Acórdão nº 0802947-27.2023.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Público, 25-09-2023

Data de Julgamento25 Setembro 2023
Órgão1ª Turma de Direito Público
Ano2023
Número do processo0802947-27.2023.8.14.0000
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
AssuntoAbono Pecuniário (Art. 78 Lei 8.112/1990)

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) - 0802947-27.2023.8.14.0000

AGRAVANTE: EDINALVA MAROTO DE ANDRADE

AGRAVADO: MUNICIPIO DE URUARA

RELATOR(A): Desembargadora ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA

EMENTA

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE COBRANÇA. JUSTIÇA GRATUITA. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. PRESUNÇÃO RELATIVA DE VERACIDADE. BENEFÍCIO INDEFERIDO PELO JUÍZO A QUO. AUSÊNCIA DE PROVAS EM SENTIDO CONTRÁRIO. SITUAÇÃO QUE AUTORIZA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

1. Cinge-se a controvérsia recursal acerca do acerto ou não da decisão de 1º grau que indeferiu o benefício da justiça gratuita pleiteado pela autora, por entender que os indícios constantes nos autos afastavam a presunção de pobreza;

2. A Justiça Gratuita possui presunção meramente relativa, a mesma pode ser desconstituída de ofício pelo magistrado, assim como por requerimento, se comprovado que o beneficiário tem condições para arcar com as custas processuais, ou seja, é necessária prova escorreita da capacidade econômico-financeira da parte beneficiada;

3. O indeferimento da gratuidade de justiça deve observar as hipóteses elencadas no art. 99, §2º do Código de Processo Civil, o que não se vislumbra no caso em apreço.

4. Analisando os autos, verifica-se que a justiça gratuita foi indeferida pelo juízo monocrático sob o fundamento da requerente auferir renda, possuir reservas em contas bancárias, além de possuir bens móveis e imóveis em seu nome;

5. Todavia, pelos documentos que instruem o processo de origem, constata-se que há relevância nas alegações da agravante, além de haver risco de dano de difícil reparação, caso o acesso à Justiça lhe seja negado.

6. Em que pese a declaração de imposto de renda demonstrar a existência de bens móveis, de um bem imóvel, de uma pequena aplicação financeira e um saldo na conta corrente da agravante e na conta do inventário, tais documentos, a meu ver, não são capazes de desconstituir a condição de hipossuficiência da agravante.

7. Isto porque, é cediço que a lei não exige a miserabilidade para a concessão do benefício, senão que o pagamento das despesas processuais possa acarretar prejuízo a própria manutenção do postulante e de sua família.

8. Recurso conhecido e provido, nos termos da fundamentação.

Vistos, etc.,

Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componentes da 1ª Turma de Direito Público, por unanimidade de votos, em CONHECER E DAR PROVIMENTO ao recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Plenário Virtual da 1ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, com início aos vinte e cinco dias do mês de setembro do ano de dois mil e vinte e três.

RELATÓRIO

RELATÓRIO

A EXMA. DESEMBARGADORA ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA (RELATORA):

Tratam os presentes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA RECURSAL, interposto por EDINALVA MAROTO DE ANDRADE, contra decisão interlocutória proferida pelo M.M Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Uruará, proferida nos autos da Ação de cobrança (Proc. n. 0800953-91.2022.8.14.0066), tendo como ora agravado o MUNICÍPIO DE URUARÁ.

Narra a agravante que ajuizou ação de cobrança em desfavor do Município de Uruará visando a cobrança dos valores referentes ao Abono do Fundeb do ano de 2021, proporcional aos meses trabalhados pelo de cujus, porém o Juízo a quo indeferiu o pedido de assistência judiciária gratuita, nos seguintes termos (id. 12802721):

“(...) No caso, afastada a presunção de pobreza pelos indícios constantes nos autos, observando-se a própria natureza e objeto da causa, a parte interessada não trouxe documentos suficientes para comprovar a impossibilidade de arcar com as custas, despesas processuais e sucumbência.

Ademais, há notícia de que a parte interessada aufere renda, possui reservas em contas bancárias, além de contar com bens móveis e imóveis em seu nome, o que é incompatível com a alegação de pobreza (ID 75267029 e 75269839).

Ante o exposto, INDEFIRO o pedido de gratuidade.

INTIME-SE a parte demandante para que emende a inicial, providenciando a comprovação do recolhimento das custas judiciais e despesas processuais, no prazo de 10 (dez) dias, sob pena de extinção do processo, por falta de pressuposto processual, sem nova intimação. (...)”

Inconformada, a autora interpôs o presente Agravo de Instrumento.

Em suas razões, aduz que o magistrado de piso indeferiu o pedido de assistência judiciária gratuita sob a justificativa de que a parte interessada aufere renda, possui reservas em contas bancárias e bens móveis e imóveis, conforme declaração de imposto de renda juntada aos autos.

