Acórdão Nº 0822430-22.2021.8.10.0001 do TJMA. Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, Presidência, 2023

Ano2023
Classe processualApelação Cível
ÓrgãoPresidência
Tipo de documentoAcórdão
PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0822430-22.2021.8.10.0001

Relator : Desembargador Jamil de Miranda Gedeon Neto

1º Apelante : B. B. S. representado por THALLIA EMILYS COSTA BARGUES SILVA

Advogado : HERICSON TOLEDO LOPES SILVA, OAB/MA 23.062

1º Apelado : HAPVIDA ASSISTÊNCIA MÉDICA S/A

Advogado : ISAAC COSTA LÁZARO FILHO, OAB/MA 21.037

2º Apelante : HAPVIDA ASSISTÊNCIA MÉDICA S/A

2º Apelado : B. B. S. representado por THALLIA EMILYS COSTA BARGUES SILVA

EMENTA

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. DIREITO À VIDA E SAÚDE. PACIENTE CRIANÇA PORTADORA DE HIDROCEFALIA. ATENDIMENTO DE EMERGÊNCIA COM PRESCRIÇÃO DE CIRURGIA PARA TROCA DE VÁLVULA. RECUSA INJUSTIFICADA DA RÉ. ALEGAÇÃO DE CARÊNCIA CONTRATUAL. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. MANDAMENTO CONSTITUCIONAL. PROTEÇÃO INTEGRAL. DANOS MORAIS. CABIMENTO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.

1. Na linha de precedentes do STJ, o período de carência contratualmente estipulado pelos contratos de planos de saúde não prevalece, excepcionalmente, diante de situações de emergência/urgência graves nas quais a recusa da cobertura possa frustrar o próprio sentido e a razão de ser do negócio firmado, pois o valor da vida humana se sobrepõe a qualquer outro interesse (STJ, AgRg no AREsp 213169-RS 2012/0164434-8 e REsp 1243632-RS 2011/0053304-4).

2. O artigo 35-C da Lei nº 9.656/98, que dispõe sobre os planos de saúde privado, prevê como imperativo o atendimento de emergência e urgência, independentemente de carência, quando a situação do paciente implicar em risco de vida ou de lesões irreparáveis.

3.Com base nas premissas de que a criança – critério etário no que se inclui o bebê – é sujeito de direitos, é titular de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa, é impossível condicionar o exercício dos seus direitos de personalidade à “consciência” dos seus direitos ou das situações de vida. Entendimento contrário seria, inclusive, privar pessoas portadoras de limitações cognitivas de usufruírem também dos direitos de personalidade e consequente direito à reparação em caso de violação.

4. Já assentou a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça que bebês podem sofrer dano moral, mesmo sem consciência do ato lesivo, e devem ter os direitos de personalidade tutelados com base no princípio da dignidade da pessoa humana, pois "as crianças, mesmo da mais tenra idade, fazem jus à proteção irrestrita dos direitos da personalidade, entre os quais se inclui o direito à integralidade mental, assegurada a indenização pelo dano moral decorrente de sua violação" (REsp. 1.037.759/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/02/2010, DJe 05/03/2010).

5.No presente caso, o valor arbitrado a título de condenação por danos morais, considerando todo o transtorno sofrido pela parte autora, pessoa em desenvolvimento titular de Prioridade Absoluta por dicção constitucional (artigo 227), que teve sua própria vida e saúde ameaçadas pela demora na realização do procedimento, justifica a condenação no montante de R$10.000,00 (dez mil reais).

6. Primeiro Recurso conhecido e parcialmente provido. Segundo Recurso conhecido e não provido.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os Senhores Desembargadores integrantes da Terceira Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por unanimidade, em sessão virtual realizada no período de 18.05.2023 a 25.05.2023, em conhecer e dar parcial provimento ao primeiro recurso, e, negar provimento ao apelo da HAPVIDA, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Votaram os Senhores Desembargadores Jamil de Miranda Gedeon Neto, Cleones Carvalho Cunha e Lourival de Jesus Serejo Sousa.

Participou do julgamento a Senhora Procuradora de Justiça, Drª Ana Lídia de Mello e Silva Moraes.

São Luís/MA, data do sistema.

Desembargador JAMIL DE MIRANDA GEDEON NETO

Relator

R E L A T Ó R I O

B. B. S., menor impúbere representado por THALLIA EMILYS COSTA BARGUES SILVA e HAPVIDA ASSISTÊNCIA MÉDICA S/A interpuseram, cada um, recurso de apelação da sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 16a Vara Cível da Comarca da Ilha de São Luís, Termo Judiciário de São Luís, prolatada nos autos da Ação Ordinária n.º 0822430-22.2021.8.10.0001, que B. B. S. propôs contra HAPVIDA ASSISTÊNCIA MÉDICA S/A, cuja parte dispositiva restou assim redigida:

“Por todo o exposto, confirmo a tutela deferida e julgo parcialmente procedentes os pedidos, para o fim específico de determinar ao requerido que autorize e custeie a internação hospitalar e o procedimento neurocirúrgico do autor BRYAN BARGUES SILVA, em hospital credenciado, preferencialmente Hospital Guarás, nos termos do parecer do especialista e relatório admissão de internamento. Condeno ainda o requerido ao pagamento das custas e honorários sucumbenciais, sendo estes de R$3.500,00 (três mil e quinhentos reais).

Consta da petição inicial de ID 21331503 que B. B. S., menor impúbere representado por THALLIA EMILYS COSTA BARGUES SILVA é portador de HIDROCEFALIA e no dia 05/06/2021 foi internado no Hospital Guarás, com complicação relacionada com a uma válvula responsável pela drenagem do líquido do crânio, recebendo parecer médico para cirurgia de urgência com a finalidade de troca da válvula, a qual não foi autorizada pelo Plano de Saúde réu, que alegou que o autor não havia cumprido o período de carência previsto no contrato.

Aduz que se trata de situação emergencial e urgente, com claro risco de vida para o infante, de modo que torna a negativa do plano de saúde completamente indevida e ilegal, razão pela qual ajuizou a ação para obter a tutela antecipada de urgência e a indenização por danos morais.

A sentença foi lançada no ID 21331561.

Em suas razões recursais (ID 21331569), o apelante B. B. S. aduz que “a negligência e omissão da HAPVIDA levou o recorrente, criança, a sofrer muito com o descaso e falha na prestação de serviços, o que, por si só, gerou uma violação aos seus direitos da personalidade e risco de vida, pois o laudo médico que recomendava a cirurgia demonstra que essa era vital”, razão pela qual deve ser parcialmente reformada a sentença para inclusão da condenação em danos morais no importe de R$20.000,00 (vinte mil reais).

Por sua vez, nas razões recursais de ID 21331571, a segunda apelante HAPVIDA ASSISTÊNCIA MÉDICA S/A requer a reforma integral da sentença, para julgamento improcedente dos pedidos autorais, pois defende que “em estrito cumprimento às normativas regulatórias do setor de saúde suplementar, a Hapvida sempre garantiu o atendimento emergencial solicitado à recorrente, nos exatos termos prescritos pelos médicos assistentes, contudo, o procedimento de cateterismo não poderia ser autorizado, visto que a autora se encontrava em cumprimento de carecia contratual, por expressa previsão contratual e legal”, e que o “paciente NÃO TEVE ATENDIMENTO DE EMERGÊNCIA NEGADO, no entanto, a internação buscada pela contraparte, para o qual a autora cumpria carência, só poderia ser realizado de maneira particular ou junto ao SUS, não havendo qualquer ato ilícito no agir da Operadora”.

Contrarrazões no ID 21331578 e 21331581.

A Procuradoria de Justiça emitiu parecer opinando pelo conhecimento e provimento do primeiro apelo e pelo não provimento do segundo apelo (ID 23257143).

É o relatório.

Inclua-se em pauta para sessão virtual de julgamento.

VOTO

Tendo verificado o preenchimento dos requisitos de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos, conheço dos recursos, passando, por conseguinte, à sua apreciação, segundo sua ordem de prejudicialidade.

I – DO RECURSO INTERPOSTO POR HAPVIDA ASSISTÊNCIA MÉDICA LTDA

Como se viu, o caso ‘sub examine’ é de recusa injustificada, pelo plano de saúde, de internação de urgência/emergência a beneficiário seu, sob a alegação de cláusula contratual de carência mínima.

A tese principal da segunda recorrente, de que a negativa de autorização se deu porque o usuário do plano ainda estava cumprindo o prazo de carência do contrato não encontra amparo na legislação e na...

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