Acórdão nº 0805701-53.2016.8.14.0301 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Público, 02-10-2023

Data de Julgamento02 Outubro 2023
Órgão1ª Turma de Direito Público
Ano2023
Número do processo0805701-53.2016.8.14.0301
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoErro Médico

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0805701-53.2016.8.14.0301

APELANTE: ADRIENNE OLIVEIRA DE SOUZA

APELADO: ESTADO DO PARA, HOSPITAL METROPOLITANO DE URGÊNCIA E EMERGÊNCIA

RELATOR(A): Desembargadora ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA

EMENTA

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, MATERIAIS E ESTÉTICOS. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. DESCUMPRIMENTO DA ORDEM DE EMENDA À INICIAL. AUSÊNCIA DE QUALIFICAÇÃO DE UM DOS REÚS. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DA AÇÃO, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. INVIABILIDADE. ART. 319, § 2º, DO CPC. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA DESCONSTITUIDA. DETERMINAÇÃO DE RETORNO DOS AUTOS À INSTÂNCIA DE ORIGEM. DECISÃO UNÂNIME.

I- O cerne da questão consiste na possibilidade de extinção do feito, sem resolução do mérito, diante do descumprimento da parte autora em proceder a qualificação adequada de um dos demandados.

II- É cediço que o Código de Processo Civil determina que cabe à parte autora, ao propor a ação, diligenciar a fim de apontar os fatos e dados necessários para viabilizar a regular tramitação processual, devendo, assim, na petição inicial o demandante observar o disposto nos artigos 319, caput, e seus incisos.

III- Entretanto, a mencionada norma não deve servir de obstáculo capaz de inviabilizar o acesso à justiça pela parte autora, criando-se exigências excessivamente onerosas, que impossibilitem a obtenção do provimento jurisdicional pleiteado.

IV- Analisando os autos e os documentos que o instruem, entendo que a petição inicial preenche os requisitos dos art. 319 e 320, do NCPC, pois dela consta a pretensão deduzida pelos fatos e fundamentos especificados; deles decorre o pedido formulado com as devidas especificações, pedido este certo e determinado e; ser clara a prestação jurisdicional objetivada e os limites da pretensão deduzida, consistente na indenização por danos morais, materiais e estéticos.

V- Não bastasse isso, o § 2º do art. 319, é cristalino ao dispor que: “A petição inicial não será indeferida se, a despeito de falta de informações a que se refere o inciso II, for possível a citação do réu”.

VI- Recurso conhecido e provido para desconstituir a sentença e determinar o retorno dos autos à instância de origem, a fim de regular processamento do feito. Decisão unânime.

Vistos, etc.,

Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componentes da 1ª Turma de Direito Público, por unanimidade de votos, em CONHECER E DAR PROVIMENTO ao recurso de Apelação, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Plenário Virtual da 1ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, com início aos dois dias do mês de outubro do ano de dois mil e vinte e três.

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA (RELATORA):

Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por ADRIENNE OLIVEIRA DE SOUZA, manifestando seu inconformismo com a decisão proferida pelo M.M Juízo de Direito da 4ª Vara de Fazenda da Capital, nos autos da Ação Ordinária de Indenização por Danos Morais, Materiais e Estéticos, ajuizada em face do ESTADO DO PARÁ E DO HOSPITAL METROPOLITANO DE URGÊNCIA E EMERGÊNCIA, que indeferiu a petição inicial e julgou extinto o processo sem resolução de mérito.

Historiando os fatos, a atora ajuizou referida ação relatando, em síntese, que no dia 26.11.2011 foi vítima de um acidente de trânsito, por volta das 22:00 horas, quando estava parada na calçada conversando com familiares e foi atingida por uma moto desgovernada.

Continua aduzindo que foi conduzida ao Hospital Metropolitano de Urgência e Emergência, onde realizou exame de raio-x; foi submetida a cirurgia; e ficou internada na enfermaria por alguns dias, momento em que teria ocorrido erro/negligência por parte da enfermeira que fazia o curativo em sua perna, o que levou a amputação do membro, conforme descrito na inicial.

Recebida a petição inicial, o Juízo de piso determinou sua emenda, a fim de que fosse realizada a devida qualificação do Hospital Metropolitano requerido, nos termos do art. 319, II, do CPC, sob pena de indeferimento, conforme decisão de id. 2127878 – Pág. 01.

Todavia, a parte autora, embora devidamente intimada, não se manifestou no prazo legal, conforme certidão expedida pela Secretaria (id. 2127880 – Pág. 01).

Ato contínuo, o Juízo de piso proferiu sentença indeferindo a petição inicial, extinguindo o feito sem resolução de mérito, com fundamento do art. 321, parágrafo único, do CPC, nos seguintes termos:

“(...) Defiro o pedido de justiça gratuita.

