Acórdão Nº 0900022-25.2018.8.24.0045 do Segunda Câmara Criminal, 19-10-2021

Número do processo0900022-25.2018.8.24.0045
Data19 Outubro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0900022-25.2018.8.24.0045/SC

RELATOR: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: FABIO VENICIO VIEIRA (RÉU) ADVOGADO: HELIO BRESSANINI PEREIRA (OAB SC040323)

RELATÓRIO

Na Comarca de Palhoça, o Ministério Público ofereceu Denúncia contra Fábio Venício Vieira, dando-o como incurso nas sanções dos art. 344, caput, do Código Penal, em razão dos fatos assim descritos (Evento 8):

[...] Consta no procedimento investigatório criminal incluso que o denunciado FÁBIO VENICIO VIEIRA, na condição de Advogado constituído pelos réus Vanderlei Schvartz, Juarez Vieira Júnior e Júlio César Fausto Carvalho Paes, para exercício de defesa junto aos autos n. 0003924-45.2017.8.24.0045, coagiu a vítima Suli Sebastião dos Santos Júnior, ao procura-lo no interior do estabelecimento prisional em que estava recluso, para que favorecesse seus clientes com depoimento judicial inverídico a ser prestado em juízo.

Foi assim que, no dia 3 de agosto de 2017, por volta das 16h38min, o denunciado FÁBIO VENICIO VIEIRA se dirigiu até o parlatório da Penitenciária de Florianópolis, ocasião em que, usando de grave ameaça, com o fim de favorecer interesse alheio em juízo, ou seja, em favor dos seus clientes Vanderlei, Júlio e Juarez, após oferecer a Suli determinada quantia em dinheiro para que depusesse em favor deles, ameaçou-o dizendo para que assumisse o material entorpecente apreendido no caminhão, pois caso contrário sua companheira e filho sofreriam as consequências na rua. [...]

Encerrada a instrução, foi julgada improcedente a Exordial, para absolver Fábio Venício Vieira, da prática do delito previsto no art. 344, caput, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal (Evento 146).

Irresignado, o Ministério Público interpôs Recurso de Apelação, em cujas Razões (Evento 150) pugna pela reforma da decisão proferida na origem, com a condenação de Fábio Venício Vieira pela prática do crime de coação no curso do processo, por entender que restaram comprovadas a autoria e materialidade.

Apresentadas as Contrarrazões (Evento 162), a Defesa pleiteia a manutenção da decisão e a fixação de honorários advocatícios pela atuação neste grau de jurisdição, em seguida os autos ascenderam ao Segundo Grau, oportunidade em que a Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer de lavra do Exmo. Sr. Dr. Rui Arno Richter, manifestou-se pelo conhecimento e provimento do Apelo (Evento 12 - autos em Segundo Grau).

Este é o relatório.

VOTO

O Recurso merece ser conhecido, por próprio e tempestivo.

Do pleito condenatório

Busca o Ministério Público a condenação do Recorrido pela prática do crime de coação no curso do processo, por entender que as provas produzidas nos autos são suficientes à prolação do édito condenatório. Razão lhe assiste.

A prova da materialidade e da autoria restaram comprovadas por meio do Procedimento Investigatório Criminal n. 06.2017.8.24.00005868-1 (Evento 1), conversas de Whatsapp (Evento 1, INF25), prontuário do IPEN (Evento 102), que comprovam que o Apelado esteve, no dia 3 de agosto de 2017, no Presídio de Florianópolis, ocasião em que pessoalmente realizou visitação a Suli Sebastião dos Santos Júnior, além dos demais elementos de prova colhidos durante a instrução, especialmente as declarações do ofendido e sua esposa.

O ofendido Suli Sebastião dos Santos Júnior, ao ser ouvido no Procedimento Investigatório Criminal n. 06.2017.00005868-1, esclareceu:

