Acórdão nº 0808997-06.2022.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Público, 13-11-2023

Data de Julgamento13 Novembro 2023
Órgão2ª Turma de Direito Público
Ano2023
Número do processo0808997-06.2022.8.14.0000
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
AssuntoAbuso de Poder

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) - 0808997-06.2022.8.14.0000

AGRAVANTE: MUNICÍPIO DE BELÉM

AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ

RELATOR(A): Desembargador LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO

EMENTA

EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO. MERO INCONFORMISMO DA PARTE. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1 – Os embargos de declaração são cabíveis quando o provimento jurisdicional incorre em omissão, contradição ou obscuridade, bem como quando há erro material a ser sanado, o que não se verifica na hipótese dos autos.

2 – O presente embargo apresenta mero inconformismo do embargante com o resultado da decisão recorrida, entretanto, tal inconformismo não autoriza a rediscussão da matéria na estreita via dos embargos de declaração.

3– Recurso conhecido e improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Desembargadores, integrantes da 2.ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade, CONHECER e NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do Relator.

Julgamento presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Mairton Marques Carneiro.

Belém (PA), data registrada no sistema.

DES. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO

Relator

RELATÓRIO

Trata-se de EMBARGOS DE DECLARAÇÃO interposto pelo MUNICÍPIO DE BELÉM em face do Acórdão (ID. nº 12770592), por meio do qual conheci do agravo interno e neguei provimento, nos autos da Ação Civil Pública (Processo nº 0835157-38.2022.8.14.0301), proposta por MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ.

Inconformado, o embargante alega omissão no julgado, eis que a 1ª tese, de que não é possível a intervenção em políticas públicas pelo Judiciário sem omissão do ente no setor, a decisão apenas apresenta uma série de precedentes em que se diz ser possível ingressar no mérito administrativo se direitos fundamentais estiverem sendo violados, aduz que tal argumento não responde à objeção, que é verdade ingressar no mérito administrativo em face de violações a direitos fundamentais. Mas assevera que aqui o argumento é que a política pública é suficiente para atender o direito fundamental, com diversos aparatos já utilizados no cuidado com estudantes com TEA. Eis a tese que precisa ser discutida e não o foi. Pugna que é preciso que o juízo discuta se na espécie o programa é insuficiente para as necessidades do aluno em questão.

Sustenta ainda omissão quanto a 2ª tese do agravo, pois trata da necessária comprovação de necessidade de atendimento individualizado, que precisa compreender manifestação não apenas médica, mas também de profissionais de educação, pedagogia, psicologia, considerando que são esses profissionais que devem avaliar a pertinência do apoio educacional. Pouco significa afirmar que a criança sofre de TEA, sendo necessário identificar o grau e o impacto no aprendizado, o que um médico, por si mesmo, não está habilitado a fazer.

Pontua que à mingua de análises dessa natureza, verifica-se a completa ausência de elementos essenciais para a identificação da identificação de necessidade de acompanhante individual ou educador individual. Para essa determinação a lei exige avaliação biopsicossocial, a partir do art. 2º da Lei 13.146/2015, que resta violado pela decisão.

Ante esses argumentos, requer o provimento aos embargos de modo a reconhecer a omissão da fundamentação e as matérias ora suscitadas, modificando os termos da decisão embargada e reconhecendo as ilegalidades do acórdão em questão e julgando procedente o agravo interno, diante das efetivas e incontornáveis irregularidades que devem conduzir, ao menos, a suspensão dos efeitos da decisão agravada, por ora.

Não foram apresentadas contrarrazões (ID. nº 1350028).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente recurso e passo a proferir o voto.

Como é cediço, os embargos aclaratórios servem para sanar omissão, contradição, obscuridade ou erro material na decisão recorrida, consoante prescreve o art. 1.022, do CPC/2015, verbis:

“Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para:

I - Esclarecer obscuridade ou eliminar contradição;

II - Suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento;

III - corrigir erro material.

Parágrafo único. Considera-se omissa a decisão que:

I - Deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento;

II - Incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1o.”

Presente essa moldura, passo ao exame meritório dos presentes Embargos, adiantando, desde já, que não verifico a ocorrência de qualquer vício na decisão impugnada, mas mero inconformismo do recorrente com pronunciamento judicial que lhe foi desfavorável, pois o acórdão apresentou fundamentos consistentes e coerentes entre si, verificando-se que, sob o pretexto de sanar omissão, o embargante pretende na realidade rever a decisão prolatada, o que é defeso na estreita via dos embargos de declaração.

No caso em tela, o direito à educação com disponibilização de atendimento por profissional especializado em favor da discente substituída em razão de ser portadora do transtorno do espectro autista encontra guarida em diversos diplomas legislativos.

Nesse contexto, ao Poder Judiciário é lícito impor obrigação à Administração Pública para adotar medidas assecuratórias de direitos reconhecidos constitucionalmente como essenciais, sem que isso configure violação ao princípio da separação de poderes, como tenta fazer crer o embargante.

Inicialmente, válido mencionar que os artigos 205 e 227 da CF/88 determinam que:

Art. 205 - A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho

Art. 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão."

Sendo obrigação do Estado admitir alunos portadores de deficiência em suas Escolas, este deve providenciar os meios adequados a sua permanência, como estrutura física e pessoal especializada, para fazer com que o direito à educação seja, de fato, efetivado.

Tratando-se das crianças com Autismo, a Lei nº 12.764/2012 institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, ficando determinado, conforme art. 1º, §2º, da referida norma, que dentre outros aspectos, "A pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais."

Nesse sentido, ainda com fulcro no mesmo diploma legal, tem-se, pelo parágrafo único do artigo 3º, que "Em casos de comprovada necessidade, a pessoa com transtorno do espectro autista incluída nas classes comuns de ensino regular, nos termos do inciso IV do art. 2º, terá direito a acompanhante especializado."

Assim, considerando o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, todas as Entidades de Ensino, sob a ótica da Legislação Federal, estão obrigadas a fornecer profissional especializado para acompanhamento dos alunos portadores de Autismo. Senão vejamos:

EMENTA: AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.307.753 - MS

(2018/0140041-0) RELATOR: MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES AGRAVANTE: INSTITUICAO ADVENT CENTRAL BRAS DE EDUC E ASS SOCIAL ADVOGADOS: FÁBIO GUTIERRES KANASHIRO - MS016040 GLAUBER DE SOUSA OLIVEIRA - DF048663 ARTHUR KAPTEINAT LIMA - MS021224B AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO N. 3/STJ. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENSINO. NÃO INTERPOSIÇÃO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SÚMULA 126/STJ. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. RAZÕES DISSOCIADAS. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 284 E 283/STF. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. NÃO ATENDIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. AGRAVO CONHECIDO PARA NÃO CONHECER DO RECURSO ESPECIAL. DECISÃO Trata-se de agravo de decisão que não admitiu recurso especial da INSTITUIÇÃO ADVENTISTA CENTRAL BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO E ASSISTÊNCIA SOCIAL fundado nas alíneas a e c do permissivo constitucional e interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul, assim ementado: E M E N T A RECURSO DE APELAÇÃO AÇÃO CIVIL PÚBLICA DISPONIBILIZAÇÃO DE ACOMPANHAMENTO ESPECIAL PARA CRIANÇA COM AUTISMO MATRICULADA EM INSTITUIÇÃO PARTICULAR DE ENSINO OBRIGATORIEDADE CONSTITUCIONALIDADE DE DISPOSITIVOS DO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA ADI 5357 ATENDIMENTO ADEQUADO E INCLUSIVO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA ARTIGO 3º, PARÁGRAFO ÚNICO DA LEI Nº 12.764/2012 SENTENÇA MANTIDA RECURSO IMPROVIDO. O Supremo Tribunal Federal ao julgar Ação Direta de Constitucionalidade proposta pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino - CONFENEN (ADI 5357 MC-Ref/DF) decidiu pela constitucionalidade das normas do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015) e, consequentemente, pela a obrigatoriedade de as escolas privadas oferecerem atendimento educacional adequado e inclusivo às pessoas com deficiência, não sendo esta uma obrigação apenas do ensino público. Pelo parágrafo único do artigo 3º, "em casos de comprovada necessidade, a pessoa com transtorno do espectro autista incluída nas classes comuns de ensino regular, nos termos do inciso IV do art. 2º, terá direito a acompanhante especializado." (...) Portanto, considerando a constitucionalidade do § 1º do artigo 28 e do artigo 30, caput, da Lei nº 13.146/2015 (Lei Brasileira de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT