Acórdão Nº 0900022-83.2014.8.24.0071 do Terceira Câmara de Direito Público, 17-11-2020
Número do processo | 0900022-83.2014.8.24.0071 |
Data | 17 Novembro 2020 |
Tribunal de Origem | Tangará |
Órgão | Terceira Câmara de Direito Público |
Classe processual | Apelação Cível |
Tipo de documento | Acórdão |
Apelação Cível n. 0900022-83.2014.8.24.0071, de Tangará
Relator: Desembargador Júlio César Knoll
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. LOTEAMENTO CLANDESTINO E IRREGULAR. IMÓVEL RURAL LOCALIZADO NO MUNICÍPIO DE TANGARÁ. ADMISSIBILIDADE. NÃO RECOLHIMENTO DO PREPARO. PLEITO DE JUSTIÇA GRATUITA EM SEDE RECURSAL. DEFERIMENTO. PRELIMINARES. ALEGAÇÃO DE ILEGITIMIDADE ATIVA E INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ATUAÇÃO DO ÓRGÃO MINISTERIAL PARA A TUTELA DA ORDEM URBANÍSTICA E DO MEIO AMBIENTE, QUE ENCONTRA AMPARO NAS DISPOSIÇÕES DO ART. 129, III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E ARTS. 1º E 5º, DA LEI N. 7.347/85. PREJUDICIAIS AFASTADAS. MÉRITO. COMPROVAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE PARCELAMENTO IRREGULAR DO SOLO PARA FINS URBANOS (MORADIA). AUSÊNCIA DE APROVAÇÃO PELO PODER PÚBLICO E DE INFRAESTRUTURA BÁSICA EXIGIDA PELA LEI N. 6.766/79 (ARTS. 2º, § 5º, E 4º). IRREFUTÁVEIS PREJUÍZOS CAUSADOS AO PATRIMÔNIO DOS ADQUIRENTES DE BOA-FÉ. RESPONSABILIDADE DO LOTEADOR PELA REGULARIZAÇÃO CONFIGURADA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0900022-83.2014.8.24.0071, da comarca de Tangará Vara Única em que são Apelantes Alcides Santo Venturin e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina e outro.
A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por meio eletrônico, por votação unânime, conhecer e desprover o recurso, mantendo hígida a sentença por seus próprios fundamentos. Custas na forma da lei.
O julgamento, realizado no dia 17 de novembro de 2020, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Júlio César Knoll, e dele participaram os Exmos. Srs. Desembargadores Paulo Ricardo Bruschi e Ronei Danielli.
Funcionou como representante do Ministério Público o Dr. Narcísio Geraldino Rodrigues.
Florianópolis, 17 de novembro de 2020.
Desembargador Júlio César Knoll
Relator
RELATÓRIO
Perante a Vara Única da comarca de Tangará, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina, no uso de suas atribuições, com fulcro nos permissivos legais, ajuizou ação civil pública c/c antecipação de tutela, em face de Alcides Santo Venturin e Município de Tangará.
Relatou, em apertada síntese, que o primeiro requerido é proprietário do imóvel registrado sob a matrícula n. 2.077, com área de 390 m², cadastrado no INCA/CIR 814.270.000.159/2.
Asseverou que, Alcides teria iniciado o parcelamento do solo para fins de moradia sem a autorização da Municipalidade, e em desacordo com as disposições da Lei n. 6.766/96, inclusive do art. 3º.
Arguiu que, o dispositivo supra prevê que somente é admitido o parcelamento para fins urbanos em zonas urbanas, de expansão urbana ou de urbanização, assim definidas no plano diretor.
Aduziu que, ao alienar frações de imóvel rural nessas circunstâncias, acarretou a existência de loteamento clandestino e eivado de irregularidades, ocasionando danos à ordem urbanística e ambiental.
Como se não bastasse, consta no Inquérito Civil que o requerido vendeu 2 (dois) lotes aos declarantes e prometeu-lhes que terminaria o loteamento, abrindo ruas, instalando energia elétrica, entre outros, o que não ocorreu, acarretando também violação às normas consumeristas.
Disse que, a Municipalidade, instada a se manifestar, informou inexistir projeto de desmembramento ou de loteamento protocolizado em nome de Alcides, que não foram emitidos os respectivos alvarás, e ao tomar ciência dos fatos, realizou por meio do Fiscal de Tributos Externo o monitoramento do imóvel, de modo a impedir a expensão das construções irregulares.
Defendeu, em que pese as alegações, que o ente público foi omisso na fiscalização e embargo das obras clandestinas, responsabilidade que lhe é atribuída por lei, deixando levar a efeito a alienação de, pelo menos, 9 (nove) lotes pelo requerido, acarretando prejuízos à coletividade.
Requereu, liminarmente, a imposição das obrigações de fazer e não fazer ao requerido Alcides Santo Venturin, para cumprimento no prazo de 15 (quinze) dias, consistentes em:
A) Colocar e manter avisos (por placa ou faixa), em todos os acessos e entradas do imóvel parcelado, em local bem visível, informando que o loteamento não está registrado em Cartório, que, por decisão judicial, é proibida a comprova e venda de lotes e que nenhuma obra por ali ser realizada;
B) abster-se de praticar atos de supressão de vegetação, de terraplanagem, remoção de terra, demarcação de quadras e lotes, abertura de ruas e vias de acesso ou circulação e quaisquer outras atividades que resultem em danos ambientais e á ordem urbanística;
C) abster-se de realizar vendas, promessas de venda, reservas, hipotecas, ou quaisquer negócios jurídicos que manifestem intenção de vender lotes do parcelamento (loteamento) aqui discutido, ou alterar a situação jurídica dos mesmos, inclusive a alienação parcial de gleba, de lotes ou de chácaras;
Ao Município de Tangará as obrigações de fazer e não fazer, para cumprimento em 30 (trinta) dias, consistentes em:
a) a fim de se verificar eventual futura desobediência à determinação judicial, realizar vistoria e diagnóstico da situação atual da área, por intermédio de servidor da Prefeitura Municipal de Tangará, auxiliado por Oficial de Justiça, juntando-se auto de constatação detalhado contendo: o número de lotes demarcados, o número de lotes ocupados com construção, o número de lotes habitados, identificação dos respectivos proprietários/residentes;
b) abster-se de autorizar ou conceder alvarás para construção no loteamento questionado, exercendo fiscalização contínua e mensal para impedir que novas obras sejam realizadas no local, com adoção das medidas administrativas cabíveis para coibir a continuidade de qualquer edificação no local;
Ademais, que:
3) seja expedido ofício ao Cartório de Registro de Imóveis de Tangará, comunicando-se as citações realizadas neste processo para anotação à margem da matrícula 270, na forma do art. 167, I, n. 21, da Lei de Registros Públicos, dentre outras finalidades, para prevenir novos negócios com glebas, lotes e chácaras, bem assim à vista de possíveis pedidos de usucapião.
Pede-se ainda que o ofício contenha ordem de bloqueio da matrícula, até para garantir a reparação dos danos urbanísticos e ambientais noticiados, além da execução das obras de infraestrutura;
4) com cópia desta inicial, sejam expedidos ofícios à CELESC e CASAN cientificando-os dos termos da liminar, bem assim para, até decisão em contrário, não realizar novas ligações de energia elétrica ou de água no local e fiscalizar a existência de ligações clandestinas;
Ao final, pugnou pela procedência dos pedidos, para tornar definitiva a tutela de urgência, impondo ao Município de Tangará e a Alcides Santo Venturin, em suma, solidariamente:
[...] c) a obrigação de fazer consistente na "regularização" do loteamento clandestino, com a instauração, pela Municipalidade, de procedimento administrativo que objetive a identificação dos "lotes" e imóveis construídos irregularmente, e o desfazimento ou adequação do loteamento clandestino e das edificações construídas irregularmente, condenando-os ainda a, posteriormente, elaboração, aprovação e registro do projeto de loteamento, realizar as obras de infraestrutura necessárias para a viabilidade de qualquer loteamento, consoante previsão da legislação federal, estadual e municipal de regência, para cumprimento em prazo não excedente a 4 (quatro) anos (art. 18, V, da Lei 6.766/79);
d) sejam condenados os réus (CDC, arts. 95 e 117, c.C Lei 7.347/85, art. 21) ao pagamento de indenização pelas eventuais perdas e danos sofridas pelos adquirentes/residentes em razão da regularização do loteamento e possível desfazimento de construções, a ser apurada em liquidação própria, assim como indenização correspondente ao dano moral causado à ordem urbanística e à coletividade (meio ambiente) (art. 1º da LACP), [...]
e) sejam os réus condenados a, em havendo necessidade de desfazimento do loteamento, repararem o dano ambiental, mediante a apresentação e aprovação de Projeto de Recuperação de Área Degradada, formulado profissional competente, com a devida ART, perante a FATMA, em prazo a ser estabelecido pelo Magistrado;
[...]
A tutela de urgência foi deferida (fls. 179/182), com a implementação das providências liminares postuladas.
Citados, os requeridos apresentaram defesa, na forma de contestação, rechaçando os argumentos expostos na peça vestibular.
Houve réplica (fls. 266/282).
Na decisão interlocutória de fls. 308/310, as preliminares arguidas na peça defensiva foram rejeitadas.
Realizada audiência, as partes postularam prazo para apresentar alegações finais, as quais foram juntadas ao feito (fls. 327/349 e 351).
Sobreveio sentença, de lavra do MM. Juiz de Direito, Dr. Flávio Luís Dell'Antônio, nos seguintes termos:
Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do CPC:a) JULGO IMPROCEDENTES os pedidos da inicial com relação ao MUNICÍPIO DE TANGARÁ. b) JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos deduzidos em face do requerido ALCIDES SANTO VENTURIN e, por conseguinte, CONDENO-O a regularizar o loteamento clandestino iniciado no imóvel registrado sob o n. 2.077 do CRI de Tangará, com a sua adequação e das edificações construídas irregularmente, mediante a elaboração, aprovação e registro do projeto de loteamento, bem como a realização das obras de infraestrutura necessárias para a viabilidade de qualquer loteamento, consoante previsão da legislação federal, estadual e municipal de regência, para cumprimento em prazo não excedente a 2 (dois) anos, a contar do trânsito em julgado da sentença, considerando que não obstante já tenha sido dada oportunidade de regularização no processo criminal, o Requerido manteve-se inerte. Fixo multa de R$ 1.000,00 (um mil reais) por dia, pelo descumprimento da sentença, a contar do primeiro dia útil após o prazo de 2 (dois) anos do trânsito em julgado, contando-se o prazo pelo...
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