Acórdão Nº 0806071-39.2017.8.10.0000 do TJMA. Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, Tribunal Pleno, 2018

Ano2018
Classe processualHabeas Corpus Criminal
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão


Sessão do dia 26 de setembro de 2018

TRIBUNAL PLENO

Habeas Corpus nº 0806071-39.2017.8.10.0000

Paciente : Lítia Teresa Costa Cavalcanti

Impetrantes : Sarah Teresa Cavalcanti de Britto (OAB/MA nº 10.488) e Carlos Victor Oliveira Fernandes (OAB/MA nº 10.235)

Autoridade Impetrada : Procurador-Geral de Justiça do Estado do Maranhão

Incidência Penal : Art. 138 do Código Penal

Relator : Desembargador João Santana Sousa

Acórdão :

EMENTA: HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DE PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO CRIMINAL (PIC) INSTAURADO CONTRA A PACIENTE NA PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO. ALEGAÇÕES DE COISA JULGADA MATERIAL, EM FACE DO QUE DECIDIDO POR ESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA NA QUEIXA CRIME Nº 35.830/2016, DE IMUNIDADE POR SUAS OPINIÕES PROFERIDAS NO EXERCÍCIO DE SEU MISTER, DE LIBERDADE DE EXPRESSÃO E, AINDA, DE NÃO CONFIGURAÇÃO DO CRIME OBJETO DE APURAÇÃO. ILEGALIDADE DO PROCEDIMENTO QUANTO AO ÚLTIMO ASPECTO, POIS AS CONDUTAS IMPUTADAS À PACIENTE SÃO ATÍPICAS. CONCESSÃO DA ORDEM.

1. O trancamento de investigação criminal por meio de habeas corpus só é medida adequada quando houver inequívoca comprovação da atipicidade da conduta, da incidência de causa de extinção da punibilidade ou se for o caso de ausência de indícios de autoria ou de prova sobre a materialidade do delito, porque aquele se reveste de excepcionalidade.

2. Não há que se falar na alegada imunidade das afirmações exaradas pela paciente quando estas não foram decorrentes do exercício da sua atividade profissional.

3. Também não procede a alegação de exercício de liberdade de expressão, na medida em que nenhum direito é absoluto.

4. Com relação ao argumento de coisa julgada material em face da decisão proferida, pelo Plenário deste Tribunal, na Queixa Crime de nº 35.830/2016, verifica-se que aquele feito cuida de outro caso. Assim, as declarações do relator, e da Corte, no sentido da inexistência de animus caluniandi quanto aos fatos imputados à paciente com relação ao então Corregedor-Geral do Ministério Público do Estado do Maranhão, foram assim exaradas em obiter dictum, não possuindo efeito vinculativo. Precedentes.

5. Entretanto, analisando a tese de ausência daquele animus, dessa vez de forma central, e não mais em passant, constata-se que as afirmativas feitas pela paciente que são objeto do PIC de nº 002003-500/2017, instaurado pelo Procurador-Geral de Justiça do Maranhão, cuidam-se de manifestações em tom de desabafo, em decorrência de supostamente estar sendo submetida a atos de assédio moral, perpetrados por membros da cúpula, a época, do Ministério Público, os quais sequer declina os nomes, não caracterizando, portanto, a prática de delito contra a honra, por restar ausente o animus de caluniar.

6. Habeas corpus concedido, para trancar o mencionado PIC.

ACÓRDÃO - Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os Senhores Desembargadores do Tribunal Pleno do Tribunal de Justiça do Maranhão, por unanimidade e contra o parecer ministerial, em conceder o presente habeas corpus, para trancamento do procedimento investigatório criminal n.º 002003-500/2017, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Votaram os Senhores Desembargadores João Santana Sousa, Josemar Lopes Santos, José Jorge Figueiredo dos Anjos, Luiz Gonzaga Almeida Filho, Tyrone José Silva, José de Ribamar Castro, Angela Maria Moraes Salazar, Marcelino Chaves Everton, Kleber Costa Carvalho, Vicente de Paula Gomes De Castro, José Luiz Oliveira de Almeida, José Bernardo Silva Rodrigues, Raimundo Nonato Magalhães Melo, Paulo Sérgio Velten Pereira, Cleonice Silva Freire e Antonio Guerreiro Junior.

Ausentes, justificadamente, os Senhores Desembargadores Ricardo Tadeu Bugarin Duailibe, Raimundo José Barros de Sousa, José de Ribamar Fróz Sobrinho, Jaime Ferreira de Araujo, Lourival de Jesus Serejo Sousa, Maria das Graças de Castro Duarte Mendes, Anildes de Jesus Bernardes Chaves Cruz, Nelma Sarney Costa, Cleones Carvalho Cunha, Jamil de Miranda Gedeon Neto, Jorge Rachid Mubárack Maluf e Antonio Fernando Bayma Araujo.

Presidência do Des. José Joaquim Figueiredo dos Anjos.

Funcionou pela Procuradoria Geral de Justiça o Drº. Francisco das Chagas Barros de Sousa.

São Luís (MA), 26 de setembro de 2018.

Desembargador JOÃO SANTANA SOUSA

Relator

RELATÓRIO

Trata-se de Habeas Corpus, com pedido de liminar, impetrado pelos advogados Sarah Teresa Cavalcanti de Britto e Carlos Victor Oliveira Fernandes, em favor de Lítia Teresa Costa Cavalcanti, contra ato do Procurador-Geral de Justiça do Estado do Maranhão, conforme ID nº 1327587.

