Acórdão nº 0811771-84.2022.822.0000 de TJRO. Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, Segundo Grau, 22-02-2023

Data de Julgamento22 Fevereiro 2023
Classe processualHABEAS CORPUS CRIMINAL
Número do processo0811771-84.2022.822.0000
Órgão1ª Câmara Criminal
1ª Câmara Criminal / Gabinete Des. Jorge Leal



Processo: 0811771-84.2022.8.22.0000 - HABEAS CORPUS CRIMINAL (307)

Relator: Des. VALDECI CASTELLAR CITON



Data distribuição: 01/12/2022 07:41:15

Data julgamento: 09/02/2023

Polo Ativo: IRLEY COSTA DA SILVA
Advogados do(a) PACIENTE: JOSE ROBERTO WANDEMBRUCK FILHO - RO5063-A, VIVALDO GARCIA JUNIOR - RO4342-A
Polo Passivo: JUIZ DE DIREITO DA 4ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE PORTO VELHO
RELATÓRIO

Inicialmente destaco que contra a decisão do juízo de origem, nos autos de nº 7043547-13.2022.8.22.0001, que trata do Inquérito Policial nº 2021.0045900 - SR/PF/RO, denominado operação amicus regem, foram impetrados cinco habeas corpus, assim, a fim de evitar repetição utilizo os fundamentos do Habeas Corpus de nº 0811436-65.2022.8.22.0000, que já apreciou a questão e utilizo-a como razão de decidir.

Trata-se de Habeas Corpus com pedido de liminar impetrado pelo advogado Vivaldo Garcia Júnior (OAB/RO nº 4.342) em favor de IRLEY COSTA DA SILVA apontando como autoridade coatora o Juízo da 4ª Vara Criminal da Comarca de Porto Velho/RO.

Aduz o impetrante, em síntese, que a autoridade policial, em atuação conjunta com o GAECO (MP/RO), representou pela expedição de mandados de prisão, busca e apreensão, sequestro e bloqueio patrimonial, bem como medidas cautelares diversas, em face do paciente e outros investigados.

Narra que a prisão preventiva do paciente foi efetivamente decretada e, segundo ela, o Inquérito Policial foi inicialmente instaurado para apurar a prática do crime de constituição de milícia privada, previsto no art. 288-A do CP, em razão da suposta utilização, por parte dos irmãos Antônio Martins dos Santos (vulgo “Galo Velho”), Sebastião Martins dos Santos e Ideildo Martins dos Santos, de servidores públicos dos quadros da polícia do Estado de Rondônia, dentre outros agentes públicos e terceiros, na segurança armada da Fazenda denominada NorBrasil/Arco-Íris, a 30km do distrito de Mutum-Paraná, em Porto Velho/RO.

Assevera que a investigação abrange fatos que estariam ocorrendo desde o ano de 2017, portanto 05 anos atrás, e que o paciente Irley, policial civil, nunca foi flagranteado cometendo qualquer atividade criminosa.

Afirma que também foi determinado nos autos de origem o afastamento cautelar do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, do paciente Irley, com fundamento no art. 319, VI do CPP, visando impedir a continuidade delitiva, ao menos até o término das investigações e/ou eventual oferecimento de denúncia pelo MP, sendo desnecessária a segregação de sua liberdade, já que sua arma funcional foi devolvida à instituição.

Alega que o paciente é radicado no distrito da culpa, bem como é trabalhador e agente de polícia estável, pessoa pacífica, com fé pública, possui residência fixa e é primário, não ostentando qualquer condenação criminal e se comprometendo a comparecer em todos os atos processuais solicitados.
Ressalta ainda que ele nasceu em Porto Velho, reside há muitos anos no mesmo endereço, é pai de 03 filhos, sendo duas crianças de 06 e 07 anos, e possui saúde frágil, embora não se atentasse a procurar médico para tratamento de problemas gástricos (vômitos e azias frequentes).

Destaca que é de conhecimento público e notório que a área onde a suposta atuação ilícita se deu sofre constantemente com invasões e possui intensos conflitos e até assassinatos praticados por grupos de invasores do local, inclusive do gerente da fazenda ocorrida frequentemente.
Argumenta que, diante da deflagração da operação e o cumprimento de suas medidas cautelares, é evidente que cessaram os requisitos da prisão cautelar previstos no art. 312 do CPP; e que esta foi decretada sem indícios de autoria e materialidade delitiva por parte do paciente, vez que não há provas que o incriminem, mas apenas meras ilações e investigações inconclusivas e que oportunamente serão esclarecidas.

Relata, por fim, que o paciente é um pai presente, que levava e trazia as suas filhas da escola, que ajudava em casa com as tarefas cotidianas, é arrimo da família e nunca se dedicou a qualquer atividade criminosa, muito menos nessa altura da vida, prestes a completar 47 anos, com duas filhas menores de idade que sentem muito a sua falta, tendo levado a vida sempre pautada por trabalho árduo.

Ao final, portanto, pugna pela concessão da liminar para que seja determinada a expedição de Alvará de Soltura em favor do paciente. No mérito, requer a confirmação da ordem, a concessão de prisão domiciliar ou outras medidas cautelares.

Foram solicitadas informações à autoridade tida como coatora, e estas foram prestadas e juntadas no ID 18167637.

Os autos voltaram conclusos, e deferi o pedido de liminar no dia 02/12/2022, determinando a expedição de contramandado de prisão em favor do paciente (ID 18170123).

Nesta instância, o Procurador de Justiça Ildemar Kussler manifestou-se pelo conhecimento e, no mérito, pela denegação da ordem (ID 18199454).

É o relatório.



VOTO

DESEMBARGADOR JORGE LEAL
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do writ.
O habeas corpus, remédio jurídico-constitucional, visa reprimir ameaça ou coação por ilegalidade ou abuso de poder que atinja a liberdade do indivíduo.
É sabido que a revogação da cautelar segregatória só ocorrerá quando a medida não preencher os requisitos legais, seja porque inexiste prova de materialidade do crime ou indícios suficientes de sua autoria ou, ainda, por não existirem razões concretas a autorizá-la.
Antes de adentrar a análise dessas questões, é preciso fazer uma breve retrospectiva dos fatos que antecederam este writ, de forma a pontuar, tanto quanto possível no âmbito restrito do habeas corpus, os fundamentos de fato e de direito que nortearam a decisão impugnada e, assim, avaliar se persistem os pressupostos ensejadores da prisão preventiva.
A Polícia Federal, em atuação conjunta com o MP/RO, representou, no âmbito da Operação “Lamassu” derivada da operação “Amicus regem”, pela expedição de mandados de prisão, busca e apreensão, sequestro e bloqueio patrimonial, bem como medidas cautelares diversas, contra diversos investigados, e, em relação ao paciente Irley Costa da Silva, foi requerida a prisão preventiva, busca e apreensão e afastamento cautelar da função pública.
Segundo consta, a investigação foi instaurada para apurar a suposta prática do crime de lavagem/ocultação de valores previsto no art. 1º da Lei n. 9.613/98, além do crime de constituição de milícia privada, tipificado no art. 288-A do Código Penal, em razão da utilização, por parte dos irmãos Antonio Martins dos Santos (vulgo “Galo Velho”), Sebastião Martins dos Santos e Ideildo Martins dos Santos, de servidores públicos dos quadros da Polícia do Estado de Rondônia, dentre outros agentes públicos e terceiros, na segurança armada da fazenda denominada Norbrasil/Arco-Íris, a 30km do distrito de Mutum-Paraná, em Porto Velho/RO.
De acordo com a decisão que decretou a prisão preventiva em 14/10/2022, Irley Costa da Silva estava envolvido no esquema criminoso em que se valia do aparato policial, com a utilização de viaturas e armas de fogo pertencentes à corporação a que é ligado, e, no exercício de suas funções públicas, atuava sob o controle e acompanhamento dos representados Antônio Martins Santos, Sebastião Martins dos Santos e Ideildo Martins dos Santos, responsáveis pela fazenda, a fim de realizar rondas na região sob o falso pretexto de proteção da propriedade. Além do mais, há indícios de que os representados utilizavam violência e armamento de grosso calibre, seja pertencente à instituição que representam, seja adquirido no “mercado negro”, para a prática delitiva investigada.
O magistrado asseverou, portanto, que os indícios de participação do ora paciente e dos demais representados estão consolidados nas provas produzidas e juntadas nos autos, e que há prova da existência de crimes e indícios suficientes de autoria. Argumentou, ainda, que o perigo gerado pelo estado de liberdade dos representados está demonstrado, ante a necessidade de desestruturação do grupo, por se considerar a atuação específica de cada um dos investigados no contexto do suposto crime de contratação de milícia privada. Há, ainda, indícios de que a ação ocorra desde 2017, o que indica a necessidade da segregação para impedir que, soltos, eles voltem a delinquir. Sobre a contemporaneidade, o juiz ressaltou que o simples fato de a organização criminosa se encontrar estruturada e em plena atividade há anos, sem cessação das atividades ilícitas, já se mostra por demais suficiente para lastrear os pedidos formulados.
Veja-se o teor da decisão:

1. DA PRISÃO PREVENTIVA
Os representantes requereram a decretação da prisão preventiva em desfavor dos investigados ANTÔNIO MARTINS DOS SANTOS (CPF 078.040.169-72), SEBASTIÃO MARTINS DOS SANTOS (CPF 219.972.922-20), IDEILDO MARTINS DOS SANTOS (CPF 408.942.662-68), IRLEY COSTA DA SILVA (CPF 678.843.932-04) e JAIRO CÉSAR DA SILVA BARRETO (CPF 220.662.762-00), com fundamento no art. 312 e seguintes do Código de Processo Penal, justificando a imprescindibilidade da medida para a garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal, tendo em vista o conjunto probatório, consistentes de indícios de autoria e materialidade.
A prisão preventiva é uma medida de caráter excepcional, onde a própria Constituição da República prevê, em seu art. 5º, inciso LXI, a possibilidade de prisão por ordem fundamentada de autoridade judiciária, desde que presentes os requisitos e pressupostos constantes da legislação infraconstitucional, preceito que convive na mais perfeita harmonia com o princípio do estado de inocência.
No plano infraconstitucional, as hipóteses que autorizam a prisão preventiva estão delineadas nos arts. 311 e 312 do Código de Processo Penal, quais sejam: prova da materialidade, indícios suficientes de autoria de crime doloso punido
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT