Acórdão nº 0814585-28.2021.8.14.0000 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Penal, 13-02-2023

Data de Julgamento13 Fevereiro 2023
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
Ano2023
Número do processo0814585-28.2021.8.14.0000
AssuntoContrabando ou descaminho
Órgão1ª Turma de Direito Penal

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0814585-28.2021.8.14.0000

APELANTE: ANTONIO RUBENS DA COSTA SILVA, VANDERLY DOS SANTOS TEIXEIRA

APELADO: JUSTIÇA PUBLICA

RELATOR(A): Desembargadora MARIA EDWIGES DE MIRANDA LOBATO

EMENTA

TRÁFICO DE DROGAS. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PROVAS DE MATERIALIDADE E AUTORIA. MODIFICAÇÃO DA PENA. INVIABILIDADE. PENA ESCORREITA E PROPORCIONAL AO CASO EM CONCRETO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO DE DROGAS. INVIABILIDADE. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos, acordam o Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes na Sessão Ordinária do Plenário Virtual da 1ª Turma de Direito Penal do E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e negar provimento, nos termos no voto da relatora.

RELATÓRIO

Tratam os autos de Recursos de Apelação interpostos por VANDERLY DOS SANTOS TEIXEIRA e ANTÔNIO RUBENS DA COSTA SILVA, interpostos pela Defensoria Pública com fulcro no art. 593, inciso I, do CPP, contra a r. sentença que o condenou às penas de 03 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, substituídas por duas restritivas de direito, consistentes em prestação pecuniária de um salário mínimo, além da prestação de serviços à comunidade, pela prática do crime tipificado no art. 33, caput, Lei nº 11.343/06 (tráfico de entorpecentes).

Narra a denúncia que (ID nº 7537495, pág. 150/153):

“(...)Cuida-se de inquérito policial acima informado visando apurar crime de tráfico de drogas praticado pelos denunciados neste município. Tal prática criminosa foi interrompida no dia 01.02.2015 pela Polícia Militar deste município que realizou a prisão em flagrante dos denunciados quando possuíam drogas prontas para serem vendidas. Apurou-se que os denunciados ANTONIO RUBENS DA COSTA SILVA e VANDERLY DOS SANTOS TEIXEIRA praticavam atos de traficância de drogas nesta cidade, em desacordo com as determinações legais previstas na Resolução - RDC n°26 de 15.02.2005 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária em conformidade com a Portaria n°344/1998 da SVS/Ministério da Saúde de 12.05.1998. Consta nos autos que no dia dos fatos, a Polícia Militar recebeu informação que estaria ocorrendo venda ilegal de drogas em uma casa localizada no local conhecido como "Beco do Jacaré".

A Polícia Militar realizou o cerco ao local apontado na notitia criminis e assim que chegaram ao local, os militares perceberam que o denunciado ANTONIO RUBENS tentou fugir do local, mas foi preso pelos policiais. Narram os autos que no interior da casa, os militares localizaram o denunciado VANDERLY e encontraram a quantidade de 06(seis) petecas de "crack", 21 (vinte e um) papelotes de maconha e 01 (um) invólucro de plástico contendo maconha.

A residência pertence ao denunciado ANTONIO. Na DEPOL o denunciado VANDERLY tentou enganar os policiais dizendo chamar-se CARLOS SANTOS FERREIRA. Perante os militares, o denunciado ANTONIO declinou que as drogas que foram encontradas eram de sua propriedade. Já o denunciado VANDERLY negou sua participação no delito. (...)”

A instrução transcorreu normalmente culminando na condenação dos denunciados.

Inconformados apelaram requerendo: 1) Preliminarmente, a inviolabilidade de domicílio/impossibilidade de relativização do direito fundamental à intimidade pautada exclusivamente em "denúncia anônima" ou "intuição policial" e sem inquérito; 2) Insuficiência de Provas para Condenação; Desclassificação para consumo próprio 3) Redimensionamento da Pena Base e diminuição redução da pena abaixo do mínimo legal; 4) Reconhecimento da causa de diminuição do §4°, do art. 33, da Lei n°11.343/2006.

Em contrarrazões, a Promotoria de Justiça, manifestou-se pela rejeição da preliminar e, no mérito, o improvimento dos recursos. No mesmo sentido foi o parecer da Procuradoria de Justiça.

É o relatório. À revisão.

Julgamento perante o plenário virtual.

VOTO

Conheço dos apelos e passo a analisa-los.

A preliminar de nulidade por violação de domicílio deve ser rejeitada.

Como muito bem ressaltou o Custos Legis o crime de tráfico de drogas é considerado crime permanente, protelando-se no tempo enquanto não cessado os verbos do crime. Além, de que a inviolabilidade do domicílio é relativa, podendo ser superada durante o estado de flagrância. Como ocorreu no caso em análise (ID 10341751):

“Dentre as hipóteses elencadas no tipo, são considerados crimes permanentes as seguintes modalidades de conduta: "expor à venda". "ter em depósito". "transportar'. "trazer consigo" e "guardar" In casa, depreende-se da peça preambular acusatória que os denunciados foram processados por no mínimo duas destas condutas, quais sejam: “ter em depósito" e "guardar”.

Considerando que as condutas acima são consideradas crimes permanentes, algumas consequências podem ser extraídas. A primeira decorre da possibilidade de se realizar a prisão em flagrante a qualquer momento, enquanto não cessada a conduta do agente. Assim dispõe o Art. 303 do CPP "Nas infrações permanentes. entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência".

A segunda consequência diz respeito à possibilidade do ingresso em domicilio independente de autorização judicial. É cediço que a inviolabilidade da propriedade privada é, além de cláusula pétrea, um direito individual fundamental previsto na Constituição Cidadã. Via de regra, só será permitido adentrar na residência de outrem mediante autorização judicial. Entretanto, essa inviolabilidade não é absoluta, podendo ser afastada em decorrência de determinadas circunstâncias definidas em lei, são elas: autorização do proprietário; flagrante delito; desastre; prestação de socorro, conforme o art. 5º, XI, in verbis:

O art. 5º, Inciso XI da Constituição Federal dispõe que “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial. ”

No caso in tela, encontravam-se presentes 01 (uma) das excetuantes prevista na lei acima mencionada, quais sejam: estado de flagrância delitiva, devendo ser rejeitada a prefacial de nulidade por ausência de mandado judicial.

Nesse sentido, tem decidido Tribunais Superiores pátrios. Senão vejamos:

“APELAÇÃO CRIMINAL - CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS (ARTIGO 33, CAPUT, LEI 11.343/06) - SENTENÇA CONDENATÓRIA - RECURSO DA DEFESA - ALEGAÇÃO DE NULIDADE ANTE A AUSÊNCIA DE MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO NO MOMENTO DO INGRESSO DOMICILIAR - CRIME DE NATUREZA PERMANENTE - ORDEM JUDICIAL DISPENSÁVEL NO CASO CONCRETO - REPRIMENDA - ADEQUAÇÃO - NECESSIDADE - PROVIDÊNCIA EFETUADA DE OFÍCIO - REQUERIMENTO DE ISENÇÃO DAS CUSTAS PROCESSUAIS - MATÉRIA PERTINENTE AO JUÍZO DE EXECUÇÃO.

-Considerando que o delito de tráfico de drogas é de natureza permanente, cuja flagrância se prolonga no tempo, não há que se falar em violação do princípio constitucional da inviolabilidade do domicílio, tampouco em nulidade.

-A despeito da natureza altamente destrutiva do entorpecente apreendido, diante da pequena quantidade de droga arrecadada não se encontra justificado o recrudescimento da pena-base, devendo ser a reprimenda adequada, ainda que de ofício.
-Compete ao juízo da execução a análise acerca do pedido de isenção das custas processuais.

(TJMG – 1.0352.18.002175-5/001 – Rel.. Desembargador Wanderley Paiva – Julgado em 06/08/2019 – Publicado em 14/08/2019). (Negritei)

Assim, constatamos que resta fartamente comprovado o estado de flagrância delitiva em que a apelante se encontrava, por ocasião de sua prisão, o que se emoldura perfeitamente à exceção prevista no dispositivo constitucional acima reproduzido, razão pela qual, entendemos ser prescindível qualquer ordem judicial para a realização da busca policial nas residências que servem de base para o cometimento de crimes.”

Rejeito a preliminar, em consonância com o parecer ministerial.

No mérito, o pleito absolutório por insuficiência de provas e desclassificação para consumo próprio não merecem prosperar.

A materialidade do crime encontra-se comprovada pela Notas de Culpa (ID nº 7537485, págs. 21 e 23), pelo Auto de Exibição e Apreensão (ID nº 7537485, pág. 37), Laudo Toxicológico Provisório nº 2015.07.000075-QUI (ID nº 7537496, pág. 39), pelo Relatório do IPL (ID nº 7537490, pág. 123) e pelo Laudo Toxicológico Definitivo nº 2016.07.000022-QUI (ID nº 7537508 - págs. 352/356).

A quantidade de droga apreendida, por si só, já desconfigura o pleito desclassificatório, como passo a demonstrar.

Foram encontrados na posse dos réus 06 PETECAS DE CRACK (COCAINA) E 21 papelotes DE MACONHA, restando, assim, incontroversa a materialidade do delito, conforme laudo toxicológico definitivo

A autoria pelos depoimentos colhidos ao longo da instrução processual, com relevância aos depoimentos dos policiais que prenderam em flagrante os apelantes, denunciados anonimamente.

Durante a audiência de instrução e julgamento, a Testemunha Lucicley Martins da Luz afirmou: " Que houve uma denúncia sobre venda de drogas no "Beco do jacaré". Que ao chegar ao local havia dois indivíduos. Que um tentou fugir e o outro ficou dentro imóvel. Que tentaram jogar a droga fora pelo balancinho, mas foi encontrada e estava toda espalhada. Que em seguida efetuaram as prisões e encaminharam os indivíduos à Delegacia de Polícia"

No mesmo sentido foram as palavras da testemunha MESSIAS BATISTA DE GOES. "Que se lembra da ocorrência em que foram acionados para irem ao "Beco do Jacaré" em uma residência lá. Que ao chegarem ao local avistaram alguns indivíduos. Que um entrou na residência e outros dois tentaram fugir. Que um escapou, mas o outro ficou engatado e foi preso. Que foi feita a detenção dos mesmos. Que ao...

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