Acórdão nº 0804091-82.2020.8.14.0051 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Privado, 28-11-2023

Data de Julgamento28 Novembro 2023
Órgão2ª Turma de Direito Privado
Ano2023
Número do processo0804091-82.2020.8.14.0051
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoReivindicação

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0804091-82.2020.8.14.0051

APELANTE: RAIMUNDO NONATO MARINHO, MARIA DO CARMO GONCALVES MARINHO

APELADO: MANUEL ANSELMO DA SILVA CAMPOS

RELATOR(A): Desembargador AMILCAR ROBERTO BEZERRA GUIMARÃES

EMENTA

PODER JUDICIÁRIO

2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0804091-82.2020.8.14.0051

APELANTE: RAIMUNDO NONATO MARINHO e MARIA DO CARMO GONÇALVES MARINHO

ADVOGADO: JORDAN DOS SANTOS AGUIAR - OAB PA28836-A

APELADO: MANUEL ANSELMO DA SILVA CAMPOS

ADVOGADO: ROSA VIRGINIA PEREIRA DA CUNHA BARROS - OAB PA8946-A, IDENILZA REGINA SIQUEIRA RUFINO - OAB PA8177-A, BENONES AGOSTINHO DO AMARAL - OAB PA9592-A

RELAOTR: DES. AMILCAR ROBERTO BEZERRA GUIMARÃES

EMENTA. APELAÇÃO CÍVEL. REIVINDICATÓRIA. TÍTULO DE AFORAMENTO COM REGISTRO NA MATRÍCULA DO IMÓVEL. DOCUMENTO VÁLIDO PARA SUBSIDIAR AÇÃO REIVINDICATÓRIA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

1. A doutrina e jurisprudência pátria reconhecem a possibilidade do titular do domínio útil de pleitear os direitos dominiais intrínsecos ao enfiteuta por meio da ação reivindicatória, desde que a enfiteuse esteja devidamente anotada no registro do imóvel.

2. Recurso conhecido e provido.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos,

Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores membros componentes da Colenda 2ª Turma de Direito Privado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Pará, por unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento ao Recurso interposto, nos termos do voto relatado pelo Exmo. Desembargador Relator.

RELATÓRIO

PODER JUDICIÁRIO

2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0804091-82.2020.8.14.0051

APELANTE: RAIMUNDO NONATO MARINHO e MARIA DO CARMO GONÇALVES MARINHO

ADVOGADO: JORDAN DOS SANTOS AGUIAR - OAB PA28836-A

APELADO: MANUEL ANSELMO DA SILVA CAMPOS

ADVOGADO: ROSA VIRGINIA PEREIRA DA CUNHA BARROS - OAB PA8946-A, IDENILZA REGINA SIQUEIRA RUFINO - OAB PA8177-A, BENONES AGOSTINHO DO AMARAL - OAB PA9592-A

RELAOTR: DES. AMILCAR ROBERTO BEZERRA GUIMARÃES


RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por RAIMUNDO NONATO MARINHO e MARIA DO CARMO GONÇALVES MARINHO, contra sentença proferida pelo MM. juízo da 4ª Vara Cível e Empresarial de Santarém que, nos autos da Ação Reivindicatória ajuizada em desfavor de MANUEL ANSELMO DA SILVA CAMPOS, julgou o processo extinto sem resolução do mérito, conforme a seguir transcrito:

(...)

Assim, para o ajuizamento de ação reivindicatória, necessária a existência de título definitivo de propriedade do imóvel, com registro imobiliário a fim de comprovar o domínio do proprietário, pelo que, existindo tão somente título de aforamento, verifica-se que falecem os autores de interesse processual no prosseguimento do feito, tendo em vista a inadequação da via eleita. Podem os autores ajuizar outra ação, na forma do ordenamento jurídico pátrio, mas certamente não há como conseguir a pretensão que deseja através da reivindicação imobiliária, eis que não preenche os requisitos legais.

Diante de todo o exposto, JULGO EXTINTO O PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, por falta de interesse processual, nos termos do art. 485. VI do CPC.

Em suas razões recursais (ID 6887349), o apelante sustenta que comprovou a titularidade sobre o imóvel por meio do título de aforamento (ID 6887254 - Pág. 1 e 2) e da certidão de inteiro teor da matrícula n. 30.319 (6887253 - Pág. 1).

Aponta jurisprudência no sentido de que a ação reivindicatória é o instrumento jurisdicional adequado para a tutela do direito real em testilha.

Assim, pugna pela reforma da sentença a quo, de modo que seja determinado o retorno dos autos ao juízo de piso, para prosseguimento do feito.

Em contrarrazões (ID 6887357), a parte apelada defende que a sentença não merece reforma, posto que defende inexistir nos autos qualquer comprovação que contrarie o entendimento do juízo de piso de que não há interesse processual.

De outra monta, defende que o título de aforamento e a certidão de averbação do referido título são provas frágeis, por não identificar de maneira clara o imóvel reivindicado.

Argumenta que no aforamento o domínio do imóvel é desdobrado em dois, quais sejam, o domínio direto pertence ao ente público enquanto que o domínio útil é exercido pelo então foreiro, caracterizando-se por precariedade e o uso ocorre por mera tolerância, existindo no cenário legal várias exigências para validade e legalidade do aforamento, inclusive o pagamento do laudêmio, cuja medida alega não ter sido comprovada no presente caso.

