Acórdão nº 0802237-23.2020.8.14.0061 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Privado, 04-07-2023

Data de Julgamento04 Julho 2023
Órgão2ª Turma de Direito Privado
Ano2023
Número do processo0802237-23.2020.8.14.0061
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoAlienação Fiduciária

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0802237-23.2020.8.14.0061

APELANTE: ADMINISTRADORA DE CONSORCIO NACIONAL HONDA LTDA

APELADO: JULIA CRISTIANE DA COSTA PAIVA

RELATOR(A): Desembargadora MARIA DE NAZARÉ SAAVEDRA GUIMARÃES

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO – DETERMINAÇÃO DE JUNTADA DE CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO ORIGINAL – ALEGAÇÃO DE CONTRATO ELETRÔNICO – NÃO COMPROVAÇÃO – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA A QUO – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Cinge-se a questão na decisão “a quo” proferida pelo Juízo a quo que extinguiu o processo sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, inciso VI, do CPC.

2. No caso em comento, observa-se que o Juízo de 1º grau, em despacho (ID 13252916), determinou a emenda, para a juntada do contrato original, tendo a parte autora, entretanto, permanecido inerte, não juntando a cédula de crédito original, conforme se depreende da certidão ID 13252926.

3. Na qualidade de título de crédito, a cédula bancária é regida pelas normas do direito cambiário, e como o crédito nela indicado pode ser transferido a outrem por endosso em preto, ao endossatário é permitido exercer todos os direitos a ele conferidos, inclusive exigir o pagamento do principal e dos demais encargos avençados no instrumento.

4. Assim, devidamente demonstrada a necessidade da juntada do documento original, sendo insuficiente, cópia, ainda que autenticada, tendo em vista a natureza cambial e a possibilidade de circulação do mencionado título. Esse é o posicionamento atual prevalecente de nossa jurisprudência nacional.

5. No mais, em que pese a afirmação do apelante de que o contrato mencionado nos autos seria digital, impende consignar que tal alegação não restou comprovada, ainda que oportunizado pelo magistrado de piso, uma vez que, pelo que se infere do pacto, trata-se na verdade de assinatura por meio de caneta magnética ou eletrônica, e não assinatura digital/eletrônica que, por certo, exigiria um certificado digital emitido por uma das autoridades associadas à ICP-Brasil, o que não se fez presente no caso vertente.

6. Recurso Conhecido e Improvido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL, tendo como apelante ADMINISTRADORA DE CONSORCIO NACIONAL HONDA LTDA., e como apelada JÚLIA CRISTIANE DA COSTA PAIVA.

Acordam os Excelentíssimos Desembargadores, Membros da 2ª Turma de Direito Privado deste Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade, em CONHECER DO RECURSO E NEGAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto da Excelentíssima Desembargadora-Relatora Maria de Nazaré Saavedra Guimarães.

Belém/PA, 04 de julho de 2023.

MARIA DE NAZARÉ SAAVEDRA GUIMARÃES

Desembargadora – Relatora

RELATÓRIO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0802237-23.2020.8.14.0061

APELANTE: ADMINISTRADORA DE CONSORCIO NACIONAL HONDA

LTDA

APELADA: JULIA CRISTIANE DA COSTA PAIVA

RELATORA: DESª MARIA DE NAZARÉ SAAVEDRA GUIMARÃES

EXPEDIENTE: 2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO

RELATÓRIO

Tratam os presentes autos de recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto por ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO NACIONAL HONDA LTDA., inconformada com a sentença prolatada pelo Juízo da 1ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Tucuruí/PA que, nos autos de AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO, ajuizada por si em face de JÚLIA CRISTIANE DA COSTA PAIVA, julgou o processo extinto sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, VI, do CPC.

Inconformada, a ora recorrente interpôs o presente recurso (ID 13252929), alegando a necessidade de reforma da sentença, posto que se trata de contrato eletrônico, e, portanto, impossível de ser acostado aos autos o contrato na sua forma física, salientando que as partes firmaram o negócio jurídico mediante assinatura digital, a qual se mostra totalmente eficaz e não invalida o contrato.

Assevera que as cláusulas do contrato são padronizadas, não havendo a necessidade de conter a assinatura “física” do devedor, já que, ao assinar digitalmente o documento, tomou ciência de todo o conteúdo do contrato, concordando com todos os seus termos, sendo assim, o fato de não conter a assinatura expressa do agravado, não lhe acarreta qualquer prejuízo e não invalida o contrato celebrado.

Assevera que a presente ação é regida pelo Decreto-Lei 911/69, e, que, a liminar de busca e apreensão é de deferimento obrigatório, quando presentes os requisitos inerentes à sua concessão.

Pleiteia, assim, pelo conhecimento e provimento do presente recurso para anular a sentença ora recorrida, com o fim de determinar o prosseguimento do feito, como medida da mais lídima justiça.

O prazo para apresentação das contrarrazões decorreu in albis, conforme certidão de ID 13252941.

É o Relatório.

VOTO

JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

Avaliados, preliminarmente, os pressupostos processuais subjetivos e objetivos deduzidos pelo apelante, tenho-os como regularmente constituídos, bem como atinentes à constituição regular do feito até aqui, razão pela qual conheço do recurso, passando a proferir voto.

