Acórdão nº 0812578-92.2023.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, Seção de Direito Penal, 26-09-2023

Data de Julgamento26 Setembro 2023
ÓrgãoSeção de Direito Penal
Número do processo0812578-92.2023.8.14.0000
Classe processualHABEAS CORPUS CRIMINAL
AssuntoTrancamento

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) - 0812578-92.2023.8.14.0000

PACIENTE: MOYSES MONTEIRO DA CRUZ FILHO

AUTORIDADE COATORA: 1ª VARA CRIMINAL DE BELÉM/PA

RELATOR(A): Desembargador PEDRO PINHEIRO SOTERO

EMENTA

EMENTA:

HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A FÉ PÚBLICA. ART. 299, DO CP. AÇÃO PENAL. TRANCAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. MEDIDA EXCEPCIONAL, PERMITIDA SOMENTE QUANDO DEMONSTRADAS A ATIPICIDADE DA CONDUTA, A AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA, OU A EXISTÊNCIA DE CAUSA DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. NÃO VERIFICADO. NÃO CABIMENTO.

1. O trancamento da ação penal, na via estreita do habeas corpus, é medida excepcional, cabível somente quando, de plano, restar evidente a atipicidade da conduta, a ausência de indícios de autoria ou materialidade do delito ou a extinção da punibilidade, sendo vedado o exame aprofundado do contexto fático-probatório.

2. Os fatos narrados na denúncia que, em tese, se amoldam às condutas delitivas previstas nos art. 299, do CP, estando a denúncia em consonância com o artigo 41 do CPP, e havendo suporte probatório mínimo (probable cause) a justificar o oferecimento da inicial acusatória, descabido é o trancamento da ação penal.

3. Habeas corpus conhecido e denegada a ordem

ACÓRDÃO

Vistos e etc...

Acordam, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores pelo conhecimento do writ impetrado e, no mérito, pela denegação da ordem nos termos do voto da Relator.

_____ Sessão Ordinária - Plenário Virtual (PJE) - Sessão de Direito Penal, aos dias _____ a ___________ do mês de ______ do ano de dois mil e vinte e três.

Julgamento presidido pela Excelentíssima Senhora Desembargadora Eva do Amaral Coelho.

Belém/PA, ____ de ___________ de 2023.

Des. PEDRO PINHEIRO SOTERO

Relator

RELATÓRIO

HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO N.º 0812578-92.2023.8.14.0000

SEÇÃO DE DIREITO PENAL

PROCESSO DE ORIGEM: 0018499-02.2018.14.0401

IMPETRANTE: MARCO ANTÔNIO PINA DE ARAÚJO, OAB/PA 10.781 e GUSTAVO DAMON ARACATY LOBATO DE SOUZA, OAB/PA 26.536.

PACIENTE: MOYSÉS MONTEIRO DA CRUZ FILHO.

AUTORIDADE COATORA: JUÍZO DA 1.ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE BELÉM

RELATOR: DES. PEDRO PINHEIRO SOTERO

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus para trancamento de ação penal impetrado por MARCO ANTÔNIO PINA DE ARAÚJO, OAB/PA 10.781 e GUSTAVO DAMON ARACATY LOBATO DE SOUZA, OAB/PA 26.536 em favor do paciente MOYSÉS MONTEIRO DA CRUZ FILHO, que figura como réu nos autos da ação penal nº 0018499-02.2018.8.14.0401, em trâmite no juízo da 1ª Vara Criminal de Belém, sob a acusação de ter praticado a conduta descrita no art. 299, caput do Código Penal.

Sustentam, os impetrantes a inépcia da inicial acusatória pois a denúncia dos autos do processo n.º 0018499-02.2018.8.14.0401 requer o processo e julgamento do paciente nas penas do art. 299, caput (falsidade ideológica), do Código Penal.

Sobre os fatos descritos na denúncia, o Parquet acusa o paciente de, no dia 01/04/2017 confessou ter inserido gravame em um veículo vendido à Sra. Luciana Carvalho Monteiro, com a seguinte modificação: inadimplemento contratual. Após a regular quitação da dívida, o gravame foi retirado.

A inicial acusatória foi recebida no dia 23/02/2023.

Em sequência, o paciente apresentou a competente resposta à acusação onde sustenta a inaplicabilidade do direito penal ao caso, porque o fato praticado tem amparo legal e jurisprudencial, não se tratando de informação falsa, e porque o conflito entre o paciente e a Sra. Luciana foi resolvida pela esfera do direito civil.

A decisão coatora seria a decisão interlocutória do magistrado onde ele decide não haver provas para uma absolvição sumária, haja vista que inexistiria manifesta causa excludente de ilicitude ou culpabilidade e que o fato narrado na denúncia, em tese, constitui crime.

Diante do não reconhecimento do caráter fragmentário e subsidiário do direito penal e de não reconhecer a legalidade do fato praticado pelo paciente, estando diante de evidente caso de constrangimento ilegal, sendo caso de trancamento de ação penal, na medida em que nõ há espaço para a instauração da demanda penal.

Requerem a absolvição sumária do paciente.

Em decisão de Num. 15686492 - págs. 265-266, indeferi o pedido liminar, considerando não estarem preenchidos nos autos os requisitos do periculum in mora e do fumus boni iuris de forma a serem aplicadas as hipóteses previstas nos artigos 647 e 648 do CPP.

A autoridade coatora apresentou informações sob o Num. 15766573 – págs. 276, informando sumariamente o processo e sua fase, informando, ainda, que existe data designada para realização de audiência para proposta de suspensão condicional do processo.

