Acórdão Nº 0900032-11.2017.8.24.0011 do Quarta Câmara Criminal, 09-06-2022

Número do processo0900032-11.2017.8.24.0011
Data09 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0900032-11.2017.8.24.0011/SC

RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA

APELANTE: VILMAR LUIS SDRIGOTTI (ACUSADO) ADVOGADO: Daniel Deggau Bastos (DPE) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) INTERESSADO: LUCIANE DEBATIN SDRIGOTTI (ACUSADO) ADVOGADO: Daniel Deggau Bastos

RELATÓRIO

Na comarca de Brusque, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Vilmar Luis Sdrigotti e Luciane Debatin Sdrigotti, imputando-lhes a prática do delito capitulado no art. 2º, II, c/c o art. 11, caput, ambos da Lei n. 8.137/90, por 7 (sete) vezes, pois, segundo consta na inicial:

Infere-se dos documentos que instruem o procedimento supramencionado, que os denunciados, na época dos fatos, eram sócios e administradores da empresa LUCKYMAR CONFECÇÕES LTDA ME. (fl. 29), CNPJ n. 00.077.787/0001-90 e Inscrição Estadual n. 25.286.947-8, estabelecida na Rua Almirante Barroso n. 67, bairro Santa Rita, Brusque/SC, que tem por objeto social a "exploração do ramo de indústria e comércio de confecções de malhas, jeans e tecidos" (Cláusula 3ª da 4ª Alteração Contratual - fl. 28).

Dessa forma, os denunciados eram responsáveis pela direção e gerência da empresa, tendo ciência e controle das transações e negócios realizados, bem como responsabilidade legal e fática pela regularidade fiscal.

Além da administração geral da empresa, determinavam os atos de escrituração fiscal e eram responsáveis pela apuração e recolhimento do ICMS - Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviço de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação devido.

Quaisquer vantagens ou benefícios obtidos pela empresa, mesmo os de origem ilícita, eram aproveitados diretamente pelos denunciados, sujeitando-os à regra prevista no art. 11, caput, da Lei n. 8.137/901 . Em procedimento rotineiro, a Fiscalização de Tributos Estaduais constatou que, apesar de terem apresentado as Declarações de Informações do ICMS e Movimento Econômico - DIMEs à Secretaria da Fazenda, os denunciados, nos períodos de março a maio e de setembro a dezembro de 2015, não recolheram aos cofres públicos, no prazo determinado pelo art. 60 do RICMS/01, os valores apurados e declarados.

Em razão disso, o Fisco Estadual, em 06/04/2016, emitiu o Termo de Inscrição em Dívida Ativa n. 16000755571, juntado às fls. 02/03, que apresenta o seguinte código da infração: "1018 - Conta Corrente - Falta de Recolhimento de ICMS declarado pelo próprio sujeito passivo - Inscrição Direta em Dívida Ativa".

As Declarações do ICMS e do Movimento Econômico - DIMEs que originaram o mencionado Termo de Inscrição em Dívida Ativa estão juntadas às fls. 04/17 do procedimento anexo.

Em relação a apuração do imposto devido, cabe ressaltar que, nos termos do art. 53 do Regulamento do ICMS/2001, "o imposto a recolher será apurado mensalmente, pelo confronto entre os débitos e os créditos escriturados durante o mês, em cada estabelecimento do sujeito passivo".

O art. 60 do RICMS/2001 determina que, ressalvadas as hipóteses que enumera, "o imposto será recolhido até o 10º (décimo) dia após o encerramento do período de apuração".

O art. 168 do Anexo 5 do RICMS/2001 dispõe que os estabelecimentos encaminharão em arquivo eletrônico, enviado pela internet, a Declaração de Informações do ICMS e Movimento Econômico - DIME, que se constituirá no registro dos lançamentos constantes do livro Registro de Apuração do ICMS, dos demais lançamentos fiscais relativos ao balanço econômico e dos créditos acumulados, referentes às operações e prestações realizadas em cada mês.

Consoante se pode constatar do objeto do Termo de Inscrição em Dívida Ativa que, apesar de terem sido devidamente escrituradas as operações tributáveis da empresa, os administradores acima relacionados, com união e conjugação de esforços, ao atuarem no comando da empresa, não realizaram e nem determinaram o pagamento devido dos tributos nas datas de vencimento, ou seja não adimpliram a obrigação tributária lesando, consequentemente, os cofres públicos.

Como é sabido, o ICMS é pago pelo consumidor, sendo o comerciante simples repassador do imposto gerado ao Estado, razão pela qual é classificado como imposto indireto e seu recolhimento é obrigação acessória do contribuinte.

Importa, ainda, salientar que o ICMS - tido como tributo incidente sobre o consumo - tem seu ônus cobrado pelo consumidor final, verdadeiro destinatário do tributo, sendo delimitado o vendedor como contribuinte de direito por razões de política tributária.

Ressalta-se que, quando o fornecedor promove a saída de mercadoria ou serviço tributável pelo ICMS, cobrado do adquirente no preço final - este tributo que deverá ser repassado ao fisco - deve recolher referido tributo ao erário no prazo legal, sob pena de violação do disposto no art. 2º, inc. II, da Lei n. 8.137/1990.

Portanto, considerando que o denunciado detinha os valores, mas optou pelo não repasse ao Estado-SC, resta evidenciado que agiu com manifesto dolo nesta omissão no pagamento do tributo.

DOS VALORES TRIBUTÁRIOS DEVIDOS

Os valores devidos referentes ao Termo de Inscrição em Dívida Ativa n. 16000755571, computando-se a multa e os juros até a data em que foi emitida totalizam R$17.263,46 (fl. 02).

O referido valor foi atualizado em 24/01/2017 e corresponde ao total de R$18.593,39 (dezoito mil quinhentos e noventa e três reais e trinta e nove centavos), conforme consulta extrato S@t de fl. 44.

DA NÃO QUITAÇÃO DOS DÉBITOS TRIBUTÁRIOS

De acordo com o registro no Sistema de Administração Tributária - S@t, da Secretaria da Fazenda do Estado de Santa Catarina, os valores correspondentes aos crimes ora narrados foram inscritos em dívida ativa e não foram pagos até o momento (extrato de fl. 44 do procedimento anexo).

DA CLASSIFICAÇÃO DOS CRIMES

Os denunciados, por terem deixado de recolher ao Erário, no prazo legal, valor do tributo ICMS descontado ou cobrado, na qualidade de sujeitos passivos de obrigação, praticaram, de forma dolosa, por sete vezes, o crime previsto no art. 2º, inciso II, c/c art. 11, caput, ambos da Lei n. 8.137/90, na forma continuada (art. 71 do Código Penal) (Evento 25, DENUNCIA1, autos originários).

Finalizada a instrução, o Magistrado a quo julgou parcialmente procedente o pedido formulado na denúncia, para: a) condenar Vilmar Luis Sdrigotti ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 10 (dez) meses de detenção, em regime inicial aberto, substituída por 1 (um) medida restritiva de direitos, consistente em prestação pecuniária, no valor de 2 (dois) salários mínimos, além do pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, no mínimo valor legal, por infração ao art. 2º, II, c/c o art. 11, caput, ambos da Lei n. 8.137/90, por 7 (sete) vezes, na forma do art. 71, caput, do Código Penal; e b) absolver Luciana Debatin Sdrigotti, com fulcro no art. 386, V, do Código de Processo Penal (Evento 73, SENT129, autos originários).

Inconformado com a prestação jurisdicional, o réu interpôs apelação criminal, mediante a qual postulou a absolvição, sustentando a atipicidade das condutas, ao argumento de que se estaria diante de mero inadimplemento tributário, que a Convenção Interamericana de Direitos Humanos veda a prisão por dívida, bem como que teria agido desprovido de dolo. Outrossim, clamou pelo reconhecimento da excludente de culpabilidade de inexigibilidade de conduta diversa, porquanto a empresa administrada estaria submetida a problemas financeiros. No mais, pleiteou a incidência do princípio da insignificância, haja vista que o valor do imposto não recolhido seria inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Ainda, buscou a substituição da pena privativa de liberdade por multa. Alternativamente, solicitou que a prestação pecuniária fixada seja reduzida para o montante de 1 (um) salário mínimo. Por derradeiro, reivindicou o decote dos dias-multa impostos, sob o argumento de que o bônus do tesouro nacional, previsto no art. 8º, parágrafo único, da Lei n. 8.137/90, estaria extinto desde o ano 1991 (Evento 79, APELAÇÃO134, autos originários).

Apresentadas as contrarrazões (Evento 95, PROMOÇÃO1, autos originários), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Dr. Rogério A. da Luz Bertoncini, manifestou-se pelo parcial conhecimento e desprovimento do recurso (Evento 11, PROMOÇÃO1).

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conhece-se do apelo.

1 Juízo de prelibação

O representante da douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo parcial conhecimento do recurso, porquanto a fundamentação relacionada aos pedidos de absolvição se trataria de mera reprodução das alegações finais defensivas.

Consoante o Superior Tribunal de Justiça, "à luz do princípio da dialeticidade, constitui ônus do recorrente, além da exposição das razões de fato e de direito de forma clara e precisa, também a demonstração da ilegalidade deduzida nas razões recursais, de sorte a impugnar os fundamentos da decisão/acórdão recorridos" (AgRg no REsp n. 1.854.348/MS, rel. Min. Nefi Cordeiro, Sexta Turma, j. em 16/6/2020).

Na espécie, a arguição não comporta acolhimento, haja vista que os argumentos da defesa desfilados nas razões recursais, conquanto já tenham sido aventados nas alegações derradeiras, são pertinentes e representam impugnação suficiente à sentença condenatória.

O Superior Tribunal de Justiça assentou recentemente o entendimento de que "[...] a repetição, no recurso de apelação, dos termos da petição inicial - ou das alegações finais, como no caso em tela - não ofende o princípio da dialeticidade, sobretudo quando sua fundamentação demonstrar suficientemente os motivos da irresignação do apelante" (HC n. 611.896/SC, rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, j. em 10/9/2020).

Esta Corte já decidiu:

APELAÇÃO CRIMINAL. TENTATIVA DE ESTUPRO E AMEAÇA (ART. 213, "CAPUT", C/C ART. 14, II, E ART. 147, TODOS DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA ABSOLUTÓRIA POR AUSÊNCIA DE PROVAS DOS FATOS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PRELIMINAR SUSCITADA EM CONTRARRAZÕES. PLEITO...

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