Acórdão nº 0803895-37.2021.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Tribunal Pleno, 25-10-2023

Data de Julgamento25 Outubro 2023
ÓrgãoTribunal Pleno
Ano2023
Número do processo0803895-37.2021.8.14.0000
Classe processualINCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS
AssuntoPiso Salarial

INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (12085) - 0803895-37.2021.8.14.0000

SUSCITANTE: 2ª VARA DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA

SUSCITADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ

RELATOR(A): Desembargador LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO

EMENTA

INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR). JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. CONTROVÉRSIA. FORMA DE APLICABILIDADE DO PISO SALARIAL NACIONAL AO MAGISTÉRIO PARAENSE. LEI FEDERAL N.º 11.738/2008. INCIDÊNCIA SOBRE O VENCIMENTO-BASE OU SOBRE VENCIMENTO-BASE ACRESCIDO DA GRATIFICAÇÃO DE ESCOLARIDADE. QUESTÃO UNICAMENTE DE DIREITO. EXISTÊNCIA DE DECISÕES CONFLITANTES EMANADAS DAS JURISDIÇÕES COMUM E ESPECIALIZADA, EM 1º E 2º GRAUS. CONSTATAÇÃO DE EFETIVA OFENSA À ISONOMIA E À SEGURANÇA JURÍDICA. AUSÊNCIA DE AFETAÇÃO ESPECÍFICA DA MATÉRIA LOCAL PERANTE AS CORTES DE VÉRTICE PARA A DEFINIÇÃO DE TESE. PRESSUPOSTOS DO ART. 976 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL PREENCHIDOS. INCIDENTE ADMITIDO. SUSPENSÃO DAS AÇÕES E RECURSOS PENDENTES EM ÂMBITO ESTADUAL, NOS TERMOS DO VOTO. À UNANIMIDADE.

1. É cabível a instauração do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) quando houver, simultaneamente, efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito e risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica – a teor do art. 976 do Código de Processo Civil (CPC) –, estando ambos os requisitos preenchidos, na espécie, verificando-se, também, a inexistência de afetação de recurso para definição de tese no âmbito dos Tribunais Superiores especificamente quanto à controvérsia delimitada pelo Juízo Suscitante, conforme exige o art. 976, § 4º, da mencionada Codificação.

2. O Juízo Suscitante detém legitimidade para suscitar IRDR, consoante dispõe o art. 977, I, do CPC.

3. Na espécie, os recursos afetados até o momento para definição de tese perante o Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal – a saber, o Recurso Especial nº 1.426.210-RS (Tema 911), o Agravo em Recurso Extraordinário nº 1.343.477 (Tema 1.179) e o Recurso Extraordinário nº 1.326.541 (Tema 1.218), bem como o entendimento vocalizado na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.167 – não abarcam as peculiaridades do direito local e as especificidades do magistério, no Estado Pará, não resolvendo integralmente os litígios que se avolumam perante o Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA).

4. Por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.362.851/PA – que resultou na reforma da decisão do TJPA que concedera a segurança pleiteada, no Mandado de Segurança Coletivo nº 0001621-75.2017.8.14.0000 – o Supremo Tribunal Federal consignou que o fato de os professores de nível superior do Estado do Pará receberem gratificação de escolaridade impede que façam jus ao piso salarial nacional estabelecido na Lei Federal nº 11.738/2008, porém tal julgamento não ocorreu sob a sistemática da repercussão geral. Por isso, a decisão proferida pelo STF não produziu formalmente efeito vinculante quanto às ações e recursos que versem sobre o mesmo tema.

4. Nesse quadro, o estudo jurimétrico atualizado, em 14/9/2023, demonstra que, no Poder Judiciário paraense, o acervo ativo cadastrado com o assunto “Piso Salarial” – código 10312 das Tabelas Processuais Unificadas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – é de 6.983 (seis mil, novecentos e oitenta e três) processos, dos quais 4.016 (quatro mil e dezesseis) processos aportaram nas unidades judiciárias após a publicação da decisão meritória do STF, no mencionado Recurso Extraordinário nº 1.362.851/PA.

5. Assim, considerando a ausência do requisito de repercussão geral quanto à decisão proferida no Recurso Extraordinário nº 1.362.851/PA e, também, a constatação de que a ratio decidendi dos demais precedentes qualificados dos Tribunais Superiores – afins ao tema objeto do presente IRDR – não exaure os pontos da controvérsia local, é necessário o estabelecimento de tese vinculante, no âmbito do TJPA, com o fito de integrar e conferir coerência às decisões prolatadas, em território paraense.

6. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas admitido, com a suspensão dos processos que versem sobre a controvérsia em questão, nos termos do voto.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componente do Tribunal Pleno do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade, em admitir o presente Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), nos termos constantes do voto do Relator. Esta sessão foi presidida pelo Exma. Sra. Desembargadora Maria de Nazaré Silva Gouveia dos Santos. Sessão Ordinária de Plenário Virtual do Tribunal Pleno do Tribunal de Justiça do Estado do Pará.

