Acórdão nº 0848804-42.2018.8.14.0301 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Público, 29-05-2023

Data de Julgamento29 Maio 2023
Órgão1ª Turma de Direito Público
Ano2023
Número do processo0848804-42.2018.8.14.0301
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoAto Lesivo ao Patrimônio Artístico, Estético, Histórico ou Turístico

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0848804-42.2018.8.14.0301

APELANTE: NATALINO DE JESUS CARDOSO MIRANDA

APELADO: MUNICIPIO DE BELEM

RELATOR(A): Desembargadora CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. NUNCIAÇÃO DE OBRA NOVA. SENTENÇA PROCEDENTE. IMÓVEL NO ENTORNO DE BEM TOMBADO. AUSÊNCIA DE LICENÇAS E ALVARÁ. DEMOLIÇÃO. MEDIDA EXTREMA. APELAÇÃO CONHECIDA E PROVIDA. INVERSÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL.

1- Trata-se de apelação cível interposta contra sentença que, nos autos da Ação de Nunciação de Obra Nova, julgou procedente a pretensão deduzida, para determinar a demolição da construção. Arbitrou custas pelo demandado e fixou honorários em R$2.000,00 (dois mil reais);

2- O imóvel do autor/apelante, de acordo com a Lei Municipal nº 8.655/2008 (Plano Diretor Urbano), pertence à Zona ZAU 6 setor I, está inserido em área de entrono da sede da CODEM, cujo prédio (Solar Barão do Guamá) é um bem imóvel tombado sendo de preservação e proteção do patrimônio histórico, artístico, ambiental e cultural, conforme Lei Municipal nº 7.709/94;

3- A demolição não será imposta caso o proprietário demonstre que a obra preenche as exigências mínimas, ou possa executar modificações que a torne concordante com a legislação em vigor. Assim, a imposição da demolição não é a única saída para a situação irregular em evidência. Inteligência do Parágrafo Único do art. 77, da Lei Municipal nº 7.400/88;

4- A demolição da obra se mostra como medida extrema, no caso concreto, porquanto não comprovada a existência de vício insanável a comprometer o prédio. A condição de regularidade técnica do imóvel em construção não foi totalmente verificada, para se afirmar a iminência ou a eficácia do dano ao patrimônio histórico;

5- Inversão do ônus sucumbencial; cabendo, à parte autora, arcar com honorários advocatícios, nos termos fixados na sentença, ressalvada a isenção de custas à Fazenda Pública;

6- Apelação conhecida e provida.

Acordam, os Excelentíssimos Desembargadores, integrantes da 1ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, na 17ª Sessão Ordinária do seu Plenário Virtual decorrida no período de 29/05/2023 a 05/06/2023, à unanimidade, em conhecer do recurso de apelação e dar provimento para reformar a sentença e julgar improcedente a pretensão inicial e inverter o ônus sucumbencial.

Desembargadora CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO

Relatora

RELATÓRIO

PROCESSO Nº 0848804-42.2018.8.14.0301

1ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO

APELAÇÃO CÍVEL

APELANTE: NATALINO DE JESUS CARDOSO MIRANDA

APELADO: MUNICIPIO DE BELÉM

RELATORA: DESA. CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO (Relatora):

Trata-se de apelação cível interposta por NATALINO DE JESUS CARDOSO MIRANDA (Id. 13663732) contra sentença (Id. 13663728), proferida pelo juízo da 1ª Vara de Fazenda de Belém que, nos autos da Ação de Nunciação de Obra Nova proposta pelo MUNICÍPIO DE BELÉM, julgou procedente a pretensão deduzida, extinguindo o processo com resolução do mérito na forma do art. 487, I do CPC, para determinar a demolição da construção. Arbitrou custas pelo demandado e fixou honorários em R$2.000,00 (dois mil reais).

Em suas razões, o apelante sustenta os seguintes pontos: a) conforme descrição da área de entorno do Centro Histórico de Belém pela Lei 7.709/1994 e os mapas colacionados, o imóvel em questão não faz parte da área do entorno do patrimônio histórico de Belém e não pode ser classificado como bem de interesse à renovação; b) a paralisação das obras não significa uma confissão de culpa do autor, mas mera obediência aos embargos do Município ocorridos em 15/10/2015 e 19/04/2016; c) existem provas de que a obra não representa riscos nem prejuízo a patrimônio tombado ou não; a demolição da obra é medida extrema e desarrazoada, sendo possível a resolução do conflito com a de regularização junto aos órgãos competentes; d) trata-se de vício meramente administrativo e perfeitamente sanável, uma vez que se refere a falta de licenciamento do Poder Público que, através dos diversos laudos e pareceres já juntados, demonstraram ser a obra viável, não apresentando perigo de dano a patrimônios do entorno.

Requer o provimento do recurso com a reforma da sentença para que não seja demolida a obra, total ou parcialmente. Junta documentos (Id 13663735/ 13663739).

Contrarrazões sob o Id. 13663742, contrapondo as razões recursais e postulando pelo desprovimento do recurso.

Feito distribuído à minha relatoria.

O Ministério Público, nesta instância, manifesta-se pelo desprovimento do recurso (Id. 13996600).

É o relatório.

VOTO

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO (Relatora):

Conheço do apelo, porquanto presentes seus requisitos de admissibilidade.

