Acórdão nº 0812762-19.2021.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Público, 04-09-2023

Data de Julgamento04 Setembro 2023
Órgão2ª Turma de Direito Público
Número do processo0812762-19.2021.8.14.0000
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
AssuntoAntecipação de Tutela / Tutela Específica

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) - 0812762-19.2021.8.14.0000

AGRAVANTE: ESTADO DO PARÁ

AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ

RELATOR(A): Desembargadora LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PUBLICA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. DECISÃO LIMINAR QUE DETERMINA QUE A POLÍCIA MILITAR REALIZE RONDAS EXTERNAS NAS UNIDADES DE INTERNAÇÃO DA FASEPA CONFORME PLANO DE SEGURANÇA DA PRÓPRIA FUNDAÇÃO, BEM COMO PROCEDA O PLANEJAMENTO E A INSTALAÇÃO DE POSTOS FIXOS DE GUARDA EXTERNA COM LOTAÇÃO DE PMS DE UNIDADE DE POLICIAMENTO ESPECIALIZADO ESPECÍFICA. DECISÃO QUE INTERFERE DIRETAMENTE NO PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO E OPERACIONAL DAS FORÇAS DE SEGURANÇA DO ESTADO. INTERFERÊNCIA NO MÉRITO ADMINISTRATIVO. OFENSA A SEPARAÇÃO DOS PODERES. ART. 2º DA CF. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA REFORMAR A DECISÃO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Desembargadores da 2ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, por unanimidade de votos, CONHECER e DAR PROVIMENTO ao recurso consoante os termos do voto da eminente Relatora.

Belém-PA, assinado na data e hora registradas no sistema.

Desa. LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO

Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto em ação civil pública 0853271-59.2021.8.14.0301 contra decisão ID 35501976 que determinou ao ESTADO DO PARÁ através da do CIEPAS da PMPA promova a ronda ostensiva às unidades de internação da FASEPA bem como promovam a elaboração e apresentação de projetos, com cronogramas de instalação de guardas externas com a lotação de policiais militares em número suficiente e em regime de escala, em juízo, no prazo de 60 (sessenta) dias, sob pena de multa de R$5.000,00 por dia de atraso.

Irresignado o Estado recorre alegando essencialmente ausência de demonstração de dotação orçamentária; carência do efetivo operacional da CIEPAS; reserva do possível; violação do art. 2º da CF por interferência no mérito administrativo; ofensa ao art. 1º, §3º da Lei n.º 8.437/92; prazo exíguo e multa exorbitante.

Pede a concessão de efeito suspensivo e o ´provimento final do recurso para reforma da decisão.

Concedi o efeito suspensivo ID7241354.

Contrarrazões em ID7467182 pugnando pela manutenção da decisão do 1º grau.

A procuradoria de justiça entendeu desnecessária a sua atuação.

É o relatório.

VOTO

Tempestivo e adequado vou conhecer do recurso.

Em que pesem os argumentos do Parquet de que a segurança nos centros de internação deve ser observada pelo Estado com absoluta prioridade em garantia ao mínimo existencial, bem como os fundamentos do juízo a quo, não pode o Judiciário simplesmente ignorar o princípio da Separação dos Poderes.

Não é difícil concluir, mesmo em cognição sumária, que não cabe ao Judiciário interferir na seara da discricionariedade do Poder Executivo, determinando-lhe a maneira com a qual deve implementar as estratégias governamentais de políticas públicas ligadas à segurança.

Em obra organizada pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, denominada “A Reconstrução Democrática do Direito Público no Brasil”[1], é possível extrair o significado de reserva de administração stricto sensu, a qual deve ser aplicada no caso concreto: “A reserva de administração em sentido estrito compreenderia o exercício da função administrativa em seu conteúdo essencial e concreto, a englobar tanto atos administrativos unilaterais (formais ou materiais) quanto bilaterais, bem como procedimentos administrativos, que não poderiam ser substituídos pelo legislador, tampouco pelo órgão jurisdicional. Equivaleria a uma reserva de função administrativa não normativa, a englobar: prestação de serviços públicos, atividade de polícia e fomento.”

Celso Antônio Bandeira de Mello[2] define: “Mérito do ato é o campo de liberdade suposto na lei e que efetivamente venha a remanescer no caso concreto, para que o administrador, segundo critérios de conveniência e oportunidade, decida-se entre duas ou mais soluções admissíveis perante a situação vertente, tendo em vista o exato atendimento da finalidade legal, ante a impossibilidade de ser objetivamente identificada qual delas seria a única adequada.”

Conforme ensina Maria Sylvia Zanella Di Pietro[3] expõe: “Com relação aos atos discricionários, o controle judicial é possível mas terá que respeitar a discricionariedade administrativa nos limites em que ela é assegurada à Administração Pública pela lei”, e conclui o raciocínio: “Isto ocorre precisamente pelo fato de ser a discricionariedade um poder delimitado previamente pelo legislador; este, ao definir determinado ato, intencionalmente deixa um espaço para livre decisão da Administração Pública, legitimando previamente a sua opção; qualquer delas será legal. Daí por que não pode o Poder Judiciário invadir esse espaço reservado, pela lei, ao administrador, pois, caso contrário, estaria substituindo, por seus próprios critérios de escolha, a opção legítima feita pela autoridade competente com base em razões de oportunidade e conveniência que ela, melhor do que ninguém, pode decidir diante de cada caso concreto. ”

Desta forma, não cabe ao julgador dizer ao Executivo como deve implementar os recursos públicos destinados à segurança pública, visto que se trata de estratégia de governo precedida de estudos e análise de orçamento disponível, funções típicas do Executivo, que possui competência para alocar os recursos materiais e humanos de forma a alcançar o princípio da eficiência (art. 37, caput da Constituição Federal).

De dizer que todas as ações dessa atividade estatal devem ser precedidas de planejamento orçamentário e deve respeitar a lei de responsabilidade fiscal, fatores que estão ligados à função típica do Poder Executivo, na qual não cabe o Judiciário imiscuir-se, sob pena de ofensa à separação dos Poderes, previsto no art. 2º da Constituição Federal.

Com todas as vênias ao juízo a quo, não há argumento nas contrarrazões do MP que justifiquem a intervenção do judiciário no planejamento e na gestão operacional e estratégica das forças estaduais de segurança, tarefas exclusivas do Poder Executivo.

Entende-se que a decisão recorrida ao determinar que a PM através de unidades especializada em Policiamento Assistencial realize rondas externas nas unidades da FASEPA conforme plano de segurança da fundação, bem como proceda o planejamento e a instalação de postos fixos de guarda externa com lotação de PMs para 7 unidades da FASEPA (centros de internação), avançou sobre o mérito administrativo incorrendo em inexorável ofensa ao art. 2º da CF, razão pela qual, DOU PROVIMENTO ao recurso.

É o voto.

Belém(PA), assinado na data e hora registradas no sistema.

Desa. LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO

Relatora



[1] Ed. Renovar, 2007, p. 596

[2] Curso de Direito Administrativo, 30ª Edição, 2012, p. 981

[3] Direito Administrativo, 21ª edição, editora Atlas, 2008, p. 206

Belém, 13/09/2023

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