Em parecer de Num. 15987577 - pág. 278-282, o Ministério Público opinou pelo conhecimento do habeas corpus e no mérito, pela denegação da ordem.

Eis os fatos.

Inclua-se em pauta de julgamento, via plenário virtual.

Intime-se.

VOTO

VOTO

Presentes os requisitos legais, conheço da ação mandamental.

Trata-se de writ impetrado ao argumento de existência de constrangimento ilegal, a pretexto de inexistência de justa causa para a persecução penal uma vez que acredita que o tema deveria ser regulado unicamente pelas normas do direito civil acarretando a inépcia da inicial acusatória, atipicidade da conduta e ausência de elementos de prova da materialidade que sustentem a imputação feita na denúncia.

Sobre o trancamento de ação penal, é sabido que se trata de medida excepcional, somente viável quando indubitavelmente demonstradas: (i) a atipicidade da conduta, (ii) a ausência de justa causa (indícios de autoria e/ou prova da materialidade), ou (iii) a existência de causa de extinção da punibilidade (morte do agente, anistia, graça ou indulto, retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso, prescrição, decadência ou perempção, renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada, retratação do agente, nos casos em que a lei a admite e perdão judicial, nos casos previstos em lei), o que não se vislumbra no caso sob exame.

Pelo que consta dos autos deste habeas corpus, o paciente foi denunciado pelos crimes contra a fé pública (art. 299, do CP), porquanto, segundo a exordial acusatória:

“I – DOS FATOS

Consta nos autos do inquérito policial anexado que o denunciado MOYSÉS MONTEIRO DA CRUZ FILHO inseriu declaração falsa no Sistema Nacional de Gravames, registrando a restrição nº 2258550, relacionada ao veículo Audi/A3, placa QDK-1862, com o fim de prejudicar direito e alterar verdade sobre fato juridicamente relevante.

Conforme apurou a investigação policial que subsidia esta peça acusatória, LUCIANA CARVALHO MONTEIRO, no ano de 2013, adquiriu um veículo Ford/Fusion da loja CAR CENTER pertencente a CLÁUDIO WERNECK, tendo na ocasião pagado o valor de R$ 65.000,00, à vista. Posteriormente, o automóvel foi apreendido em uma blitz do DETRAN por atraso no licenciamento. Assim, LUCIANA entrou em contato com CLÁUDIO WERNECK e ele, com o fito de resolver o débito, levou a compradora até a loja Mundurucus Veículos, de propriedade do denunciado MOYSÉS MONTEIRO DA CRUZ FILHO, de quem CLÁUDIO era credor do valor de R$ 65.000,00.

Assim, conforme consta, para saldar a dívida com CLÁUDIO, MOYSÉS aceitou disponibilizar um veículo neste valor para LUCIANA, tendo ela escolhido o veículo Audi/A3, placa QDK-1862, em nome de PATRICK BRUCE CARNEIRO AGUIAR, no valor de R$100.000,00.

Diante disso, foi acordado o seguinte, LUCIANA pagaria entrada em dinheiro no valor de R$27.000,00 e um cheque no valor de R$ 8.000,00, sendo o restante do valor de R$65.000,00 abatido da dívida que MOYSÉS possuía com CLÁUDIO. Na oportunidade, ficou

acertado que, após a quitação do valor que era devido por LUCIANA (R$ 27.000,00 + R$8.000,00), seria entregue a ela o documento único de transferência (DUT), o que ocorreu em 20.06.2016.

Contudo, LUCIANA, ao tentar realizar a transferência do veículo para o seu nome, constatou que havia financiamento pendente em nome do antigo proprietário PATRICK BRUCE, datado de 24.03.2015. À vista disso, a ofendida procurou MOYSÉS MONTEIRO e informou o ocorrido, tendo ele se comprometido a quitar o financiamento e dar baixa no gravame, o que ocorreu em 30.03.2017.

Dessa forma, novamente, LUCIANA tentou realizar a transferência do automóvel para o seu nome, oportunidade em que foi informada que havia sido registrado um novo gravame no veículo em nome de PATRICK BRUCE e datado do dia 01.04.2017, portanto, um dia após ter sido dado baixa no gravame anterior.

Isto posto, LUCIANA entrou em contato com PATRICK, o qual informou-lhe que não havia realizado novo financiamento relacionado àquele automóvel. Assim, LUCIANA novamente procurou por MOYSÉS, o qual admitiu o registro do novo gravame e o justificou no fato de que CLÁUDIO WERNECK ainda teria débito com ele, razão pela qual condicionou a liberação do gravame ao pagamento da dívida.

Perante a autoridade policial, MOYSÉS MONTEIRO DA CRUZ FILHO confessou ter, no dia 01/04/2017, inserido o gravame em relação ao veículo vendido à LUCIANA, admitindo que não havia sido realizado novo financiamento conforme as informações por ele registradas no sistema nacional de gravame (Id. 57410548-p.25 e Id.

57410549-p.1).

No ano de 2020 o denunciado deu baixa no gravame (Id. 81733942), portanto, o prejuízo causado a LUCIANA CARVALHO MONTEIRO não mais persiste.”

É cediço que o exame aprofundado de provas é inadmissível, em sede de habeas corpus, pois seu manejo exige a demonstração de plano do constrangimento ilegal.

No caso, os impetrantes acostaram apenas a denúncia oferecida pelo Ministério Público (Num. 15503460 - Pág. 11-13), resposta à acusação (Num. 15503461 - Pág. 15-19), decisão interlocutória ratificando o recebimento da denúncia (Num. 15503462 – Pág. 21) e despacho designando audiência para proposta de suspensão condicional do...

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