Acórdão nº 0803882-04.2022.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Tribunal Pleno, 06-02-2023

Data de Julgamento06 Fevereiro 2023
AssuntoExecução Penal e de Medidas Alternativas
Ano2023
Número do processo0803882-04.2022.8.14.0000
ÓrgãoTribunal Pleno
Classe processualRECURSO ESPECIAL

AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413) - 0803882-04.2022.8.14.0000

AGRAVANTE: CLEISON AMARAL DA ROCHA

AGRAVADO: JUSTIÇA PUBLICA

RELATOR(A): Desembargadora VÂNIA VALENTE DO COUTO FORTES BITAR CUNHA

EMENTA

AGRAVO EM EXECUÇÃO. PEDIDO DE LIVRAMENTO CONDICIONAL. IMPROCEDÊNCIA. ARTIGO 83, INCISO III, DO CÓDIGO PENAL. LEI Nº 13.964/2019 (LEI ANTICRIME). NOVA REDAÇÃO. AUSÊNCIA DO REQUISITO SUBJETIVO. AGRAVO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. A lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime) alterou o inciso III do art. 83 do Código Penal para aumentar a exigência para concessão do livramento condicional, impondo, entre outros requisitos, o bom comportamento do sentenciado durante a execução da pena acrescida do não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses.

2. A ausência de falta grave nos 12 (doze) meses antecedentes ao livramento condicional complementa a obrigação do apenado em ter uma postura certa e adequada durante a execução da pena para fazer jus à benesse.

2.1. A alínea “b” do inciso III do art. 83 reforça o rigor para o almejo da liberdade antecipada, e não o abrandamento dos outros requisitos descritos nas demais alíneas.

3. Não tendo o agravante apresentado comportamento retilíneo durante o período de execução da reprimenda, pois fugiu do estabelecimento prisional, inviável a concessão do livramento condicional.

4. Agravo conhecido e não provido, na esteira do parecer ministerial. DECISÃO UNÂNIME.

RELATÓRIO

Cuida-se de agravo em execução penal, interposto pela Defensoria Pública, em favor de CLEISON AMARAL DA ROCHA, contra a r. decisão do Douto Juízo de Direito da Vara de Execuções Penais da Região Metropolitana de Belém/PA, que negou o pedido de livramento condicional formulado em favor do apenado.

Insatisfeito, o apenado recorreu, argumentando, em suma, que o fundamento da decisão guerreada não se sustenta, posto que já cumpriu os requisitos necessários ao deferimento do benefício, arguindo, ainda, que falta disciplinar antecedente, não podem obstar o reconhecimento do seu direito ao livramento para sempre, pois estaria evidenciada dupla punição.

Em Contrarrazões, o representante do Ministério Público Estadual requereu o provimento do recurso, pedindo a reconsideração dos termos da r. decisão do MM. Juízo “a quo”, a fim de conceder o livramento condicional (Id. 8739090).

Em juízo de retratação, o Magistrado a quo manteve a decisão por seus próprios fundamentos (Id. 8739094)

Os autos foram distribuídos a minha relatoria, oportunidade na qual determinei o seu encaminhamento ao Ministério Público de 2º Grau para emissão de parecer.

Na condição de custos legis, o Procurador de Justiça manifestou-se pelo “CONHECIMENTO do presente Agravo, e no mérito, por seu DESPROVIMENTO. (Id. 9343586)

É o relatório. Sem revisão, nos termos do art. 610 do Código de Processo Penal.

VOTO

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do agravo em execução.

É imperioso esclarecer, inicialmente, que o livramento condicional constitui a última etapa do cumprimento da pena, sendo, a título precário, a antecipação da liberdade ao preso.

Indubitavelmente, tal benefício é crucial para a ressocialização do indivíduo e sua concessão assenta-se na conjugação favorável dos requisitos objetivos e subjetivos, os quais informam modificações de comportamento que permitam o retorno do apenado ao convívio em sociedade.

No caso dos autos, conforme consta na decisão guerreada, o requisito objetivo foi atendido pelo agravante. Todavia, o que deve ser analisado é o preenchimento do requisito subjetivo, sendo este o exame das condições pessoais do condenado, como disposto no art. 83, III, do Código Penal. No ponto de interesse, torna-se salutar transcrever os seguintes excertos da decisão agravada:

