Acórdão Nº 0900015-65.2019.8.24.0023 do Quinta Câmara de Direito Público, 29-09-2022

Número do processo0900015-65.2019.8.24.0023
Data29 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão
Apelação / Remessa Necessária Nº 0900015-65.2019.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador HÉLIO DO VALLE PEREIRA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS (RÉU) E OUTRO INTERESSADO: DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DE SANTA CATARINA (INTERESSADO) INTERESSADO: AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA - ANEEL (INTERESSADO) INTERESSADO: TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4 REGIAO (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Adoto o relatório da sentença:

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA propôs ação civil pública com pedido liminar em face do MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS e da CELESC DISTRIBUIÇÃO S/A, requerendo:

2) a concessão de tutela antecipada, antes da citação, com supedâneo nos artigos 11 e 12, caput, da Lei 7.347/85, no artigo 14, IV, da Lei 6.938/81 e no artigo 300, §2º, do CPC, determinando-se:

2.1) que a CELESC se abstenha de realizar, no Município de Florianópolis, novas ligações de energia elétrica, sem prévia apresentação, pelo solicitante, de alvará de construção (para as ligações provisórias destinadas à execução de obras, e apenas pelo prazo máximo definido no alvará) ou de habite-se, bem como quando se tratar de parcelamento de solo clandestino ou irregular ou áreas de ocupação irregular, sob pena de multa de R$ 30.000,00 (trinta mil reais por ocorrência);

2.2) que o MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS se abstenha de emitir qualquer documento (certidões, ofícios, solicitações etc) à Concessionária ré CELESC que autorize a ligação de luz elétrica com respaldo na Lei Municipal 10.384/2018, exceto o alvará de construção (para as ligações provisórias destinadas à execução de obras, com prazo máximo definido no alvará), sob pena de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais por ocorrência);

[...]

5) a procedência dos pedidos, para tornar definitiva as medidas liminares, condenando-se:

5.1) a CELESC na obrigação de não fazer, se abstenha de realizar, no Município de Florianópolis, novas ligações de energia elétrica, sem prévia apresentação, pelo solicitante, de alvará de construção (para as ligações provisórias destinadas à execução de obras, e apenas pelo prazo máximo definido no alvará) ou de habite-se, bem como de praticar qualquer ato direcionado a instalar ou autorizar a instalação de rede de energia elétrica na hipótese de se tratar de parcelamento do solo clandestino ou irregular ou área de ocupação irregular;

5.2) o MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS na obrigação de não fazer no sentido de abster-se de emitir qualquer documento (certidões, ofícios, solicitações etc) à Concessionária ré CELESC que autorize a ligação de luz elétrica com respaldo na Lei Municipal 10.384/2018;

6) incidentalmente, a declaração da inconstitucionalidade e da ilegalidade da Lei Municipal 10.384/18 em face da violação à Constituição Federal (art. 30, inciso VIII e art. 182, caput), à Constituição Estadual (art.112, incisos VIII e IX, arts. 140 e 141), ao Estatuto da Cidade (art. 2º), à Lei Estadual 17.492/18 (art. 17, incisos II e III) e à Resolução ANEEL 414/2015 (art. 27, inciso II, alínea d); (e.1.1).

Os réus foram intimados para prestar informações (e.6), ocasião em que a Celesc defendeu a regularidade do procedimento de novas ligações de energia elétrica (e.64) e o Município de Florianópolis deixou de se manifestar (e.68).

A tutela de urgência foi deferida para o fim de determinar que: (a) a Celesc se abstenha de realizar novas ligações de energia elétrica sem prévia apresentação de regularidade da construção e (b) o Município de Florianópolis se abstenha de emitir qualquer documento à Celesc que autorize a ligação de luz com respaldo na Lei nº 10.384/2018 (e.71).

O Município de Florianópolis comunicou a interposição de agravo de instrumento (e.86).

O TJSC deu provimento em parte ao agravo de instrumento "para condicionar a incidência da Lei 10.384/18 tão somente ao procedimento disposto no art. 52, § 2º, da Resolução n. 414/2010 da ANEEL, quanto ao "atendimento de unidades consumidoras localizadas em assentamentos irregulares ocupados predominantemente por população de baixa renda"" (e.102).

A Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina requereu a habilitação no feito na condição de custos vulnerabilis (e.141).

A Celesc apresentou contestação, impugnando os argumentos da inicial, requerendo o chamamento da ANEEL para o polo passivo, a remessa dos autos para a Justiça Federal, a revogação da liminar, a revisão da liminar para permitir o fornecimento de energia elétrica de foram provisória a partir do protocolo do pedido do REURB e a improcedência dos pedidos (e.142).

O Município de Florianópolis contestou os pedidos, ratificando a legalidade da norma municipal. Por fim requereu a improcedência dos pedidos (e.143).

Houve réplica (e.148).

Intimados para indicarem as provas que pretendiam produzir(e.150), as partes informaram não ter interesse na produção de provas (e.155; e.158-160).