Desembargador LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO Relator

RELATÓRIO

O Juízo de Direito da 2ª Vara do Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Belém suscitou Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), com base no art. 977, II, do Código de Processo Civil (CPC), no qual aponta vários processos para fins de demonstração da multiplicidade e da existência de divergência de entendimentos no âmbito do Poder Judiciário paraense, tendo o aludido Juízo delimitado a seguinte controvérsia a ser dirimida: aplicabilidade do Piso Salarial Nacional ao magistério paraense, a fim de elucidar a existência, ou não, de conformidade com a Lei Federal n.º 11.738/2008, ou seja, se o piso se refere ao vencimento-base ou ao vencimento-base acrescido da gratificação de escolaridade.

Na inicial, o Juízo suscitante assim historiou a evolução da temática do piso salarial nacional do magistério e de suas peculiaridades quanto ao magistério paraense:

A Lei nº 11.738/08 fixou o valor do Piso Salarial do Magistério, logo, nenhum professor no país, poderia receber abaixo do valor previsto na lei federal. Descontentes, os Estados ingressaram com a ADI n.º 4167/DF, suscitando inconstitucionalidade da referida norma. Porém em 2011, o STF declarou a constitucionalidade do dispositivo legal, o que obrigou os Estados a respeitarem-na.

O Estado do Pará, em um primeiro momento, estava pagando o vencimento base dos professores, em conformidade com o piso salarial nacional. Porém, a partir de 2015, deixou de adequar o vencimento base, ao piso nacional. Diante disso, professores da rede estadual de ensino começaram a ingressar com ações, requerendo o reajuste.

No entanto, o Estado do Pará argumentou que respeitava o piso nacional, pois o valor do vencimento base, somado à gratificação de escolaridade, superava o valor previsto na lei. Diante disso, o Sindicato dos Professores do Pará impetrou dois Mandados de Segurança Coletivos, para discutir a matéria, o MS 0001621-75.2017.8.14.0000 e o MS 0002367- 74.2016.8.14.0000.

O Pleno deste e. Tribunal de Justiça decidiu em ambos os MS, que os professores não estavam recebendo de acordo com o piso nacional e que o Estado do Pará devia fazê-lo, pois o piso é aferido no valor do vencimento base, e não do vencimento base somado à gratificação de escolaridade. Então, o Estado recorreu aos Tribunais Superiores.

No MS 0002367-74.2016.8.14.0000, o STJ não admitiu o recurso, já com decisão transitada em julgado, e o STF também não admitiu o recurso, mas ainda está pendente de trânsito em julgado. Quanto ao MS 0001621-75.2017.8.14.0000, este segue pendente de decisão, em ambas as cortes superiores.

Ocorre que, após o Pleno do TJ/PA conceder a segurança aos professores, nos MS, o Estado protocolou Ação de Suspensão de Segurança no STF, SS n.º 5236MC/PA, postulando pela suspensão dos efeitos das referidas decisões do TJ/PA. A Medida Cautelar foi concedida pela Min. Carmem Lúcia, no sentido de que até o trânsito em julgado dos Recursos no STJ e STF, as seguranças ficariam suspensas:

"Pelo exposto, defiro liminarmente a suspensão dos efeitos dos acórdãos proferidos nos Mandados de Segurança nº. 0002367-74.2016.8.14.0000 e 0001621-75.2017.8.14.0000 e da decisão pela qual imposta multa diária ao Pará, até o trânsito em julgado dos acórdãos (§ 4º do art. 15 da Lei n. 12.016/2009, art. 297 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e art. 25 da Lei n. 8.038/1990), reiterando não se ter com essa decisão antecipação sobre o mérito da matéria submetida a exame nas impetrações e seus recursos."

Na referida decisão da Min. Carmem Lúcia, no âmbito de Medida Cautelar de cognição sumária, ela pontuou:

"Essa compreensão da matéria não parece mitigar a política de incentivo advinda com a fixação do piso nacional, como anotado no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.167/DF, por não abranger parcelas remuneratórias baseadas em critérios individuais e, portanto, meritórias."

O excerto acima transcrito, tem fundamentado algumas sentenças acerca do tema, para julgar totalmente improcedentes, ações relativas ao piso nacional do magistério. Porém, em pesquisa no PJe, vê-se decisões julgando ações idênticas, em que professores também recebem a gratificação de escolaridade, como totalmente procedentes, desconsiderando o entendimento da Min. Carmem Lúcia, vez que ela mesma salienta que seu entendimento, não pode ser tido como antecipação de mérito da matéria, já que se trata de Medida Cautelar, de cognição não exauriente.

Vislumbraram-se ainda, decisões que julgam a extinção do processo sem resolução do mérito, por inexistência de requerimento administrativo prévio. Por fim, ainda existe decisão determinando a suspensão da ação, até o julgamento da questão, pelo STF, isso em acatamento à parecer no Ministério Público.

Enfim, conforme se listará no tópico subsequente, essa magistrada encontrou uma diversidade de decisões conflitantes, em casos idênticos, quanto ao percebimento do piso salarial nacional pelo magistério paraense, tanto contra o Estado do Pará, quanto em face dos Municípios e do IGEPREV, todos discutindo a mesma questão de direito.

Logo, em sendo nítida a controvérsia sobre questão...

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