Acórdão Nº 0900031-24.2017.8.24.0044 do Primeira Câmara de Direito Público, 22-09-2020

Número do processo0900031-24.2017.8.24.0044
Data22 Setembro 2020
Tribunal de OrigemOrleans
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0900031-24.2017.8.24.0044

Relator: Desembargador Pedro Manoel Abreu

APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER PROPOSTA PELO MPSC VISANDO REGULARIZAR A FORMA DE CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA PELO PODER PÚBLICO MUNICIPAL DE ORLEANS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DO MUNICÍPIO. ALEGAÇÃO DE QUE CABE UNICAMENTE À FAZENDA PÚBLICA ORGANIZAR O QUADRO DE SERVIDORES CONFORME SEUS INTERESSES, SOB PENA DE VIOLAÇÃO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. TESE EQUIVOCADA. POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. PRECEDENTES DESTA CORTE E TRIBUNAIS SUPERIORES. NULIDADE DAS CONTRATAÇÕES EVIDENCIADAS. LEIS MUNICIPAIS DECLARADAS INCONSTITUCIONAIS DE MODO ACERTADO. OBRIGATORIEDADE DA REALIZAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA SEM REFERIDA EXIGÊNCIA, APENAS NOS CASOS PRESCRITOS EM LEI. RECURSO DESPROVIDO.

Para a contratação temporária de servidores com respaldo no art. 37, IX, da Constituição Federal, sem o prévio concurso público, imprescindível o preenchimento das seguintes condições: 'a) previsão em lei dos casos; b) tempo determinado; c) necessidade temporária de interesse público excepcional. II. - Precedentes do Supremo Tribunal Federal: ADI 1.500/ES, 2.229/ES e 1.219/PB, Ministro Carlos Velloso; ADI 2.125-MC/DF e 890/DF, Ministro Maurício Corrêa; ADI 2.380-MC/DF, Ministro Moreira Alves; ADI 2.987/SC, Ministro Sepúlveda Pertence' (ADI n. 3210, Min. Carlos Velloso)" (TJSC, rel. Des. Vanderlei Romer).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0900031-24.2017.8.24.0044, da comarca de Orleans 2ª Vara em que é Apelante Município de Orleans e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Primeira Câmara de Direito Público decidiu, por meio eletrônico, por unanimidade, negar provimento ao recurso e ao reexame. Custas legais.

O julgamento, realizado no dia 22 de setembro de 2020, foi presidido pelo Desembargador Luiz Fernando Boller, com voto, e dele participou o Desembargador Jorge Luiz de Borba.

Florianópolis, data da assinatura digital.

Desembargador Pedro Manoel Abreu

Relator


RELATÓRIO

Trata-se de Recurso de Apelação interposto pelo Município de Orleans em face da sentença prolatada às fls. 493/502, que julgou parcialmente procedente os pedidos formulados na inicial para declarar, de forma incidental, a inconstitucionalidade do art. 176, IV, V, VII e IX da Lei Complementar nº 1.929/2005; art. 7º da Lei nº 2.534/2017; Lei Complementar nº 2.333/2010; Lei Complementar nº 2.591/2014 e Lei Complementar nº 2.695/17, bem como reconhecer a nulidade das contratações temporárias amparadas pelas leis aludidas.

Nos termos da sentença, o Município de Orleans foi condenado a obrigação de fazer de:

A) deflagrar concurso público e nomear os aprovados para provimento dos cargos de médico veterinário, motorista socorrista e enfermeiro socorrista do SAMU, psicólogo do CREAS, instrutor de trabalhos manuais do PETI, auxiliar de ensino de educação infantil e auxiliar de serviços gerais feminino, no prazo máximo de 10 (dez) meses, prorrogável por igual período;

B) exonerar todos os funcionários, servidores e empregados admitidos em caráter temporário, exceto nas hipóteses reais de excepcionalidade e temporariedade, sendo que as vagas decorrentes da exoneração deverão ser preenchidas através da realização do concurso público;

C) somente contratar servidores por tempo determinado mediante processo seletivo de provas ou provas e títulos, com ampla divulgação, possibilitando a contratação temporária sem a referida exigência somente para atender às necessidades decorrentes de calamidade pública, emergência ambiental e de emergências em saúde pública ou, ainda, quando restar frustada a seleção realizada anteriormente, por ausência de interessado ou aprovado.

Além disso, foi condenado à obrigação de não fazer, para que se abstenha de contratar servidores por tempo determinado, sem que estejam caracterizadas hipóteses reais de excepcionalidade e temporariedade previstas em lei local, bem como para que não admita servidores para o exercício de qualquer cargo público sem a realização de prévio concurso público, ressalvados os cargos em comissão, as contratações por tempo determinado nos casos previstos em lei e as hipóteses de admissão de agentes comunitários de saúde e de agentes de combate às endemias, devidamente precedidas de processo seletivo.

Em seu apelo, sustenta, em síntese, que cabe à Fazenda Municipal organizar o quadro de servidores conforme seus interesses, de modo que é defeso compeli-la judicialmente a realizar concurso público, sob pena de violação da separação dos Poderes. Assevera a inexistência de inconstitucionalidade dos dispositivos legais citados na sentença, porquanto a norma municipal define as hipóteses de contratação temporária por excepcional interesse público.

Por derradeiro, alega a legalidade das contratações temporárias realizadas pelo Poder Executivo Municipal.

Em sede de contrarrazões, o apelado pugnou pela manutenção do decisum.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo desprovimento do recurso.

Este é o relatório.


VOTO

Sem delongas, nega-se provimento ao recurso.

O tema em debate foi precisamente esquadrinhado no judicioso parecer da lavra da Procuradora de Justiça, Dra. Walkyria Ruicir Danielski , cujos fundamentos, de fato e de direito, pede-se vênia para adotar como razões de decidir na hipótese. Colhe-se do parecer ministerial:

[...]

Inicialmente, a fim de que melhor se possa compreender a matéria posta a exame, afigura-se aconselhável proceder a uma breve retrospectiva desta demanda.

Com base no Inquérito Civil Público n. 06.2011.00003045-6 e no Inquérito Civil Estadual n. 001/2009/CMA/MPSC, o Órgão de Execução Ministerial oficiante perante a Comarca de Orleans ajuizou a presente ação civil pública com o escopo de obstar que o Município de Orleans continue realizando contratações temporárias fora das hipóteses constitucionais e legais, bem como para que o réu promova concurso público para o provimento dos cargos indevidamente ocupados por servidores transitórios.

Para tanto, pugnou pela declaração incidental de inconstitucionalidade de diversas normas municipais que regem a contratação temporária fundamentada no excepcional interesse público, notadamente para os cargos de professores, auxiliares de ensino de Educação Infantil, auxiliares de serviços gerais feminino, médicos veterinários, motoristas socorristas, técnicos de enfermagem socorrista do SAMU, instrutores de trabalhos manuais do PETI e psicólogos do CREAS.

Ao final da instrução sobreveio a sentença de procedência, nos termos acima expostos, motivo pelo qual o Ente Municipal interpôs a competente insurgência.

2. PREFACIALMENTE: do controle incidental de constitucionalidade

Ab initio, convém consignar que "O Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência firme e consolidada de que 'é possível a declaração incidental de inconstitucionalidade, na ação civil pública, de quaisquer leis ou atos normativos do Poder Público, desde que a controvérsia constitucional não figure como pedido, mas sim como causa de pedir, fundamento ou simples questão prejudicial, indispensável à resolução do litígio principal, em torno da tutela do interesse público" (REsp 437.277/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ 13.12.2004)" (REsp 1696938/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/10/2017, DJe 23/10/2017.

Dito isso, vale repisar os diplomas municipais e seus respectivos preceptivos declarados inconstitucionais na sentença objurgada:

Lei Complementar n. 1.929/2005, que dispõe sobre o Estatuto dos Servidores Públicos Municipais e dá outras providências.

Art. 176 - Consideram-se como de necessidade temporária de excepcional interesse público as contratações que visem a:

[...]

IV - substituir professor ou admitir professor visitante, inclusive estrangeiro;

[...]

VI - Substituir médicos e demais profissionais da área de saúde;

VII - Substituição de Servidores efetivos designados para exercer cargos comissionados, em férias e demais licenças previstas nesta Lei Complementar;

[...]

IX - Evitar a solução de continuidade em outros serviços essenciais;

[...]

§ 1º As contratações de que trata este artigo terão dotação específica e obedecerão aos seguintes prazos:

[...]

II - na hipótese do inciso II, VI e VIII, IX pelo prazo máximo de doze meses;

III - nas hipóteses dos incisos IV, V, VII pelo prazo máximo de quarenta e oito meses.

[...]

§ 2º - Os prazos de que trata o parágrafo anterior são improrrogáveis.

Lei n. 2.534/2014, que cria o Programa Municipal de Apoio e Incentivo à Agroindústria PMAI e dá outras providências.

Art. 7º Fica autorizada a contratação de pessoal, por tempo determinado, para atender a necessidade de excepcional interesse público.

Parágrafo Único - A contratação prevista no caput deste artigo poderá ocorrer pelo período de até 1 (um) ano, prorrogável uma única vez por até igual período, ou até a realização de concurso público.

Lei Complementar n. 2.333/2010, que dispõe sobre a criação de cargos e vagas de motoristas socorristas e técnico de enfermagem, por tempo determinado, para execução dos Serviços de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU e dá outras providências.

Art. 1º Fica o Município autorizado a criar cargos e vagas de motorista socorrista e técnico de enfermagem socorrista, por tempo determinado, para execução dos Serviços de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU, conforme quadro a seguir:

[...]

Art. 2º Por ocasião de interrupção, suspensão ou resolução do convênio celebrado com o Ministério da Saúde, os cargos estarão automaticamente extintos, dando fim imediato às contratações efetuadas.

Art. 3º Para atender a necessidade de excepcional interesse público, fica o Executivo Municipal autorizado a contratar servidores públicos através...

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