Acórdão Nº 0900013-33.2016.8.24.0013 do Segunda Câmara de Direito Público, 20-09-2022

Número do processo0900013-33.2016.8.24.0013
Data20 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0900013-33.2016.8.24.0013/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO ROBERTO BAASCH LUZ

APELANTE: DEONIR LUIZ FERRONATTO (RÉU) APELANTE: CÁSSIO ANDRÉ PREDEBON (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por DEONIR LUIZ FERRONATO e CÁSSIO ANDRÉ PREDEBON contra a sentença que, na ação civil de improbidade administrativa ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, julgou parcialmente procedentes os pedidos conforme colhe-se do dispositivo do pronunciamento judicial objurgado:

Pelo exposto, com fundamento no art. 487, I, do CPC, julgo procedentes, em parte, os pedidos formulados na inicial para

(a) condenar Deonir Luiz Ferronato ao pagamento de R$ 14.480,73 a título de perda dos valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio e ressarcimento do dano ao erário e ao pagamento de R$ 43.442,19 a título de multa civil e decretar, em relação a ele, a suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 8 anos, a proibição de o réu contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 10 anos e a perda do cargo público;

(b) condenar Cássio André Predebon ao pagamento de R$ 14.480,73 a título de perda dos valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio e ressarcimento de dano ao erário e ao pagamento de R$ 43.442,19 a título de multa civil e decretar, em relação a ele, a suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 8 anos, a proibição de o réu contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 10 anos e a perda de eventual cargo público;

O valor da condenação deverá continuar a ser corrigido pelo INPC a partir da publicação desta decisão e acrescido de juros de 1% ao mês desde o trânsito em julgado.

Mantenho a ordem de indisponibilidade, a qual todavia, fica restrita aos valores da condenação. Por outro lado, determino que o cartório, antes de qualquer outra providência e independentemente do trânsito em julgado, registre a indisponibilidade no Cadastro Nacional de Indisponibilidade e realize nova tentativa de indisponibilidade via BACENJUD.

Despesas pelos réus.

Sem honorários (Evento 160, em 1º grau).

Os recorrentes, em preliminar, apontam a nulidade da sentença em razão da suspeição do Juiz Direito por possuir opinião formada em relação a Deonir Luiz Ferronato. Adiante, arguem vício no pronunciamento judicial por ter ele incorrido em julgamento ultra petita. No mérito, defendem que, se o acréscimo ilícito foi de R$ 14.480,73, e de forma solidária, não há como se condenar os apelantes de forma individual, culminando com o pagamento do dobro da quantia. Quanto à questão de fundo, asseveram que não houve irregularidades nos contratos questionados, e, não bastasse, o próprio Ministério Público em suas alegações finais reconhecer não ter ocorrido dano ao erário ou enriquecimento ilícito. No ponto, esclarecem que os serviços foram prestados pela empresa CONNECT, tanto na atividade de recuperação de crédito quanto na assessoria jurídica, resultando num benefício de mais de R$ 200.000,00. Outrossim, dizem que entre a exoneração do cargo de assessor jurídico e a licitação para contratação de serviços jurídicos, o apelante Cássio passou a prestar serviços de recuperação tributária ao Município pela empresa CONNECT, tendo, em face da ausência de outro profissional jurídico nomeado ou contratado naquele período, assinado parecer jurídico que se limitava a dizer que a espécie de licitação convite se amoldava ao valor licitado, e, sem qualquer favorecimento, já que o edital era público e as propostas de menor preço foram recebidas, analisadas e deslacradas pela Comissão de Licitação. Destacam, ainda, que a própria sentença reconhece que não houve fraude ou direcionamento no processo licitatório que resultou na celebração do Contrato n. 53/2008 e que os serviços foram efetivamente prestados pela empresa. Por fim, requerem a improcedência do pedido ou, se assim não se entender, pela retirada do bloqueio de bens, exclusão da pena de suspensão dos direitos políticos e perda do cargo público, redução da multa civil, exclusão da pena de proibição de contratar com o Poder Público, e adequação dos índices de correção monetária e juros (Evento 176, em 1º grau).

Contrarrazões regularmente apresentadas (Evento 186, em 1º grau).

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer exarado pelo Excelentíssimo Senhor Rogê Macedo Neves, pelo conhecimento e desprovimento do reexame necessário e pelo conhecimento e parcial provimento do recurso de apelação interposto por Deonir Luiz Ferronato e Cássio André Predebon, para tão somente reconhecer a responsabilidade solidária dos réus ao pagamento de R$ 14.480,73, correspondente à quantia acrescida ilicitamente ao patrimônio desse, em prejuízo ao erário (Evento 8, em 2º grau).

O feito foi sobrestado em razão do Tema 1.042/STJ (Evento 10, em 2º grau).

Em face da entrada em vigor da Lei n. 14.230/2011, determinou-se intimação das partes para manifestação (Evento 19, em 2º grau).

