Acórdão Nº 0806921-93.2017.8.10.0000 do TJMA. Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, Seção de Direito Criminal, 2020

Year2020
Classe processualConflito de Jurisdição
ÓrgãoSeção de Direito Criminal
Tipo de documentoAcórdão (Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão)


Sessão de 14 de fevereiro de 2020

CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS

Conflito de Jurisdição nº 0806921-93.2017.8.10.0000

Suscitante : Juízo da Auditoria da Justiça Militar do Estado do Maranhão

Suscitado : Juízo da 9ª Vara Criminal da Comarca de São Luís

Relator : Desembargador João Santana Sousa

Acórdão nº

EMENTA - CONFLITO DE JURISDIÇÃO. DELITO PRATICADO POR MILITAR EM EXERCÍCIO CONTRA MENOR. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA AUDITORIA DA JUSTIÇA MILITAR DO ESTADO DO MARANHÃO OU DO JUÍZO DA 9ª VARA CRIMINAL DE SÃO LUÍS. MATÉRIA À ANÁLISE DESTAS “CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS” EM FACE DE AFETAÇÃO DO SEU RELATOR. POSSIBILIDADE. EXERCÍCIO DISCRICIONÁRIO. REGRAMENTO EXPRESSO DO ART. 124 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, COM BASE NO “PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL”. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA AUDITORIA MILITAR. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PRIORIDADE ABSOLUTA E DO MELHOR INTERESSE DO MENOR NESTE DERRADEIRO JUÍZO, DA AUDITORIA DA JUSTIÇA MILITAR. CONFLITO CONHECIDO E JULGADO IMPROCEDENTE.

1. O relator de caso de competência de uma das Câmaras Criminais Isoladas desta Corte de Justiça pode afetá-lo às Câmaras Criminais Reunidas quando convier o seu pronunciamento, em decorrência da relevância da questão, e para prevenir divergências entre os órgãos criminais fracionários referidos. Aplicação analógica do art. 259, XXX, do Regimento Interno deste Tribunal. Inúmeros precedentes do STF (HC nº 152.752, ADPF nº 515, AgRg na Pet nº 7.670 e ainda no HC nº 143.333) e do STJ (REsp nº 1.798.903). “Exercício discricionário” do relator.

2. A relatoria do caso afetado para as Câmaras Criminais Reunidas, como descrito no item anterior, continua com o Desembargador que é o relator do caso originário na Câmara Criminal Isolada.

3. A Constituição Federal estipula, de forma expressa, em seus arts. 124 e 125, ser da competência da Justiça Militar o processamento e o julgamento dos crimes militares, não fazendo qualquer ressalva, à exceção do Tribunal do Júri, quanto aos delitos praticados contra as crianças e os adolescentes.

4. O art. 53 do Código de Divisão e Organização Judiciárias do Estado do Maranhão (Lei Complementar Estadual nº 014/1991), o qual reza a competência da Justiça Militar Estadual para o processamento e o julgamento dos crimes militares, é “reprodução” da norma contida no art. 124 da Constituição Federal, pelo que a regra nele apresentada, mesmo nos casos de delitos contra menores, deve prevalecer sobre o art. 9º, XLVIII, da referida lei estadual, a qual trata da competência da 9ª Vara Criminal da Comarca de São Luís.

5. Vale pontuar que a aplicação dos princípios da prioridade absoluta e do melhor interesse do menor podem ser muito bem aplicados pelo Juízo da Auditoria da Justiça Militar do Estado do Maranhão, com até a possibilidade de depoimento especial (Lei nº 13.431/2017).

6. A alegação de que a Justiça Militar Estadual não possui estrutura para o julgamento dos referidos crimes é irrelevante em decorrência do comando constitucional, expresso, dos arts. 124 e 125, na esteira do que já decidiu o STF no Inquérito nº 4.435, quando decidiu que à justiça eleitoral compete julgar “os crimes eleitorais e os comuns que lhe forem conexos”, como prescrevem os arts. 109, IV, e 121, caput, ambos da Carta Magna.

7. Conflito julgado improcedente, para se declarar a competência do Juízo da Auditoria da Justiça Militar do Estado do Maranhão no caso e para assentar a seguinte tese: “no conflito entre a justiça militar e a justiça da infância e da juventude com relação aos crimes que são perpetrados por militares em serviço contra crianças e adolescentes, reconhece-se a competência da justiça militar, como inserto nos arts. 124 e 125 da Constituição Federal”.

Acórdão – vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os senhores Desembargadores das Câmaras Criminais Reunidas do Tribunal de Justiça do Maranhão, unanimemente, e em desacordo com o parecer ministerial, em conhecer do presente Conflito de Jurisdição, para o fim de declarar competente o Juízo da Auditoria da Justiça Militar do Estado do Maranhão, para processar e julgar o Inquérito Policial n° 103/2015-DPCA, nos termos do voto do relator, Desembargador João Santana Sousa.

Participaram do julgamento os Desembargadores João Santana Sousa, Josemar Lopes Santos, Vicente de Paula Gomes de Castro, José Bernardo Silva Rodrigues, Raimundo Nonato Magalhães Melo, Antônio Fernando Bayma Araújo e Luíz Gonzaga Almeida Filho (convocado para compor quórum).

Presidência do Desembargador Antônio Fernando Bayma Araújo.

Procuradora de Justiça a Drª. Maria de Fátima Rodrigues Travassos Cordeiro.

São Luís (MA), 14 de fevereiro de 2020.

Desembargador JOÃO SANTANA SOUSA

Relator

RELATÓRIO

Trata-se de Conflito de Jurisdição entre o Juízo da Auditoria da Justiça Militar do Estado do Maranhão, suscitante, e o Juízo da 9ª Vara Criminal da Comarca de São Luís, suscitado, no bojo do Inquérito Policial nº 103/2015-DPCA, os quais se deram por incompetentes para o seu processamento e julgamento.

Assinala o Juízo suscitado, na decisão de ID nº 1428682, que, como se trata o caso de suposto crime de lesão corporal praticada mediante disparos de arma de fogo por policiais militares em serviço contra uma criança de somente 05 (cinco) anos de idade, a competência para a sua apreciação é da Auditoria da Justiça Militar, nos termos do art. 125, § 4º, da Constituição Federal, e do art. 53 do Código de Divisão e Organização Judiciárias do Estado do Maranhão.

E, por outro lado, o Juízo suscitante, da Auditoria da Justiça Militar, na decisão de mesmo ID, aduz que o delito em tela deve ser apurado por uma vara criminal especializada em crimes contra crianças e adolescentes, porquanto se trata de “unidade jurisdicional mais adequada à proteção do interesse do menor”, com fundamento no art. 9º, XLVIII, do Código de Divisão e Organização Judiciárias do Estado do Maranhão.

O conflito em tela foi distribuído inicialmente ao Desembargador Jaime Ferreira de Araújo, o qual, no despacho de ID nº 2806611, determinou a sua distribuição para um dos integrantes das Câmaras Criminais Isoladas deste Tribunal de Justiça.

Dessa forma, este signatário foi o sorteado para a relatoria do conflito, ocasião em que, no despacho de ID nº 2943756, determinou o seu envio à Procuradoria Geral de Justiça, que, na manifestação contida no ID nº 3014167, requereu a conversão do julgamento em diligência, para que o Juízo suscitado se manifestasse.

Despacho deste relator no ID nº 3227136, deferindo o pleito ministerial. Assim, o Juízo suscitado, no ID nº 3308908, reiterou os seus argumentos constantes do ID nº 1428682.

Destarte, os autos em foco retornaram à Procuradoria Geral de Justiça, que, no ID nº 3437451, manifestou-se pela procedência do conflito, declarando-se o Juízo suscitado, da 9ª Vara Criminal de São Luís, como competente para o processamento da causa constante do Inquérito Policial nº 103/2015-DPCA.

Decisão deste subscrevente no ID nº 3722702, “afetando” o caso para as Câmaras Criminais Reunidas deste Tribunal de Justiça, com arrimo no art. 259, XXX, do Regimento Interno desta Corte, aplicado por analogia, em face das inúmeras decisões conflitantes das Câmaras Criminais Isoladas a respeito, o que foi comunicado, via ofício, a todos os membros deste colegiado maior.

Nova manifestação do Ministério Público de 2º grau no ID nº 3938265, reiterando o seu anterior parecer, constante no ID nº 3437451.

É o relatório.

VOTO

Presentes os seus requisitos legais, conheço do conflito.

1: DA AFETAÇÃO DO CASO ÀS CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS

A questão de fundo do conflito reside em saber: se um crime militar for perpetrado contra uma criança ou um adolescente na cidade de São Luís, a competência para o processamento e o julgamento do respectivo inquérito policial ou ação penal será do Juízo da Auditoria Militar do Estado do Maranhão ou do Juízo da 9ª Vara Criminal da referida Comarca?

Feito este registro, e verificando-se a existência de inúmeros julgados deste Tribunal de Justiça, por meio das suas 1ª, 2ª e 3ª Câmaras Criminais, caminhando em sentido “diametralmente opostos”, gerando, assim, insegurança jurídica, este relator, na decisão de ID nº 3722702, “afetou” o julgamento “do caso” para as Câmaras Criminais Reunidas deste Tribunal de Justiça, com espeque no art. 259, XXX, do Regimento Interno desta Corte, aplicado por analogia, adiante transcrito.

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