Acórdão nº 0809414-22.2023.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Seção de Direito Penal, 12-09-2023

Data de Julgamento12 Setembro 2023
ÓrgãoSeção de Direito Penal
Número do processo0809414-22.2023.8.14.0000
Classe processualHABEAS CORPUS CRIMINAL
AssuntoEstupro de vulnerável

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) - 0809414-22.2023.8.14.0000

PACIENTE: WANDERSON JACKSON ASSUNCAO DOS SANTOS

AUTORIDADE COATORA: JUÍZO DA 2º VARA CRIMINAL DE ALTAMIRA

RELATOR(A): Desembargador LEONAM GONDIM DA CRUZ JÚNIOR

EMENTA

EMENTA: HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO COM PEDIDO DE LIMINAR. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. ART. 217-A, DO CÓDIGO PENAL. ALEGAÇÃO DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO NA DECISÃO QUE MANTEVE A MEDIDA CAUTELAR. DECRETO FUNDAMENTADO NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. PRISÃO DOMICILIAR. FILHO MENOR DE 12 ANOS DE IDADE. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA IMPRESCINDIBILIDADE DA PRESENÇA PARA O AMPARO DO TUTELADO. ORDEM DENEGADA.

1. O alegado constrangimento não se apresenta com a nitidez imprimida na inicial, sobretudo porque a decisão impugnada fez menção ao fato de que a gravidade concreta do delito, é fundamentação idônea a justificar o decreto da custódia preventiva para a conveniência da instrução criminal e como garantia da aplicação da lei penal;

2. A segregação domiciliar com fulcro no art. 318, inc. III ou VI, do CPP, exige a comprovação da imprescindibilidade da presença do paciente ao infante ou de que seja o único responsável pelas crianças, não sendo suficiente para a conversão a mera circunstância de ser ele pai, sobretudo porque ausente, in casu, prova idônea da dependência e do desamparo dos tutelados.

3. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, "embora todo pai seja indispensável à criação de seus filhos, o benefício previsto no art. 318, inciso VI, do CPP não possui aplicação automática, sendo necessário que o homem comprove ser o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos" (RHC n. 126.702/GO, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 18/08/2020, DJe 02/09/2020;

4. Ordem conhecida e denegada. Decisão unânime.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Seção de Direito Penal do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade de votos, em conhecer da ordem impetrada e denegá-la, nos termos do voto do e. Des. Relator.

Sessão Virtual do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, aos doze dias do mês de setembro do ano de dois mil e vinte e três.

Julgamento presidido pela Exma. Sra. Desa. Eva do Amaral Coelho.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. DES. LEONAM GONDIM DA CRUZ JUNIOR (Relator): Trata-se de habeas corpus liberatório com pedido de liminar, impetrado pelo i. advogado Dr. ROCIVALDO MAIA DA SILVA, em favor do nacional WANDERSON JACKSON ASSUNÇÃO DOS SANTOS, em face do ato ilegal atribuído ao Douto Juízo de Direito da 2ª Vara Criminal da Comarca de Altamira/PA, indicado tecnicamente como autoridade coatora.

Alega, o impetrante, na Id. 14563871, em síntese, que:

“Trata-se de auto de prisão em flagrante, nos termos do art. 302, inc. I do Código Penal, no qual o Delegado de Polícia comunica a prisão em flagrante de WANDERSON JACKSON ASSUNÇÃO DOS SANTOS, qualificado nos autos, pela suposta prática do crime tipificado no art. 217-A do Código Penal.

Narram os autos, em síntese, que no dia 03.04.2023, por volta das 09h25min, a guarnição da Polícia Militar foi acionada para averiguar uma denúncia de estupro de vulnerável. Consta do relato que, em contato com a mãe da vítima e com a própria vítima, M.G.S., de 12 anos de idade, este relatou ter sido abusado sexualmente pelo autuado, naquela manhã. Ato contínuo, a equipe policial se deslocara até o endereço indicado realizou a prisão em flagrante, conduzindo o flagranteado até a Delegacia de Polícia para os procedimentos aplicáveis.

Audiência de custódia realizada em 04 de abril de 2023 sendo homologada prisão em flagrante e convertida em prisão preventiva, conforme Decisão ID 90306475 (DOC. 01).

O acusado foi denunciado em 30 de abril de 2023, conforme peça acusatória ID 91870663.

Em 10 de maio de 2023 a Defesa pugnou pela Revogação da Prisão Preventiva e a aplicação de medidas cautelares, nos termos da Petição ID 92561544 (DOC. 2).

A denúncia foi recebida pelo nobre Juízo em 17 de maio de 2023, bem como determinado citar o réu para apresentar resposta a acusação, conforme decisão ID 93020138.

Devidamente citado o réu apresentou resposta a acusação, reservando-se ao direito de aprofundar o debate em torno das questões que envolvem o mérito da peça acusatória na oportunidade da audiência de instrução e julgamento em âmbito de Memoriais/alegações finais, conforme ID 93829857.

Em 12 de junho de 2023 foi prolatada decisão interlocutória indeferindo o pedido de revogação de prisão preventiva em argumentos genéricos e que são inerentes ao tipo penal, bem como designada a audiência de instrução e julgamento para o dia 10 de agosto de 2023, conforme decisão de ID 94417465 (DOC.3)

É a síntese necessária dos fatos.”

