Acórdão nº 0805744-73.2023.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Seção de Direito Privado, 01-06-2023

Data de Julgamento01 Junho 2023
ÓrgãoSeção de Direito Privado
Número do processo0805744-73.2023.8.14.0000
Classe processualCONFLITO DE COMPETÊNCIA CÍVEL
AssuntoImunidade de Jurisdição

CONFLITO DE COMPETÊNCIA CÍVEL (221) - 0805744-73.2023.8.14.0000

SUSCITANTE: 14ª VARA CÍVEL E EMPRESARIAL DA COMARCA DE BELEM

SUSCITADO: 5ª VARA CIVEL E EMPRESARIAL DA COMARCA DE BELÉM

RELATOR(A): Desembargador RICARDO FERREIRA NUNES

EMENTA

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO REIVINDICATÓRIA. AÇÃO POSSESSÓRIA. RISCO DE DECISÃO CONFLITANTE. AUSÊNCIA. INSTITUTOS JURÍDICOS DIFERENTES. DECLARADA A COMPETÊNCIA DA 5ª VARA CÍVEL EMPRESARIAL DE BELÉM À UNANIMIDADE.

1. O Conflito de Competência ocorre em Ação Reivindicatória, na qual foi aventada a existência de anterior Ação Possessória sobre o mesmo imóvel, podendo ocorrer o risco de decisões conflitantes.

2. A Ação Reivindicatória possui como fundamento jurídico a propriedade da coisa, e esta independe da posse, assim como a tutela da posse pode se dar mesmo contra a propriedade. Precedente do STJ.

3. Se a posse, um estado de fato, pode ser reclamada inclusive contra o titular do domínio da coisa, fica afastada tanto a conexão como o risco de decisões conflitantes entre as ações cujos fundamentos jurídicos são diferentes.

4. Conflito de Competência julgado para declarar a competência da 5ª Vara Cível e Empresarial de Belém, à unanimidade.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

ACORDAM os Excelentíssimos Desembargadores integrantes da Seção de Direito Privado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade de votos, em DECLARAR competente o Juízo da 5ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Belém, nos termos do voto do Eminente Desembargador Relator.

RELATÓRIO

RELATÓRIO

Cuida-se de conflito de competência instaurado pelo Juízo da 14ª Vara Cível e Empresarial de Belém em dissenso com a 5ª Vara Cível e Empresarial de Belém.

Na origem, trata-se de “ação reivindicatória com pedido de tutela de urgência em caráter liminar”. Distribuído para a 5ª Vara Cível e Empresarial de Belém, aquele Juízo, após indeferir o pedido de gratuidade da justiça e determinar o pagamento das custas processuais, declinou da competência para julgar o processo em vista da existência de “ação de reintegração de posse em trâmite na 14ª Vara Cível e Empresarial de Belém (processo nº 0816621-18.2018.814.0301)” com os mesmos fatos amplamente discutidos. Afirmou que “em que pese não haver com esta ação reivindicatória o fenômeno da conexão com a mencionada ação possessória, entendo prudente a reunião dos feitos no juízo prevento, como forma de se evitar decisões conflitantes, tudo conforme o art. 54, §3º do CPC.

Ao receber o processo, o Juízo da 5ª Vara Cível e Empresarial de Belém recusou a competência, argumentando que “além de inexistir conexão entre as demandas, não há que se falar em risco de decisões conflitantes, pois, apesar de se referirem a um mesmo imóvel, a presente ação é fundamentada na propriedade enquanto nos autos da ação nº 0816621-18.2018.814.0301 o que se discute é o exercício da posse”.

Suscitado o conflito, o incidente foi distribuído a minha relatoria.

Solicitei informações ao juízo suscitado e designei o Juízo suscitante para decidir sobre as medidas urgentes.

Certidão da secretaria informando a inexistência de informações pelo juízo suscitado, apesar de notificado.

O Ministério Público ofertou parecer pela competência do Juízo da 5ª Vara Cível e Empresarial de Belém.

É o relatório.

Inclua-se o feito na sessão de julgamento do Plenário Virtual.

Belém, 15 de maio de 2023.

RICARDO FERREIRA NUNES

Desembargador Relator

VOTO

VOTO

O conflito de competência ocorre em ação reivindicatória, na qual na qual foi aventada a existência de anterior ação possessória sobre o mesmo imóvel. Em razão disso, a 5ª Vara Cível e Empresarial de Belém se declarou incompetente para continuar processando o feito remetendo o processo para a 14ª Vara Cível e Empresarial, na qual tramita a ação possessória, sob a justificativa de evitar decisões conflitantes.

Inicialmente, vale destacar a redação do artigo 55 e §3º, do Código de Processo Civil que trata da possibilidade de reunião de processos conexos, quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir, bem como houver risco de decisões conflitantes ou contraditórias. Vejamos:

Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir.

§ 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta, salvo se um deles já houver sido sentenciado.

§ 2º Aplica-se o disposto no caput :

I - à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico;

I - às execuções fundadas no mesmo título executivo.

§ 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre eles.

O juízo suscitado reconhece a ausência de conexão, porém afirma que há risco de decisões conflitantes entre a ação possessória e a reivindicatória.

Todavia, como é de amplo conhecimento, ação reivindicatória possui como fundamento jurídico a propriedade da coisa, e esta independe da posse, assim como a tutela da posse pode se dar mesmo contra a propriedade.

Essa lição, usada como ratio decidendi, foi sedimentada na jurisprudência do STJ ao julgar se há prejudicialidade externa a justificar a suspensão da ação possessória até até o julgamento de ação de usucapião que foi posteriormente ajuizada. Eis a ementa:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. PREJUDICIALIDADE EXTERNA ENTRE AÇÃO POSSESSÓRIA E USUCAPIÃO ESPECIAL URBANO. INEXISTÊNCIA. NECESSIDADE DE PROSSEGUIMENTO DO FEITO.

- Ajuizada ação de usucapião especial urbano posteriormente e contra aquele que já havia deduzido em juízo sua pretensão de reintegração de posse, suspendeu-se este último processo, por prejudicialidade externa, com fundamento no art. 265, IV, 'a', CPC.

- Não há prejudicialidade externa que justifique a suspensão da possessória até que se julgue a usucapião. A posse não depende da propriedade e, por conseguinte, a tutela da posse pode se dar mesmo contra a propriedade.

Recurso Especial provido.

(REsp n. 866.249/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 17/4/2008, DJe de 30/4/2008.) (grifei)

Sendo assim, parece-me que o raciocínio deve ser aplicado também ao presente caso, no qual se aventa a possibilidade de decisões conflitantes entre a ação possessória e a ação reivindicatória. Ora, se a posse, um estado de fato, pode ser reclamada inclusive contra o titular do domínio da coisa, tenho que fica afastada tanto a conexão como o risco de decisões conflitantes entre as ações cujos fundamentos jurídicos são diferentes.

Ante o exposto, na forma do artigo 957, do CPC e na companhia do parecer Ministerial, Declaro Competente o Juízo de Direito da 5ª Vara Cível e Empresarial de Belém para processar e julgar a ação reivindicatória com pedido de tutela de urgência em caráter liminar n.º 0853239-20.2022.8.14.0301. Em vista da parte final do referido artigo, verifico que a decisão de indeferimento da gratuidade foi prolatada pelo juízo agora declarado competente, razão pela qual não há porque o tribunal se manifestar sobre sua validade.

Comunique-se a decisão aos juízos em conflito para cumprimento do parágrafo único do artigo 957, do Código de Processo Civil.

É o voto.

RICARDO FERREIRA NUNES

Desembargador Relator

Belém, 12/06/2023

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