Acórdão Nº 0900015-20.2019.8.24.0038 do Primeira Câmara Criminal, 27-07-2023

Número do processo0900015-20.2019.8.24.0038
Data27 Julho 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0900015-20.2019.8.24.0038/SC



RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO


APELANTE: ALIANE MARIA PEREIRA MARCOSKI (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na 2ª Vara Criminal da Comarca de Joinville, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de Aliane Maria Pereira Marcoski pelo cometimento, em tese, do crime de apropriação indébita tributária (art. 2ª, II, da lei 8.137/90), em continuidade delitiva por 9 (nove) vezes (art. 71 do Código Penal) em razão dos fatos assim narrados na peça acusatória (evento 1 dos autos principais):
"[...] A denunciada, na condição de titular de 'FRIOVILLE COMÉRCIO VAREJISTA DE PEÇAS E ACESSÓRIOS PARA APARELHOS ELETRÔNICOS EIRELI EPP.', CNPJ n. 06.063.197/0001-94 e Inscrição Estadual n. 25.469.827-1, estabelecida na Rua Doutor João Colin, n. 1588, Bairro América, em Joinville, deixou de efetuar, no prazo legal, o recolhimento de R$ 187.865,81 (cento e oitenta e sete mil oitocentos e sessenta e cinco reais e oitenta e um centavos) a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS cobrado de consumidores, locupletando-se ilicitamente mediante este tipo de apropriação de valores em prejuízo ao Estado de Santa Catarina, conforme declarado pelo sujeito passivo da obrigação nas DIMEs (Declarações do ICMS e do Movimento Econômico) dos meses de janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto e setembro de 2016, documentos geradores da Dívida Ativa n. 17001482623, de 28/04/2017.
É de se registrar que o débito da dívida ativa supramencionada foi objeto do Parcelamento n. 181100013735, o qual foi cancelado por inadimplemento, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional no período de 23/01/2018 a 31/08/2018, conforme preceitua o §2º do art. 83 da Lei n. 9.430/96, com nova redação dada pelo art. 6º da Lei n. 12.382/11 [...]".
Encerrada a instrução e apresentadas alegações finais pelas partes, sobreveio a sentença com o seguinte dispositivo (evento 111):
"[...] Em face do que foi dito, julgo procedente a denúncia para condenar ALIANE MARIA PEREIRA MARCOSKI ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 10 (dez) meses de detenção, em regime aberto (art. 33, § 2º, "c" do CP), além do pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, cada qual no valor mínimo legal (art. 49, § 1º do CP), por infração ao art. 2º, II da Lei nº 8137/90, por 09 vezes, em continuidade delitiva (art. 71, caput, do CP).
Custas pela acusada (CPP, art. 804).
Substituo a pena por restritiva de direito, nos termos da fundamentação.
Permito o recurso em liberdade (art. 387, § 1º, do CPP), já que, para além da incompatibilidade da custódia com a reprimenda aplicada, "segundo o entendimento desta Corte, aquele que respondeu solto à ação penal assim deve permanecer após a condenação em primeira instância, se ausentes novos elementos que justifiquem a alteração de sua situação" (STJ, HC nº 384831/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Transitada em julgado, lance-se o nome da ré no rol dos culpados, comunique-se à CGJ e à Justiça Eleitoral, efetue-se o cálculo e intimação para pagamento das custas e da pena de multa (art. 381 do CNCGJ), aguardando-se no último caso pela execução ministerial no prazo de noventa dias (v. Circular nº 121/2020 da CGJ), forme-se o processo de execução (art. 1º da Resolução nº 113/2010 do CNJ) e remeta-se ao r. juízo competente (art. 147 da LEP).
Em seguida, arquivem-se [...]".
Inconformada, a defesa interpôs recurso de apelação, nos termos do artigo 600 do Código de Processo Penal, pugnando, em suas razões recursais (evento 123), pela absolvição da ré baseada nos argumentos de atipicidade da conduta praticada, ausência de dolo específico, além de contumácia e dolo de apropriação e, por fim, excludente de culpabilidade diante da crise financeira sofrida pela empresa na época dos fatos.
Contrarrazões da acusação pela manutenção incólume da sentença recorrida (evento 127).
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Humberto Francisco Scharf Vieira, que se manifestou pela extinção da pretensão punitiva do Estado mediante a ocorrência de prescrição (evento 15 dos autos apelatórios).
Este é o relatório

VOTO


Trata-se de recurso de apelação interposto pela defesa em face de sentença proferida pela 2ª Vara Criminal da Comarca de Joinville que, julgando procedente a pretensão acusatória, condenou Aliane Maria Pereira Marcoski ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 10 (dez) meses de detenção, em regime inicial aberto, com o pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, fixados na razão mínima legal, por infração ao previsto no art. 2º, II, da Lei 8137/90, em continuidade delitiva por 9 vezes, nos termos do art. 71 do Código Penal.