Por fim, requer, ipsis litteris:

“Pelo exposto, requeremos que sejam considerados os argumentos acima expostos para:

a. A imediata concessão de medida liminar determinando a sua substituição da prisão preventiva por medidas cautelares diversas da prisão ou prisão domiciliar;

b. Subsidiariamente, caso não seja concedida a medida liminar, fato que não se espera, após o trâmite legal, prestadas as informações pela autoridade coatora e proferido o Parecer pelo Ministério Público, no julgamento de mérito requeremos que seja relaxada/revogada a prisão preventiva, substituída por medidas cautelares diversas da prisão, a luz do artigo 319 ou prisão domiciliar nos termos do artigo 318, III, todos CPP.

Por fim, requeremos a intimação do patrono abaixo assinado, antes do julgamento do mérito do writ, uma vez que possui interesse em fazer sustentação oral.”

Junta documentos, Id. 14316889 a 14316902.

O pedido de liminar foi indeferido, Id. 14571324, sendo prestadas as informações, Id. 14829268, tendo o Ministério Público se manifestado pela denegação da ordem, Id. 14912019.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. DES. LEONAM GONDIM DA CRUZ JUNIOR (Relator): Analisando-se os autos, em que pesem os argumentos expendidos pelo impetrante, verifica-se que não merecem prosperar.

Pois bem.

No tocante ao argumento da falta fundamentação na decisão que manteve a prisão preventiva, Id. 14563875, constata-se que ela se encontra apoiada em elementos concretos, sendo esclarecedor transcrevê-la, naquilo que interessa, o seguinte, verbis:

“(...).

II – FUNDAMENTAÇÃO

a) Do pedido de revogação da prisão preventiva

Entendo que o pedido de revogação da prisão preventiva deve ser indeferido.

Inicialmente, no que tange à ausência de laudo de perícia de sexologia forense, entendo que é irrelevante para fins de análise da necessidade de manutenção da prisão preventiva do agente.

De fato, segundo o art. 158 do CPP, quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.

No mesmo sentido, o art. 564, III, “b”, do CPP reconhece a nulidade no caso de falta do exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios.

No entanto, a regra legal é exigida apenas para fins de prolação de sentença, de modo que, para fins de recebimento da denúncia, basta que a materialidade esteja comprovada por outros documentos e/ou depoimentos testemunhais.

No caso em tela, verifico que constam dos autos depoimentos da vítima e de sua genitora que indicam a existência de indícios mínimos de autoria em desfavor do acusado, o qual teria praticado sexo anal com a vítima.

No que tange à suposta condição de único provedor dos filhos, cabe mencionar que referida condição – quando devidamente comprovada – não enseja a revogação da prisão preventiva, mas, sim, o seu cumprimento em regime domiciliar, nos termos do art. 318, VI, do CPP.

Dito isso, verifico que não há provas suficientes que indiquem que o acusado é o único responsável pelos cuidados de filho de até 12 anos de idade incompletos.

A defesa juntou apenas uma declaração supostamente de lavra de sua enteada.

Diga-se “supostamente”, pois não possui firma reconhecida em cartório. Além disso, não há qualquer previsão legal que autorize a concessão de prisão domiciliar em razão de suposta dependência de enteado.

Por fim, no que tange à declaração de boa conduta social e outras condições pessoais favoráveis, é sabido que, por si só, não são suficientes para ensejar a revogação da prisão preventiva, quando presentes os fundamentos para a decretação da cautelar máxima.

No caso em tela, conforme já delineado por ocasião da decretação da prisão preventiva, a cautelar se faz necessária para fins de garantia da ordem pública, haja vista a gravidade em concreto do delito, em que o acusado teria se aproveitado da vítima, enquanto esta dormia, de modo que os fatos só não foram mais graves em razão da vítima ter acordado, corrido e procurado ajuda.

Assim, verifico que a manutenção da prisão preventiva é medida que se impõe.

(...)

III – CONCLUSÃO

Isto posto, com esteio na fundamentação acima descrita:

1) Indefiro o pedido de revogação da prisão preventiva de Id. 90271004;

2) Designo audiência de instrução e julgamento para o dia 10/08/2023, às 11h30, a ser realizada em caráter presencial;”

Na hipótese, concluo que os fundamentos que sustentam o decreto prisional são firmes e suficientes, baseados na lei, e o magistrado condutor do feito, a quem deve-se creditar a faculdade de valorar as circunstâncias e de apreciar a necessidade da medida extrema diante dos fatos objetivos, decidiu com propriedade e acerto.

Nesse diapasão, o posicionamento do c. Superior Tribunal de Justiça é o seguinte, verbis:

AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. POSSÍVEL CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. SÉRIOS INDÍCIOS DE CONTUMÁCIA DELITIVA, CONTRA A MESMA VÍTIMA, EM ANO ANTERIOR, E CONTRA OUTRA FILHA, TAMBÉM MENOR. DISPENSA DE CONTRADITÓRIO PRÉVIO A MEDIDAS URGENTES. EXCESSO DE PRAZO QUE NÃO SE VERIFICA. RECURSO DA DEFESA NÃO PROVIDO.

1. Como registrado na decisão impugnada, a...

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