Acórdão nº 0802790-71.2019.822.0000 de TJRO. Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, Segundo Grau, 20-04-2020

Data de Julgamento20 Abril 2020
Classe processualDIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Número do processo0802790-71.2019.822.0000
ÓrgãoTribunal Pleno
ESTADO DE RONDÔNIA PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Tribunal Pleno / Gabinete Des. José Antônio Robles



Processo: 0802790-71.2019.8.22.0000 - DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (95)

Relator: JOSE ANTONIO ROBLES



Data distribuição: 31/07/2019 09:59:49

Data julgamento: 16/03/2020

Polo Ativo: HILDON DE LIMA CHAVES e outros
Polo Passivo: CAMARA MUNICIPAL DE PORTO VELHO



RELATÓRIO






Trata-se de AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE promovida pelo PREFEITO DO MUNICÍPIO DE PORTO VELHO (HILDON LIMA CHAVES), em face da Lei n. 2.602/19, que dispõe sobre a instalação, em estabelecimentos públicos ou privados destinados ao uso coletivo, onde circulem diariamente mais de quinhentas pessoas, de fraldários para uso por gestantes, portadores de necessidades especiais ou com mobilidade reduzida e idosos.



Sustenta a inconstitucionalidade da norma, sob o fundamento de representar ingerência do Legislativo Municipal ao dispor sobre a organização e funcionamento da administração municipal, na medida que é do Chefe do Executivo a competência para iniciar processo legislativo que verse sobre a “estruturação de órgãos públicos, quiçá, alteração das construções e modificações em prédios públicos e prédios privados”.



Demais disso, aduz que aludida lei não trata da desnecessidade da existência de fraldário em bares, local este onde criança não pode frequentar, sendo ainda omissa ao não especificar como deve ser o fraldário, além de inexistir previsão de sanção no caso de descumprimento, o que tornaria a norma inócua; por fim, registra que a norma viola o direito de propriedade, ao ditar regras para estabelecimentos privados (art. 170 da CF).





Assim, apontando vício de inconstitucionalidade, propugna pela declaração de inconstitucionalidade formal, com efeitos ex tunc, da Lei n. 2.602/2019. (Núm. 6644621)


Juntou os documentos necessários à instrução desta ação, conforme certificado (Núm. 6645157).


Por meio da decisão de n. 7041635, reconheceu-se a relevância da matéria e, como consequência, esta demanda passou a seguir o rito previsto no art. 12 da Lei n. 9.868/1999 (dispõe sobre o processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal).


A Câmara Municipal de Porto Velho propugna pelo julgamento de improcedência dos pedidos constantes nesta ação, “visto que a lei guerreada não tratou de nenhuma matéria de iniciativa legislativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo e tampouco violou o princípio da separação de poderes”, colacionando, para tanto, o julgamento havido nos autos do Recurso Extraordinário n.º 742532-SP, de relatoria da Excelentíssima Senhora Ministra Cármen Lúcia.


Subsidiariamente, requer que a inconstitucionalidade seja declarada restritivamente à expressão “públicos”, prevista no início do art. 1º. (Núm. 7232770).


A Procuradoria-Geral do Município de Porto Velho, notificada, absteve-se de se manifestar, ao fundamento desta ação ser também de sua lavra (Núm. 7274933).


Por seu turno, a Procuradoria-Geral do Estado de Rondônia aduz não vislumbrar violação à Constituição Estadual, razão pela qual não tem interesse jurídico no feito (Núm. 7375912).


Com vista dos autos, o eminente Procurador-Geral de Justiça, Dr. Osvaldo Luiz de Araújo, em sede de r. parecer, aduz ser caso de parcial procedência, pois, “a despeito da boa intenção do legislador, a norma inquinada, de iniciativa parlamentar, imiscuiu-se na organização, administração e em atribuições de órgãos da administração pública municipal, além de criar despesas ao Poder Executivo”, o que caracteriza vício de inconstitucionalidade formal, devido à iniciativa ser exclusiva do chefe do Executivo Municipal.






Lado outro, “no que refere à obrigatoriedade de instalação em estabelecimentos privados o entendimento que vem sendo adotado pelo Supremo Tribunal Federal, é o de que normas criadas nesse sentido não padecem de vício formal de inconstitucionalidade”. (Núm. 7456262).




É o relatório.


VOTO

DESEMBARGADOR JOSÉ ANTONIO ROBLES

A Lei Municipal nº. 2.602/2016, referida na presente ação, possui o seguinte texto:

“Dispõe sobre a instalação de fraldários para uso de pessoas gestantes, necessidades especiais e idosas”.
FAÇO SABER que a CÂMARA MUNICIPAL DE PORTO VELHO manteve, e eu, Vereador EDWILSON NEGREIROS Presidente da Câmara Municipal, promulgo, nos termos do § 6º, do art. 72 da Lei Orgânica do Município, a seguinte
LEI:
Art. 1° - Os estabelecimentos públicos ou privados destinados ao uso coletivo, onde circulem diariamente mais de quinhentas pessoas, deverão dispor de pelo menos um fraldário acessível, contendo equipamentos e acessórios de maneira que possam ser utilizados por gestantes, idosos, pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.
Parágrafo único – Entende-se por fraldário, ambiente reservado que disponha de mesa para troca de fraldas, lavatório e produtos destinados à higienização.
Art. 2º - As despesas decorrentes da execução desta Lei correrão por conta das dotações orçamentárias próprias, suplementadas, se necessário.
Art. 3º - Esta Lei entrará em vigor, 90 (noventa) dias após a sua publicação.”

Pois bem.

A teor do disposto no art. 39, § 1º, II, d, e art. 65, VII, ambos da Constituição do Estado de Rondônia, é de iniciativa privativa do Governador do Estado dispor sobre leis que tratem da criação, estruturação e atribuição das Secretarias de Estado e Órgãos do Poder Executivo, bem como da organização e o funcionamento da administração do Estado. Confira-se:

“Art. 39. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Assembleia Legislativa, ao Governador do Estado, ao Tribunal de Justiça, ao Tribunal de Contas, ao Ministério Público, à Defensoria Pública e aos cidadãos, na forma prevista nesta Constituição.
§ 1° São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:
II - disponham sobre:
d) criação, estruturação e atribuição das Secretarias de Estado e Órgãos do Poder Executivo.
Art. 65. Compete privativamente ao Governador do Estado:
VII - dispor sobre a organização e o funcionamento da administração do Estado na forma da lei”.

Tais dispositivos estão em consonância com o disposto no art. 61, § 1º, II, b, da Constituição Federal, in verbis:

“Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.
§ 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:
II - disponham sobre:
b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios”.

Em razão do princípio da simetria, essas normas devem ser observadas, também, no âmbito da legislação municipal, de modo que há de ser respeitada a iniciativa privativa do Prefeito acerca de lei que trate da criação, estruturação e atribuição das Secretarias Municipais e Órgãos do Poder Executivo Municipal, bem como da organização e o funcionamento da administração do Município.

Nesse diapasão, a própria Lei Orgânica do Município de Porto Velho, em seus art. 65, § 1º, IV, e art. 87, trata do tema, nos seguintes termos:

“Art. 65 - A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara Municipal, ao Prefeito e aos cidadãos, na forma prevista na Constituição Federal e Estadual e nesta Lei Orgânica.
§ 1º - São de iniciativa privativa do Prefeito as leis que disponham sobre:
IV - criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgão da Administração Pública Municipal”.
“Art. 87 - Compete privativamente ao Prefeito:
III - iniciar o processo legislativo, na forma e nos casos previstos nesta Lei Orgânica;
VI - dispor sobre a organização e funcionamento da administração municipal, na forma da lei”.


No caso em apreço, a Lei n.º 2.602/19 teve por origem projeto de autoria de membro do Poder Legislativo Municipal, norma essa por meio da qual, como visto, estabeleceu, em seu art. 1º, obrigações a estabelecimentos públicos e privados destinados ao uso coletivo, onde circulem diariamente mais de quinhentas pessoas, no sentido de dispor de pelo menos um fraldário acessível, em que deverá conter “equipamentos e acessórios de maneira que possam ser utilizados por gestantes, idosos, pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida”.

Da
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