Acórdão nº 0804320-93.2023.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Seção de Direito Penal, 11-07-2023

Data de Julgamento11 Julho 2023
ÓrgãoSeção de Direito Penal
Ano2023
Número do processo0804320-93.2023.8.14.0000
Classe processualHABEAS CORPUS CRIMINAL
AssuntoEstupro de vulnerável

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) - 0804320-93.2023.8.14.0000

IMPETRANTE: MARCELO NUNES DOS SANTOS, VANESSA KELLY NASCIMENTO PAES
PACIENTE: TOME DIAS SOUZA

AUTORIDADE COATORA: JUÍZO DE DIREITO DA 2ª VARA CRIMINAL DE CASTANHAL

RELATOR(A): Desembargadora VÂNIA VALENTE DO COUTO FORTES BITAR CUNHA

EMENTA

HABEAS CORPUS. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. 1 – ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA ESCUTA ESPECIALIZADA DA VÍTIMA EM SEDE POLICIAL. TESE NÃO CONHECIDA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DA MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA INVIÁVEL NA ESTREITA VIA DA AÇÃO MANDAMENTAL. 2 – ALEGAÇÃO DE NULIDADE DECORRENTE DA NÃO REALIZAÇÃO DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA. MERA IRREGULARIDADE SUPERADA PELA DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. PRECEDENTES. 3 - PLEITO DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA DO PACIENTE. IMPROCEDÊNCIA. GRAVIDADE CONCRETA DO DELITO. PERICULOSIDADE ACENTUADA DO AGENTE EVIDENCIADA PELO MODUS OPERANDI EMPREGADO. INDISPENSABILIDADE DA IMPOSIÇÃO DA MEDIDA EXTREMA NA HIPÓTESE. 4 - INVIABILIDADE DA CONCESSÃO DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS. DECISÃO FUNDAMENTADA. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. CARACTERÍSTICAS PESSOAIS DO PACIENTE QUE, ISOLADAMENTE, SÃO IRRELEVANTES PARA A CONCESSÃO DA ORDEM PRETENDIDA, ESPECIALMENTE, QUANDO ESTIVEREM PRESENTES OS REQUISITOS DA PRISÃO PREVENTIVA, NOS TERMOS DO ENUNCIADO DA SÚMULA Nº.: 08 DESTA EGRÉGIA CORTE DE JUSTIÇA. PRECEDENTES DO STJ. 5 - WRIT PARCIALMENTE CONHECIDO. ORDEM DENEGADA. UNANIMIDADE.

RELATÓRIO

Trata-se de Habeas Corpus com Pedido de Liminar, impetrado em favor de TOME DIAS SOUZA, com fundamento no art. 5º, inciso LXVIII da Constituição Federal e art. 647 e 648 do CPP, apontando como autoridade coatora o MM. Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Castanhal/Pa.

Narra o impetrante que o paciente foi preso em cumprimento do mandado de prisão preventiva na data de 18.02.2023, em razão da suposta prática do crime descrito no art. 217-A do CPB.

Argumenta que o procedimento judicial está eivado de ilegalidade ante a não realização da audiência de custódia.

Discorre acerca do constrangimento ilegal imposto ao paciente, em razão da ausência de fundamentação idônea do decreto preventivo, amparado em motivação genérica, não tendo sido demonstrados os pressupostos necessários à segregação cautelar.

Outrossim, argumenta acerca da ilegalidade do procedimento de escuta especializada da vítima, uma vez que não foi colhido por profissionais capacitados para tanto, demandando pela nulidade do ato, com a realização de nova escuta.

Ao final, pugna pela concessão liminar do writ, para que seja concedida a liberdade ao paciente, confirmando-se a ordem por ocasião do julgamento definitivo do mandamus. Demanda ainda pelo reconhecimento da nulidade da escuta especializada, determinando-se a renovação do ato, além do reconhecimento da nulidade por não ter sido realizada a audiência de custódia.

O pleito liminar do impetrante foi indeferido sob relatoria do Des. Rômulo José Ferreira Nunes (ID 13218861).

A autoridade inquinada coatora apresentou as informações determinadas (ID 13293551).

Instada a se manifestar, a Douta Procuradoria de Justiça opinou (ID 13325679) pelo conhecimento e denegação da ordem impetrada.

É o relatório.

VOTO

Cinge-se a impetração no suposto constrangimento imposto ao paciente decorrente da suposta ilegalidade da sua prisão em flagrante, aduzindo em resumo: 1 – que houve nulidade na prisão por ausência de realização da audiência de custódia; 2 – que não houve fundamentação idônea do decreto prisional e que não foram preenchidos os requisitos da prisão preventiva; 3 – que o coacto apresenta predicados pessoais favoráveis que justificam a concessão da liberdade, mediante a imposição de medidas cautelares alternativas; 4 – que houve nulidade na realização do procedimento de escuta especializada, por não ter sido realizada por profissional habilitado.