O apelado veio aos autos, oportunidade em que defendeu a irretroatividade dos preceitos estabelecidos pela Lei n. 14.230/2021 aos fatos sob julgamento, sob pena de grave retrocesso à proteção do direito fundamental à probidade administrativa, com violação ao regime constitucional e convencional acerca da matéria (Evento 23, em 2º grau).

Os apelados, por sua vez, reiteraram o pedido de improcedência (Evento 28, em 2º grau).

Após nova vista, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer exarado pelo Excelentíssimo Senhor Rogê Macedo Neves, manifestou-se pela não aplicação das alterações trazidas pela Lei n. 14.230/2021 ao caso dos autos. No mais, reiterou o parecer já lançado (Evento 31, em 2º grau).

VOTO

1. Na primeira preliminar, os apelantes apontam a suspeição do Juiz de Direito que proferiu a sentença recorrida.

Para tanto, entendem que o magistrado teria demonstrado ter "opinião pessoal formada à respeito do réu Deonir Luiz Ferronatto na sentença emanada nos autos do processo nº 0900014-18.2016.8.24.0013". Também dizem que "antecipou sua decisão e anseio condenatório/punitivo no presente processo, ao sentenciar em processo distinto" (0900013-33.2016.8.24.0013). Por fim, afirmam que Sua Excelência "utilizou fatos de relatados em outros processos, o quais não foram mencionados na fase probatória deste, prejudicando a defesa".

Sem razão.

Com efeito, segundo art. 145, IV, do CPC, há suspeição do juiz interessado no julgamento do processo em favor da qualquer das partes:

Art. 145. Há suspeição do juiz:

I - amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados;

II - que receber presentes de pessoas que tiverem interesse na causa antes ou depois de iniciado o processo, que aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa ou que subministrar meios para atender às despesas do litígio;

III - quando qualquer das partes for sua credora ou devedora, de seu cônjuge ou companheiro ou de parentes destes, em linha reta até o terceiro grau, inclusive;

IV - interessado no julgamento do processo em favor de qualquer das partes.

Conforme doutrina, "as exceções instrumentais de impedimento e suspeição são as formas estabelecidas em lei para afastar o juiz da causa, por lhe faltar capacidade subjetiva ou compatibilidade, que é pressuposto processual subjetivo referente ao juiz. [...] A imparcialidade é requisito processual de validade; portanto, o ato do juiz parcial é ato que pode ser invalidado" (Fredie Didier Junior. Curso de Direito Processual Civil. Teoria geral do processo e processo de conhecimento. v.1. 8ª ed. Salvador: Podivm, 2007, p. 458-459).

Humberto Theodoro Júnior ensina que, "por importar afastamento do magistrado do exercício da jurisdição e envolver matéria de ordem moral e de alta relevância, que pode afligir a pessoa do suspeitado e suscitar até menosprezo à própria dignidade da Justiça para acolhimento da exceção de suspeição 'é indispensável prova induvidosa'" (Humberto Theodoro Júnior, in Curso de Direito Processual Civil, Rio de Janeiro : Forense, 1998, p. 387).

Este Tribunal de Justiça, mutatis mutandi, reconhece que apenas a conduta inteiramente injustificada na condução de um processo, em tese, poderia ser cogitada como parcialidade do julgador:

Não demonstrado, por meio da prova produzida pelo excipiente, a existência de relação de amizade entre a parte e o magistrado (muito menos de forma íntima) ou a alegada ocorrência de demora injustificada na prestação jurisdicional, impossível falar em parcialidade do julgador, sendo mister a rejeição da exceptio apresentada. (TJSC, 3ª Cam. de Direito Civil, rel. Des. Henry Petry Jr, Exceção de Suspeição n. 2009.030273-6, de Urubici, j. 24/9/2009).

No caso, o Juiz de Direito efetivamente decidiu outras ações de improbidade administrativa movidas em face do apelante Deonir Luiz Ferronato. Porém, essa circunstância nem de longe podem implicar na demonstração de suspeição do julgador.

Ora, não é qualquer decisão do magistrado tomada no curso de algum processo que pode ser considerada como prejulgamento da causa e, por consequência, fazer transparecer qualquer espécie de parcialidade.

A respeito, colhe-se deste Tribunal de Justiça:

EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO DE MAGISTRADO. INCONFORMISMO DA PARTE COM ATOS PRATICADOS NA CONDUÇÃO DO FEITO. SITUAÇÃO FÁTICA, TODAVIA, NÃO-ENQUADRÁVEL NAS HIPÓTESES TIPIFICADAS. IMPROCEDÊNCIA. Não é de reputar-se suspeito o Magistrado pelo só fato de haver tomado posições e proferido decisões cujo conteúdo descontentou o excipiente, dado que isso não se presta para tipificar a suspeição delineada no Código de Processo Civil (Exceção de Suspeição n. 0019756-93.2016.8.24.0000, de Fraiburgo, rel. Des. João Henrique Blasi, j. 17-5-2016 - grifou-se).

EXCEÇÃO...

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