Aduzem os impetrantes, inicialmente, que o writ tem por objeto o Procedimento Investigatório Criminal (PIC) nº 002003-500/2017, instaurado em face da paciente por meio da Portaria de nº 49/2017, da Assessoria Especial de Investigação do Ministério Público do Estado do Maranhão, em decorrência de Notícia de Fato (Ofício nº 061/2016-CGMP/SEC) apresentada pelo então Corregedor-Geral do Ministério Público, Dr. Suvamy Vivekananda Meireles, a qual almeja investigar a prática de supostos crimes contra a honra deste noticiante.

Esclarecem, dessa forma, que o pleito do remédio heroico é o trancamento daquele PIC, que foi instaurado por aquela Assessoria Especial através de delegação do Procurador-Geral de Justiça do Estado do Maranhão, cessando, portanto, o constrangimento ilegal sofrido pela paciente.

E pontuam, ainda nessa parte inicial, que não é a primeira vez que a paciente vem suplicar a este Tribunal de Justiça que intervenha nos procedimentos administrativos seriais que são instaurados em seu desfavor, um após o outro, por parte do Parquet do Maranhão, contabilizando-se, em pouco mais de 02 (dois) anos, 03 (três) sindicâncias, 02 (dois) procedimentos disciplinares, 01 (uma) queixa-crime e inúmeras e sucessivas inspeções.

Com relação especificamente ao referido PIC, asseveram que, consoante nele pontuado, a paciente teria atentado contra a honra do então Corregedor-Geral do Ministério Público do Estado do Maranhão e contra a própria Instituição, através de postagens na rede social “Twitter”, onde assinala sobre assédio moral e improbidade administrativa.

Em razão destes eventos, continuam alegando os impetrantes, os quais constituem só mais um capítulo de uma verdadeira cruzada institucional em face da paciente, instaurou-se o multicitado procedimento investigatório criminal, nos autos do qual já se pretende a prática de atos voltados à instrução probatória, com data marcada para a coleta do depoimento da paciente, a se realizar em 21/11/2017. Todavia, alegam ainda que a tramitação do referido PIC, por si só, já configura manifesto constrangimento ilegal, por atentar contra os limites subjetivos da coisa julgada e contra a autoridade deste Tribunal de Justiça, autorizando o respectivo trancamento.

Após tecerem argumentações acerca do cabimento do remédio heroico para trancamento de procedimento investigatório criminal embasado em eventos absolutamente atípicos e já examinados por este Tribunal de Justiça, requerem que o writ seja distribuído, por dependência, ao relator da Queixa Crime nº 35.830/2016, alegando a sua conexão com o PIC em comento.

Sustentam a ocorrência de coisa julgada material, pelo reconhecimento da atipicidade, em razão de o Plenário desta Corte, em 14/06/2017, por ocasião de “juízo de recebimento” da Queixa Crime nº 35.830/2016, apresentada em desfavor da impetrante, ter examinado os mesmos fatos noticiados no PIC atacado e, ao final, concluído que a pretensão acusatória era carente de justa causa.

Asseveram, no caso, que o comando que se extrai da decisão colegiada máxima deste Tribunal se reveste de imutabilidade erga omnes, que se opera dentro e fora daquele processo.

E, ainda, que o que se pretende com o citado PIC sobre estes mesmos fatos é uma verdadeira revisão pro societate, que é expressamente vedada pelo ordenamento jurídico pátrio, vulnerando, assim, o direito da impetrante à imutabilidade da decisão que lhe foi favorável e, ainda, a autoridade deste Tribunal de Justiça.

Noutro passo, aduzem que a imputação de calúnia pressupõe que o agente atribua à vítima um ilícito penal, e, ao contrário do que se quer fazer crer no PIC nº 002003-500/2017, não há no ordenamento jurídico brasileiro o “crime” de assédio moral. E, também, que tampouco serve, à configuração do mencionado delito, a suposta imputação de ato de improbidade administrativa.

Registram que os tribunais superiores têm entendimento claro que o animus narrandi, que orienta os relatos aos órgãos correicionais, descaracteriza os crimes contra a honra. Isto fica mais evidente, segundo os impetrantes, quando o citado contexto dos eventos analisados demonstra que tudo o que dito foi em resposta a vários questionamentos do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), e colaciona, logo em seguida, julgado do Superior Tribunal de Justiça a respeito (HC nº 234.134/MT).

Ressaltam que os membros do Ministério Público, assim como os do Poder Judiciário, gozam de imunidade material por suas opiniões quando exaradas no exercício de seu mister, sem as quais jamais conseguiriam cumprir as suas funções institucionais. E não há dúvida, segundo frisam, que a impetrante estava na condição de inspecionada pelo CNMP quando dos fatos a ela imputados.

Nessa linha, aduzem que a liberdade de expressão incomoda e a crítica livre perturba a consciência do equívoco e assalta a tranquilidade daqueles que comandam as instituições republicanas.

Com estas considerações, entendendo presentes o fumus boni iuris, a partir do que delineado anteriormente, e o periculum in mora, que residiria no fato de que o respectivo PIC já está na fase instrutória, com data para a inquirição da paciente designada para o mês da impetração, pugnam pela concessão da liminar, objetivando a suspensão daquele procedimento administrativo, e, no mérito, pela concessão definitiva da ordem, a fim de determinar o trancamento daquele.

Outrossim, pugnam pela decretação de segredo de justiça aos autos do writ, tendo em vista o que dispõe o art. 792, § 1º...

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