“(...) Trata-se de pleito de LIVRAMENTO CONDICIONAL do apenado. O Ministério Público manifestou-se pelo indeferimento do pedido. Conquanto tenha atingido o requisito objetivo para a concessão do benefício, o apenado não satisfaz o requisito subjetivo, já que empreendeu fuga em: 30/06/2017, 07/12/2018, 11/01/2019, bem como prática de novos delitos em: 01/03/2011, 02/10/2012, 29/08/2016, 30/01/2019, conforme se constata do seu histórico carcerário e espelho do INFOPEN. Com efeito, para fins de concessão do livramento condicional, é necessário que o apenado, conforme art. 83 do CP, comprove comportamento satisfatório durante a execução da pena, bem como quanto ao livramento condicional bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto e tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração. A falta disciplinar grave impede a concessão do livramento condicional, por evidenciar a ausência do requisito subjetivo relativo ao comportamento satisfatório durante o resgate da pena, nos termos do art. 83, III, do Código Penal – CP. O livramento condicional é concedido desde que o condenado tenha bom comportamento durante a execução da pena (art. 83, inc. III, a, do CP). E, segundo alteração promovida pela Lei 13.964/19 no Código Penal, o condenado não pode ter cometido falta grave nos últimos 12 (doze) meses (inc. III, b). Esses requisitos cobram do condenado comportamento adequado durante todo o tempo da execução penal, seja no cumprimento das obrigações internas, seja no seu relacionamento com os demais habitantes do sistema e com os funcionários, elementos indicativos de sua capacidade de readaptação social. Se, sob vigilância direta, o condenado resiste ao cumprimento das regras, não há por que confiar em sua disposição para cumpri-las sem o acompanhamento permanente das autoridades carcerárias. Por isso, o cometimento de faltas disciplinares de natureza grave pode impedir o livramento condicional: 1.O requisito previsto no art. 83, III, b, do Código Penal, inserido pela Lei n. 13.964/2019, consistente no fato de o sentenciado não ter cometido falta grave nos últimos 12 meses, é pressuposto objetivo para a concessão do livramento condicional, e não limita a valoração do requisito subjetivo necessário ao deferimento do benefício, inclusive quanto a fatos ocorridos antes da entrada em vigor da Lei Anticrime. 2. A norma anterior já previa a necessidade de comportamento satisfatório durante a execução da pena para o deferimento do livramento condicional. E não se pode negar que a prática de falta disciplinar de natureza grave acarreta comportamento insatisfatório do reeducando. Precedentes. 3. No caso, a fuga do paciente, no curso da execução da pena privativa de liberdade, ocorrida em 16/4/2019, serviu, nas instâncias ordinárias, como fator para considerar a ausência do pressuposto subjetivo necessário para o livramento condicional, negado em 28/4/2020. 4. Ordem denegada” (HC 612.296/MG, j. 20/10/2020). Como se infere dos autos, o histórico carcerário do apenado é incompatível com o comportamento satisfatório. Nesse caso, com base na pacífica jurisprudência do STJ, torna-se imperiosa a negativa do benefício de livramento condicional. (...) As faltas graves praticadas no decorrer da execução penal não interrompem o prazo para a obtenção do livramento condicional - Súmula n. 441 do Superior Tribunal de Justiça - STJ - mas justificam o indeferimento do benefício pelo inadimplemento do requisito subjetivo. Precedentes. (STJ. HC 473.994/ SP, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 13/11/2018, DJe 28/11/ 2018) Nos termos da jurisprudência do Tribunal Superior, até mesmo uma falta grave já é suficiente para denegar o livramento condicional. Vale lembrar que o magistrado não se vincula ao teor da certidão carcerária. Então, mesmo que esteja documentado “bom comportamento”, cumpre ao magistrado avaliar a situação concreta de cada apenado e considerar, sobretudo, seu histórico carcerário. Acaso observado aspectos negativos, exsurge o dever de valorar negativamente o comportamento do apenado para fins de livramento condicional. Aliás, cumpre dizer, lamentavelmente, o “bom comportamento” nas certidões carcerárias da SEAP é atestado sem qualquer critério. É a praxe do sistema penal. Latrocidas, líderes de motins, foragidos, líderes de organizações criminosas, inexplicavelmente, são classificados como apenados de “bom comportamento” pela SEAP. Quiçá menos de um por cento das certidões ateste mau comportamento. Isso prejudica severamente o trabalho do Poder Judiciário. Daí por que, sobretudo por este motivo, o fato de constar “bom comportamento” não é vinculante. Ademais, não fosse isso, para fins de livramento condicional, além do “comportamento satisfatório durante a execução da pena” (o que, como visto, o apenado não demonstrou), é também requisito para o gozo do benefício: Parágrafo único - Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinqüir. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984). Quanto ao requisito previsto no art. 83, p. único, do CP (presunção que não voltará a delinquir), diante de constar do seu histórico carcerário a prática de falta grave, a presunção é exatamente o contrário. Ou seja, a presunção é que volte a cometer delitos, por inexistir qualquer indicativo de ressocialização. O instituto do livramento condicional não pode ser banalizado, de maneira que seus requisitos sejam mitigados ou simplesmente ignorados por meras razões de política carcerária. Muito pelo contrário, é instituto sério, que precisa ser aprimorado e encarado, pelo reeducando, como um prêmio pelo seu bom comportamento durante todo o cumprimento da pena. Daí por que, na hipótese dos autos, sendo desfavorável o histórico carcerário do apenado, e não tendo demonstrado quaisquer dos requisitos do art. 83,...

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