Cuida-se, na origem, de ação de nunciação de obra nova ajuizada pelo Município de Belém em face de Natalino de Jesus Cardoso Miranda, sob alegação de que o réu estaria realizando construção de obra irregular, eis que sem o competente alvará e em imóvel situado em área tombada pelo Autor e que, também, necessita, ainda, de aprovação de projeto perante a FUMBEL, caracterizando assim violação do art. 6º, o que resultou no interdito na forma dos arts. 75 e 76, todos da Lei Municipal nº 7.400/1988, e em inobservância dos arts. 22 e 39, ambos da Lei Municipal nº 7.709/1994.

A exordial explana que, por meio do Oficio n° 1297/2015 – GPRES/FUMBEL, de 29.9.2015, a Fundação Cultural do Município de Belém – FUMBEL informou à Secretaria Municipal de Urbanismo – SEURB acerca da ocorrência de obra irregular, pelo fato de o imóvel encontrar-se protegido pela Lei Municipal nº 7.709/1994, que dispõe sobre a preservação e proteção do patrimônio histórico, artístico, ambiental e cultural, e pela Lei Estadual n° 5.629/1990, que dispõe sobre a preservação e proteção do patrimônio histórico, artístico, natural e cultural, e não haver solicitação de aprovação de projeto.

Após fiscalização, foi expedido Auto de Infração nº 11621, com aplicação de multa correspondente por falta do competente alvará (art. 69, III da Lei Municipal nº 7.400/1988) e procedido o Embargo n° 928/2015 – DEAF/DFC em 15.10.2015. Ante a inércia do dono da obra, houve o Interdito nº 058/2016-DEAF-DFC, de 15.04.2016 e lavrado o Auto de Infração nº 9218 de 19/04/2016, que resultou em aplicação de multa pelo descumprimento do Embargo nº 928/2015-DEAF/DFC.

Em face dos fatos narrados, o autor, entendendo fazer jus à ratificação judicial, para obter o direito a proceder com a demolição da obra irregular, postulou tutela de urgência para suspensão da obra irregular e, ao fim, a condenação do Réu a reconstituir, modificar ou demolir o que estiver feito em detrimento da legislação pertinente e o pagamento das perdas e danos. Juntou os seguintes documentos (Id 13663669): Ofício nº 726/2017-GABS/SEFIN; Ofício nº 1297/2015 – GAPRES/FUMBEL; Vistoria Técnica nº 034/2015; auto de Infração nº 11621; Termo de Embargo nº 928/2015; Ofício nº 0314/2016-GAPRES/FUMBEL; Termo de Interdito nº 058/2016; Auto de Infração nº 09218.

Deferida a tutela provisória para suspensão da obra em 21.08.2018 (Id 13663672).

Em contestação, o réu sustentou a ausência de interesse processual tendo em vista que a obra se encontra paralisada há anos por força de interdição ditada em sede administrativa em 2016. Alegou que, com objetivo de dar continuidade à obra, requereu projeto e autorização de serviço, em 18/09/2018 e protocolizou requerimento de alvará nº 2018/427069 - processo nº 5210/2018. Juntada a ficha de protocolo dos referidos documentos (Id 13663687).

Juntados pelo réu: Alvará de Obra nº337/2019, datado de 16/09/2019 com validade de 1 (um) ano e; Projetos de obra; Parecer nº 131/2018 DEPH/FUNBEL (Id 13663706/3663711). Juntados pelo autor: Laudo/Manifestação Técnica nº 50 exarado pela FUMBEL (Id 13663715).

Os fundamentos da sentença são os seguintes:

VII – DO MÉRITO – PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.

A conduta do réu a um só tempo viola o Código de Postura do Município e a Lei de Edificações – 7.400/1988 -, que outorga ao Município de Belém o poder-dever de demolir as edificações irregulares, servindo-se do seu Poder de Polícia Administrativa, como se depreende da referida norma:

Art. 77. A demolição total ou parcial da edificação ou dependência será imposta nos seguintes casos:

I – quando a obra for clandestina, entendendo-se por tal aquela que for executada sem Alvará de Licenciamento de Construção;”.

A construção sob análise situa-se no entorno de bem tombado, por isso, nos termos da lei municipal nº 7.709 de 18/05/1994, que dispõe sobre a proteção e preservação do Patrimônio Histórico, Artístico, Ambiental e Cultural, o imóvel está classificado como Bem de interesse à Renovação.

A irregularidade na construção apontada pelo Município autor é tipificada no art. 22 caput e § único da Lei Municipal nº 7.400/1988, que dispõe:

Art. 22 - O bem tombado não poderá ser destruído, demolido, mutilado, desmontado ou abandonado, ressalvado o disposto no artigo 18 desta Lei.

Parágrafo Único - Caberá à Fundação Cultural do Município de Belém, em conjunto com a Secretaria Municipal de Urbanismo, analisar e aprovar projetos e serviços de reparação, pintura ou restauração ou qualquer obra de intervenção nos bens imóveis tombados e de sua área de entorno de que trata este artigo. No caso de bens móveis e integrados, esse procedimento ficará a cargo da Fundação Cultural do Município de Belém.

A construção em tela foi executada sem a solicitação de aprovação do projeto de edificação, sem implementação das medidas de proteção, sem as devidas licenças e consequente Alvará, comprometendo não apenas o prédio em si, mas todo o entorno, por se tratar de área que faz parte do patrimônio histórico do Município. A confessada paralisação da obra pelo autor só faz aumentar os riscos ao entorno, já que um imóvel sem conclusão tende a ruína pelo desgaste...

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