Acórdão Nº 0900015-41.2017.8.24.0086 do Quinta Câmara Criminal, 08-04-2021

Número do processo0900015-41.2017.8.24.0086
Data08 Abril 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0900015-41.2017.8.24.0086/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ NERI OLIVEIRA DE SOUZA

APELANTE: JOAO MARIA ALVES MOTA (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Otacílio Costa, o representante do Ministério Público ofereceu denúncia contra João Maria Alves Mota, dando-o como incurso nas sanções do artigo 2º, inciso II, da Lei n. 8.137/90, por duas vezes, nos moldes dos artigos 69 e 71 do Código Penal, conforme os seguintes fatos descritos na inicial acusatória, in verbis (Evento 1, Petição 1):

"Inicialmente, cumpre esclarecer que o denunciado João Maria Alves Mota era, ao tempo dos fatos narrados na denúncia, empresário individual do estabelecimento comercial João Maria Alves Mota Eireli EPP (conforme cláusula quinta, fl. 09), empresa esta estabelecida na Avenida Roberto Henckemaier, nº 65, sala 02, Centro, Palmeira-SC, tendo por objeto social "comércio varejista de madeira e artefatos; transporte rodoviário de cargas, intermunicipal, interestadual e internacional; serviços de manutenção e reparação mecânica de veículos automotores e serviços florestais" (fl. 09).

Administrando a empresa citada, o denunciado João Maria Alves Mota tinha ciência e controle das transações e negócios realizados bem como responsabilidade legal pela apuração e recolhimento do ICMS devido, possuindo, assim, domínio integral do fato e responsabilidade pelo seu resultado, sendo, ainda, como sócio e administrador, o principal beneficiado dos lucros da atividade empresarial.

Nessa qualidade, o denunciado deixou de recolher, no prazo legal (10º dia do mês seguinte ao mês de apuração, conforme artigo 60 do Regulamento do ICMS/SC), o ICMS referente aos meses de Setembro e Novembro de 2015, apropriando-se, dessa forma, de valores recolhidos por terceiros e que deveriam ser entregues ao Estado de Santa Catarina, destinatário final do tributo.

Por tais infrações fiscais e penais, lavrou-se contra a citada empresa o termo de inscrição em dívida ativa n. 16002608932 (R$ 35.871,49), com a apuração do imposto devido, multa fiscal e juros de mora, montante este que até a presente data não foi devolvido ao Fisco.

As apropriações realizadas pelo denunciado João Maria Alves Mota podem ser delineadas conforme a tabela abaixo, tomando por parâmetro o período de apuração e a data limite para repasse do montante recebido ao Fisco:

[...]

As infrações fiscais foram apuradas através da análise das Declaração de ICMS e do Movimento Econômico - DIMEs - fornecidas pelo próprio contribuinte, elementos estes trazidos às fls. 10/13 dos autos.

O termo de inscrição em dívida ativa objeto desta, lavrado pelo fisco, e que respalda a materialidade da presente denúncia, indica, pelo ICMS declarado pelo denunciado, a criminosa e continuada apropriação do total de R$ 27.683,29 (Vinte e sete mil, seiscentos e oitenta e três reais e vinte e nove centavos) do ICMS que deveria ser recolhido aos cofres públicos nos períodos acima mencionados, isso em valores históricos, os quais importavam, com os acréscimos legais decorrentes de correção monetária, multa fiscal e juros, à época da emissão do termo de inscrição em dívida ativa de fl. 04, o total de R$ 35.871,49 (trinta e cinco mil, oitocentos e setenta e um reais e quarenta e nove centavos).

Tal valor, em data atual, conforme consulta realizada no SAT em 15/02/2017, registrava o montante da dívida tributária em R$ 37.706,89 (trinta e sete mil, setecentos e seis reais e oitenta e nove centavos),

descontadas frações de parcelamento eventualmente realizado, conforme atualização do débito de fl. 27.

Assim, o denunciado João Maria Alves Mota, deliberadamente e com o propósito de locupletar-se ilicitamente em prejuízo do Estado de Santa Catarina, deixou de recolher no prazo legal valor de tributo cobrado na qualidade de sujeito passivo da obrigação, o que caracteriza o crime previsto no art. 2º, II, da Lei nº 8.137/1990, conduta esta que foi praticada por 02 (duas) vezes, uma para cada período de apuração, cuja consumação ocorreu no prazo de vencimento citado".

Encerrada a instrução, o magistrado a quo proferiu sentença julgando procedente a denúncia, nos seguintes termos (Evento 86, Sentença 110):

"3. Isto posto, julgo PROCEDENTE a denúncia para, em consequência, CONDENAR João Maria Alves Mota à pena de 7 meses de detenção, a ser cumprida no regime aberto, e 11 dias-multa, no valor individual de 1/30 do salário mínimo vigente na época dos fatos, substituída a pena privativa de liberdade por uma alternativa, conforme consta acima, por infração ao art. 2º, inciso II, da Lei nº 8.137/90, na forma do art. 71, do Código Penal".

Irresignado, o acusado interpôs recurso de apelação por intermédio de defensor constituído. Nas razões recursais requereu a absolvição do apelante ante a nulidade da sentença por ausência de fundamentação necessária em promover o édito condenatório, violando preceitos constitucionais do art. 93, inciso IX, da Carta Magna; bem como pelo reconhecimento da inexigibilidade de conduta diversa e do erro de proibição (Evento 116).

Em contrarrazões, o Mistério Público manifestou-se pelo desprovimento do recurso (Evento 121).

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Rogério A. da Luz Bertoncini, opinando pelo parcial conhecimento e desprovimento do recurso interposto. (Evento 12 destes autos).

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conhece-se dos recursos e, à luz do princípio tantum devolutum quantum apellatum, passo a analisar unicamente as insurgências deduzidas.

1. Inicialmente, a defesa suscita que a sentença é nula, pois ausente fundamentação necessária que respalde a condenação, violando o magistrado singular o disposto no art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, porquanto não houve correta apreciação das teses suscitadas por ocasião das alegações finais (inexigibilidade de conduta diversa e do erro de proibição).

A insurgência não merece provimento.

Júlio Fabbrini Mirabete ensina que toda sentença deve ser completa, portanto, "é nula se o juiz deixar de examinar toda a matéria articulada ou de considerar todos os fatos articulados na denúncia contra o réu (sentença citra petita). Da mesma forma, é eivada de nulidade a sentença que não responde às alegações da defesa, seja de mérito, seja de preliminares argüida oportunamente". (Código de Processo Penal interpretado. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 970).

Todavia, sabe-se que não é obrigação do magistrado responder todas as alegações das partes, especialmente quando já tenha encontrado motivos suficientes para fundamentar a decisão, a teor do disposto no art. 93, IX, da Constituição Federal. Nesse sentido, vide: Embargos de Declaração n. 0004455-20.2014.8.24.0019, rel. Des. Carlos Alberto Civinski, j. 29-11-2018; Embargos de Declaração n. 0001531-38.2009.8.24.0075, rel. Des. Júlio César M. Ferreira de Melo, j. 14-12-2017.

E foi isso que aconteceu no decisum.

A corroborar, extrai-se fragmentos da sentença condenatória, a qual possui a fundamentação necessária para a formação da convicção do julgador na condenação do apelante pelo crime descrito no art. 2, inciso II, da Lei 8.137/90, ante a ponderação das provas existentes nos autos, a qual demonstrou a ilicitude da conduta ao não recolher devidamente os tributos devidos ao fisco, contribuindo para o afastando da tese de ausência de dolo e da excludente da culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa, o que rechaça qualquer mácula ao art. 93, inciso IX, da Constituição Federal (Evento 86, Sentença 110):

"2.2. O crime de sonegação

2.2.1. A tipicidade

2.2.1.a.

O art. 2º, inciso II, da Lei 8.137/90 preconiza:

Art. 1º. Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: (...)

Art. 2° Constitui crime da mesma natureza: II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos;

Ainda que o ICMS seja imposto indireto, suportado pelo consumidor final (contribuinte de fato), cabe ao responsável tributário repassar o que é cobrado do consumidor por ocasião da aquisição do produto ao Fisco. A respeito, leciona Pedro Roberto Decomain:

[...]

Saliente-se ainda que a esfera penal não serve para dirimir conflitos acerca de erro de cálculo, mas sim para punir quem pratica a conduta típica definida em lei. Dessa feita, não há falar em revisão dos lançamentos efetuados para a apuração da existência ou não de saldo devedor de ICMS. Não é demais esclarecer que a persecução penal somente tem início com a constituição definitiva do crédito tributário, de modo que não demonstrado qualquer êxito obtido em esfera administrativa, apresenta-se a revisão absolutamente inoportuna na seara judicial. Para a caracterização do crime em comento basta o dolo genérico. Nesse sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

[...]

Eventual tese defensiva de que a ausência de pagamento de um tributo dentro do prazo de vencimento caracterizaria mero inadimplemento de uma obrigação tributária de natureza não criminal, a afastar o crime de sonegação fiscal, não deve prosperar. A conduta é típica, porquanto se subsume ao tipo penal positivado no art. 2º, II, da...

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