Aduz que os apelantes nunca foram legalmente investido do título de propriedade, nunca responderam pelo bem como proprietários, nunca regularizaram pendências relativas a imposto junto ao poder público municipal, ao contrário do apelado, que desde o início da aquisição do bem, no ano de 2007, paga todos os impostos.

Assim, pugna pela manutenção da sentença de piso.

É o relatório.

VOTO

VOTO

DO CABIMENTO

O presente recurso é cabível, visto que foi apresentado tempestivamente (ID 6887353) por quem detém interesse recursal e legitimidade, tendo sido firmado por advogado legalmente habilitado nos autos. Preparo comprovado, conforme ID 6887351 e 687352.

Preenchidos os pressupostos recursais intrínsecos e extrínsecos, conheço do presente recurso.

DA ANÁLISE DO PEDIDO DA REFORMA

Cinge-se a controvérsia recursal em analisar se correta a sentença que julgou o processo extinto, sem resolução de mérito.

Consta na inicial que a parte autora, ora apelante ajuizou ação reivindicatória c/c pedido de tutela provisória de imissão da posse, consubstanciada em título, contudo, o seu pleito não foi conhecido pelo juízo de piso, em razão da ausência de interesse processual.

O juízo sentenciante entendeu que o título de aforamento não atende ao pressuposto de propriedade do imóvel, necessário à ação reivindicatória.

De imediato, entendo que a apelação merece provimento.

A ação reivindicatória é o meio processual adequado para se discutir a propriedade de bem imóvel devidamente individualizado. Assim, para seu conhecimento, necessária a demonstração da titularidade do domínio, da área reivindicada e da existência de discussão quanto a propriedade/posse alegada por outrem a qualquer título (art. 1228 do CC/2002 – art. 524 do CC/1916).

No caso dos autos, o apelante apresentou documento de registro do contrato de constituição de aforamento no cartório de registro de imóveis da Comarca, a fim de demonstrar sua legitimidade para promover a discussão referente a propriedade do imóvel individualizado e objeto do litígio, contra quem se diz proprietário e detém a posse injusta do imóvel.

Tal circunstância pode ser observada nos autos, posto que consta certidão de inteiro teor da matrícula do imóvel atestando a existência de aforamento em favor dos apelantes, o que entendo ser suficiente como prova da existência do direito real sobre o imóvel.

Nesse sentido, é o entendimento deste e. Tribunal:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REIVINDICATÓRIA JULGADA PROCEDENTE PELO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU - INTELIGÊNCIA DO ART. 1.228 DO CÓDIGO CIVIL - PROVA DO DOMÍNIO - COMPROVAÇÃO ATRAVÉS DE ESCRITURA PÚBLICA E REGISTRO EM CARTÓRIO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. 1. A ação reivindicatória é aquela proposta pelo proprietário que não tem a posse, contra o não proprietário que detém a posse, habilitando-se à recuperação do bem reivindicando a parte que prova ter o domínio e ser injusta a posse exercida por outrem. 2. De acordo com o disposto no artigo 1.228, caput, do Código Civil de 2002 para reivindicação da coisa há a necessidade de a parte autora comprovar a titularidade do domínio sobre o bem reclamado, sua individualização e o exercício de posse injusta pela parte ré. 3. À unanimidade, nos termos do voto do Desembargador Relator, sentença confirmada na sua integralidade.

(TJ-PA - AC: 00042513920138140067 BELÉM, Relator: LEONARDO DE NORONHA TAVARES, Data de Julgamento: 12/08/2019, 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Data de Publicação: 14/08/2019)

Nesse sentido, também é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REIVINDICATÓRIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 489 E 1.022 DO NCPC. NÃO CONFIGURADA. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA. 1. A reivindicatória, de natureza real e fundada no direito de sequela, é a ação própria à disposição do titular do domínio para requerer a restituição da coisa de quem injustamente a possua ou detenha ( CC/1916, art. 524, e CC/2002, art. 1.228), exigindo a presença concomitante de três requisitos: a prova da titularidade do domínio pelo autor, a individualização da coisa e a posse injusta do réu ( REsp 1.060.259/MG, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 4/4/2017, DJe de 4/5/2017). 2. Na hipótese dos autos, o Tribunal estadual, com base nos elementos fáticos-probatórios constantes dos autos, concluiu que o recorrido apresentou título idôneo, apto a comprovar a propriedade do bem, bem como consignou não estarem presentes os requisitos necessários à configuração da usucapião em favor dos recorrentes. Alterar tais conclusões demandaria o reexame de fatos e provas, inviável em recurso especial, a teor do disposto na Súmula nº 7/STJ. 3. A ausência de prequestionamento no processo enseja a aplicação da Súmula nº 211 do STJ. 4. Agravo interno negado provimento.

(STJ - AgInt no AREsp: 1862247 RJ 2021/0086106-5, Data de Julgamento: 05/09/2022, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 08/09/2022).

Assim, verifica-se que perfeitamente cabível o título de aforamento, desde que devidamente registrado em cartório de registro de imóvel, para subsidiar ação reivindicatória, eis que a parte é detentora do domínio útil.

Impedir o processamento da ação em comento, mesmo diante da inexistência de óbice legal, é ferir de morte o direito constitucional de ação e o princípio da inafastabilidade da...

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