Acórdão Nº 0900015-07.2013.8.24.0078 do Terceira Câmara de Direito Público, 24-11-2020

Número do processo0900015-07.2013.8.24.0078
Data24 Novembro 2020
Tribunal de OrigemUrussanga
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0900015-07.2013.8.24.0078, de Urussanga

Relator: Desembargador Júlio César Knoll

APELAÇÃO CÍVEL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. EXTINÇÃO NA ORIGEM. IRRESIGNAÇÃO DO ENTE FEDERATIVO. ITCMD. CONTRATO ADMINISTRATIVO. CESSÃO DE DIREITO REAL DE USO DE IMÓVEL DE ÁREA INDUSTRIAL. POSTERIOR RESCISÃO DO AJUSTE PELO DESCUMPRIMENTO POR PARTE DO CESSIONÁRIO. IRRELEVÂNCIA. NATUREZA JURÍDICA DA TRANSMISSÃO DE DIREITOS REAIS. DISTINÇÃO DO TERMO DE DOAÇÃO, QUE SE PERFECTIBILIZA COM A TRANSFERÊNCIA DE PROPRIEDADE. DESNECESSIDADE. INCIDÊNCIA DO TRIBUTO QUE SE CONFIGURA COM A CELEBRAÇÃO DO TERMO. FATO GERADOR CONFIGURADO. HIGIDEZ DO TÍTULO EXECUTIVO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA CASSADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROCESSAMENTO.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0900015-07.2013.8.24.0078, da comarca de Urussanga 2ª Vara em que é Apelante Estado de Santa Catarina e Apelado Comércio de Reciclados Eva Ltda.

A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por meio eletrônico, por unanimidade, conhecer do recurso interposto pelo Estado de Santa Catarina e dar-lhe provimento, a fim de cassar a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para regular processamento. Custas na forma da lei.

O julgamento, realizado no dia 24 de novembro de 2020, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Júlio César Knoll, e dele participaram os Exmos. Srs. Desembargadores Paulo Ricardo Bruschi e Jaime Ramos.

Funcionou como representante do Ministério Público o Dr. César Augusto Grubba.

Florianópolis, 24 de novembro de 2020.


Desembargador Júlio César Knoll

Relator


RELATÓRIO

Perante a Vara de Execuções Fiscais da comarca de Urussanga, o Estado de Santa Catarina, pessoa jurídica de direito público interno, devidamente qualificada, mediante procuradores habilitados, fulcrado nos permissivos legais, ajuizou Ação de Execução Fiscal, em desfavor de Comércio de Reciclados Eva Ltda.

A Fazenda Pública Estadual visava à cobrança de Imposto Sobre a Transmissão Causa Mortis e Doações, que alcançava o montante de R$ 8.271,04 (oito mil, duzentos e setenta e um reais e quatro centavos).

Devidamente citado, o devedor compareceu ao feito e apresentou exceção de pré-executividade. (fls. 14/18)

Houve impugnação às fls. 41/50.

A execução foi suspensa diante da informação de parcelamento do débito. (fls. 51)

Ato contínuo, sobreveio sentença de lavra do MM. Juiz de Direito, Dr. Roque Lopedote, acolhendo a exceção de pré-executividade para extinguir o feito, reconhecendo a inexigibilidade do crédito tributário.

Irresignado, a tempo e modo, o Estado de Santa Catarina interpôs recurso de apelação.

Em suas razões recursais, sustentou que o "contrato administrativo efetiva-se quando a Administração Pública transfere o uso de terreno público a particular, como direito real resolúvel, para fins específicos de urbanização, industrialização, edificação, cultivo ou qualquer outra exploração de interesse social".

Desta forma, como a concessão de uso de bem imóvel foi realizada no ano de 2008, com assinatura do respectivo contrato de doação, subsume-se ao preceito legal caracterizador do ITCMD, nos termos do art. 2º da Lei n. 13.136/04, motivo pelo qual a sentença comporta reforma, a fim de que seja retomada a marcha processual do feito executivo.

Com as contrarrazões às fls. 83/87, os autos ascenderam a esta Corte de Justiça e vieram conclusos em 07/11/2019.

Este é o relatório.





VOTO

A insurgência voluntária apresentou-se tempestiva e satisfez os demais pressupostos de admissibilidade, motivo pelo qual merece ser conhecida.

Cuida-se de recurso de apelação, interposto pelo Estado de Santa Catarina, contra sentença que, nos autos da Execução Fiscal, promovida em face de Comércio de Reciclados Eva Ltda, acolheu a exceção de pré-executividade e extinguiu o feito.

O ente federativo visava à cobrança de "saldo do termo de parcelamento n. 91100004001, que se refere a DIE ITCMD de doação n. 909200000254, enviada à Fazenda Estadual em 13/01/2009".

O débito origina-se de um contrato de concessão de direito real de uso dos imóveis de matrícula n. 23.604 e 23.605 do Registro de Imóveis de Urussanga, firmado entre o executado e a Municipalidade, em 12/12/2008.

Extrai-se do contrato n. 83/08, de 12/12/2008, ajustado entre Município de Cocal do Sul e Comércio de Reciclados Eva Ltda, que as partes acordaram a concessão de direito real de uso de dois imóveis cadastrados nas matrículas n. 23.604 e 23.605 no Cartório de Registro de Imóveis da comarca de Urussanga.

Posteriormente, alegando descumprimento das "exigências contidas na Lei 1.053, de 25 de maio de 2011 c/c a Lei 590, de 15 de agosto de 2003", a Municipalidade publicou Decreto de n. 431/11, de 14/12/2011, rescindindo o contrato e revertendo os imóveis ao patrimônio público.

O magistrado de origem considerou que, como o referido pacto foi rescindido por iniciativa da Administração Pública Municipal, antes do efetivo uso do imóvel por parte do cessionário, não houve ocorrência de fato gerador na hipótese, razão pela qual extinguiu o feito.

Pois bem. A incidência do ITCMD é preconizada pela Lei Estadual n. 13.136, de 25 de novembro de 2004 , que assim dispõe:

Art. 2º O imposto de que trata o art. 1º desta Lei, tem como fato gerador a transmissão causa mortis ou a doação a qualquer título, de:

I - propriedade ou domínio útil de bem imóvel;

II - direitos reais sobre bens móveis e imóveis; e

III - bens móveis, inclusive semoventes, direitos, títulos e créditos.

§ 1º Para efeitos deste artigo, considera-se doação qualquer ato ou fato, não oneroso, que importe ou se resolva em transmissão de quaisquer bens ou direitos.

§ 2º Nas transmissões causa mortis e nas doações ocorrem tantos fatos geradores quantos forem os herdeiros, legatários ou donatários.


O Código Tributário Nacional, por seu turno, acerca do referido tributo, assim dispõe:

Art. 35. O imposto, de competência dos Estados, sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos tem como fato gerador:

I - a transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis por natureza ou por acessão física, como definidos na lei civil;

II - a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os direitos reais de garantia;

III - a cessão de direitos relativos às transmissões referidas nos incisos I e II.

Parágrafo único. Nas transmissões causa mortis, ocorrem tantos fatos geradores distintos quantos sejam os herdeiros ou legatários.


O Código Civil, em seu art, 538, conceitua a doação como um "contrato em que pessoa, por liberalidade, transfere seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra".

Destarte, a lei civil também define a forma como se dá a transmissão de bem imóvel, a saber:

Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.

§ 1 o Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.

§ 2 o Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do imóvel.


A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça há muito adota este mesmo entendimento, veja-se:

TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ITCMD. DOAÇÃO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO.

PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. DECISÃO JUDICIAL ANULATÓRIA DO ACORDO JUDICIAL QUE ENSEJOU O RECOLHIMENTO. ART. 165, II, DO CTN.

1. Recurso especial no qual se discute o termo inicial da prescrição para a ação de repetição de indébito de imposto sobre a transmissão de bem imóvel mediante doação (ITCMD). No presente caso, o contribuinte, em face de acordo de separação judicial, prometeu doar a nu-propriedade de bem imóvel às filhas, e, para isso, recolheu, em 29/12/98, o imposto de transmissão correspondente. Todavia, em face de ação proposta pela ex-esposa, a aludida promessa de doação foi declarada ineficaz, por decisão transitada em julgado em 8/8/02 (com consequente registro imobiliário do bem em nome da ex-esposa), o que motivou o recorrente a pedir a repetição de indébito administrativamente em 17/11/06, a qual foi negada em 30/7/07, dando ensejo a presente demanda judicial, ajuizada em 15/8/07.

2. O fato gerador do imposto de transmissão (art. 35, I, do CTN) é a transferência da propriedade imobiliária, que somente se opera mediante o registro do negócio jurídico junto ao ofício competente. Nesse sentido, acerca do ITBI, já decidiu o STJ: REsp 771.781/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ 29/06/07; AgRg no AgRg no REsp 764.808/MG, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 12/04/07.

3. O recolhimento do ITCMD, via de regra, ocorre antes da realização do fato gerador, porquanto o prévio pagamento do imposto é, normalmente, exigido como condição para o registro da transmissão do domínio. Assim, no presente caso, não é possível afirmar que o pagamento antecipado pelo contribuinte, ao tempo de seu recolhimento, foi indevido, porquanto realizado para satisfazer requisito indispensável para o cumprimento da promessa de doação declarada em acordo de separação judicial.

4. Considerando, portanto, que é devido o recolhimento antecipado do ITCMD para fins de consecução do fato gerador, não se mostra possível a aplicação do art. 168, I, do CTN, porquanto esse dispositivo dispõe sobre o direito de ação para reaver tributo não devido.

5. Deve, portanto, na espécie, ser prestigiado o entendimento adotado pelo acórdão a quo, no sentido de que o direito de ação para o contribuinte reaver a exação recolhida...

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