QUESTÕES PRELIMINARES

Face a ausência de questões preliminares, passo a análise do mérito do presente recurso.

MÉRITO

Cinge-se a questão na decisão “a quo” proferida pelo Juízo a quo que extinguiu o processo sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, inciso VI, do CPC.

No caso em comento, observa-se que o Juízo de 1º grau, em despacho (ID 13252916), determinou a emenda, para a juntada do contrato original, tendo a parte autora, entretanto, permanecido inerte, não juntando a cédula de crédito original, conforme se depreende da certidão ID 13252926.

Cumpre salientar, que a Cédula de Crédito Bancário possui regramento próprio (Lei 10.931/04), aplicando-se o CPC apenas naquilo que não for contrário a aludida lei, consoante previsto em seu art. 44:

“Aplica-se às Cédulas de Crédito Bancário, no que não contrariar o disposto nesta Lei, a legislação cambial, dispensado o protesto para garantir o direito de cobrança contra endossantes, seus avalistas e terceiros garantidores.”

Nesse sentido, a cédula de crédito bancário está sujeita à negociação, nos termos do art. 29, §1º da Lei n. 10.931/2004, e, por isso, é necessário que o original da cambial instrua a busca e apreensão, a fim de que o credor comprove a sua legitimidade.

Oportuno ressaltar que a juntada aos autos do título de creditício original é providência indispensável, em razão do princípio da cartularidade, haja vista a possibilidade de sua circulação, mercê de endosso (art. 29, §1º da Lei nº. 10.931/2004), sendo, pois, insuficiente sua apresentação por cópia.

O art. 26 da Lei nº. 10.931/2004 assim dispõe:

“Art. 26. A Cédula de Crédito Bancário é título de crédito emitido, por pessoa física ou jurídica, em favor de instituição financeira ou de entidade a esta equiparada, representando promessa de pagamento em dinheiro, decorrente de operação de crédito, de qualquer modalidade.”

Na qualidade de título de crédito, a cédula bancária é regida pelas normas do direito cambiário. Como o crédito nela indicado pode ser transferido a outrem por endosso em preto, ao endossatário é permitido exercer todos os direitos a ele conferidos, inclusive exigir o pagamento do principal e dos demais encargos avençados no instrumento.

Assim, devidamente demonstrada a necessidade da juntada do documento original, sendo insuficiente, cópia, ainda que autenticada, tendo em vista a natureza cambial e a possibilidade de circulação do mencionado título. Esse é o posicionamento atual prevalecente de nossa jurisprudência nacional, senão vejamos:

Em caso semelhante, assim decidiu o STJ:

“RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO - DETERMINAÇÃO DE EMENDA À INICIAL A FIM DE QUE FOSSE APRESENTADO O TÍTULO ORIGINAL DA CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO - PROVIDÊNCIA NÃO ATENDIDA SEM CONSISTENTE DEMONSTRAÇÃO DA INVIABILIDADE PARA TANTO - TRIBUNAL A QUO QUE MANTEVE A SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL, NOS TERMOS DO ART. 267, INC. I, DO CPC, POR AFIRMAR QUE A CÓPIA DO CONTRATO DE FINANCIAMENTO É INÁBIL PARA EMBASAR A DEMANDA. INSURGÊNCIA DA CASA BANCÁRIA.

Hipótese: Controvérsia acerca da necessidade de apresentação do título original do contrato de financiamento com garantia fiduciária (cédula de crédito bancário) para instruir a ação de busca e apreensão.

1. Possibilidade de recorrer do "despacho de emenda à inicial".

Excepciona-se a regra do art. 162, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil quando a decisão interlocutória puder ocasionar prejuízo às partes. Precedentes.

2. Nos termos da Lei nº 10.931/2004, a cédula de crédito bancário é título de crédito com força executiva, possuindo as características gerais atinentes à literalidade, cartularidade, autonomia, abstração, independência e circulação.

O Tribunal a quo, atento às peculiaridades inerentes aos títulos de crédito, notadamente à circulação da cártula, diligente na prevenção do eventual ilegítimo trânsito do título, bem como a potencial dúplice cobrança contra o devedor, conclamou a obrigatoriedade de apresentação do original da cédula, ainda que para instruir a ação de busca e apreensão, processada pelo Decreto-Lei nº 911/69.

A ação de busca e apreensão, processada sob o rito do Decreto-Lei nº 911/69, admite que, ultrapassada a sua fase inicial, nos termos do artigo 4º do referido regramento normativo, deferida a liminar de apreensão do bem alienado fiduciariamente, se esse não for encontrado ou não se achar na posse do devedor, o credor tem a faculdade de, nos mesmos autos, requerer a conversão do pedido de busca e apreensão em ação executiva.

A. juntada do original do documento representativo de crédito líquido, certo e exigível, consubstanciado em título de crédito com força executiva, é a regra, sendo requisito indispensável não só para a execução propriamente dita, mas, também, para todas as demandas nas quais a pretensão esteja amparada na referida cártula.

A dispensa da juntada do original do título somente ocorre quando...

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