Acórdão nº 0813470-35.2022.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Penal, 25-09-2023

Data de Julgamento25 Setembro 2023
Órgão2ª Turma de Direito Penal
Número do processo0813470-35.2022.8.14.0000
Classe processualAGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL
AssuntoExecução Penal e de Medidas Alternativas

AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413) - 0813470-35.2022.8.14.0000

AGRAVANTE: FELIPE MARTAN SANTOS DA COSTA

AGRAVADO: JUSTIÇA PUBLICA

RELATOR(A): Desembargador RÔMULO JOSÉ FERREIRA NUNES

EMENTA

AGRAVO EM EXECUÇÃO. PEDIDO DE LIVRAMENTO CONDICIONAL. IMPROCEDÊNCIA. ARTIGO 83, INCISO III, DO CÓDIGO PENAL. LEI Nº 13.964/2019 (LEI ANTICRIME). NOVA REDAÇÃO. AUSÊNCIA DO REQUISITO SUBJETIVO. AGRAVO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. A legislação penal exige, para a concessão do livramento condicional, não só a ausência de cometimento de faltas disciplinares de natureza grave nos últimos 12 meses - requisito objetivo - como, também, bom comportamento durante a execução da pena – requisito subjetivo - (art. 83, III, "a" e "b", do CP, cuja redação foi introduzida pela Lei n. 13.964/2019, conhecida como Pacote Anticrime), inclusive quanto a fatos ocorridos antes da entrada em vigor da Lei Anticrime. Precedentes do STJ.

2. A ausência de falta grave nos 12 (doze) meses antecedentes ao livramento condicional complementa a obrigação do apenado em ter uma postura certa e adequada durante a execução da pena para fazer jus à benesse. A alínea “b” do inciso III do art. 83 reforça o rigor para o almejo da liberdade antecipada, e não o abrandamento dos outros requisitos descritos nas demais alíneas.

3. Não tendo o agravante apresentado bom comportamento durante o período de execução da reprimenda, pois fugiu do estabelecimento prisional e, ainda, cometeu outros delitos, inviável a concessão do livramento condicional.

4. Agravo conhecido e não provido.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores da 2ª Turma de Direito Penal, por unanimidade, em conhecer do recurso e lhe negar provimento, na conformidade do voto do relator.

Desembargador RÔMULO JOSÉ FERREIRA NUNES

Relator

RELATÓRIO

Cuida-se de agravo em execução penal, interposto pela Defensoria Pública do Estado do Pará em favor de Felipe Martan Santos da Costa, contra a r. decisão do Douto Juízo de Direito da Vara de Execuções Penais da Região Metropolitana de Belém/PA, que negou o pedido de livramento condicional formulado em favor do apenado.

Insatisfeito, o apenado recorreu, argumentando, em suma, que o benefício do livramento condicional influenciará na ressocialização do preso e que este não cometeu falta grave nos últimos doze meses.

Em contrarrazões, o Órgão Ministerial de Primeiro Grau se manifestou pelo provimento do recurso (ID 11103118).

Em juízo de retratação, o magistrado a quo manteve a decisão agravada (ID 11103121).

A Procuradoria de Justiça se manifesta pelo conhecimento e improvimento do agravo.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do agravo em execução.

É imperioso esclarecer, inicialmente, que o livramento condicional constitui a última etapa do cumprimento da pena, sendo, a título precário, a antecipação da liberdade ao preso.

O instituto do Livramento Condicional veio elencado no art. 83 e seguintes do CP, alterado pela lei denominada Pacote Anticrime (Lei de nº 13.964/2019), in verbis:

“Requisitos do livramento condicional

Art. 83 - O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que:

I - cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes;

II - cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso;

III - comprovado: (redação dada pela Lei n. 13.964/2019)

a) bom comportamento durante a execução da pena; (incluído pela Lei n. 13.964/2019)

b) não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses; (incluído pela Lei n. 13.964/2019)

c) bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído; e (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

d) aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto; (incluído pela Lei n. 13.964/2019)

IV - tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração;

V - cumpridos mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.

Parágrafo único - Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir”.

Conforme demonstrado, a legislação penal exige, para a concessão do livramento condicional, não só a ausência de cometimento de faltas nos últimos 12 meses como, também, bom comportamento durante a execução da pena (art. 83, III, "a" e "b", do CP).

No caso dos autos, conforme consta na decisão guerreada, o requisito objetivo foi atendido pelo agravante. Todavia, o que deve ser analisado é o preenchimento do requisito subjetivo, sendo este o exame das condições pessoais do condenado, como disposto no art. 83, III, do Código Penal.

No ponto de interesse, transcrevo os seguintes excertos da decisão agravada:

“(...) Trata-se de pleito de LIVRAMENTO CONDICIONAL do apenado. O Ministério Público manifestou-se pelo indeferimento do pedido. Conquanto tenha atingido o requisito objetivo para a concessão do benefício, o apenado não satisfaz o requisito subjetivo, já que empreendeu fuga em: 20/08/2019, bem como prática de novos delitos em: 29/06/2015 e 14/10/2020, conforme se constata do seu histórico carcerário e espelho do INFOPEN.

(...) Como se infere dos autos, o histórico carcerário do apenado é incompatível com o comportamento satisfatório. (...)”

Como se vê, o apenado tem registro de fuga em 20/08/2019 e de novos delitos, conforme se constata do seu histórico carcerário.

Pois bem. O livramento condicional deve ser deferido aos presos que preenchem integralmente os requisitos legais, de forma que não deve ser concedido sem uma análise detalhada do comportamento do reeducando durante o cumprimento da pena.

Assim, a prática de falta de natureza grave acarreta o reconhecimento de comportamento insatisfatório do agravante, mormente considerando a prática de novo delito no período da execução da pena.

Nesse sentido é a orientação do Superior Tribunal de Justiça:

“HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO. LIVRAMENTO CONDICIONAL. ART. 83, III, b, DO CP. NÃO COMETIMENTO DE FALTA GRAVE NOS ÚLTIMOS 12 MESES. PRESSUPOSTO OBJETIVO CUMPRIDO. FALTAS GRAVES PRATICADAS OU REABILITADAS HÁ MENOS DE 5 ANOS. REQUISITO SUBJETIVO NÃO PREENCHIDO. HABEAS CORPUS DENEGADO.

1. Para a concessão do livramento condicional, a teor do art. 83, III, do Código Penal, o reeducando deverá preencher os requisitos de natureza objetiva (lapso temporal) e subjetiva: comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto.

2. O requisito previsto no art. 83, III, b, do Código Penal, inserido pela Lei 3.964/2019, qual seja, comprovada ausência de falta grave nos últimos 12 meses, é pressuposto objetivo para a concessão do livramento condicional. Tal critério não limita a análise do requisito subjetivo, inclusive quanto a fatos anteriores à vigência da Lei Anticrime, de forma que somente haverá fundamento inválido quando consideradas faltas disciplinares muito antigas.

3. Hipótese em que o pedido foi indeferido pela prática de duas faltas disciplinares graves durante a execução da pena, cometidas no interior do estabelecimento prisional - a primeira ocorrida em 11/11/2016 (data de reabilitação 11/11/2017) e a última datada de 05/09/2017 (reabilitação ocorrida em 10/12/2018), de forma que não resulta o preenchido o requisito de natureza subjetiva para fins de obtenção do livramento condicional. 4. Habeas corpus denegado. (HC 647.268/SP, Rel. Ministro OLINDO MENEZES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), SEXTA TURMA, julgado em 25/05/2021, DJe 31/05/2021).

Cabe dizer que, a antiga redação do art. 83, III, do Código Penal, exigia apenas “comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena”, tendo a Lei n.º 13.964/2019 modificado o requisito para “bom comportamento durante a execução da pena”.

Para a correta e melhor compreensão da alteração legislativa, importante se faz recorrer às razões legislativas da modificação da regra de regência, no ponto, obtida através da justificação do projeto de lei nº 10.372/2018 do qual se originou a Lei n.º 13.964/2019, in verbis:

“Necessária, da mesma maneira, a atualização dos requisitos para concessão do livramento condicional, adequando o instituto às alterações acima propostas e, não menos importante, prevendo o bom comportamento (e não apenas o ‘comportamento satisfatório’) como requisito à sua concessão, além de estabelecer o cometimento de falta grave nos últimos doze meses como fator impeditivo do benefício, mecanismo importante para manter a disciplina em estabelecimentos prisionais".

Constata-se, pois, o nítido propósito do legislador em dar mais rigor ao cumprimento de pena quando da “troca dos adjetivos”, exigindo do reeducando maior grau do seu comportamento durante a execução da pena.

Além do aumento da expectativa do comportamento do condenado, acresceu-se a proibição de cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses. São, portanto, dois requisitos cumulativos, ou seja, bom comportamento carcerário e não cometimento de falta grave nos últimos 12 meses.

Assim, a hermenêutica correta, ou seja, a que se alinha ao objetivo da norma, sob o prisma do postulado constitucional da individualização da pena, no aspecto de sua execução, é a no sentido de que a ausência de falta grave nos doze meses antecedentes ao livramento condicional complementa a obrigação do apenado em ter uma postura certa e adequada durante toda a execução da pena para fazer jus à benesse.

A propósito,...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT