Acórdão Nº 0900049-59.2017.8.24.0007 do Quinta Câmara de Direito Público, 29-11-2022

Número do processo0900049-59.2017.8.24.0007
Data29 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0900049-59.2017.8.24.0007/SC

RELATOR: Desembargador HÉLIO DO VALLE PEREIRA

APELANTE: MUNICÍPIO DE GOVERNADOR CELSO RAMOS (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) INTERESSADO: ANTONIO JOSE DE SIMAS (Espólio) (RÉU) INTERESSADO: ODILON JOSE DE SIMAS (Inventariante) (RÉU)

RELATÓRIO

Na ação civil pública movida pelo Ministério Público houve julgamento de procedência para os seguintes fins:

CONFIRMO a liminar concedida e JULGO PROCEDENTES, com resolução de mérito (art. 487, I, do CPC), os pedidos formulados pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina em face do Município de Governador Celso Ramos e Espólio de Antônio José Simas para CONDENAR A MUNICIPALIDADE à adoção das medidas indispensáveis para a regularização fundiária, incluindo o diagnóstico socioambiental, bem como estudo técnico, nos moldes desta decisão, da localidade Loteamento Bela Vista, Areias do Meio, Governador Celso Ramos/SC, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias para finalização do diagnóstico socioambiental e estudo técnico e mais 365 (trezentos e sessenta e cinco dias) para conclusão da regularização fundiária; e CONDENAR O ESPÓLIO DE ANTÔNIO JOSÉ SIMAS a regularizar eventuais pendências que estejam em sua alçada identificadas no diagnóstico socioambiental.

Caso decorrido o prazo de 180 dias sem cumprimento da obrigação pela Municipalidade, desde já, fixo a multa mensal de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), recaindo a obrigação do ente público, inclusive, na pessoa do Prefeito Municipal.

Rejeitados embargos de declaração, apela a Fazenda Pública.

Defende a nulidade da sentença na medida em que faltou perícia e oportunidade para contrarrazões. Também se pondera, ainda no campo processual, que deveria ter sido enfrentada com clareza a perspectiva de suspensão do processo em face do Tema 1.076, haja vista que neste processo se devem definir os limites da intervenção humana em áreas próximas de curso d'água, notadamente em face do Reurb. Pondera ainda que o juízo não esclareceu o nexo causal entre o apregoado dano ambiental e a atividade da Administração, diversamente do que se reclama na jurisprudência. De todo modo, destaca que outras pessoas jurídicas administrativas se omitiram e deram causa à ilicitude discutida. Alerta que se deveriam ter sido pesadas as consequência da pandemia da Covid-19 e seus reflexos nas finanças locais, tanto mais que existem processos congêneres em curso, inclusive sendo merecido o julgamento dessas causas em conjunto.

Conclui nestes termos:

1) Reunião de todas essas demandas aqui apontadas inicialmente; quais sejam:

0900044-37.2017.8.24.0007 Regularização Fundiária da Rua José Dorlito Nunes - Bairro: Canto dos Ganchos

0900049-59.2017.8.24.0007 Regularização Fundiária do Loteamento Bela Vista - Bairro: Areias do Meio

09026301320188240007 Regularização Fundiária da Rua Poço Frio (ao longo do curso d´água) - Bairro: Ganchos do Meio 09003833020168240007 Regularização Fundiária da Rua Horácio Fiel

2) de suspensão dessas ações até que o STJ no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, Controvérsia n. 73, defina a questão da faixa "non aedificandi" em APP de áreas Urbanas consolidadas;

3) de determinação para que após a volta da suspensão haja a criação de um cronograma de cumprimento por áreas à partir de critérios de dificuldade a serem claramente definidos;

4) de desconsideração da Multa aplicada na pessoa física do Gestor, pelos fatos apontados de ausência de nexo causal e diminuição no aporte de 50 a 90% para a Municipalidade;

5) Pugna essa Municipalidade que a incumbência de arcar com o Estudo Sócio Ambiental fique com quem deu causa a todas as irregularidades, ou seja, o particular, espólio, no presente caso;

6) Além disso, requer que este seja incumbido de apresentar nos Autos, após o feitio de Estudo Sócio Ambiental, toda a documentação sob sua posse relativa aos lotes, projetos e vendas realizadas, no intuito de tornar clara toda a situação e após o Estudo socioambiental, acelerar a Regularização futura da Área;

7) Requer a aplicação da Responsabilidade Subsidiária com relação à Municipalidade, afinal o Falecido-Espólio se beneficiou com a venda de lotes irregulares, em contrapartida a Coletividade é quem resta prejudicada. Coletividade esta representada pelo Município.

