Acórdão nº 0808025-02.2023.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Seção de Direito Penal, 20-06-2023

Data de Julgamento20 Junho 2023
ÓrgãoSeção de Direito Penal
Número do processo0808025-02.2023.8.14.0000
Classe processualHABEAS CORPUS CRIMINAL
AssuntoRoubo

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) - 0808025-02.2023.8.14.0000

PACIENTE: TIAGO OLIVEIRA DE ARAUJO

AUTORIDADE COATORA: JUÍZO DE DIREITO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE MOJÚ

RELATOR(A): Desembargador PEDRO PINHEIRO SOTERO

EMENTA

EMENTA: HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. ROUBO MAJORADO. PRISÃO PREVENTIVA. PEDIDO DE LIBERDADE. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE. INEXISTÊNCIA. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ART. 302 DO CPPB. AUSÊNCIA DE AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA POR SI SÓ NÃO GERA NULIDADE. NECESSIDADE TÃO SOMENTE DE REALIZAÇÃO DA AUDIÊNCIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA.NÃO OCORRÊNCIA. PRESENÇA DO FUMUS COMISSI DELICTI E DO PERICULUM LIBERTATIS. GRAVIDADE CONCRETA DO DELITO E PERICULOSIDADE DO AGENTE. MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. INSUFICIENTES.

1. Para ocorrer o flagrante é necessária a certeza visual ou evidência do crime. O flagrante pode ser impróprio, quando há perseguição, ou presumido, quando não há perseguição, mas o criminoso é apontado pelo próprio ofendido ou é encontrado em situação que faça presumir sua culpabilidade.

2. A decisão que homologou a prisão em flagrante não incorre em qualquer ilegalidade eis que amparada no conceito legal e doutrinário de flagrante.

3. Para o Supremo Tribunal Federal a ausência da audiência de custódia reclama a sua realização, mas não necessariamente o relaxamento da prisão.

4. Imperiosa a Custódia cautelar para garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal. Decreto fundamentado por existirem razões concretas para a segregação.

5. Concessão da prisão preventiva do paciente em consonância com os requisitos previstos no art. 312 do CPPB .

6. Aplicação de medidas cautelares diversas previstas no art. 319 do CPP se revelam insuficientes.

7. Ordem conhecida e concedida parcialmente.

DES. PEDRO PINHEIRO SOTERO

RELATOR

RELATÓRIO

HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO COM PEDIDO DE LIMINAR

ÓRGÃO JULGADOR: SEÇÃO DE DIREITO PENAL

PROCESSO N.º 0808025-02.2023.8.14.0000

PACIENTE: TIAGO OLIVEIRA DE ARAUJO

IMPETRANTE: HALLAN REIS ANTONIO JOSÉ

AUTORIDADE COATORA: JUÍZO DE DIREITO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE MOJÚ/PA

PROCESSO REFERÊNCIA: N.º 0800692-03.2023.8.14.0031

Trata-se de HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO com pedido de liminar impetrado por HALLAN REIS ANTONIO JOSÉ, em favor do paciente TIAGO OLIVEIRA DE ARAUJO, apontando como autoridade coatora JUIZO D A VARA ÚNICA DE MOJU/PA, nos autos do processo nº 0800692-03.2023.8.14.0031.

O impetrante informa, em suma, que o paciente foi cerceado de sua liberdade em 11 de maio de 2023, quando do cumprimento de prisão em flagrante, por supostamente ter participado o delito do artigo 157, § 2º, inciso V, do Código Penal.

Infere que a autoridade coatora presumiu que o paciente tenha sido um dos autores do crime. Alega a inexistência dos requisitos ensejadores da prisão em flagrante, sendo esta ilegal.

Ressalta que não houve a audiência de custódia e que por isso há ilegalidade na prisão, devendo ser relaxada a mesma.

Aduz que há ausência de fundamentação idônea no decreto prisional, pois não respeitou os requisitos do art. 312 do CPPB.

Assevera que o Paciente tem condições favoráveis necessárias para a substituição da prisão preventiva por outras medidas cautelares previstas no artigo 319 do CPP.

Desta feita, postula liminarmente pela concessão do habeas corpus, para manter o direito à liberdade e no mérito a confirmação da liminar.

Os autos foram distribuídos com pedido de liminar a qual foi indeferida, solicitando-se informações da autoridade coatora bem como manifestação ministerial.

As informações foram prestadas na data de 29/05/2023, por meio do Documento de Id 14319476.

O Órgão Ministerial se manifestou pelo conhecimento em parte e na parte conhecida, pela denegação da ordem.

É o relatório.

DES. PEDRO PINHEIRO SOTERO

RELATOR

VOTO

A ação mandamental preenche os pressupostos e condições de admissibilidade, razão pela qual a conheço.

1. DA AUSÊNCIA DE FLAGRANTE

Sabe-se que o flagrante delito ocorre no exato momento em que o agente está cometendo o crime, ou, quando após sua prática, os vestígios encontrados e a presença da pessoa no local do crime dão a certeza de ser o autor do delito, ou ainda, quando o criminoso é perseguido após a execução do crime.

Para ocorrer o flagrante é necessária a certeza visual ou evidência do crime. O flagrante pode ser impróprio, quando há perseguição, ou presumido, quando não há perseguição, mas o criminoso é apontado pelo próprio ofendido ou é encontrado em situação que faça presumir sua culpabilidade.

Frise-se que a expressão logo após, encontrada no inciso III do art. 302 do CPPB, segundo Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto não menciona um tempo determinado, sendo equivocada a impressão popular de que, passadas 24 horas, desaparece a situação de flagrância. De tal maneira que a análise deve ser feita, pelo juiz, à luz do caso concreto, sem que se estipule um lapso cronológico, no mais desconhecido em qualquer legislação alienígena(...)” (Cunha, Rogério Sanches e Pinto, Ronaldo Batista; Código de Processo Penal e Lei de Execução Penal comentados – artigo por artigo – 7ª Ed. Editora Jus Podium, 2023).

No caso em comento, a decisão que homologou a prisão em flagrante não incorre em qualquer ilegalidade eis que amparada no conceito legal e doutrinário de flagrante, senão vejamos trecho do referido decisum:

Consta nos autos, em síntese, que por volta das 22:00 horas do dia 10.05.2023, a família composta por Kátia Sirlene Sombrio Heidemann Wensing, seus filhos Hugo Heidemann Wensing e Raul Heidemann Wensing, e sua nora Camila Martins, estavam no lar quando foram rendidos por três indivíduos, dois deles empunhando arma de fogo. No ensejo da ação, proferiram ameaças de morte a todo momento e obrigaram as vítimas a realizarem transferências bancárias, tendo Katia enviado R$ 516,00 para Osmar Chaves da Cruz (chave pix 319.265.332-91). Os assaltantes vasculharam a residência, quebrando objetos, e de lá subtraíram 05 telefones celulares, 01 tablet, 04 notebooks, 01 aparelho de som, 01 fone, diversas joias, 08 relógios, 01 lanterna, 03 mochilas, 04 bolsas femininas, 01 óculos de sol, 01 óculos de grau, diversos perfumes e roupas, carregadores dos aparelhos, 01 aparelho data show, 01 pistola de pressão e R$ 6.000,00 em espécie. Acionada, a Polícia Militar seguiu o sinal GPS de um dos celulares roubados, empreendendo diligências que resultaram na prisão em flagrante de Tiago Oliveira de Araujo. Com ele foi encontrado 01 invólucro de erva prensada assemelhando-se a droga vulgarmente conhecida como maconha. Outrossim, em poder dele foi apreendida parte dos bens subtraídos, tratando-se de R$ 3.320,00 em espécie, 78 peças de joias, 03 relógios, 01 tablet, 01 mochila de cor cinza, 02 mouses e 04 fontes de energia. Conduzido à presença da autoridade policial, o flagranteado confessou a autoria delitiva, indicando como comparsas “NEGUINHO” e “JAILSON”.

Desta feita observa-se que tão logo a Polícia foi acionada seguiram o sinal de GPS do celular roubado e conseguiram chegar nos indivíduos, afastando, portanto, a tese de ausência de flagrante.

2. AUSÊNCIA DE AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA

Quanto ao tema da Audiência de Custódia, temos que esta, segundo a Ministra Rosa Weber propicia, desde logo, que o Juiz responsável pela ordem prisional avalie a persistência dos fundamentos que motivaram a sempre excepcional restrição ao direito de locomoção, bem assim a ocorrência de eventual tratamento desumano ou degradante, inclusive, em relação aos possíveis excessos na exposição da imagem do custodiado.(...). Sem razão, no entanto, o recorrente no ponto em que sustenta que a não realização da audiência de custódia no prazo de 24h (vinte quatro horas) após a realização da constrição de liberdade enseja, por si só, a ilegalidade da prisão, devendo esta ser relaxada. (...). A não realização da audiência de custódia dentro do prazo de 24h (vinte quatro horas) após a prisão em flagrante não conduz ao imediato relaxamento da prisão, notadamente nos casos em que decretada a prisão preventiva”. (STF - Rcl: 45349 SP 0111749-35.2020.1.00.0000, Relator: ROSA WEBER, Data de Julgamento: 08/04/2021, Primeira Turma, Data de Publicação: 13/04/2021).

Verifica-se, portanto, no voto da relatora acima mencionada, que a despeito da obrigatoriedade da realização da audiência de custódia, sua ausência não implica de imediato o relaxamento da prisão quando ela é amparada em decisão que decreta a prisão preventiva com a presença de seus fundamentos.

O Supremo em outros julgados se posiciona no mesmo sentido:

“CUSTÓDIA AUDIÊNCIA REALIZAÇÃO AUSÊNCIA. A falta de audiência de custódia constitui irregularidade, não tendo o efeito, por si só, de afastar a preventiva imposta, uma vez assentados, pelo Juízo, os requisitos autorizadores do citado artigo 312 e observados os direitos e garantias versados na Constituição Federal.” (HC 178.547/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, DJe 09.3.2020).

Para o Supremo Tribunal Federal portanto, a ausência da audiência de custódia reclama a sua realização, mas não necessariamente o relaxamento da prisão.

Assim deve a autoridade coatora no prazo de 24 horas do recebimento dos autos providenciar a referida audiência.

3. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA

É inequívoco que a prisão preventiva deve ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da Lei Penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria, conforme disposto no art. 312 do CPP.

Ademais, devem ser observados os pressupostos para a decretação e manutenção de qualquer medida cautelar, quais sejam, o fumus commissi delicti e o periculum libertatis. Em outras palavras, primeiro devem ser aferidos elementos concretos que demonstrem se a liberdade do ora custodiado oferecerá ou não, risco à sociedade, prejudicará ou não, a instrução processual...

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