[...] Estou preso desde 4 de julho de 2017. Primeiramente eu fui para a cadeia de prisão máxima né, que é isolamento, e depois eu fui para o COT. Atualmente eu estou no presídio público, na galeria B. Logo depois que fui preso, eu não tinha advogado que estava acompanhando. Eu vim a constituir uma semana, duas semanas depois, que a minha família constituiu um advogado para mim, era o Dr. Álvaro. Ele era o meu advogado, não tinha nenhum outro. Eu tinha assinado a procuração e tudo. Recebi a visita de outro advogado antes e depois de ter constituído o Dr. Álvaro. Primeiro ele apareceu e se identificou como advogado do Vanderlei, do Bruno e do Juarez, o nome dele é Fábio, o sobrenome eu não sei. Aí ele se identificou e se apresentou para mim como advogado do Juarez, do Vanderlei e do Bruno. Ele se identificou como advogado deles e veio me oferecer para ser meu advogado. No primeiro episódio a gente conversou no COT, a primeira conversa foi lá. Mas antes disso ele já tinha entrado em contato com a minha esposa, através de como ele conseguiu eu não sei. Ele andou ligando para ela, oferecendo dinheiro e dizendo que tinha conversado comigo já, e que ele ia advogar para mim, aí a minha esposa falou para ele que não né, que já tinha advogado. Ele estava oferecendo dinheiro para eu dar um depoimento para favorecer os outros investigados, no caso né, aqueles que eram clientes dele. A minha esposa disse que não havia necessidade, porque a minha mãe e ela já tinham requerido um outro advogado, que era o Dr. Álvaro, e que não havia necessidade. Quando eles tiveram essa conversa, o Dr. Álvaro já tinha sido contratado. Na primeira conversa ele foi falar para mim que ele queria que eu desse um depoimento, que ele queria que eu falasse que a droga era minha, que o caminhão era meu, que os clientes dele não iam ficar presos, que ele já tinha feito uns pedidos para os clientes dele saírem, que eles iam responder em liberdade, mas eu não, porque a droga tinha sido pega na minha casa, o caminhão estacionado na rua da minha casa também, e que o certo era eu ter assumido a droga toda no depoimento perante a juíza, no caso né. Mas na delegacia eu assumi. Aí ele pegou e me ameaçou né, primeiramente ele me ameaçou, falou que era para eu assumir perante o juiz no dia que eu fosse interrogado, porque senão ia ser complicado porque eu tinha a minha mulher e o meu filho na rua, ele falou com essas palavras. Aí eu me apavorei, chamei o chefe de segurança, inclusive até na hora ele falou para mim que iria pedir uma transferência para mim dali, ia me tirar dali, ou ia me levar junto com ele para o CTT, ou ia transferir nós tudo junto para o presídio público. O chefe de segurança ali era o senhor Carlos, e ele ouviu. Eu chamei "senhor Carlos, senhor Carlos, o senhor me tira daqui, que esse não é o meu advogado, o meu advogado é o Dr. Álvaro". Isso foi na segunda visita. Na primeira visita ele só me ofereceu dinheiro e foi embora, eu não aceitei. A primeira vez ele me ofereceu 4 mil reais, na segunda ele me ofereceu 100, que é mandado do Vanderlei. Para a minha esposa, os mesmos 4 mil da primeira. Na segunda vez ele me ofereceu 100, mas como eu disse que não pretendia no caso acolher a pretensão dele, que eu tinha uma família, eu falei para ele "não, eu tenho uma família", aí foi onde ele me ameaçou. Ele falou que era para mim falar perante o juízo que era tudo meu, porque senão a minha mulher e o meu filho estavam na rua e eles iam sofrer as consequências, ele falou isso. Foi quando eu chamei o Carlos e o assunto encerrou. Depois disso, eu nunca mais recebi visitas do Fábio. Ele já sabia que eu tinha advogado, porque eu tinha falado para ele, no começo da conversa eu tinha falado para ele. Eu achei estranho na hora que ele me chamou, porque eu conhecia ele já da delegacia, porque na delegacia ele foi já para defender eles né, foi onde eu não sei a conversa que eles tiveram ali e eles mandaram eu assumir tudo né, foi onde eu falei aquela história toda na delegacia para a Doutora lá. É essa questão da ameaça e das duas vezes que ele tentou me comprar né, me corromper [...]

Em Juízo, reafirmou o relato e acrescentou:

[...] (perguntas pelo Ministério Público) Nós fomos presos, porque veio os policiais lá na minha casa e deu o flagrante no caminhão que era do Vanderlei né, e foi preso todo mundo junto, eu, o Vanderlei, o Fábio, o Júlio e o Juarez, fomos todos presos né. Aí conforme depois foram passando os dias, que a gente foi para a Delegacia, depois nós fomos para o presídio da Capital de Florianópolis, o advogado deles veio procurando eu e também entrando em contato com a minha família para oferecer um suposto valor para fazer um acordo, pra mim poder assumir aquela droga, aquele entorpecente, o caminhão, o carro e as armas que tinha no caminhão. Esse advogado era o Dr. Fábio. No mesmo dia da prisão ele esteve na delegacia, quando a gente tava preso naquela celinha ali da delegacia da Palhoça. Ele veio e falou para todos nós que se eu assumisse a droga, pelo fato de ter sido preso na frente da minha casa o caminhão, seria bom para eles e eles conseguiriam sair. Seria bom para eles eu assumir a droga. Aquela droga não era minha, eu só estava auxiliando no transporte. Umas duas semanas antes o Dr. Fábio já tinha ido lá no parlatório e falado para mim que tinha entrado em contato com a minha esposa e que ele ia advogar para mim, a mando do Vanderlei, que a mando do Vanderlei ele ia ser meu advogado. Aí eu falei para ele que eu já tinha advogado e que era o Dr. Álvaro Sanguinetti. Aí ele "não, é que o Dr. Álvaro Sanguinetti não tá fazendo nada por ti, e aí eu fui contratado pelo Vanderlei para te defender", eu digo "não, eu já tenho advogado eu não preciso do serviço do senhor". Tudo bem, aí ele foi embora. Aí nessa data que o senhor me falou hoje (13/08/2017) ele retornou de novo, falando que ele ia advogar para mim, que ele ia levar uma quantia de 20 mil reais para a minha esposa, para eu estar assumindo a droga. Aí eu digo "tá, mas como assim? Como é que eu vou assumir uma coisa que não é minha?", e ele assim "não, vai ser melhor para ti, vai ser melhor pros rapazes que vão sair, e o Vanderlei te prometeu um certo valor o mês", acima desse 20 mil que ele queria dar em mãos para a minha esposa. Aí eu falei para ele que eu não aceitava, que eu não ia me corromper por causa desse dinheiro, que eu já tava naquela situação ali por causa de um erro meu e eu não ia querer. Aí ele começou...

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