Assim, constatada a desídia da parte autora, corporificada na ausência de atendimento de atos e diligências que lhe competiam, INDEFIRO A INICIAL E JULGO EXTINTO O PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, com fulcro no art. 321, parágrafo único do Novo CPC.

Sem condenação em honorários de advogado, pela não instauração do contraditório.

Sem condenação em custas, por ser beneficiária da justiça gratuita. (...)”

A Autora opôs embargos de declaração aduzindo contradição no julgado na medida em que o juízo fundamentou a decisão fazendo referência ao valor da causa, quando o despacho que determinou a emenda versava apenas sobre a qualificação da parte demandada, o que afirma ter sido feito no prazo legal (id. 2127882).

Os embargos foram parcialmente acolhidos, apenas para declarar como razão de decidir a ausência de emenda à inicial quanto a qualificação da parte demandada, nos termos da sentença de id. 2127888.

Inconformada, a autora interpôs o presente recurso de apelação (id. 2127889).

Em suas razões, aduz que ajuizou ação indenizatória em face de dois réus, o Estado do Pará, devidamente qualificado e, o Hospital Metropolitano, cuja qualificação foi incompleta, todavia, afirma que a ausência de qualificação do segundo réu não impede o regular processamento do feito, pois a ação pode prosseguir apenas contra o Estado do Pará, excluindo-se o Hospital Metropolitano.

Assevera que a gravidade dos fatos narrados na exordial torna imperativa uma decisão de mérito e considerando a atual sistemática processual, a solução jurídica mais adequada ao caso é o prosseguimento da ação.

Afirma que teve a perna direita infeccionada e amputada devido à demora no atendimento médico-hospitalar e à imperícia dos profissionais de enfermagem do Hospital Metropolitano, não sendo razoável extinguir o feito sem resolução de mérito.

Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, a fim de reformar a sentença a quo, devolvendo-se os autos ao juízo de origem para regular processamento da demanda.

Recurso recebido no duplo efeito (id. 14221407).

Instada a se manifestar, a Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e provimento do recurso, para reformar a sentença, determinando-se a remessa dos autos ao 1º grau, a fim de dar prosseguimento ao feito (id. 15052824).

É o relatório.

VOTO

A EXMA. DESEMBARGADORA ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA (RELATORA):

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso voluntário.

Não havendo questão preliminar suscitada, passo a análise de mérito.

O cerne da questão gira em torno do acerto ou não da sentença de piso que indeferiu a petição inicial e extingui o processo sem resolução de mérito, com fundamento no art. 321, parágrafo único, do CPC, na medida em que a parte autora, embora devidamente intimada para proceder a emenda à inicial, não o fez, conforme certificado nos autos. Nesse sentido, pretende a Apelante a reforma da sentença vergastada.

No caso ora em análise, a ora Apelante ajuizou ação de indenização por danos morais, materiais e estéticos em face do Estado do Pará e do Hospital Metropolitano de Urgência e Emergência relatando ter sido vítima de erro/negligência médica por parte do Hospital requerido quando sofreu um acidente de trânsito e foi atingida por uma moto desgovernada, alegando que em razão do atendimento recebido naquele hospital, seu ferimento evoluiu, resultando na amputação da sua perna direita.

O recurso merece provimento. Vejamos.

É cediço que o Código de Processo Civil determina que cabe à parte autora, ao propor a ação, diligenciar a fim de apontar os fatos e dados necessários para viabilizar a regular tramitação processual, devendo, assim, na petição inicial o demandante observar o disposto nos artigos 319, caput, e seus incisos, a saber:

Art. 319. A petição inicial indicará:

I - o juízo a que é dirigida;

II - os nomes, os prenomes, o estado civil, a existência de união estável, a profissão, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, o endereço eletrônico, o domicílio e a residência do autor e do réu;

III - o fato e os fundamentos jurídicos do pedido;

IV - o pedido com as suas especificações;

V - o valor da causa;

VI - as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados;

VII - a opção do autor pela realização ou não de audiência de conciliação ou de mediação.

As informações requeridas, com base no disposto no inciso II, do artigo 319, do CPC/2015, objetivam individualizar a figura da parte ré, impossibilitando a confusão acerca de sua identidade, com o objetivo de serem apresentadas condições para a localização dos demandados.

Entretanto, a mencionada norma não deve servir de obstáculo capaz de inviabilizar o acesso à justiça pela parte autora, criando-se exigências excessivamente onerosas, que impossibilitem a obtenção do provimento jurisdicional pleiteado.

Referida norma deve ser analisada e compatibilizada com os princípios da cooperação e da primazia da resolução integral do mérito, previstos nos arts. e , do CPC, estabelecidos como normas fundamentais do processo civil, devendo, portanto, tais princípios embasarem a interpretação dos demais artigos do diploma processual civil.

Analisando os autos e os documentos que o instruem, entendo que a petição inicial preenche os requisitos dos art. 319 e 320, do NCPC, pois dela consta a pretensão deduzida pelos fatos e fundamentos especificados;...

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