Acórdão nº 0804654-69.2019.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Tribunal Pleno, 26-04-2023

Data de Julgamento26 Abril 2023
ÓrgãoTribunal Pleno
Número do processo0804654-69.2019.8.14.0000
Classe processualDIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
AssuntoInconstitucionalidade Material

DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (95) - 0804654-69.2019.8.14.0000

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ - MPPA

RECORRIDO: MUNICÍPIO DE RONDON DO PARÁ, CÂMARA MUNICIPAL DE RONDON DO PARÁ

RELATOR(A): Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

EMENTA

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEIS MUNICIPAIS N° 765/2019 E 766/2019 AMBAS DO MUNICÍPIO DE RONDON DO PARÁ. DETERMINAÇÃO DE QUE O ATO DE REMOÇÃO DE VEÍCULO EM SITUAÇÃO IRREGULAR SEJA REALIZADO EXCLUSIVAMENTE POR GUINCHO (LEI N° 765/2019). PROIBIÇÃO DE APREENSÃO DE VEÍCULOS NO MUNICÍPIO DE RONDON DO PARÁ NA HIPÓTESE DE AUSÊNCIA DE QUITAÇÃO DO IPVA. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO PARA LEGISLAR EM MATÉRIA DE TRÂNSITO E TRANSPORTE. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 22, INCISO XI DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL RECONHECIDA. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO. AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTE. À UNANIMIDADE.

1. A União ostenta competência privativa para legislar sobre diretrizes da política nacional de trânsito transporte, nos termos do artigo 22, inciso XI da Constituição Federal.

2. O Código Nacional de Trânsito (Lei nº 9.503/97) já definiu o procedimento e as hipóteses de remoção de veículo em situação irregular (art. 271), assim como, estabeleceu a penalidade e as medidas administrativas a serem aplicadas na hipótese do não pagamento do imposto sobre a propriedade de veículos automotores – IPVA (artigo 230, inciso V), desta forma, as disposições das Leis Municipais n° 765/2019 e 766/2019 de Rondon do Pará configuram clara usurpação de competência legislativa privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte, nos termos do artigo 22, inciso XI da Constituição Federal.

3 – A questão já está pacificada no C. Supremo Tribunal Federal, havendo diversos precedentes em que se firma a ocorrência de vício formal de inconstitucionalidade de lei municipal ou estadual que verse sobre normas e regras de trânsito, por usurpação de competência legislativa privativa da União (art. 22, XI, CF). Precedentes: ADI nº 3.196/ES; ADI nº 3.444/RS; ADI nº 3.186/DF; ADI nº 2.432/RN; ADI nº 2.814/SC.

4 – Reconhecida de declarada a inconstitucionalidade formal das Leis Municipais de Rondon do Pará n° 765/2019 e 766/2019.

5 – AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTE. À UNANIMIDADE.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores que integram o Pleno do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, em julgar procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade, para declarar a inconstitucionalidade das Leis Municipais n° 765/2019 e 766/2019 do Município de Rondon do Pará, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Julgamento presidido pela Exma. Sra. Desembargadora Célia Regina de Lima Pinheiro.

Belém-Pa, data de registro no sistema.

Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ, em face das Leis Municipais n° 765/2019 e 766/2019 de Rondon do Pará.

Em síntese da inicial (id 1820974), o Ministério Público Estadual propôs a presente Ação Direta de Inconstitucionalidade, objetivando declarar a inconstitucionalidade das Leis Municipais n° 765/2019 e 766/2019 de Rondon do Pará, afirmando que os textos legais tratam de matéria de trânsito e transporte, sendo esta privativa da União para legislar, segundo o artigo 22, inciso XI da Constituição Federal.

Sustenta a inconstitucionalidade das leis municipais, afirmando que compete privativamente à União legislar sobre trânsito e transporte, nos termos do artigo 22, inciso XI da Constituição Federal.

Defende que, a princípio, os Estados e os Municípios não podem editar normas sobre trânsito e transporte, alegando que a Constituição Federal determinou que tais regras devem possuir disciplina uniforme em todo território nacional, prevalecendo o interesse nacional em detrimento de interesses locais.

Cita jurisprudências na defesa de sua tese. Afirma que o Município não pode usurpar iniciativa legislativa privativa da União.

Defende a concessão da medida cautelar sem a oitiva da parte adversa, com base no artigo 300 do CPC, para que seja determinada a suspensão das eficácias das Leis Municipais n° 765/2019 e 766/2019 de Rondon do Pará/PA.

Ao final, requereu a notificação da Câmara Municipal de Rondon do Pará e do Município de Rondon do Pará para que se manifestem, no prazo legal, bem como, a concessão da medida cautelar e, no mérito, a procedência do pedido para que seja declarada a inconstitucionalidade das Leis Municipais n° 765/2019 e 766/2019 de Rondon do Pará/PA (id 1820974). Juntou documentos.

Coube-me a relatoria do feito por distribuição.

Em ato contínuo, proferi despacho determinando a intimação da Câmara Municipal de Vereadores e do Município de Rondon do Pará, para apresentarem manifestações sobre a lei impugnada no prazo legal (id 2213052).

O Município de Rondon do Pará/PA apresentou manifestação, argumentando, em síntese, que os projetos de leis n° 001/2019 e 002/2019 que deram origem as Leis Municipais n° 765/2019 e 766/2019 foram de autoria de Vereadores da Casa Legislativa de Rondon do Pará, como se indefere do processo legislativo, anexado aos autos.

Alega que ambos os projetos de leis foram vetados pelo Chefe do Poder Executivo, entretanto, o Presidente da Câmara Municipal promulgou as duas citadas leis. Ao final, requereu apenas a intimação do Município quanto as ulteriores deliberações no presente feito (id 2312641). Juntou documentos.

A Câmara Municipal de Rondon do Pará/PA apesar de regularmente intimada, não apresentou manifestação, conforme certidão (id 4208577).

O Ministério Público do Estado do Pará por intermédio do D. Procurador-Geral de Justiça apresentou parecer, pugnando que a presente Ação Direta de Inconstitucionalidade seja julgada totalmente procedente para afastar os efeitos jurídicos das leis municipais n° 765/2019 e 766/2019 de Rondon do Pará (id 5005035).

É o relatório.

VOTO

Em juízo de admissibilidade, verifico presentes os pressupostos de adequação da presente ADI, observados os artigos 161, inciso I, alínea “l” e 162, V da Constituição do Estado do Pará.

Conforme relatado, verifico que a tutela de urgência não foi apreciada, todavia considerando a regular instrução do feito, passo ao exame de mérito da presente Ação Direta de Inconstitucionalidade.

Na presente demanda, o Ministério Público do Estado do Pará propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade, com a finalidade de declarar a inconstitucionalidade das Leis Municipais n° 765/2019 e 766/2019 de Rondon do Pará, afirmando que os textos legais tratam de matéria de trânsito e transporte, sendo esta privativa da União para legislar, segundo o artigo 22, inciso XI da Constituição Federal.

Por oportuno, transcrevo o disposto no artigo 22, inciso XI da Constituição Federal:

“Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

XI – trânsito e transporte;”

Conforme relatado, apesar de regularmente intimada a Câmara Municipal de Rondon do Pará não apresentou manifestação na presente Ação Direta de Inconstitucionalidade, quedando-se inerte, deixando de apresentar as suas razões quanto a legalidade das leis promulgadas por aquela Casa Legislativa.

Por outro lado, o Município de Rondon do Pará prestou informações, argumentando que os projetos de leis n° 001/2019 e 002/2019 que deram origem as Leis Municipais n° 765/2019 e 766/2019 foram de autoria de Vereadores da Casa Legislativa de Rondon do Pará, fato comprovado, conforme processo legislativo (id 2312642), anexado aos autos, sendo que ambos os projetos de leis foram vetados pelo Prefeito Municipal.

Entretanto, apesar do Veto proferido pelo Chefe do Executivo em ambos os projetos, a Câmara Municipal de Rondon do Pará rejeitou os vetos e promulgou as Leis Municipais n° 765/2019 e 766/2019.

Feitas essas considerações, importa destacar na integra o teor das citadas Leis Municipais n° 765/2019 e 766/2019 de Rondon do Pará, a seguir transcritas:

Lei n° 765/2019

Art. 1° Modifica o Parágrafo Único do Art. 1° da Lei n° 750/2008, de 02 de Julho de 2018, que passa a ter a seguinte redação:

Parágrafo Único: Quando da abordagem de um veículo em situação irregular, e havendo a necessidade da apreensão ou retenção do mesmo ao pátio do DEMUTRAN, fica terminantemente proibido a sua remoção por agentes de trânsito sem o transporte adequado, que deve ser feito exclusivamente por guincho”

Lei n° 766/2019

Art. 1° Não haverá recolhimento, retenção ou apreensão de veículos, no âmbito do Município de Rondo do Pará, pela identificação do não pagamento do imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA.

Art. 2° A cobrança de impostos Estaduais ou Municipais nos limites do território de Rondon do Pará deverá seguir rigorosamente o procedimento legal específico da legislação em vigor.

Art. 3° A Administração Pública, Estadual ou Municipal não poderá exercer o Poder de Polícia de forma ilegal com a finalidade de arrecadar tributos ou utilizar-se de meios confiscatórios.”

Analisando o parágrafo único da Lei n° 765/2019, verifica-se que o dispositivo estabelece a proibição de remoção de um veículo em situação irregular por agentes de trânsito, determinando que a remoção será feita exclusivamente por guincho.

Assim, observa-se que a normal municipal estabelece uma forma de restrição para a medida administrativa de remoção, limitando a atuação dos agentes de trânsito, o que configura clara violação pelo Município ao disposto no artigo 22, XI da CF/88, em razão de legislar sobre matéria de trânsito, assim como, afronta o artigo 271 do Código de Trânsito Brasileiro (Lei n° 9.503/1997), o qual não estabelece a utilização única e exclusiva do guincho para o ato de remoção, senão vejamos:

“Art. 271. O veículo será removido, nos casos previstos neste Código, para o depósito fixado pelo órgão ou entidade competente, com circunscrição sobre a via.

§ 1º A restituição do veículo...

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