De plano, é imperioso ressaltar que o argumento acerca da nulidade da escuta especializada por não ter sido realizada por profissional habilitado para tanto, constitui matéria que demanda o reexame fático-probatório aprofundado, questão inviável na via estreita e célere do presente writ, salvo em caso de flagrante ilegalidade, não constatada in casu, especialmente, por não ter sido demonstrado se a Delegada responsável pela escuta especializada da menor possui ou não qualificação adequada para a colheita especial do depoimento, de modo que a matéria não deve ser conhecida.

De outra banda, a alegação de nulidade da prisão em razão da não realização de audiência de custódia deve ser rechaçada, havendo entendimento firmado no Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, ainda que a audiência de custódia não seja realizada, tal deficiência não induz de imediato a revogação da prisão, constituindo mera irregularidade processual, desde que sejam respeitados os direitos e garantias constitucionais do acusado. Outrossim, a decretação da prisão preventiva do coacto torna superada a alegação de nulidade em decorrência da falta de realização do referido ato, constituindo novo título apto a justificar a privação da liberdade. No mesmo sentido, vejamos recente precedente da Corte Superior, verbis:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. AUSÊNCIA DE AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA. QUESTÃO SUPERADA COM A CONVERSÃO DO FLAGRANTE EM PREVENTIVA. NOVO TÍTULO. SÚMULA 691/STF. INDEFERIMENTO LIMINAR DO WRIT. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE DE ILEGALIDADE. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO IMPROVIDO.

1. Apresentada fundamentação concreta para decretação da prisão preventiva, evidenciada na vivência delitiva do agravante, que ostenta outras quatro condenações anteriores, não há que se falar em ilegalidade.

2. Ressalvada compreensão diversa, o entendimento firmado pela jurisprudência da Sexta Turma desta Corte é no sentido de que a não realização de audiência de custódia não é suficiente, por si só, para ensejar a nulidade da prisão preventiva, quando evidenciada a observância das garantias processuais e constitucionais. Ademais, a posterior conversão do flagrante em prisão preventiva constitui novo título a justificar a privação da liberdade, restando superada a alegação de nulidade decorrente da ausência de apresentação do preso ao Juízo de origem.

3. Inexistindo ilegalidade para justificar a mitigação do enunciado da Súmula 691 do STF, o writ deve ser indeferido liminarmente.

4. Agravo regimental improvido.

(AgRg no HC 561.160/MG, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 10/03/2020, DJe 16/03/2020)

Ademais, a insurgência do impetrante quanto a suposta ilegalidade da prisão em flagrante do coacto, fulcrada da alegada ausência de fundamentação do decreto, não merece prosperar. Com efeito, os requisitos da prisão preventiva, descritos no art. 312 do CPP restaram devidamente demonstrados e fundamentados na decisão que decretou a segregação cautelar do coacto (ID 13198251), tendo sido motivada na gravidade concreta e na periculosidade real do agente evidenciada pelo modus operandi do delito em tese praticado, tendo o réu se aproveitado da vulnerabilidade da ofendida dentro de sua própria casa, em momentos em que estava sem a vigilância e cuidados da mãe.

Some-se a isso a informação constante na decisão acerca da contemporaneidade da medida, visto que há indícios de que o coacto continua frequentando a casa da vítima, causando-lhe angústia e medo.

Portanto, conforme descrito, não há que se falar na suposta ilegalidade da prisão do paciente, tendo sido demonstrado no caso concreto os requisitos da prisão preventiva, não havendo razões para a revogação do decreto prisional, ou mesmo a imposição de medidas cautelares diversas, as quais seriam inadequadas e insuficientes para os fins a que se destinam.

É importante ressaltar ainda, que as qualidades pessoais do paciente, suscitadas pelo impetrante para afastar a necessidade da prisão cautelar são irrelevantes, isoladamente, para a concessão do presente remédio constitucional, especialmente, quando estiverem presentes os requisitos do art. 312 do CPP, nos termos do enunciado da Súmula nº.: 08[1] desta Egrégia Corte de Justiça.

Sobre a questão, colaciono os seguintes precedentes da Corte Superior, in verbis:

PROCESSO PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. PRISÃO PREVENTIVA. REVOGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. PERICULOSIDADE DO AGENTE. MODUS OPERANDI. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. INSUFICIÊNCIA. RECOMENDAÇÃO N. 62/2020 DO CNJ. MATÉRIA NÃO ANALISADA PELA CORTE DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. RECURSO DESPROVIDO.

1. Em vista da natureza excepcional da prisão preventiva, somente se verifica a possibilidade da sua imposição quando evidenciado, de forma fundamentada e com base em dados concretos, o preenchimento dos pressupostos e requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal ? CPP. Deve, ainda, ser...

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