Houve contrarrazões.

A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo desprovimento da apelação.



VOTO

1. O Município de Governador Celso Ramos alega cerceamento de defesa porque, primeiramente, não se permitiu a produção de provas, expondo isto:

A ausência de prova, em especial de técnica pericial inviabiliza um decreto condenatório adequado, em especial porque de uma lado temos o Apelado alegando o haver um curso d`água, e, de outro, temos o Apelante demonstrando que poderia vir a ser constatado tratar-se de uma vala de drenagem por exemplo. Mas isso nem mesmo foi levado em consta pelo Juízo. Além disso, há no polo passivo o Espólio, mas que nem mesmo acarreou ou foi instado a fazer juntada de toda a documentação em sua posse e dos valores com os quais o falecido se beneficiou na venda dos lotes irregulares. Um total disparate.

Nada disso convence, muito menos que se trate de um "total disparate".

A sentença teve um comando genérico, como é próprio de um pedido que envolve obrigações fluidas. O objetivo imposto, em essência, é realizar na fase de cumprimento estudo técnico e a partir daí promover as medidas urbanísticas apropriadas. A natureza do aludido curso d'água deverá ser avaliada oportunamente, entrosando-se então a situação concreta com as providências factíveis e a legislação de regência. Realizar, enfim, o diagnóstico socioambiental envolverá exatamente a avaliação de pontos como o agora destacado e para isso não era necessária a realização de perícia na etapa de conhecimento.

Também não seria justo postergar a sentença para averiguar os lucros que o criador do loteamento houvesse obtido. Isso não interfere na solidariedade da obrigação ou arrefesse os deveres em si da Fazenda Pública. Muito hipoteticamente, esse debate pode ser proveitoso quanto a direito regressivo da municipalidade, mas que não foi nesta fase de conhecimento questionado de maneira processualmente adequada. Em outros termos, como não se deu pedido de tal natureza, é assunto a ser - digo novamente: hipoteticamente falando - solucionado nas vias ordinárias.

(Sendo mais claro, não renego o direito de regresso, muito pelo contrário. Apenas entendo que a sentença não poderia ter deliberado conclusivamente sobre o tópico por falta de pleito específico e procedimentalmente adequado.)

2. O Poder Público também desejava apresentar alegações finais, mas isso não tem sentido se não houve a fase de instrução.

Aquele ato processual visa justamente propiciar que as partes debatam as provas posteriores ao saneamento, mas aqui o julgamento foi antecipado:

PROCESSO CIVIL - JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE (OU DO MÉRITO) - ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA - PRESCINDIBILIDADE DA PROVA DOCUMENTAL REQUISITADA - IRRELEVÂNCIA DA OITIVA DE TESTEMUNHAS - FATOS INCONTROVERSOS - DISPENSA DE DECISÃO SANEADORA.

Há um direito - decorrência do devido processo legal - à produção de provas. Identicamente existe a expectativa por um processo de duração razoável. Por isso cabe ao juiz indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias (art. 370, NCPC; art. 130, CPC/73).

Sem que haja ofensa à ampla defesa, deve ser rejeitada a produção de provas (aqui, oitiva de testemunhas e requisição de documentos) que de antemão se percebam desimportantes para a revelação dos fatos, que eram incontroversos.

Se o juízo opta pelo julgamento antecipado da lide (hoje, do mérito) fica logicamente prejudicada a perspectiva de saneamento. São condutas que se rivalizam: o saneador é decisão que prepara a fase instrutória; já a sentença de plano é dada justamente porque não são necessárias outras provas - e muito menos faria sentido permitir alegações finais antes do julgamento, arrazoado que tem por objetivo justamente debater os novos eventos vindos com a...

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