Acórdão Nº 0900086-96.2017.8.24.0036 do Primeira Câmara Criminal, 08-07-2021

Número do processo0900086-96.2017.8.24.0036
Data08 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0900086-96.2017.8.24.0036/SC



RELATORA: Desembargadora Ana Lia Moura Lisboa Carneiro


APELANTE: ROBSON DIAS BELO APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA


RELATÓRIO


Na 2ª Vara Criminal da Comarca de Jaraguá do Sul, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de Robson Dias Belo, pelo cometimento, em tese, do crime descrito no art. 2º, inc. II da Lei n. 8.137/90, por 6 (seis) vezes, na forma do art. 71, caput, do Código Penal, em razão dos fatos assim narrados na peça acusatória (Evento 2, dos autos n. 0900086-96.2017.8.24.0036):
O denunciado, na condição de sócio-administrador de 'COMÉRCIO DE AÇOS JARAGUÁ EIRELI. EPP.', CNPJ n. 07.221.605/0001-51 e Inscrição Estadual n. 25.492.006-3, estabelecida na Rua Carlos Hardt, n. 1110, Bairro Água Verde, em Jaraguá do Sul, deixou de efetuar, no prazo legal, o recolhimento de R$ 39.694,98 (trinta e nove mil seiscentos e noventa e quatro reais e noventa e oito centavos) a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS cobrado de consumidores, locupletando-se ilicitamente mediante este tipo de apropriação de valores em prejuízo ao Estado de Santa Catarina, conforme declarado pelo sujeito passivo da obrigação nas DIMEs (Declarações do ICMS e do Movimento Econômico) dos meses de junho, julho, agosto, setembro, outubro e dezembro de 2014, documentos geradores da Dívida Ativa n. 15004714006, de 13/08/2015.
Assim agindo, o denunciado infringiu o disposto no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, por 06 (seis) vezes, na forma dos arts. 69 e 71 do Código Penal, de modo que se oferece a presente denúncia, que se requer seja registrada, autuada e recebida com vistas à citação para fins de resposta à acusação e demais atos processuais. Ademais, pleiteia-se sejam certificados os antecedentes criminais no Estado de Santa Catarina e perante a Justiça Federal, instruindo-se o feito com o cumprimento das demais formalidades legais até final condenação.
Encerrada a instrução e apresentadas alegações finais, sobreveio a sentença com o seguinte dispositivo (Evento 97, dos autos originários):
Ante o exposto, julgo procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia para condenar Robson Dias Belo ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 9 meses de detenção, a ser cumprida no regime inicialmente aberto, e ao pagamento de 60 dias-multa, no valor unitário descrito na fundamentação, por infração ao art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, por seis vezes, na forma do art. 71 do Código Penal. Fica autorizada a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos conforme fundamentação.
Inconformado com o decisum, Robson Dias Belo interpôs a presente apelação criminal, em cujas razões recursais, apresentadas por meio de defensor constituído, sustenta a atipicidade da conduta, porquanto ausente o elemento subjetivo do tipo, consistente no dolo de supressão do tributo, na medida em que restou demonstrado que o inadimplemento fiscal se houve porque a pessoa jurídica se encontrava em graves dificuldades financeiras. Aduz, ainda, a existência de mero inadimplemento civil e não ilícito penal tributário, considerado que a pessoa jurídica por si administrada atua na condição de contribuinte e não de responsável tributário, esse o real destinatário da norma penal. Pugna, ademais, pelo reconhecimento da inconstitucionalidade do artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.137/90, com a consequente absolvição. Na fase dosimétrica, requer a minoração da pena aplicada, vez que o apelante é réu primário, aposentado, pai de família, tem bons antecedentes e não há circunstâncias agravantes na conduta do suposto crime. (Evento 27, dos autos originários).
Contrarrazões da acusação pelo conhecimento e provimento parcial do recurso, apenas para readequar a pena de multa para 15 dias-multa, considerando o aumento da fração da pena corporal, qual seja 1/2 (metade) (Evento 77, dos autos originários).
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Jorge Orofino da Luz Fontes, que se manifestou pelo conhecimento e provimento parcial do recurso de apelação interposto (Evento 16).
Este é o relatório

VOTO


1. Da Admissibilidade
Trata-se de recurso de apelação interposto por Robson Dias Belo em face da sentença proferida pelo juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Jaraguá do Sul, que julgou procedente a pretensão deduzida na denúncia, a fim de condená-lo ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 9 (nove) meses de detenção, a ser cumprida no regime inicialmente aberto, e ao pagamento de 60 (sessenta) dias-multa, cada qual fixado no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, por seis vezes, na forma do art. 71 do Código Penal.
Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso e passo ao exame do pleito recursal.
2. Do Mérito
Pugna a defesa pela absolvição, sustentando a ausência de dolo na falta de recolhimento do imposto e a atipicidade da conduta (art. 386, incisos II, IV, V, VI e VII, e art. 395, I, do CPP), vez que a empresa passava por dificuldades financeiras na época dos fatos, não podendo agir de forma diversa. Ademais, fundamenta pela inconstitucionalidade do artigo 2º, II da Lei 8.137/90, por crer tratar-se o débito tão somente de inadimplemento civil, não possuindo natureza penal e sendo, desse modo, uma modalidade de prisão civil por dívida, vedada no ordenamento brasileiro.
Sem razão, todavia.
Narra a denúncia que a empresa apelante deixou de efetuar o recolhimento ao fisco de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS, decorrente de sua atividade econômica nos meses de junho a dezembro de 2014, incorrendo, assim, na conduta típica descrita no artigo 2º, II da Lei nº 8.137/90, e ferindo a ordem tributária:
Art. 2° Constitui crime da mesma natureza: [...]II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos; [...]Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Na espécie, a materialidade e autoria delitivas restaram devidamente comprovadas pelo Termo de Dívida Ativa nº 15004714006, Notícia de Fato nº 08.2017.0117022-3, Notícia-Crime ao Ministério Público nº 1660000012413, DIMEs nº 140506381221, 140505517022, 140505055053, 140504449066, Contrato Social, sem prejuízo da prova oral produzida durante toda a fase da persecução penal (Evento 1, dos autos originários).
No tocante ao argumento da inexigibilidade de conduta diversa, em face da crise financeira enfrentada pela empresa, aproveita-se a transcrição dos resumos dos depoimentos de ex-funcionários, elaborados pelo nobre magistrado de origem Dr. Samuel Andreis, acerca dos fatos (Evento 59, dos autos originários):
As testemunhas de defesa (prova emprestada do processo 0900098-81.2015), Ketlin de Cássia Uhlick Alves, Reni de Liz e Roseli Gaedke Martins, todos funcionários na época dos fatos, apenas relataram que a empresa passou por uma crise muito forte que a impediu de adimplir os tributos, bem como diversas outras contas
Retira-se da oitiva dos antigos empregados que, de fato, a empresa passava por fragilidade financeira por ocasião dos fatos, o que teria lhe compelido a escolher entre pagar os encargos trabalhistas dos funcionários ou adimplir as obrigações tributárias.
Não obstante, cumpre ressaltar que o ICMS é tido como um imposto indireto, ou seja, é suportado economicamente não pelo próprio sujeito passivo, mas pelo consumidor do produto adquirido ou serviço prestado, já que incorporado ao valor final da atividade econômica, incumbindo ao contribuinte direto tão somente o repasse dos valores ao fisco.
Sobre o assunto, extrai-se da doutrina:
Dentro desse quadro, é com muita simplicidade que se diz, por exemplo, que os impostos que incidem sobre o consumo seriam indiretos, ao passo que aqueles que oneram o patrimônio e a renda seriam diretos. O ICMS, v.g., é pago pelo vendedor de um produto (contribuinte de direito), mas, na prática, seria suportado pelo comprador (contribuinte de fato),...

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