Acórdão Nº 0834439-55.2017.8.10.0001 do TJMA. Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, 4ª Câmara Cível, 2021

Ano2021
Classe processualApelação Cível
Órgão4ª Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão
QUARTA CÂMARA CÍVEL

Sessão do 23 de março de 2021

APELAÇÃO CÍVEL NO 0834439-55.2017.8.10.0001 – SÃO LUÍS

Apelante: Bradesco Saúde S/A

Advogado: Reinaldo Luís Tadeu Rondina Mandaliti (OAB/MA 11.706-A)

Apelada: Iaciara Sousa Câmara

Advogado: Adaiah Martins Rodrigues Neto (OAB/MA 8.336)

Relator: Desembargador Marcelo Carvalho Silva

ACÓRDÃO NO ____________

EMENTA

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. ENUNCIADO 3 DO STJ. AÇÃO ORDINÁRIA. PLANO DE SAÚDE. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CONTRATO. PACTA SUNT SERVANDA. FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO. AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE. ROL MERAMENTE EXEMPLIFICATIVO. NEGATIVA QUANTO A TRATAMENTO DE REPARAÇÃO DE MAMAS. DECISÃO LIMINAR. DESCUMPRIMENTO. ABUSIVIDADE. APLICAÇÃO DE MULTA. DANO MORAL. OCORRÊNCIA. APELAÇÃO DESPROVIDA.

I — Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, considerando que se trata de contrato de plano de saúde, não vinculado à entidade de autogestão, em atenção à Súmula nº 469/STJ, que assim dispõe: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde.

II — A falta de previsão de procedimento médico solicitado no rol da ANS não representa a exclusão da cobertura contratual.

III — A negativa de cobertura de parte do tratamento é flagrantemente contrária à função social do contrato de plano de saúde, pois o escopo desse contrato é oferecer assistência à saúde, tanto para as doenças cobertas contratualmente (no caso, a dermolipectomia), quanto para aquelas não relacionadas, de modo que a recusa de cobertura de tratamento conexo (a cirurgia reparadora das mamas com prótese) impede que o contrato atinja a sua função social.

IV — O pacto assinado pelas partes é lei. Se a parte mais forte da relação contratual não responde ao contrato estabelecido, a parte mais fraca sofre com uma penalidade que não deu causa.

V — Na fixação de multa cominatória, nenhum reparo comporta a sentença, eis que o único obstáculo ao cumprimento da determinação judicial para a qual havia incidência de multa diária foi o descaso da apelante. Justifica-se, assim, a manutenção do valor das astreintes, que são fixadas pelo juiz com o escopo de promover a efetividade de uma decisão judicial, destinando-se a evitar que o devedor se furte, indeterminadamente, ao cumprimento da obrigação em flagrante prejuízo da parte contrária.

VI — Havendo solicitação de autorização ao plano, visando atender o paciente que se apresenta com alguma doença, e este, sem nenhuma justificativa plausível, nega a cobertura, deve indenizar o segurado em razão da negativa indevida. A aflição, a angústia, o sofrimento, a falta de apoio naquele momento pelo plano de saúde fazem incidir a indenização por danos morais.

VII — Considerando-se as peculiaridades e os aspectos fáticos da espécie, o valor arbitrado de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a título de danos morais, atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

VIII — Os juros de mora, nas indenizações por dano moral, devem incidir a partir da citação, eis que se trata de relação contratual, e a correção monetária para atualização do dano moral observa o que prescreve a Súmula 362 do STJ (data do arbitramento).

IX — Apelação desprovida. Sem interesse ministerial.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por unanimidade de votos, em negar provimento ao apelo, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Participaram do julgamento os Senhores Desembargadores Marcelo Carvalho Silva, Maria Francisca Gualberto de Galiza e José Gonçalo de Sousa Filho.

Funcionou pela Procuradoria de Justiça o Dr. José Henrique Marques Moreira.

São Luís, 23 de março de 2021.

Desembargador Marcelo Carvalho Silva

Relator

RELATÓRIO

Adoto como relatório a parte expositiva da sentença de primeiro grau (id. 6833356, páginas 1/2), de lavra da douta Juíza de Direito, Dra. Ariane Mendes Castro Pinheiro, que transcrevo a seguir:

IACIARA SOUSA CAMARA ajuizou a presente ação em face de BRADESCO SAÚDE S/A, relatando que a autora é beneficiária no plano de saúde réu desde 15/09/2014 e foi submetida à cirúrgica bariátrica (gastroplastia redutora) em 01/01/2016.

Aduz que, em decorrência da cirurgia, a autora ficou com as seguintes sequelas: flacidez, excesso de pele no abdome, mamas e região dorsal, conforme laudo médico. Ademais, em decorrência da cirurgia bariátrica, a autora perdeu uma grande quantidade de peso e, em consequência, houve o aparecimento de pele redundante em mamas e abdômen, devido a isso, pode apresentar infecções fúngicas recorrentes por conta do excesso de umidade no local, conforme laudo médico.

