Acórdão Nº 0807432-71.2013.8.24.0023 do Primeira Câmara de Direito Civil, 15-12-2022

Número do processo0807432-71.2013.8.24.0023
Data15 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0807432-71.2013.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador FLAVIO ANDRE PAZ DE BRUM

APELANTE: IVAN PIRES ADVOGADO: GUILHERME DAMIANI NUNES (OAB SC025055) APELANTE: RANGEL FERREIRA PIRES ADVOGADO: GUILHERME DAMIANI NUNES (OAB SC025055) APELANTE: MARISA FERREIRA TEIXEIRA ADVOGADO: GUILHERME DAMIANI NUNES (OAB SC025055) APELANTE: RICARDO TEIXEIRA ADVOGADO: GUILHERME DAMIANI NUNES (OAB SC025055) APELADO: ALZEMIRO ABREU DO NASCIMENTO ADVOGADO: ALAN CAMILO GARCIA (OAB SC043116) ADVOGADO: KLAUS PACHECO MARTINS (OAB SC019014) APELADO: ZENILDA FERREIRA MOCELIN ADVOGADO: ALAN CAMILO GARCIA (OAB SC043116) ADVOGADO: KLAUS PACHECO MARTINS (OAB SC019014)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Ivan Pires e outros, contra sentença prolatada pelo juízo da 3ª Vara Cível da Comarca da Capital que, nos autos da "Ação de reintegração de posse c/c pedido liminar "inaudita altera pars" n. 0807432-71.2013.8.24.0023, ajuizada contra Alzemiro Abreu do Nascimento e outra, julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial, condenando-os ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa (evento 110 da origem).

Inconformados, os autores arguiram, preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, além de postularem o afastamento da multa de 2% aplicada em razão da oposição dos aclaratórios. No mérito, sustentaram que a sentença recorrida confundiu os fatos narrados e as provas produzidas, esclarecendo que o imóvel dos apelados é encravado e, por tal razão, "[...] tinham apenas a permissão para passarem no terreno dos Apelantes, contudo nos dias 10/01/2013 e 27/03/2013, os Apelados resolveram esbulhar, definitivamente, a posse do imóvel dos Apelantes. O ponto crucial do processo em apreço é acerca dessa permissão que os Apelantes deram, para que os Apelados continuassem a passar pelo seu terreno. Fato é que o caminho utilizado pelos Apelados para entrarem no seu terreno era feito por meio do terreno dos Apelantes, todavia os Apelados insistem em esbulhar a posse, construindo garagens, modificando moirões etc. como se donos fossem, motivo pelo qual esta ação de reintegração de posse deve ser julgada procedente".

Neste andar, ressaltaram estarem preenchidos todos os requisitos para a reintegração da posse, pugnando pela reforma da decisão, com a procedência da demanda (evento 117).

Com as contrarrazões (evento 121), ascenderam os autos a esta Corte.

Recebo-os conclusos.

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão por que dele se conhece.

Ab initio, quanto à preliminar de cerceamento de defesa, deixa-se de adentrar na discussão, porquanto o mérito do presente reclamo aproveita aos recorrentes, consoante adiante se verá, o que, a sua vez, desobriga a análise da prefacial, conforme estatuído no art. 282, § 2º, do Código de Processo Civil, assim vazado:

Art. 282. Ao pronunciar a nulidade, o juiz declarará que atos são atingidos e ordenará as providências necessárias a fim de que sejam repetidos ou retificados.(...)§ 2º Quando puder decidir o mérito a favor da parte a quem aproveite a decretação da nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato ou suprir-lhe a falta.

Aliás, sobre o tema, já decidiu esta Corte de Justiça, com as adequações necessárias:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO COMINATÓRIA. PLANO DE SAÚDE. REEMBOLSO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA RÉ. PRELIMINARES. SUSCITADA A NULIDADE DA SENTENÇA. INVERSÃO NA ORDEM DE OITIVA DE TESTEMUNHAS QUE SUPOSTAMENTE CAUSOU PREJUÍZOS À REQUERIDA. ALEGAÇÃO DE QUE A DECISÃO É EXTRA PETITA. PRESCINDIBILIDADE DE PRONUNCIAÇÃO DOS VÍCIOS. JULGAMENTO DO MÉRITO QUE SERÁ BENÉFICO À APELANTE NO TOCANTE AOS SUPOSTOS ERROS SUSCITADOS (ART. 282, § 2º, CPC). [...] REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA. REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação n. 0026663-69.2012.8.24.0018, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Osmar Nunes Júnior, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 22-09-2022).

E de minha relatoria:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DO AUTOR. PREFACIAL DE CERCEAMENTO DE DEFESA PELO JULGAMENTO ANTECIPADO. DESNECESSIDADE DE ENFRENTAMENTO, CONFORME ART. 282, §2º, DO CPC. MÉRITO QUE FAVORECE AO RECORRENTE. DESCONTOS PROCEDIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO REJEITADO PELO CONSUMIDOR. ELEMENTOS PROBATÓRIOS QUE DESCORTINAM A OCORRÊNCIA DE FRAUDE. ATO ILÍCITO RECONHECIDO. DEVOLUÇÃO DE VALORES DA FORMA SIMPLES, ACRESCIDA DOS ENCARGOS LEGAIS. DANO MORAL CONFIGURADO. DEVER DE REPARAR. DECISUM MODIFICADO. QUANTUM COMPENSATÓRIO FIXADO EM CONSONÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. CONSECTÁRIOS LEGAIS ARBITRADOS DE ACORDO COM AS SÚMULAS 362 E 54 DO STJ. ÔNUS SUCUMBENCIAIS INVERTIDOS. HONORÁRIOS RECURSAIS DESCABIDOS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5022295-42.2020.8.24.0020, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 21-10-2021 - grifou-se).

Dito isso, no caso concreto, infere-se do caderno processual que o objeto do litígio é uma área de propriedade dos autores, que serve de passagem para os réus acessarem sua residência, localizada em terreno encravado, e sobre a qual construíram uma garagem sem autorização.

Urge se registre de início que a decisão recorrida decidiu pela improcedência dos pedidos formulados na inicial a partir de uma premissa equivocada, qual seja, de que o imóvel dos autores não teria acesso à via pública, quando, na verdade, tal condição é relativa à propriedade dos réus. Neste contexto, impende destacar que o acervo probatório amealhado ao feito evidencia a posse exercida pelos demandantes, os quais tão somente permitiam a passagem dos demandados pelo local por mera tolerância.

Tanto assim o é que na ação possessória n. 023.96.008992.8, ajuizada no ano de 1996 pela proprietária anterior (Agripina) - que vendeu a área ora litigiosa aos apelantes (evento3/INF3) -, as partes firmaram acordo para que os réus não mais voltassem a molestar a posse de Agripina Firmina Vidal, a qual autorizou Alzemiro Abreu do Nascimento e Zenilda Ferreira Mocelin a eventualmente transitarem pelo seu imóvel, sem que tal fato ensejasse eventual aquisição ao direito de passagem, tudo nos termos do ajuste firmado na época (Evento 3/INF10, fl. 13) e em consonância com o artigo 1.208 do Código Civil, segundo o qual, "Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade".

Além disso, infere-se do caderno processual que os Autores já haviam notificado judicialmente os apelados no ano de 2005 (evento 3/INF6), através da Ação de Notificação n. 023.04.683139-0, a fim de comunicar que a permissão de passagem cedida pela possuidora anterior havia cessado, em razão do descumprimento do acordo judicial retromencionado.

No ponto, embora os apelados tenham alegado que tais demandas referiam-se a uma área diversa, e não exatamente aquela sobre a qual construíram a garagem, fato é que o acervo probatório amealhado ao feito - boletins de ocorrência, depoimentos testemunhais e demais documentos - evidenciam que os apelantes sempre exerceram e defenderam a posse sobre toda a área que adquiriram de Agripina Firmina Vidal no ano de 2001, a qual inclui aquela na qual os demandados edificaram uma garagem, revelando-se imperativo o reconhecimento de que, de fato, na data da referida pactuação ocorreu transferência de todos os poderes inerentes à propriedade aos autores, nos termos do art. 1.204, do Código Civil, verbis: "Adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade".

Convém destacar que não merece guarida as assertivas dos demandados no sentido de que restou comprovada a preexistência de sua posse sobre a área, bem como o uso do caminho de maneira ininterrupta sob a forma de servidão, vez que as fotos e os documentos amealhados ao feito corroboram com a narrativa tecida pelos autores na inicial, de que edificaram um prédio de apartamentos sobre o imóvel descrito, sendo constituído um condomínio fechado, de modo que os condôminos fazem uso da passagem quando necessitam, para ter acesso à parte dos fundos...

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