Acórdão nº 0811800-93.2021.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Seção de Direito Público, 2023

Número do processo0811800-93.2021.8.14.0000
Ano2023
Classe processualMANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
AssuntoIrredutibilidade de Vencimentos
ÓrgãoSeção de Direito Público

MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) - 0811800-93.2021.8.14.0000

IMPETRANTE: FERNANDA ARAUJO PINTO

IMPETRADO: SECRETÁRIA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DO PARÁ

RELATOR(A): Desembargador LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO

EMENTA

MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. PRELIMINAR. TUTELA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. REJEITADA. SERVIDORA PÚBLICA. LICENÇA MATERNIDADE. SUPRESSÃO DA GRATIFICAÇÃO “SOME”. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. CONFIGURADO. CONCESSÃO DA SEGURANÇA EM PARTE.

1. O direito líquido e certo é aquele comprovado de plano, ou seja, demonstrado mediante prova pré-constituída que o ato combatido é ilegal e abusivo, dada a impossibilidade de dilação probatória.

2. A supressão da gratificação do Sistema de Organização Modular de Ensino (SOME) dos vencimentos da impetrante, durante o período de licença maternidade, implica significativa redução na sua remuneração, contrariando o disposto nos art. 7º, inciso XVIII e 39, § 3º, ambos da CF, que garantem a integralidade do salário à servidora pública afastada nestas condições.

3. Concedo em parte a segurança, determinando que a Secretária de Estado de Educação inclua nos vencimentos da impetrante a gratificação “SOME” nos mesmos moldes outrora concedidos, com efeitos patrimoniais incidentes a partir da data da impetração do writ. Tudo nos termos da fundamentação.

ACÓRDÃO

Acordam, os Excelentíssimos Desembargadores integrantes da Seção de Direito Público do TJE/PA, à unanimidade, em CONCEDER PARCIALMENTE SEGURANÇA, nos termos do voto relator.

Sessão Ordinária da Seção de Direito Público, realizada em 04 de abril de 2023. Sessão presidida pela Exma. Desa. Célia Regina de Lima Pinheiro.

Belém (PA), data registrada no sistema.

Des. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO

Relator

RELATÓRIO

Trata-se de Mandado de Segurança, com pedido de liminar, impetrado por FERNANDA ARAÚJO PINTO, contra suposto ato praticado pela SECRETÁRIA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DO PARÁ.

Narra a impetrante que é professora temporária do Estado do Pará, com matrícula de nº 57219318/3, lotada no ANEXO GOROTIRE DA E.E. JOÃO PINTO PEREIRA, especificadamente no Sistema de Organização Modular de Ensino – SOME, no qual, os professores do referido sistema, que trabalham em comunidades rurais distantes dos centros urbanos, fazem jus a uma gratificação especial, denominada “Gratificação Some”, correspondente ao percentual de 180% sobre o vencimento-base.

Informa que requereu a concessão de licença-maternidade, tendo sido deferida através da Portaria 7.054/2021 de 10/08/2021, pelo período de 28/06/21 a 24/12/21, que nada dispôs em relação à Gratificação SOME.

Enfatiza que se tem como ato impugnado a Portaria 7.054/2021 de 10/08/2021, que concedeu a licença-maternidade e deixou de dispor explicitamente sobre a Gratificação Some, ato este ilegal, que se materializa com o desconto dessa vantagem pecuniária em contracheque do mês de setembro de 2021, bem como com descontos parciais dos valores de R$ 689,42, R$ 69,01, R$ 0,07, R$ 689,42, R$ 0,07 e R$ 0,07, em razão do recebimento da GRATIFICAÇÂO SOME em agosto que, supostamente, foram indevidos, conforme se observa com contracheques anexos.

Ressalta que as servidoras públicas em gozo de licenças gestantes se encontram em efetivo exercício para todos os fins, não poderão sofrer com a redução de suas remunerações, desde a confirmação da gravidez até seis meses após o parto, especialmente pela referida verba ser paga com habitualidade, quando em atividade, por expressa disposição constitucional e lei estadual.

Ante os argumentos expostos, requer o deferimento de liminar, determinando que o impetrado suspenda a Portaria 7.054/2021 de 10/08/2021, bem como se abstenha de reduzir os vencimentos da impetrante durante o período da licença maternidade, especialmente a "Gratificação Some", procedendo com o imediato restabelecimento e pagamento da referida bonificação à Impetrante, inclusive, do mês de setembro e outubro de 2021.

No mérito, pleiteia a concessão definitiva da segurança para tornar nulo o ato impugnado, que se considera concretizado na Portaria 7.054/2021 de 10/08/2021, garantindo a impetrante o direito a percepção da gratificação SOME e demais vantagens pagas com habitualidade durante o seu período de estabilidade gestacional, com consequente restituição de qualquer quantia descontada indevidamente.

A impetrante requer, ao final, a concessão de gratuidade da justiça.

Em decisão interlocutória deferi, parcialmente, a medida liminar pleiteada (ID. 6898372).

O Estado do Pará interpôs Agravo Interno aduzindo, preliminarmente, que a pretensão deduzida no mandado de segurança perdeu o objeto, vez que já foi regularizado o pagamento da vantagem postulada no sistema de pagamentos da SEDUC, em favor dos interessados.

Argumenta que a Gratificação do SOME consiste em verba de natureza propter laborem, sendo devida apenas enquanto perdurar o exercício extraordinário, o qual deixou de ser desempenhado pela autora, quando passou ao exercício da licença maternidade; que no caso dos autos, o pedido liminar é satisfativo, pois é o próprio pedido de mérito; que é incabível a concessão de liminar em face da Fazenda Pública, pois objetiva o pedido a concessão de aumento e sucessivamente a extensão de vantagem.

Pleiteia a reconsideração da decisão através do juízo de retratação e, caso assim não entenda, para que o recurso seja conhecido e provido, com o fito de reformar o decisum.

O Estado do Pará apresentou petição, por meio da Procuradoria do Estado (ID. 7116127) pleiteando o ingresso no feito, ratificando as informações prestadas pela autoridade coatora.

A autoridade indicada como coatora prestou as suas informações (ID. 7116128).

Foram apresentadas contrarrazões ao Agravo Interno pela impetrante (ID. 7524490).

Instado a se manifestar, o Ministério Público de 2º grau (ID. 7916183) opinou pelo conhecimento e no mérito pelo provimento do presente recurso.

Em petição (ID. 8720116), a impetrante informa o descumprimento da tutela outrora deferida.

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos processuais e condições da ação, conheço do mandamus.

Inicialmente, cumpre ressaltar que estando os autos prontos para julgamento, procedo a análise conjunta do agravo interno interposto pelo Estado do Pará e do mérito do mandado de segurança.

Cinge-se a controvérsia em analisar se a impetrante, em gozo de licença-maternidade, faz jus ao recebimento, durante seu afastamento, da gratificação denominada “some” prevista na Lei nº.7.643/2012, cujas respectivas normas, ora reproduzo:

“Art. 1º O caput do art. 30 da Lei nº 7.442, de 2 de julho de 2010, passa a vigorar com a seguinte redação:

Art. 30. O professor que exercer suas atividades no Sistema de Organização Modular de Ensino - SOME, fará jus a gratificação no valor correspondente a 180% (cento e oitenta por cento) sobre o vencimento-base, repercutindo sobre a parcela salarial referente a férias e ao décimo terceiro salário.”

Com base no do art.30, acima colacionado, depreende-se que o professor que exerce suas atividades no Sistema de Organização Modular de Ensino – SOME fará jus a gratificação no valor correspondente a 180% (cento e oitenta por cento) sobre o vencimento-base, repercutindo sobre a parcela salarial referente a férias e ao décimo terceiro salário.

Desse modo, é questão incontroversa que os professores integrantes do referido sistema de ensino, que trabalham em comunidades rurais distantes, dos centros urbanos, fazem jus a uma gratificação especial, denominada Gratificação “SOME", correspondente ao percentual de 180% sobre o vencimento-base.

Outrossim, o auxílio-maternidade consiste em garantia constitucional, insculpida no inciso XVIII, do art. , da CF/88 e, a exemplo de todos os direitos assegurados neste dispositivo, o benefício é erigido à qualidade de cláusula pétrea, in verbis:

“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(....)

XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias;

Ainda o §3º do art.39 da Carta Magna dispõe que:

“Art. 39: (...)

§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.”

Da análise nas normas constitucionais acima transcritas, evidencia-se que a licença-maternidade não pode trazer prejuízos à remuneração de uma servidora pública, pois da leitura do texto constitucional, não se extrai qualquer interpretação que comporte redução remuneratória de uma servidora pelo simples gozo de licença-maternidade.

Por sua vez, a Lei Estadual nº 5.810/94, que dispõe sobre o Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Civis da Administração Direta das Autarquias e das Fundações Públicas do Estado do Pará, in verbis:

“Art. 88. Será concedida licença à servidora gestante, por cento e oitenta dias consecutivos, sem prejuízo de remuneração.”

Assim, a interpretação que se deve emprestar à expressão “sem prejuízo do salário” (art. 7º, XVIII, CF/88) e “sem prejuízo de remuneração” (Art. 88. Lei Estadual nº 5.810/94) é a de que não pode a remuneração até então percebida pela servidora/impetrante sofrer redução em razão da licença-maternidade a que tem direito amparo constitucionalmente, sob pena de esvaziamento da própria natureza do direito social em questão.

Ademais, tenho que o direito social relativo à licença-gestante visa justamente conceder à mãe a percepção de renda mensal igual à última remuneração percebida, que no caso dos autos, inclui, a gratificação “SOME”, independente da sua modalidade.

No mesmo sentido, colaciono jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, senão vejamos:

DECISÃO. Vistos. Trata-se de Recurso Ordinário em Mandado de Segurança interposto por SAMARA COSTA GALVÃO, com base no art. 105, II, b, da Constituição da...

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