Diz que o médico recomendou procedimentos denominados Dermolipectomia no abdômen bem como cirurgia reparadora das mamas com prótese, contudo, apenas o primeiro foi autorizado pelo plano de saúde.

Requer tutela de urgência para que seja obrigado o requerido a autorizar todos os procedimentos necessários para que a requerente realize no Hospital São Domingos a cirurgia reparadora das mamas, inclusive disponibilizando os honorários do médico responsável pela cirurgia, Dr. Henrique Amaral, e demais materiais necessários.

Nos pedidos finais, pugna seja a Ré condenada ao pagamento de indenização pelos danos morais causados à Autora, no valor de R$ 50.000,00.

Decisão ID 8171538, deferiu o pleito de tutela antecipada, bem como o pedido de justiça gratuita e a inversão do ônus da prova em favor da autora. Na oportunidade, foi designada audiência de conciliação.

Citada, a ré apresentou contestação, ID 9206017, na qual informa que foi autorizado o procedimento de dermolipectomia para correção de abdome em avental e a reconstrução da mama com prótese e/ou expansor foi negada, pois a cirurgia plástica está excluída da cobertura contratual, já que não se trata de doença neoplásica, conforme RN 387 ANS e cláusula do contrato.

Sustenta a validade da cláusula contratual de exclusão de cobertura no contrato de seguro e que houve o consentimento legítimo da parte autora com os termos e condições contratuais, razão pela qual vincula as partes. Aduz que não houve descumprimento contratual pela requerida. E que não restaram configurados danos morais.

Réplica em id 9210837.

Ata de Audiência de Conciliação ID 9677046, na qual não houve proposta de acordo, restando prejudicada a conciliação.

Intimadas as partes para indicarem outras provas que ainda pretendem produzir, sob a advertência de julgamento antecipado da lide apenas a ré veio aos autos, para informar que não possui provas a produzir (id 10365178).

Acórdão em agravo de instrumento, para reduzir a multa diária e majorar o prazo de cumprimento (id 15368523).

Despacho de id 25117080, reduziu o montante devido a título de astreintes para R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

Os autos vieram-me conclusos.

Acrescento que, ao final, a magistrada julgou procedentes os pedidos da inicial, para confirmar a tutela provisória concedida, que determinou que a apelante autorizasse também o procedimento de reconstrução mamária, com prótese ou extensor, com seus consectários, em hospital e médico da rede conveniada, profissional este com especialidade e aptidão para realizar o procedimento, consolidando as astreintes em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), em decorrência do descumprimento da tutela de urgência, bem como condenando-a ao pagamento de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a título de danos morais, além custas e honorários, estes últimos calculados à base de 20% (vinte por cento) do valor da condenação.

Inconformada, a apelante ajuizou o presente recurso (id. 6833358, pág. 1/29), requerendo a reforma da sentença, sustentando, em síntese, que o procedimento cirúrgico pleiteado pela apelada não tem cobertura contratual, sendo a negativa de atendimento a consequência lógica para o desfecho da demanda, tendo em vista a inexistência de previsão no rol dos serviços obrigatórios da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, conforme Resolução Normativa nº 428.

Alega, ainda, que não pode ser compelida a proceder a cobertura de um tratamento, cuja obrigatoriedade foi afastada pela ANS, tendo em vista que no procedimento requerido não há qualquer evidência de doença neoplástica (câncer de mama), não havendo que se falar em descumprimento contratual, ou mesmo atuação de forma ilícita.

Assevera que a multa aplicada de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) deve ser revogada, em razão de ter dado atendimento à ordem liminar, enviando a autorização, por meio de Telegrama, para realização do procedimento antes da data de 15/01/2018. No que concerne aos danos morais, arbitrados em R$ 8.000,00 (oito mil reais), afirma que não ocorreu o dano, porque não houve o descumprimento do contrato e sequer alguma relação de culpa. Pede também sua exclusão. Caso não seja esse o entendimento, que seja aplicada a Súmula 362/STJ, quanto à incidência dos juros e correção monetária. Por fim, reclama da condenação nas custas processuais e honorários advocatícios.

Não houve apresentação de contrarrazões ao apelo, conforme certidão juntada aos autos (id. 6833371).

Encaminhados os autos ao Ministério Público com atuação nesta Instância, esse, devidamente representado pelo ilustre Procurador de Justiça, Dr. Joaquim Henrique de Carvalho Lobato, deixou de se manifestar sobre o mérito recursal, por entender que na espécie prescinde da intervenção ministerial, porquanto a demanda versa sobre direitos privados disponíveis, sem interesse público e social objetivamente considerado, não incidindo qualquer das hipóteses autorizadoras da intervenção elencadas no art. 178, do CPC (id. 7581757, pág. 1/2).

É o relatório.

VOTO

I — Juízo de admissibilidade

A sentença foi assinada em 14/02/2020 (id. 6833355, pág. 8). Sendo assim, aplico o Enunciado Administrativo nº 3, do STJ, in verbis:

Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.

Incide, portanto, o Código Fux.

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