Acórdão Nº 0806457-06.2022.8.10.0029 do TJMA. Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, Quarta Câmara de Direito Privado, 2023
Ano | 2023 |
Classe processual | Apelação Cível |
Órgão | Quarta Câmara de Direito Privado |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO
APELAÇÃO CÍVEL Nº:0806457-06.2022.8.10.0029
APELANTE:JOSEFA LOPES DA SILVA
ADVOGADO:CHIRLEY FERREIRA DA SILVA - OAB PI 10.862-A; LENARA ASSUNÇÃO RIBEIRO DA COSTA – OAB PI 12.646
APELADO:BANCO PAN S.A.
ADVOGADO:ENY ANGE SOLEDADE BITTENCOURT DE ARAÚJO – OAB BA 29.442
RELATOR:DESEMBARGADORLUIZ GONZAGAALMEIDA FILHO
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA E INDENIZATÓRIA. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR PESSOA ANALFABETA. COMPROVAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE CONTRATO ESCRITO, COM APOSIÇÃO DE DIGITAL E ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS IDENTIFICADAS. AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO (ARTIGO 595 DO CPC). CONTRATO PACTUADO PELAS PARTES. RELATIVIZAÇÃO DO VÍCIO DE FORMA. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA CONTRATUAL. ART. 422 DO CC e 4ª TESE do IRDR nº 53983/2016. VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM. SUPRESSIO. DESPROVIMENTO RECURSAL.
I. O cerne da demanda cinge-se em analisar a validade do contrato firmado com pessoa analfabeta sem observância dos preceitos estabelecidos na legislação.
II. O presente caso deve ser analisado à luz do princípio da boa - fé objetiva (art. 422 do CC e 4ª Tese do IRDR nº 53983/2016) visto que os contratantes são obrigados a guardar probidade, proteção, lealdade, honestidade e confiança recíproca, de modo a não frustrar as legítimas expectativas da contra parte. A boa-fé objetiva é cláusula geral dos contratos e deve incidir nas fases pré e pós-contratual. Trata-se de uma crença efetiva no comportamento alheio, cujo objetivo é evitar o exercício abusivo dos direitos subjetivos, repelindo a prática de condutas contraditórias que importem em quebra da confiança legitimamente depositada no parceiro contratual.
III. A Apelante, além de não negar que realizou a contratação, (i) deixou de suscitar incidente de falsidade do documento em tempo oportuno; (ii) se verifica dos autos que o próprio filho da autora/apelante, assinou o contrato como testemunha (iii) protestou judicialmente contra os descontos em sua conta-corrente após mais de 1 ano do primeiro desconto (Supressio); (iv) deixou de colacionar seus extratos bancários, não sendo suficiente apenas discordar ou alegar, genericamente, que a contraparte não comprovou a regularidade da contratação, em completo desarranjo com o acervo probatório produzido oportunamente, fatos que demonstram a violação do boa-fé objetiva (CC, art. 422 e 4ª Tese do IRDR nº 53983/2016).
IV. Destaco que os extratos bancários, mesmo não sendo documentos essenciais à propositura da ação, são inerentes à discussão do meritum causae, devem ser apresentados pela parte autora, em decorrência do princípio da cooperação, quando afirmado o não recebimento dos valores decorrentes de empréstimo bancário impugnado, nos termos da 1ª Tese do IRDR nº 53983/2016, de compulsória observância (art. 927, III, c/c art. 928, I, todos do CPC).
V. A alegação de nulidade por vício formal configura-se como comportamento contraditório com a conduta praticada anteriormente pela apelante. Por essas razões, o STJ tem rejeitado a pretensão de declaração de nulidade do negócio deduzida por quem contribuiu com o vício (REsp: 1881149 DF 2019/0345908-4). Assim, a boa-fé tem força para impedir a invocação de nulidade do contrato, devendo haver a conservação do negócio jurídico de forma a consagrar a confiança provocada na outra parte da relação contratual.
VI. Desprovimento do recurso.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos “A QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, POR VOTAÇÃO UNÂNIME, CONHECEU E NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO DESEMBARGADOR RELATOR.”.
Participaram da sessão os Desembargadores Douglas Airton Ferreira Amorim, José Jorge Figueiredo dos Anjos e Luiz Gonzaga Almeida Filho.
Atuou pela Procuradoria Geral de Justiça o(a) Dr(a). Eduardo Daniel Pereira Filho
São Luís – MA, 24 de agosto de 2023.
Desembargador LUIZ GONZAGA Almeida Filho
Relator
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Cível interposta por JOSEFA LOPES DA SIL, inconformado com a sentença proferida pelo Juízo de direito da 1a Vara Cível da Comarca de Caxias/MA nos autos da Ação Ordinária ajuizada contra BANCO PAN S.A., que julgou improcedentes os pedidos iniciais.
Em sua exordial, a autora, ora apelante, diz que é idosa, analfabeta e aposentada, percebendo seus proventos junto ao INSS. Assevera que percebeu descontos relativos ao empréstimo consignado nº 324404174-9, que alega não ter contraído nem recebido o valor correspondente. Ainda de acordo com a exordial, o valor do empréstimo dito fraudulento foi de R$ 272,83, a ser pago em parcelas de R$ 12,30. Almeja declaração de inexistência dos débitos, repetição do indébito em dobro e indenização por danos morais.
Em sua contestação, a instituição financeira alega a existência, legitimidade e juntada do contrato questionado, defendendo sua regularidade, pugnando pela improcedência de todos os...
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO
APELAÇÃO CÍVEL Nº:0806457-06.2022.8.10.0029
APELANTE:JOSEFA LOPES DA SILVA
ADVOGADO:CHIRLEY FERREIRA DA SILVA - OAB PI 10.862-A; LENARA ASSUNÇÃO RIBEIRO DA COSTA – OAB PI 12.646
APELADO:BANCO PAN S.A.
ADVOGADO:ENY ANGE SOLEDADE BITTENCOURT DE ARAÚJO – OAB BA 29.442
RELATOR:DESEMBARGADORLUIZ GONZAGAALMEIDA FILHO
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA E INDENIZATÓRIA. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR PESSOA ANALFABETA. COMPROVAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE CONTRATO ESCRITO, COM APOSIÇÃO DE DIGITAL E ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS IDENTIFICADAS. AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO (ARTIGO 595 DO CPC). CONTRATO PACTUADO PELAS PARTES. RELATIVIZAÇÃO DO VÍCIO DE FORMA. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA CONTRATUAL. ART. 422 DO CC e 4ª TESE do IRDR nº 53983/2016. VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM. SUPRESSIO. DESPROVIMENTO RECURSAL.
I. O cerne da demanda cinge-se em analisar a validade do contrato firmado com pessoa analfabeta sem observância dos preceitos estabelecidos na legislação.
II. O presente caso deve ser analisado à luz do princípio da boa - fé objetiva (art. 422 do CC e 4ª Tese do IRDR nº 53983/2016) visto que os contratantes são obrigados a guardar probidade, proteção, lealdade, honestidade e confiança recíproca, de modo a não frustrar as legítimas expectativas da contra parte. A boa-fé objetiva é cláusula geral dos contratos e deve incidir nas fases pré e pós-contratual. Trata-se de uma crença efetiva no comportamento alheio, cujo objetivo é evitar o exercício abusivo dos direitos subjetivos, repelindo a prática de condutas contraditórias que importem em quebra da confiança legitimamente depositada no parceiro contratual.
III. A Apelante, além de não negar que realizou a contratação, (i) deixou de suscitar incidente de falsidade do documento em tempo oportuno; (ii) se verifica dos autos que o próprio filho da autora/apelante, assinou o contrato como testemunha (iii) protestou judicialmente contra os descontos em sua conta-corrente após mais de 1 ano do primeiro desconto (Supressio); (iv) deixou de colacionar seus extratos bancários, não sendo suficiente apenas discordar ou alegar, genericamente, que a contraparte não comprovou a regularidade da contratação, em completo desarranjo com o acervo probatório produzido oportunamente, fatos que demonstram a violação do boa-fé objetiva (CC, art. 422 e 4ª Tese do IRDR nº 53983/2016).
IV. Destaco que os extratos bancários, mesmo não sendo documentos essenciais à propositura da ação, são inerentes à discussão do meritum causae, devem ser apresentados pela parte autora, em decorrência do princípio da cooperação, quando afirmado o não recebimento dos valores decorrentes de empréstimo bancário impugnado, nos termos da 1ª Tese do IRDR nº 53983/2016, de compulsória observância (art. 927, III, c/c art. 928, I, todos do CPC).
V. A alegação de nulidade por vício formal configura-se como comportamento contraditório com a conduta praticada anteriormente pela apelante. Por essas razões, o STJ tem rejeitado a pretensão de declaração de nulidade do negócio deduzida por quem contribuiu com o vício (REsp: 1881149 DF 2019/0345908-4). Assim, a boa-fé tem força para impedir a invocação de nulidade do contrato, devendo haver a conservação do negócio jurídico de forma a consagrar a confiança provocada na outra parte da relação contratual.
VI. Desprovimento do recurso.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos “A QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, POR VOTAÇÃO UNÂNIME, CONHECEU E NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO DESEMBARGADOR RELATOR.”.
Participaram da sessão os Desembargadores Douglas Airton Ferreira Amorim, José Jorge Figueiredo dos Anjos e Luiz Gonzaga Almeida Filho.
Atuou pela Procuradoria Geral de Justiça o(a) Dr(a). Eduardo Daniel Pereira Filho
São Luís – MA, 24 de agosto de 2023.
Desembargador LUIZ GONZAGA Almeida Filho
Relator
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Cível interposta por JOSEFA LOPES DA SIL, inconformado com a sentença proferida pelo Juízo de direito da 1a Vara Cível da Comarca de Caxias/MA nos autos da Ação Ordinária ajuizada contra BANCO PAN S.A., que julgou improcedentes os pedidos iniciais.
Em sua exordial, a autora, ora apelante, diz que é idosa, analfabeta e aposentada, percebendo seus proventos junto ao INSS. Assevera que percebeu descontos relativos ao empréstimo consignado nº 324404174-9, que alega não ter contraído nem recebido o valor correspondente. Ainda de acordo com a exordial, o valor do empréstimo dito fraudulento foi de R$ 272,83, a ser pago em parcelas de R$ 12,30. Almeja declaração de inexistência dos débitos, repetição do indébito em dobro e indenização por danos morais.
Em sua contestação, a instituição financeira alega a existência, legitimidade e juntada do contrato questionado, defendendo sua regularidade, pugnando pela improcedência de todos os...
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