Acórdão nº 0802045-70.2021.8.14.0024 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Público, 02-10-2023

Data de Julgamento02 Outubro 2023
Órgão1ª Turma de Direito Público
Ano2023
Número do processo0802045-70.2021.8.14.0024
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoObrigação de Fazer / Não Fazer

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0802045-70.2021.8.14.0024

APELANTE: ESTADO DO PARÁ

APELADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO PARA, MUNICIPIO DE ITAITUBA

RELATOR(A): Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

EMENTA

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO QUANTO O TEMA 793. SUPERVENIÊNCIA TEMA 1234 STF. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO CONSTITUCIONAL À SAÚDE. PACIENTE PORTADOR DE SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA DO ENTE ESTADUAL DE FORNECER O MEDICAMENTO IMUNOGLOBULINA HUMANA 5g. TEMA 793 DO STF. ARTS. , 196 DA CF. MULTA DIÁRIA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.


ACÓRDÃO

Vistos etc. Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componentes da Primeira Turma de Direito Público, por unanimidade de votos, CONHECER O RECURSO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, NEGANDO-LHE PROVIMENTO, tudo nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Belém (Pa), data de registro do sistema.

Desembargadora

EZILDA PASTANA MUTRAN


RELATÓRIO

Trata-se de EMBARGOS DE DECLARAÇÃO APELAÇÃO CÍVEL interposta pelo ESTADO DO PARÁ em face do MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO PARÁ em favor de Denilson Castro Gomes, nos autos de Ação Civil Pública, contra acórdão proferido por este colegiado, que julgou improcedente os pedidos contidos na apelação.

Em síntese, narrou o Ministério Público na inicial que o paciente Denilson Castro Gomes foi diagnosticado com síndrome de Guillain-Barré, que se encontrava internado no Hospital Regional de Tapajós desde o dia 21/05/2021, e necessita do uso do medicamento IMUNOCLOBULINA HUMANA HIPER-IMUNE – 6 AMPOLAS – 5g. Alegou que buscou o fornecimento do fármaco junto a SESPA e SEMSA, contudo não obteve sucesso em sua demanda, motivo pelo qual buscou o judiciário. Assim, requereu a concessão da tutela de urgência e no mérito a procedência da Ação. (ID. 8674930)

Em decisão interlocutória ID. 8674934, foi deferido o pedido de tutela pleiteado, sendo determinado solidariamente ao Estado do Pará e ao Município de Itaituba, o fornecimento do medicamento IMUNOCLOBULINA HUMANA HIPER-IMUNE – 6 AMPOLAS – 5g, no prazo de 5 (cinco) dias, até o período do término do tratamento do paciente, sob pena de multa diária no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) até o limite de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).

Em sentença (ID. 8675017) proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível e Empresarial de Itaituba, foi julgada procedente a Ação e confirmado os termos da decisão interlocutória ID. 8674934.

Inconformado, o Estado do Pará interpôs a presente Apelação Cível na qual alega preliminarmente a incompetência da Justiça Estadual para julgar o feito, em razão da responsabilidade da União de fornecer o medicamento pleiteado, pois o medicamento é adquirido pelas Secretarias de Estados mediante a transferência de recursos financeiros do Ministério da Saúde.

No mérito, argumenta que ao cumprir a liminar o Estado do Pará suportou o ônus de responsabilidade que pertence a União, motivo pelo qual possui direito ao ressarcimento dos valores gastos com o custo do medicamento, com fundamento no Tema 793 do STF, repetindo no mérito os argumentos expostos em preliminar quanto a responsabilidade da União e competência da Justiça Federal.

Aduz que, no presente caso não há responsabilidade solidaria dos Entes Federados em razão da divisão de competências estabelecida pelo Sistema Único de Saúde – SUS. Argumenta ainda que o valor da multa diária aplicada é desproporcional e exorbitante, sem determinação de limite temporário, devendo ser reduzido para R$ 100,00 (cem reais) por dia, por se tratar de Fazenda Pública. Desse modo, requer o conhecimento e o provimento do recurso. (ID. 8675020)

Em contrarrazões, a parte apelada pugnou pelo desprovimento da Apelação Cível. (ID. 8675028)

A Apelação foi conhecida e desprovida em Acórdão de forma unânime.

Foi oposto o atual Embargos de Declaração, alegando omissão quanto à observância do tema 793 do STF, indicando que a competência da lide é da União.

Foi apresentada contrarrazões, solicitando pelo conhecimento e provimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço dos embargos de declaração interpostos e passo a proferir voto, sob os seguintes fundamentos:

Inicialmente, cumpre ressaltar que são cabíveis embargos declaratórios contra qualquer decisão judicial para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual o juiz devia se pronunciar de ofício ou a requerimento e corrigir erro material.

Desse modo, diz-se que os Embargos de Declaração têm efeito integrativo, servindo apenas para aperfeiçoar a prestação jurisdicional.

Pois bem. Em que pese os argumentos levantados nos presentes embargos não terem sido objeto da decisão hostilizada, bem como, ter sido discutida no acórdão aclarado a questão da responsabilidade passiva, a superveniência do Tema 793 do Supremo Tribunal Federal, reflete diretamente no deslinde da presente demanda relativa ao fornecimento de medicamento.

O STF ao julgar o Recurso Extraordinário n. 855.178-RG, Tema 793, reafirmou a jurisprudência dominante sobre a matéria. Veja-se:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. (RE 855178 RG, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 05/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-050 DIVULG 13-03-2015 PUBLIC 16-03-2015).

No julgamento dos embargos de declaração opostos contra essa decisão, o Plenário deste Supremo Tribunal decidiu o seguinte:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. DESENVOLVIMENTO DO PROCEDENTE. POSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE DE SOLIDÁRIA NAS DEMANDAS PRESTACIONAIS NA ÁREA DA SAÚDE. DESPROVIMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. 1. É da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. 2. A fim de otimizar a compensação entre os entes federados, compete à autoridade judicial, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, direcionar, caso a caso, o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. 3. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União. Precedente específico: RE 657.718, Rel. Min. Alexandre de Moraes. 4. Embargos de declaração desprovidos"( RE 855.178-RG-ED, Redator para o acórdão o Ministro Edson Fachin, DJe 16.4.2020).

No entanto, ainda ocorreram divergências na interpretação dada ao julgamento do STF sobre, o que veio ser esclarecido de forma ainda mais detalhada no seguinte julgamento:

CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO EM RECLAMAÇÃO. INDEVIDA APLICAÇÃO DO TEMA 793 DA REPERCUSSÃO GERAL PELO JUÍZO DA ORIGEM. ÔNUS OBRIGACIONAL A SER SUPORTADO PELA UNIÃO. NECESSIDADE DE SUA INCLUSÃO NO POLO PASSIVO. AGRAVO INTERNO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. 1. O objeto do Agravo é a correta interpretação e aplicação da tese fixada no Tema 793 da Repercussão Geral, cujo teor é o seguinte: "os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro". 2. A solidariedade atribuída a todos os entes (art. 23, II, da CF) não pode significar possibilidade absoluta de atropelo, por ordens judiciais, da estrutura fixada essencialmente a partir da lógica hierarquizada e sistematizada das ações e serviços públicos de saúde (art. 198, caput e I, da CF), materializada pela divisão de atribuição feita pela Lei 8.080/1990, que instituiu o Sistema Único de Saúde. 3. A interpretação do Tema 793-RG deve considerar a existência de solidariedade entre todos os entes em caso de competência comum, mas deve observar o direcionamento necessário da demanda judicial ao ente responsável pela prestação específica pretendida, permitindo-se que o cumprimento seja direto e, eventual ressarcimento, eficaz. Nesses casos, quando identifica-se a responsabilidade direta da União pelo fornecimento do medicamento ou pelo tratamento pretendido, nos termos da Lei 8.080/1990, sua inclusão no polo passivo da demanda é medida necessária, a ser providenciada pelo juiz da causa, evitando-se o descompasso entre a previsão orçamentária e a concretização da despesas na área da saúde. 4. Da mesma forma, quando se objetivar a "incorporação, a exclusão ou a alteração pelo SUS de novos medicamentos, produtos e procedimentos, bem como a constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica", as quais são atribuições do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS, nos termos do art. 19-Q da Lei 8.080/1990, a inclusão da União também se fará necessária. 5 No caso concreto, entendeu-se pela desnecessidade da inclusão da União no polo passivo, sob o argumento de tratar-se de obrigação solidária de todos os Entes Políticos. Entretanto, trata-se de pedido de fornecimento de medicamentos para tratamento oncológico, não incluído nas políticas públicas do SUS, o que obriga a sua...

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