Acórdão Nº 0900039-35.2014.8.24.0002 do Quinta Câmara de Direito Público, 17-04-2020

Número do processo0900039-35.2014.8.24.0002
Data17 Abril 2020
Tribunal de OrigemAnchieta
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0900039-35.2014.8.24.0002 Anchieta

Relatora: Desembargadora Denise de Souza Luiz Francoski

APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA.

AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, COM A FINALIDADE DE IMPOR AO MUNICÍPIO DE ANCHIETA OBRIGAÇÃO DE FAZER, CONSISTENTE NA CRIAÇÃO DO CONSELHO MUNICIPAL DO IDOSO NO SEU ÂMBITO.

SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

(1) INSURGÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

ALEGAÇÃO DE QUE O MUNICÍPIO TEM A OBRIGAÇÃO DE CRIAR O CONSELHO MUNICIPAL DO IDOSO, CUJA OMISSÃO DEVE SER SANADA PELO PODER JUDICIÁRIO, PORQUE INDISPENSÁVEL TAL ÓRGÃO PARA ZELAR E FAZER CUMPRIR OS DIREITOS DOS IDOSOS, ALÉM DE SER RECOMENDADA SUA CRIAÇÃO PELO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA.

TESE ACOLHIDA.

OBRIGAÇÃO DE TODOS ZELAR PARA O CUMPRIMENTO DOS DIREITOS DOS IDOSOS COM ABSOLUTA PRIORIDADE, INCLUSIVE DO PODER PÚBLICO. INTELIGÊNCIA DO ART. 3º DO ESTATUTO DO IDOSO (LEI N. 10.741/2003).

COMPETÊNCIA DOS CONSELHOS MUNICIPAIS DOS IDOSOS A FISCALIZAÇÃO DO CUMPRIMENTO DOS DIREITOS DOS IDOSOS (ART. 7º DO ESTATUTO DOS IDOSOS.

LEI FEDERAL N. 8.842/1994 (ARTS. E ) QUE DISPÕE SEREM OS CONSELHOS DOS IDOSOS ÓRGÃOS PERMANENTES, PARITÁRIOS E DELIBERATIVOS, COMPETINDO-LHES A SUPERVISÃO, ACOMPANHAMENTO, FISCALIZAÇÃO E AVALIAÇÃO DOS DIREITOS DOS IDOSOS.

CRIAÇÃO DE CONSELHO DE IDOSO QUE SE IMPÕE, PARA O CUMPRIMENTO E FISCALIZAÇÃO DOS DIREITOS DOS IDOSOS, NÃO PODENDO OS MUNICÍPIOS SE FURTAREM À SUA CRIAÇÃO.

COMPETÊNCIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA A GARANTIA DO FUNCIONAMENTO DO CONSELHO DO IDOSO, NÃO HAVENDO MARGEM PARA DISCRICIONARIDADE, SOB PENA DE AFRONTA À LEGISLAÇÃO PERTINENTE (RESP 1702195/RJ, REL. MINISTRO HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, JULGADO EM 10/04/2018, DJE 06/03/2019).

PODER JUDICIÁRIO QUE DIANTE DE OMISSÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, PODE DETERMINAR QUE ESTA CUMPRA AS OBRIGAÇÕES RELATIVAS AOS DIREITOS ESSENCIAIS EM RAZÃO DO MÍNIMO EXISTENCIAL.

PRECEDENTES.

(2) REMESSA NECESSÁRIA QUE SE OPERA EM VIRTUDE DA IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA, PORQUE APLICÁVEL A ESTA AÇÃO O DISPOSTO NO ART. 19 DA LEI N. 4.717/1965 (LEI DA AÇÃO POPULAR), SEGUNDO O RESP 1108542.

PREJUDICADO O REEXAME OBRIGATÓRIO.

A ANÁLISE INTEGRAL DA SENTENÇA FOI PROCEDIDA NO RECURSO VOLUNTÁRIO, PELO QUAL DEU-SE PROVIMENTO PARA REFORMAR A SENTENÇA E JULGAR A LIDE PROCEDENTE.

(A) RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL, INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, CONHECIDO E PROVIDO PARA REFORMAR A SENTENÇA E JULGAR PROCEDENTES OS PEDIDOS INICIAIS E, POR CONSEQUÊNCIA, DETERMINAR QUE O MUNICÍPIO DE ANCHIETA INSTITUA O CONSELHO MUNICIPAL DO IDOSO EM SUA ESFERA.

(B) REMESSA NECESSÁRIA PREJUDICADA.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0900039-35.2014.8.24.0002, da comarca de Anchieta Vara Única em que é Apelante Ministério Público do Estado de Santa Catarina e Apelado Município de Anchieta.

A Quinta Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade: (a) conhecer do recurso de apelação interposto pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina, e dar-lhe provimento para condenar o Município de Anchieta à obrigação de fazer, consistente na criação do Conselho Municipal do Idoso, conforme determinações no dispositivo desse acórdão; (b) julgar prejudicada a remessa necessária. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Hélio do Valle Pereira, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Artur Jenichen Filho e Exmo. Sr. Des. Vilson Fontana.

Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Carlos Alberto de Carvalho Rosa.

Florianópolis, 17 de abril de 2020.

Desembargadora Denise de Souza Luiz Francoski

Relatora


RELATÓRIO

Cuida-se de recurso de apelação cível interposto pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina, contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados nos autos da ação civil pública n. 0900039-35.2014.8.24.0002, ajuizada contra o Município de Anchieta, bem como tratam os autos de reexame necessário.