Argui que para a concessão do benefício não é necessário que o requerente se encontre em situação de miserabilidade, pois conforme o art. 98 do CPC, a simples afirmação da parte no sentido de que não está em condições de pagar as custas processuais sem prejuízo do seu sustento e de sua família, corroborada com os elementos de prova capazes de sustentar tal alegação, é suficiente para o deferimento.

Assevera que a decisão agravada causa dano irreparável caso não seja concedida a antecipação de tutela, pois, uma vez que comprovada a hipossuficiência econômica da agravante, o Poder Judiciário não deve criar obstáculos, sob pena de violação ao princípio da Inafastabilidade Jurisdicional.

Aponta que foi apresentado nos autos de origem os valores que dispõe em sua conta bancária, bem como o auxílio-doença que recebe do INSS, o qual, inclusive, estava suspenso, e que é com a sua remuneração que a agravante se mantém e mantém sua filha menor de idade, estudante e moradora de outra cidade.

Aduz que suas despesas fixas comprometem praticamente toda a sua renda mensal, o que torna impossível para a agravante exercer o seu direito à tutela jurisdicional caso precisa pagar, ainda que parcelado.

Pugna pela concessão da tutela antecipada, no sentido de suspender os efeitos da decisão de piso, determinando o prosseguimento do feito sem o recolhimento das custas e despesas processuais, e no mérito, o conhecimento e provimento do recurso, para conceder a gratuidade da justiça.

Em decisão monocrática de id. 12836043, deferi a tutela recursal pretendida.

O Município Agravado não apresentou contrarrazões, conforme certidão de id. 14940991.

Instada a se manifestar, a Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e provimento do recurso, a fim de reformar a decisão guerreada para assegurar a gratuidade processual à recorrente (id. 15235654).

É o relatório.

VOTO

VOTO

A EXMA. DESEMBARGADORA ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA (RELATORA):

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Ressalto que o conhecimento do agravo deve ficar restrito ao acerto ou não da decisão atacada, não sendo viável discussão aprofundada de temas relativos ao mérito da causa, sob pena do indevido adiantamento da tutela jurisdicional pleiteada, e por consequência em supressão de instância.

Cinge-se a controvérsia recursal acerca do acerto ou não da decisão de 1º grau que indeferiu o benefício da justiça gratuita pleiteado pela autora, por entender que os indícios constantes nos autos afastavam a presunção de pobreza, tendo em vista a notícia de que a parte interessada aufere renda, possui reservas em contas bancárias, além de contar com bens móveis e imóveis em seu nome.

A Agravante sustenta que para a concessão do benefício não é necessário que o requerente se encontre em situação de miserabilidade, aduzindo que a decisão agravada, caso não modificada, causará dano irreparável, pois, uma vez comprovada a hipossuficiência econômica, o Poder Judiciário não deve criar obstáculos, sob pena de violação ao princípio da Inafastabilidade Jurisdicional.

O recurso merece prosperar.

Pelo art. 5º, inciso LXXIV da Constituição Federal/88, cabe ao Estado prestar assistência integral e gratuita aos que tiverem insuficiência de recursos. Assim, a concessão da gratuidade da justiça está intimamente ligada à garantia constitucional do amplo acesso à justiça. O cidadão não pode ser desestimulado a recorrer ao Poder Judiciário por ponderar que os recursos gastos para cumprir esse desiderato poderão comprometer seu patrimônio e seu orçamento doméstico.

O referido benefício também está previsto nos arts. 98 e seguintes do Código de Processo Civil, de modo que cumpre salientar que o §2° do art. 99, dispõe sobre a possibilidade de o juiz indeferir o pedido da gratuidade da justiça se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para sua concessão.

Sobre o tema, a Súmula 6º deste Eg. Tribunal de Justiça, dispõe o seguinte:

“Súmula nº 06 (Res.003/2012 – DJ. Nº 5014/2012, 24/04/2012): Para a concessão dos benefícios da justiça gratuita basta uma simples afirmação da parte declarando não poder arcar com as custas processuais, tendo em vista a penalidade para a assertiva falsa está prevista na própria legislação que trata da matéria. ALTERAÇÃO DA SÚMULA Nº 6 PAOFI-2016/06592 - Proposta de Alteração da Súmula nº 6 - aprovada na 27ª Sessão Ordinária do Pleno, realizada em 27/7/2016: Após aprovação unânime da proposta, o mencionado enunciado sumular passou a ter a seguinte redação: SÚMULA Nº 6: "A alegação de hipossuficiência econômica configura presunção meramente relativa de que a pessoa natural goza do direito ao deferimento da gratuidade de justiça prevista no artigo 98 e seguintes do Código de Processo Civil (2015), podendo ser desconstituída de ofício pelo próprio magistrado caso haja prova nos autos que indiquem a capacidade econômica do requerente" .TJ/PA - DIÁRIO DA JUSTIÇA - Edição nº 6019/2016 - Quinta-Feira, 28 de Julho de 2016, p. 12. ”

Destarte, o comando constitucional inserido no art. 5°, LXXIV da CF/88 autoriza o julgador a condicionar a concessão do benefício a apresentação de elementos aptos a atestar a situação de dificuldade financeira da parte, para...

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