1. Dos fatos sob recurso.
Conforme contido no incluso caderno processual, Aliane Maria Pereira Marcoski, na condição de sócia-administradora da empresa "Frioville Comércio Varejista de Peças e Acessórios para Aparelhos Eletrônicos EIRELI", sob o CNPJ n. 06.063.197/0001-94 e Inscrição Estadual n. 25.469.827-1, estabelecida no endereço Rua Doutor João Colin, n. 1588, Bairro América, município e comarca de Joinville, deixou de repassar aos cofres públicos, nos meses de janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto e setembro de 2016, o equivalente ao montante de R$ 187.865,81 (cento e oitenta e sete mil oitocentos e sessenta e cinco reais e oitenta e um centavos) à título de Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS, devidamente cobrados de seus consumidores e subscritos nas Declarações do ICMS e do Movimento Econômico - DIMEs prestadas ao fisco estadual, conforme Termo de Inscrição em Dívida Ativa n. 17001482623, de 28/04/2017.

2. Da admissibilidade recursal.
Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso e passo ao exame dos pleitos recursais.

3. Da prescrição.
A Procuradoria-Geral de Justiça, em seu parecer juntado no evento 15 destes autos apelatórios, suscitou a ocorrência de prescrição no presente caso.
No entanto, percebe-se que, considerando a pena em concreto imposta à apelante (10 meses de detenção - evento 111 dos autos principais), a prescrição da pretensão punitiva do Estado ocorreria em 3 (três) anos, nos termos do inc. VI do art. 109 do Código Penal.
Dos autos se colhe que a denúncia foi recebida em 18/3/2019 (evento 2).
Por seu turno, em 18/12/2019, houve a determinação da citação editalícia da acusada (evento 34), a qual ocorreu em 22/1/2020 (evento 38), sendo que em 23/2/2020, houve decisão de suspensão do prazo prescricional (evento 47), o qual voltou a correr com o comparecimento espontâneo da acusada em cartório, havido em 3/4/2023 (evento 54), conforme decisão do evento 57.
Assim, considerando que entre o recebimento da denúncia e a suspensão do prazo pela citação editalícia transcorreram cerca de 10 (dez) meses, e entre o retorno do curso do prazo prescricional até a sentença (publicada em 29/5/2023 - vide evento 111) transcorreram pouco mais de 1 (um) mês, não restou transcorrido o prazo prescribente de 3 (três) anos previsto para o caso.
Dessa forma, não há que se falar em extinção da punibilidade.

4. Do mérito recursal.
4.1 Do pleito absolutório.
Conforme consta das razões recursais defensivas, pretende a apelante a sua absolvição baseada nas alegações de (1) atipicidade da conduta praticada, sob o argumento de que o ato configurou um mero inadimplemento fiscal, bem como (2) ausência de dolo específico na conduta praticada, além de inexistência de prova da contumácia delitiva e do dolo de apropriação, (3) ocorrência da excludente de culpabilidade, tendo em vista a grave crise financeira enfrentada pela empresa na época dos fatos.
Assim, restando incontroversa a caracterização da materialidade e autoria delitivas, inexistindo, por seu turno, vícios que devessem ser sanados de ofício, ficam mantidas, nesse sentido, as conclusões exaradas pelo juízo a quo, de modo que passo a analisar apenas as teses aventadas e conhecidas.
Salienta-se que tal proceder encontra amparo no princípio do tantum devolutum quantum appellatum, o qual norteia o âmbito de cognição dos recursos no processo penal, não podendo o julgador agir de ofício para exercer atividade sem ter sido provocado, sob pena de proferir decisório ultra ou extra petita, ressalvadas as hipóteses de equívoco material e/ou flagrante ilegalidade, as quais não se verificam nos autos sob análise.
No mais, não obstante os combativos argumentos lançados pela defesa, imerece acolhida o pleito absolutório, por qualquer dos argumentos expendidos.
Primeiramente, acerca da alegada atipicidade da conduta relativa ao delito de apropriação indébita tributária suscitada pela defesa, sabido é que tal controvérsia se encontra devidamente superada vez devidamente firmado entendimento pela Corte da Cidadania acerca da tipicidade da conduta em questão, que assim decidiu:
"HABEAS CORPUS. NÃO RECOLHIMENTO DE ICMS POR MESES SEGUIDOS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA TRIBUTÁRIA. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. DECLARAÇÃO PELO RÉU DO IMPOSTO DEVIDO EM GUIAS PRÓPRIAS. IRRELEVÂNCIA PARA A CONFIGURAÇÃO DO DELITO. TERMOS 'DESCONTADO E COBRADO'. ABRANGÊNCIA....

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