1.1 Desenvolvimento processual

Adota-se o relatório da sentença proferida pela magistrada singular Marta Regina Jahnel (fls. 77-81):

"O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA ajuizou ação civil pública de obrigação de fazer contra o MUNICÍPIO DE ANCHIETA aduzindo, em suma, que o presente procedimento deveria ter tramitação prioritária por envolver interesse dos idosos; que o Município réu não contaria com o Conselho Municipal do Idoso CMI, conforme apurado no Inquérito Civil n. 06.2016.00008768-6; que teria buscado por diversas vezes, na esfera extrajudicial, uma solução consensual com a parte ré, para instituir o Conselho do Idoso, porém as tentativas não teriam tido êxito; que a parte requerida não teria tomado nenhuma providência ou medida concreta para a criação do CMI; que o Município demandado teria se recusado a firmar o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC); que a parte ré estaria recusando suprir tal omissão, com evidente descaso aos direitos dos idosos do Município; que não haveria outra medida a ser tomada senão o ajuizamento da presente demanda; que a presente questão teria por escopo a tutela dos direitos dos idosos; que ao Poder Judiciário seria dado legitimidade para intervenção no Poder Executivo omisso; que devido a inexistência do CMI não se saberia se efetivamente as pessoas idosas estariam amparadas; que sem o controle social não haveria garantia do tratamento prioritário aos interesses dos idosos; que seria obrigatória a criação do Conselho no âmbito Municipal; que a ausência do Conselho traduziria no descumprimento do princípio da participação democrática na formulação de políticas públicas destinadas às pessoas idosas; que a tutela de urgência deveria ser deferida; e, que os pedidos formulados na petição inicial deveriam ser acolhidos e a demanda julgada procedente para obrigar o Município a criar o CMI (p. 1-11). Os documentos, dentre eles o Inquérito Civil, foram juntados às p. 12-42.

A análise do pedido de antecipação dos efeitos da tutela foi postergada para depois do contraditório (p. 43).

Citado, o Município de Anchieta não apresentou resposta (p. 54).

Por envolver direitos indisponíveis e relativos às políticas públicas, o pedido de antecipação dos efeitos da tutela foi indeferido. E ao Município réu não foram aplicados os efeitos da revelia (p. 55-61).

As partes não manifestaram interesse na produção de outras provas.

O Ministério Público apresentou alegações finais às p. 66-69 e documentos às p. 71-76.

Vieram-me os autos conclusos.

É o relatório. Decido".

A causa foi valorada em R$ 1.000,00 (um mil reais), quando do ajuizamento da ação, em 18-11-2014.

1.2 Sentença

A MM. Juíza Marta Regina Jahnel (fls. 77-81) declarou a improcedência dos pedidos formulados na inicial, consubstanciado no fundamento de que a legislação não impõe a obrigação de criação do Conselho Municipal do Idoso, não podendo o Poder Judiciário obrigar o Município a criar referido órgão, porque se adentraria à esfera da discricionariedade, mormente porque a instituição de tal conselho iria depender de recursos financeiros que se mostram parcos para a municipalidade no momento e, que ademais, não foi verificada nenhuma violação aos direitos dos idosos naquele Município, cujo dispositivo foi lavrado nos seguintes termos:

"Em face do exposto, e nos termos da fundamentação, julgo o processo com apreciação do mérito, com fulcro no art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil, rejeitando os pedidos da parte autora, por entendê-los improcedentes.

Sem custas e honorários, nos termos do artigo 88 e parágrafo único do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/2003).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos".

1.3 Apelação Cível interposta pelo requerente (Ministério Público do Estado de Santa Catarina) (fls. 86-97)

Inconformado, o Ministério Público interpôs recurso de apelação, no qual alegou, em síntese, que houve omissão por parte do Município de Anchieta na criação do Conselho Municipal do Idoso, a qual deve ser sanada pelo Poder Judiciário "a via judicial, no exercício legítimo da função jurisdicional nos termos que fundamentam sua existência no sistema de freios e contrapesos impostos pelo princípio da separação de poderes explícito no art. 2º da Constituição Federal de 1988" (fl. 88).

Sustentou que foram inúmeros esforços na esfera extrajudicial para que o Município cumprisse a determinação legal de instituição do Conselho do Idoso, mas inexitosas.

Aduziu, também, que "sem a atuação do Conselho Municipal do Idoso exercendo o controle social de forma independente, através da supervisão, do acompanhamento, da fiscalização e da avaliação da política municipal do idoso, não se sabe se efetivamente as pessoas idosas estão devidamente amparadas, com absoluta prioridade, em seus direitos à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar" (fl. 91).

Afirmou que a criação do Conselho Municipal do Idoso também foi recomendada pelo Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, por meio da Resolução n. TC77/2016/TCE-SC.

Pugnou pelo conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença e julgar a lide procedente.

1.4 Contrarrazões

Contrarrazões foram ofertadas às fls. 104-107.

1.5 Reexame necessário

Sabe-se que é obrigatória a remessa obrigatória da sentença de improcedência da ação civil pública, em razão de ser aplicável a esta ação o disposto no art. 19 da Lei n. 4.717/1965 (Lei da Ação Popular), segundo o REsp 1108542.

1.6 Manifestação do Ministério Público

Nesta Instância, o Procurador-Geral de Justiça Alexandre Herculano Abreu opinou "pelo conhecimento e provimento do recurso, reformando-se a sentença vergastada para dar procedência a ação para reconhecer a obrigatoriedade de...

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