Acórdão nº 0802048-29.2023.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Seção de Direito Penal, 2023

Número do processo0802048-29.2023.8.14.0000
Classe processualHABEAS CORPUS CRIMINAL
AssuntoLiberdade Provisória
ÓrgãoSeção de Direito Penal

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) - 0802048-29.2023.8.14.0000

PACIENTE: IRACILDA DOS SANTOS

AUTORIDADE COATORA: JUÍZO DE DIREITO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE NOVO REPARTIMENTO

RELATOR(A): Desembargadora VÂNIA LÚCIA CARVALHO DA SILVEIRA

EMENTA

HABEAS CORPUS. ARTS. 33 E 35 DA LEI Nº 11.343/06. ALMEJADO RECONHECIMENTO DE NULIDADE ANTE A INOBSERVÂNCIA DO RITO DO ART. 55 DA LEI Nº 11.343/06. NÃO COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO. EXCESSO DE PRAZO. INOCORRÊNCIA. RAZOABILIDADE. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES DA SEGREGAÇÃO CAUTELAR. IMPROCEDÊNCIA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE CONCRETA DO CRIME. ELEVADA QUANTIDADE DE DROGA ENCONTRADA EM PODER DOS ACUSADOS. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. SÚMULA Nº 08 DO TJE/PA. ORDEM DENEGADA. DECISÃO UNÂNIME.

1. Agiu o juiz, de fato, em contrariedade ao que estipula o art. 55 da Lei nº 11.343/06, recebendo a denúncia antes de notificar os acusados para a apresentação de resposta à acusação. Todavia, é cediço que, de acordo com a jurisprudência das Cortes Superiores, para que se reconheça a aventada nulidade – a qual é relativa – é necessário que haja comprovação de prejuízo para o réu, advindo da supracitada inversão, o que não ocorre no caso em tela. Princípio do pas de nullité sans grief.

2. Não há que se falar em constrangimento ilegal por excesso de prazo se o feito tramita regularmente, talvez não com a celeridade desejada, mas, ainda assim, em tempo aceitável, devendo-se levar em conta o princípio da razoabilidade, pelo qual não basta a simples ultrapassagem dos prazos legais para assegurar ao réu o direito à liberdade. Para tanto, a demora na instrução há de ser injustificada, o que não se vislumbra no vertente caso.

3. Observa-se a existência de fundamentos suficientes e aptos à manutenção da prisão cautelar do paciente, em razão não só dos indícios de autoria e materialidade, mas, principalmente, para a garantia da ordem pública – dada a natureza e a gravidade concreta dos crimes em epígrafe, pois a paciente e o corréu tinham em poder e mantinham em sua posse alta quantidade de maconha.

3. Quanto ao argumento de a acusada possuir condições pessoais favoráveis, está pacificado nesta Egrégia Câmara que tal característica não é garantidora de eventual direito à liberdade, quando os motivos que ensejaram a prisão cautelar são suficientes para respaldá-la, nos termos da Súmula nº 08 do TJE/PA.

5. ORDEM DENEGADA à unanimidade, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Seção De Direito Penal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em DENEGAR a ordem impetrada, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Sessão do Plenário Virtual do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, iniciada aos vinte e um dias e finalizada aos vinte e três dias do mês de março de 2023.

Julgamento presidido pela Excelentíssima Desembargadora Eva do Amaral Coelho.

Belém/PA, 21 de março de 2023.

Desa. VÂNIA LÚCIA SILVEIRA

Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de Habeas Corpus Liberatório com pedido de liminar impetrado em favor de IRACILDA DOS SANTOS, em face de ato do Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Novo Repartimento/PA, nos autos do processo de conhecimento criminal n.º 0802194-26.2022.8.14.0123.

Consta da impetração que a paciente foi presa em flagrante delito no dia 17.10.2022, prisão essa posteriormente homologada e convertida em preventiva, pela suposta prática dos crimes ínsitos nos arts. 33 e 35 da Lei nº 11.343/06.

Alega a impetrante a nulidade processual absoluta, ante a não observância do rito procedimental contido na Lei n.º 11.343/06, uma vez que o juízo a quo recebeu a denúncia sem antes determinar a notificação dos acusados.

Aduz, ainda, que o reconhecimento da aludida nulidade importará em excesso de prazo, eis que a prisão da paciente já perfaz mais de 113 (cento e treze) dias.

Afirma a ausência de requisitos legais para a manutenção da prisão cautelar da paciente, uma vez que a paciente sempre negou qualquer envolvimento com a prática delituosa em tela, além de possuir condições subjetivas favoráveis.

Pugna pela concessão liminar da ordem.

A liminar foi indeferida ante a ausência de seus requisitos legais.

