Acórdão nº 0805502-67.2018.8.14.0040 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Privado, 28-03-2023

Data de Julgamento28 Março 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Ano2023
Número do processo0805502-67.2018.8.14.0040
AssuntoPráticas Abusivas
Órgão2ª Turma de Direito Privado

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0805502-67.2018.8.14.0040

APELANTE: L.M.S.E. EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA

APELADO: GILMAR LOPES BATISTA

RELATOR(A): Desembargador RICARDO FERREIRA NUNES

EMENTA

1. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO COM RESTITUIÇÃO DE PARCELAS. DEVOLUÇÃO DE 80% DO VALOR PAGO. RETENÇÃO DEVIDA. PRECEDENTES DO STJ. REsp. 1692346/DF. SENTENÇA CONFIRMADA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO À UNANIMIDADE.

2. Pretende o recorrente a reforma da sentença que o condenou a restituir 80% do pagamento realizado pelo apelado, em razão da rescisão contratual por iniciativa do comprador, ora apelado de contrato de venda e compra de terreno, a ser pago na forma parcelada.

3. As principais alegações recursais residem nos argumentos de que o próprio apelado confessa que deixou de arcar com o pagamento das parcelas oriundas do contrato, além do argumento de que o contrato firmado entre as partes prever expressamente em sua cláusula 16ª, §§1º e 2º a forma e o valor da restituição em caso de desistência do negócio jurídico e, por ser ato jurídico perfeito e acabado, deve haver a proteção necessária para imutabilidade da situação jurídica que foi realizada de boa-fé, dentro dos parâmetros legais.

4. Na hipótese dos autos, entendo restar comprovado que o desfazimento se deu por vontade do comprador. Assim, segundo vem entendendo o Superior Tribunal de Justiça, o percentual razoável para a retenção estaria configurado entre 10% (dez por cento) a 25% (vinte e cinco por cento) do valor pago.

5. A inexistência de edificação no terreno feita pelo comprador retira-lhe a possibilidade de auferir vantagem ou proveito econômico da sua posse, o que afasta o requisito do enriquecimento sem causa por parte do comprador, pois a Colenda Corte entende que “correspondem os lucros cessantes a tudo aquilo que o lesado razoavelmente deixou de lucrar, ficando condicionado, portanto, a uma probabilidade objetiva resultante do desenvolvimento normal dos acontecimentos” (STJ - REsp: 846455 MS 2006/0124674).

6. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO, À UNANIMIDADE.


RELATÓRIO

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação cível interposto por L.M.S.E. EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA contra sentença proferida pelo juízo da 2ª Vara Cível e Empresarial de Parauapebas, nos autos da ação de restituição de parcelas (proc. 0805502-67.2018.8.14.0040), ajuizada por GILMAR LOPES BATISTA, em face do ora recorrente.

Alega a autora, em sede inicial, que as partes firmaram contrato de Compromisso de Compra e Venda do Imóvel, que consiste em lote não edificado (ID 3423332 - Pág. 1-10) situado à Qd. 53, Lt. 44, 2° etapa, localizado no Residencial Cidade Jardim, nesta cidade de Parauapebas/PA.

Narra a adquirente/autora que comprou o aludido imóvel em outubro de 2010, alegando que após pagar 99 parcelas do contrato, totalizando a quantia de R$ 32.849,59, o requerente se viu impossibilitado de continuar arcando com os referidos valores em razão da abusiva elevação dos juros somado ao cenário econômico negativo ao qual vem atravessando.

Requer ao final, seja julgada totalmente procedente a ação para reconhecer a resilição do contrato de compromisso de compra e venda do lote, com restituição de 90% dos valores pagos, corrigidos monetariamente desde cada desembolso.

Citada, a requerida apresentou contestação (ID 16067591) e documentos, aduzindo, em síntese, que firmaram contrato particular de compromisso de compra e venda de lote/terreno que seria pago em 180 parcelas mensais reajustáveis no valor de R$ 218,53. Os valores pagos a título de parcelas do financiamento totalizam R$ 33.134,18, equivalente a 100 parcelas. Por fim, aduz que parte autora estava ciente dos valores e condições de reajustes, e concordou com os termos contratuais de livre e espontânea vontade, e a ele se vinculando.

O Juiz sentenciante deu parcial provimento ao pedido, nos seguintes termos.

ANTE O EXPOSTO, julgo parcialmente procedente a demanda, nos termos do artigo 487, inciso I, todos do Código de Processo Civil, confirmando a decisão liminar, declarar rescindido o contrato de promessa de compra e venda do imóvel objeto desta lide, com a consequente reintegração de posse do imóvel à Requerida, e determinar a restituição ao compromissário comprador das parcelas efetivamente pagas, em valor único (Tema 577-RR/STJ), sobre o qual deve incidir apenas a correção monetária pelo IGPM, a partir de cada desembolso, sendo incabível a aplicação de juros de mora, podendo o promissário vendedor reter o percentual de 20% (vinte por cento) desse valor, levando-se em conta as despesas realizadas pelo vendedor com publicidade, tributárias e administrativas, e como forma de compensação pela rescisão unilateral do contrato pelo autor

Inconformado, o requerido interpôs o presente Apelo, sob alegação de que o próprio apelado confessa em sua peça inicial que estava inadimplente com o contrato, além de argumentar que o acordo firmado entre as partes é ato jurídico perfeito e acabado, consumado segundo a lei vigente ao tempo que se efetuou, pois, satisfeitos todos os requisitos formais para gerar plenitude dos seus efeitos. Quanto à restituição, aduz que o contrato faz lei entre as partes e, no caso concreto, se encontra estabelecido entre os litigantes, em sua cláusula 16ª, §§1º e 5º, a forma de restituição dos valores pagos pelos adquirentes em caso de rescisão. Além de entender que o percentual de retenção. afronta à Lei 6.766/79, artigo 32-a e incisos.

Nesse contexto, entende a requerida, ora apelante que o desfazimento do contrato deve obedecer as cláusulas contratuais que prever: perda da entrada básica, limitada a 5% do valor contratado, além de multa compensatória rescisória de 10% (dez por cento) do valor atualizado deste contrato, perda de 20% (vinte por cento) do valor das parcelas pagas, a título de despesas e indenização de 0,25 a título de taxa de fruição. Por fim, que a restituição seja parcelada. (ID 3423331 - Pág. 1-72).

Contrarrazões, pela manutenção da sentença recorrida (ID 3423347 - Pág. 1-11).

É o relatório.

Belém, 14 de março de 2023.

DES. RICARDO FERREIRA NUNES

Relator

VOTO

1. Juízo de admissibilidade.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.

2. Razões recursais.

Conforme relatado, pretende o recorrente a reforma da sentença que o condenou a restituir 80% do pagamento realizado pelo apelado e, por entender que a rescisão contratual se deu por iniciativa do comprador, alega que a resolução do contrato deva se pautar na forma estipulada no acordo entre ambos estipulado na cláusula 16ª, §§1º e 2º do instrumento contratual, que prever a perda da entrada básica de 5% do valor contratado, além de multa compensatória de 10% (dez por cento) do valor atualizado do contrato, mais perda de 20% (vinte por cento) do valor das parcelas pagas, a título de despesas e indenização, tudo isso somado a 0,25% a título de taxa de fruição. Por fim, que a restituição seja parcelada.

Aduz, ainda, que os negócios jurídicos somente podem ser revistos ou anulados diante da existência de fraude, coação ou dolo, conforme preconizam as normas elencadas nos artigos 138 ao 155 do Código Civil, o que não aconteceu no caso concreto.

Passo ao exame dos argumentos articulados no recurso.

3. Da alegação de que o contrato firmado entre as partes deva obedecer cláusula 16ª, §§1º e 2º para a restituição por culpa do devedor, além de entender que a devolução dos valores pagos deva se dar na forma parcelada.

Verifica-se da sentença que o juízo de piso declarou rescindido o contrato com a determinação de imediata devolução de 80% dos valores pagos pela autora, considerando a abusividade das cláusulas 15ª e seguintes do contrato, com fundamento na Súmula 543 do STJ e no Artigo 67-A da Lei 4.591/64.

Sem maiores digressões, não assiste razão o apelante. Isto porque, o Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento acerca da imperiosa necessidade de restituição imediata das parcelas pagas pelo promitente comprador, ainda que de forma parcial, quando a culpa pela rescisão for exclusiva do comprador, conforme se verifica a seguir:

Súmula nº 543 do STJ - Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.

Na hipótese dos autos, entendo restar comprovado que o desfazimento se deu por vontade do comprador. Assim, segundo vem entendendo o Superior Tribunal de Justiça, o percentual razoável para a retenção estaria configurado entre 10% (dez por cento) a 25% (vinte e cinco por cento) do valor pago.

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. RESCISÃO. PARCELAS PAGAS. RETENÇÃO PARCIAL. CABIMENTO. PERCENTUAL RETIDO. ALTERAÇÃO. SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA.

1. "A jurisprudência desta Corte tem considerado razoável, em resolução de contrato de compra e venda de imóvel por culpa do comprador, que o percentual de retenção, pelo vendedor, de parte das prestações pagas, seja arbitrado entre 10% e 25%, conforme as circunstâncias de cada caso, avaliando-se os prejuízos suportados" (AgInt no AREsp n. 725.986/RJ, Relator Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 20/6/2017, DJe 29/6/2017).

2. O recurso especial não comporta exame de questões que impliquem análise de cláusulas contratuais e revolvimento do contexto fático-probatório dos autos (Súmulas n. 5 e 7 do STJ).

3. O Tribunal de origem analisou o contrato e as demais provas contidas no processo para concluir que o percentual aplicado pela agravante, para a retenção parcial da quantia paga pelo consumidor, era abusivo. Alterar esse entendimento demandaria reexame do conjunto probatório do feito, vedado em...

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