Intimados sobre o pedido de habilitação da Defensoria Pública (e.162), O Ministério Público se manifestou contrário ao pedido (e.166). O Município de Florianópolis não se opôs (e.179).

A Celesc formulou pedido de tutela de urgência para obter autorização para promover a ligação de energia elétrica às famílias que fizeram solicitação de REURB (e.178).

O pedido de habilitação da Defensoria Pública foi indeferido e determinada a intimação da União e da ANEEL sobre o interesse em intervir no feito (e.181).

A ANEEL informou não ter interesse em intervir no feito (e.199).

A Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina interpôs recurso de agravo de instrumento (e.201) e o TJSC deferiu, em parte, efeito suspensivo para "possibilitar a habilitação da Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina nos autos da ação civil pública enquanto custos vulnerabilis." (e.204).

Adito que os pedidos foram julgados parcialmente procedentes:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pedido inicial desta ação, proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA em face do MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS e da CELESC DISTRIBUIÇÃO S/A para o fim de:

a) DETERMINAR à Celesc que se abstenha de realizar, no Município de Florianópolis, novas ligações de energia elétrica, sem prévia apresentação, pelo solicitante, de alvará de construção (para as ligações provisórias destinadas à execução de obras, apenas pelo prazo máximo definido no alvará) ou "habite-se" expedidos pelo Município, bem como de praticar qualquer ato direcionado a instalar ou autorizar a instalação de rede de energia elétrica sem que haja comprovação que o empreendimento ou a edificação se mostrem regulares, sob pena de multa de R$ 30.000,00 por ocorrência, ressalvadas a excepcionalidade do art. 52 da Resolução da ANEEL nº 414/2010 e as situações em que o consumidor comprovou que deu entrada no pedido de regularização do imóvel pelas regras da REURB.

b) DETERMINAR ao Município de Florianópolis que se abstenha de emitir qualquer documento à Celesc que autorize a ligação de luz elétrica com respaldo exclusivamente na Lei Municipal nº 10.384/2018, exceto o alvará de construção (para as ligações provisórias destinadas à execução de obras, com prazo máximo definido no alvará), a excepcionalidade do art. 52 da Resolução da ANEEL nº 414/2010 e as situações em que o consumidor deu entrada no pedido de regularização do imóvel pelas regras da REURB, sob pena de multa de R$ 10.000,00 por ocorrência.

c) AUTORIZAR o fornecimento de energia elétrica os 41 solicitantes da Servidão Alaíde Silveira de Barcelos, condicionada ao cumprimento dos termos da REURB, no prazo de 30 dias a contar da publicação desta sentença.

Sem condenação no pagamento de taxa de serviços judiciais e sem honorários advocatícios (art. 18, Lei nº 7.347/85).

Por fim, DECLARO resolvido o mérito do processo, forte no art. 487, I, do CPC.

Sentença sujeita ao reexame necessário (CPC, art. 496).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

A Defensoria Pública apresentou aclaratórios, que foram desprovidos.

Na sequência, vieram apelos da Celesc e da Defensoria Pública.

A Celesc defende que é competência privativa da União legislar sobre energia elétrica, de modo que a legislação municipal é inconstitucional.

Destaca que a atual regulamentação da Aneel revogou a expressão "entre outras" presente na antiga legislação e condicionou, de forma expressa, apresentação de licença ou declaração emitida pelo órgão competente apenas para os casos de o imóvel estar localizado em "áreas protegidas pela legislação, tais como unidades de conservação, reservas legais, áreas de preservação permanente, territórios indígenas e quilombolas".

Defende, por fim, ser atribuição do Município e do próprio Ministério Público fiscalizar as construções clandestinas em áreas ambientalmente protegidas, sendo injusta a transferência de obrigações para si por conta da inércia dos entes públicos.

Requer que se julgue extinto o processo quanto a ela, reconhecendo-se a inconstitucionalidade formal da Lei Municipal 10.384/18. Subsidiariamente requer o reconhecimento de que a atual legislação suprimiu a expressão "entre outras", que justificava, no art. 27, inc. I, da Res. 414/10 da mesma autarquia, a exigência de alvará e habite-se, bem como a determinação para que se permita o fornecimento de energia elétrica, de forma provisória, a todas as hipóteses previstas no Art. 495 e seguintes da Resolução 1.000/21 da Aneel.

Em seu recurso, a Defensoria Pública argumenta que há incompetência absoluta da Justiça Estadual em processar e julgar o feito, uma vez que a demanda visa modificar sistema legal de regulação de serviço público federal.

Destaca ainda que não compete ao legislador municipal, muito menos ao Judiciário, condicionar o fornecimento de energia elétrica à apresentação de alvarás de construção ou de habite-se fornecidos pela Prefeitura Municipal a pretexto de regular o desenvolvimento urbano, uma vez que se trata de competência exclusiva da União para legislar sobre energia elétrica, consoante entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal quando do...

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