais devem ser exclusivas para envase do referido produto e litografadas em alto relevo, em tamanho mínimo de 30 cm x 7 cm, com a expressão "água adicionada de sais", sendo expressamente vedado o envase de outro produto nas mesmas;

III - as embalagens devem ser produzidas especificamente para águas adicionadas de sais, a partir de resina, aditivos pigmentos, devendo atender às exigências da legislação vigente para materiais em contato com alimentos e bebidas, sendo obrigatoriamente em coloração vermelha a fim de diferenciá-las das embalagens utilizadas pelas envasadoras de água mineral natural/água natural;

IV - os rótulos do produto a serem fixados nas embalagens de água adicionada de sais, devem obrigatoriamente constar no mínimo o que segue:

a) a designação "água adicionada de sais", em caracteres com tamanho no mínimo da metade dos caracteres utilizados para grafar a marca do produto;

b) a relação das substâncias químicas adicionadas à água e de outras substâncias naturalmente nela presentes, em ordem decrescente de concentração e com as respectivas concentrações em miligramas por litro;

c) a expressão "com gás" ou "gaseificada artificialmente", quando adicionada de gás carbônico;

d) deve constar a forma de tratamento utilizada;

e) a procedência da água utilizada para a produção.

(...)

Art. 6º As empresas de envase de água adicionada de sais ficam proibidas de envasar seu produto em embalagem diferente das especificadas nesta Lei, bem como em qualquer embalagem de "uso exclusivo" de outra envasadora, seja ele de água adicionada de sais ou de água mineral natural/água natural.

Art. 7º Todas as empresas de envase de água, sejam elas adicionada de sais, água mineral ou água natural, ficam proibidas de envasar seu produto em embalagem de "uso exclusivo" de outra envasadora.” (grifei).

Informa que tal lei proíbe que as águas adicionadas de sais sejam envasadas em garrafões de coloração igual da água mineral ou qualquer coloração, exigindo que as embalagens sejam unicamente de coloração vermelha, além de determinar que sejam produzidos garrafões específicos para água adicionada de sais, não podendo envasar em outros garrafões, e proibir que que as envasadoras utilizem embalagens de uso exclusivo de outras envasadoras.

Sustenta a competência deste Tribunal de Justiça para processar e julgar a presente ação direta de inconstitucionalidade, nos termos do art. 125, § 2º, da Constituição Federal e art. 161, inciso I, alínea L, da Constituição Estadual, ressaltando a sua legitimidade ativa para atuar no controle de constitucionalidade estadual, nos termos do art. 162, IX, da Constituição Estadual.

Defende a inconstitucionalidade da lei estadual n° 8.461/17, argumentando que, ao dispor que as águas adicionadas de sais obrigatoriamente sejam envasadas em garrafões com coloração diferente da permitida anteriormente e que sejam produzidos garrafões específicos para o envasamento de água adicionada de sais, a lei estadual acaba por ferir a livre escolha do consumidor.

Esclarece que, antes da lei em questão, o consumidor poderia escolher na hora da compra entre a água mineral e a adicionada de sais, uma vez que possuía um garrafão de coloração padrão e podia fazer a troca com qualquer envasadora, no entanto, a partir da vigência dessa nova lei, só poderão comprar água mineral, não podendo escolher pela água adicionada de sais, a não ser que adquiram novos garrafões vermelhos, fazendo a troca.

Explica, também, que segundo a análise dos impactos econômicos decorrentes da implementação da lei estadual aludida no segmento de água adicionada de sais no Estado do Pará feita pela empresa de Consultoria José do Egypto Neirão Reymão-ME, no tocante a 55% das envasadoras de água adicionada de sais do estado do Pará, a quantidade de vasilhames em circulação é de 889.500 vasilhames, ou seja, o impacto para a reconstituição desse inventário e substituição por garrafões vermelhos será de no mínimo R$9.410.910,00 (nove milhões, quatrocentos e dez mil e novecentos e dez reais).

Frisa que além desse impacto com relação à constituição de um novo inventário, também destaca a dificuldade no descarte do inventário que já possuem.

Salienta que a justificativa apontada para a criação da lei, de que o consumidor vem sendo confundido no ato da compra de água, é totalmente infundada, obsoleta e descabida, visto que as águas adicionadas de sais já possuem a obrigatoriedade de inserir no rótulo de suas embalagens as características do produto e a sua especificação, ou seja, a frase “ÁGUA ADICIONADA DE SAIS” para informar devidamente os consumidores sobre o produto que estão adquirindo, conforme estabelece a resolução RDC n° 274, de 22 de setembro de 2005.

Assevera que a Anvisa não dispõe sobre qualquer reserva ou exclusividade de embalagem para um determinado tipo de água, haja vista que cada embalagem retornada deve ser submetida a processo de pré-lavagem, o qual removerá o rótulo, nos termos da RDC 173/2006, que estabelece também procedimentos de fabricação e higienização das embalagens.

Sobre esse ponto, esclarece também que a Anvisa é responsável pelas águas envasadas, no entanto a própria agência considerou que não há embasamento para que o Estado estabeleça padrões diferentes para as embalagens de envase de água mineral e água adicionada de sais, conforme manifestação do Coordenador Geral de Alimentos.

Quanto ao envase em embalagens intercambiável do galão plástico retornável azul, a requerente assevera que a jurisprudência compreendeu que não causa nenhum prejuízo ao consumidor e permitiu o envase de água adicionada de sais nesses vasilhames, inclusive em vasilhames que contenham em seu fundo a gravação “exclusivo para agua mineral”, vez que nos rótulos há especificações sobre o tipo de água e suas características, conforme exige a RDC 274/2005, não podendo então alegar o engano ou confusão do consumidor.

Realça que, inclusive, o Tribunal de Justiça de São Paulo, em julgamento do Agravo de Instrumento de n° 2228702-50.2014.8.26.0000, afirmou que a reutilização de galões retornáveis pelas águas adicionadas de sais é precedente do STF, sustentando também que os sinais indicativos utilizados pelas empresas de água adicionada de sais para denotar a especialidade do seu produto são visualmente ostensivos e bem claros para chamar atenção do consumidor quando se trata de água diversa da mineral.

Evidencia que, segundo o seu entendimento, quando o consumidor adquire um garrafão pela primeira vez este paga pelo vasilhame e o produto, de forma que se torna legitimo proprietário do garrafão, de forma que, se for mantido os termos da lei ora atacada, ocorrerá fidelização compulsória, uma vez que a lei objeto desta ADI obriga o consumidor a consumir apenas água mineral, visto que para comprar água adicionada de sais deverá adquirir outro vasilhame com coloração diversa daquela que já possuem.

Afirma que, com isso, o consumidor não poderá então escolher o produto pela sua qualidade ou menor preço, mas sim deverá escolher dentre as marcas que produzem água cujo garrafão ele já possui ou...

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