Solicitadas as informações da autoridade coatora, esta esclarece:

“(...) a) Trata-se de Ação Penal que noticia a suposta prática do delito de tráfico de drogas e associação para o tráfico (art. 33 e art. 35, ambos da Lei nº 11.343/2006). Em síntese, segundo narra a denúncia, Iracilda, na companhia de outra pessoa, identificada como Gerson de Araújo Fernandes, teria sido presa em flagrante delito pela Polícia Rodoviária Federal, em virtude de ter sido flagrada transportando, em compartimento oculto de veículo, o montante de 55 Kg de cocaína, divididos em 50 tabletes. Referida droga estaria sendo transportada pelos acusados desde o município de Santarém, com destino final em Marabá, onde seria repassada para terceiro, tendo sido acordado o pagamento da quantia de R$ 10.000,00 pelo transporte.

b) A prisão preventiva foi determinada após acolhimento do pedido do Parquet, em razão da necessidade de garantia da ordem pública e por conveniência da instrução criminal, pois a acusada foi presa, juntamente com o segundo acusado, Gerson de Araújo Fernandes, em posse de vultosa soma da substância conhecida como cocaína, consoante atesta o laudo toxicológico provisório (55 Kg cindidos em 50 tabletes). Além disso, foram apreendidos a quantia de R$ 1.128,40, dois celulares e o veículo que transportava a droga. A mencionada substância estaria sendo transportada para o município de Marabá, onde seria entregue para terceiro, sob a promessa de pagamento da quantia de R$ 10.000,00, havendo fundado receio de reiteração criminosa, além disso, por entender este juízo que em liberdade a acusada poderia coagir testemunhas e/ou destruir provas.

c) A Paciente é primária.

d) O feito se encontra aguardando a realização da audiência de instrução e julgamento, designada para o dia 15/03/2022, às 09h45 (data e horário de agendamento mais próximos e livres na pauta de audiências à época da decisão). (...)”

Nesta Superior Instância, o Procurador de Justiça Hamilton Nogueira Salame opina pela denegação do writ.

É o relatório.

VOTO

Da análise acurada dos presentes autos, bem como, com base nas informações do Juízo processante, observa-se que a pretensão não merece prosperar.

Observa-se que a impetrante requer a nulidade processual absoluta, ante a não observância do rito procedimental contido na Lei n.º 11.343/06, uma vez que o juízo a quo recebeu a denúncia sem antes determinar a notificação dos acusados.

Das peças colacionadas aos autos, vê-se que a denúncia (oferecida em 02.12.2022) foi recebida em 06.12.2022, tendo o juiz, na mesma oportunidade, determinado a notificação da paciente e do corréu para a apresentação da defesa preliminar, assim como, designado a audiência de instrução e julgamento para 15.03.2023 (fls. 118/120).

Agiu o juiz, de fato, em contrariedade ao que estipula a Lei nº 11.343/06, a qual determina:

Art. 55. Oferecida a denúncia, o juiz ordenará a notificação do acusado para oferecer defesa prévia, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias.

(...)

§ 4º Apresentada a defesa, o juiz decidirá em 5 (cinco) dias.

(...)

Art. 56. Recebida a denúncia, o juiz designará dia e hora para a audiência de instrução e julgamento, ordenará a citação pessoal do acusado, a intimação do Ministério Público, do assistente, se for o caso, e requisitará os laudos periciais.

Ocorre que, como cediço, de acordo com a jurisprudência das Cortes Superiores, para que se reconheça a aventada nulidade, a qual é relativa, é necessário que haja comprovação de prejuízo para o réu, advindo da não observância do referido rito procedimental, sendo insuficiente a alusão genérica a hipóteses prováveis, em razão do art. 563 do CPP, que consagra o princípio do pas de nullité sans grief, estabelecendo que “nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa”.

Não se vê, da presente impetração, a comprovação de qual prejuízo teria sofrido o paciente, até porque, em consulta ao PJE-1º Grau, vê-se que a defesa, inclusive, já apresentou a defesa preliminar em 07.03.2023.

Neste sentido:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. INOBSERVÂNCIA DO RITO PROCEDIMENTAL PREVISTO NO ART. 55 DA LEI N. 11.343/2006. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. NULIDADE NÃO DECLARADA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. "A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é no sentido de que a inobservância do rito procedimental previsto no art. 55 da Lei n. 11.343/2006, que prevê a apresentação de defesa preliminar antes do recebimento da denúncia, gera nulidade relativa, desde que demonstrados, concretamente, eventuais prejuízos suportados pela defesa, (...)' (AgRg no AREsp 292.376/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, DJe 21/9/2015), o que inocorre na espécie" (RHC 52.147/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, DJe 23/6/2017). 2. Recurso ordinário desprovido. (STJ - RHC n. 113.880/SP, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 26/5/2020, DJe de 10/6/2020.)

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. DESIGNAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO ANTES DO OFERECIMENTO DE DEFESA PRÉVIA E DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. DESCUMPRIMENTO DE FORMALIDADE QUE NÃO IMPEDIU O ATENDIMENTO DOS PRECEITOS PROCESSUAIS PENAIS PERTINENTES. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. MÁCULA NÃO CARACTERIZADA. DESPROVIMENTO DO RECLAMO. 1. Conquanto o princípio do devido processo legal compreenda a garantia ao procedimento tipificado em lei, não se admitindo a inversão da ordem processual ou a adoção de um rito por outro, não se pode olvidar que as regras procedimentais não...

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