Acórdão Nº 0900095-91.2017.8.24.0025 do Segunda Câmara Criminal, 15-03-2022

Número do processo0900095-91.2017.8.24.0025
Data15 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0900095-91.2017.8.24.0025/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO

APELANTE: BRUNO DEGANI (RÉU) ADVOGADO: HERLEY RICARDO RYCERZ (OAB SC007509) APELANTE: ROMY GASSERT DEGANI (RÉU) ADVOGADO: HERLEY RICARDO RYCERZ (OAB SC007509) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Gaspar, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Bruno Degani e Romy Gassert Degani, imputando-lhes a prática do crime previsto no art. 2º, II, da Lei 8.137/90, por sete vezes, na forma do art. 71, caput, do Código Penal, nos seguintes termos:

Os denunciados Bruno Degani e Romy Gassert Degani na época dos fatos exerciam a função de sócios e administradores da empresa R BY R Confecções Ltda. Me, com endereço comercial na rua Pedro Arthur Zimmermann, n. 580, Fundos, bairro Bela Vista, Gaspar/ SC.

Na condição de sócios e administradores da referida empresa, os denunciados deliberavam (e concorreram para a deliberação), entre outras questões, sobre o pagamento, supressão ou redução de tributos devidos ao Estado de Santa Catarina.

Nos períodos de julho/2011 até novembro/2011, março/2012 e abril/2012 os denunciados passaram a praticar atos ilegais contra a fiscalização tributária, sonegando o tributo ICMS.

Para tanto, em cada período elencado acima, os denunciados determinaram que a empresa R BY R Confecções Ltda. deixasse de efetuar, total ou parcialmente, o recolhimento do ICMS relativo às operações/prestações tributáveis, as quais foram escrituradas pelo próprio contribuinte no Livro Registro de Apuração do ICMS e declarado na Guia de Informação e Apuração de ICMS e/ ou DIME (Declaração do ICMS e do Movimento Econômico).

O valor do imposto reconhecido com o devido, contudo, quando do vencimento, não foi recolhido e a importância declarada acabou por não ingressar aos Cofres do Erário Estadual. Ao não recolherem os valores referentes ao imposto incidente sobre operações tributáveis devidos aos cofres públicos, dentro do prazo legal, os denunciados sonegaram elevada monta, resultando em prejuízo aos Cofres Públicos e a toda coletividade.

Dessa forma, os denunciados deixaram de recolher aos cofres públicos a soma a seguir discriminada:

[...]

Foi assim que os denunciados, dolosamente, deixaram de efetuar o recolhimento do imposto devido dentro do prazo legal.

Em assim sendo, agindo reiteradamente, os denunciados determinaram que a empresa deixasse de recolher aos cofres públicos, em suas condutas delituosas anteriormente descritas, a importância de R$ 49.005,25 (quarenta e nove mil, cinco reais e vinte e cinco centavos) com a multa e juros, ao Fisco Estadual, recursos estes que deveriam ser aplicados em proveito de toda a sociedade catarinense (Evento 1, doc1).

Concluída a instrução, o Doutor Juiz de Direito julgou procedente a exordial acusatória e condenou Bruno Degani e Romy Gassert Degani à pena de 10 meses de detenção, a ser cumprida em regime inicialmente aberto, e 16 dias-multa, substituída a privativa de liberdade por limitação de fim de semana, pelo cometimento do delito previsto no art. 2º, II, da Lei 8.137/90, por sete vezes, na forma do art. 71, caput, do Código Penal (Evento 152).

Insatisfeitos, Bruno Degani e Romy Gassert Degani deflagraram recurso de apelação.

Em suas razões, apontam, preliminarmente, a ocorrência de prescrição da pretensão punitiva estatal.

No mérito, alegam não estar comprovado que "deixaram de recolher aos cofres públicos os valores atinentes ao ICMS, por livremente decidirem aplicar tais valores em outras contas que não fossem as do Governo Estadual", e "muito menos" que "se apropriaram de tais valores, que compõem as notificações fiscais nºs 126030021421 e 126030314380".

Ponderam que não havia "prévia determinação em deixar de recolher ao fisco, uma vez que o fato sobreveio de um problema de mercado", de modo que "não haviam recursos para o recolhimento das contribuições, daí se optou em pagar os salários e não encerrar as atividades", o que redunda em "ausência do dolo pela inexistência de vontade dirigida", mesmo porque "é indispensável a prova da intenção de lesar o fisco".

Pontuam que "o ICMS em questão, que ficticiamente compõe as CDAs, fazendárias, não foi cobrado do consumidor no momento em que adquiriu o bem produzido pela sociedade mercantil".

Sob tais argumentos, requerem as proclamações das suas absolvições (eproc2G, Evento 7).

O Ministério Público deixou transcorrer o prazo para apresentação das contrarrazões (eproc2G, Eventos 6-9).

A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Humberto Francisco Scharf Vieira, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do apelo (eproc2G, Evento 14).

VOTO

O recurso preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

1. O pedido de decretação da extinção da punibilidade, por conta da prescrição da pretensão punitiva, merece parcial acolhimento.

Bruno Degani e Romy Gassert Degani foram denunciados pelo não recolhimento do ICMS declarado referente às operações tributáveis dos meses de julho a novembro de 2011, e março e abril de 2012, com vencimento do prazo de recolhimento, conforme as Notificações Fiscais 126030021421 e 126030314380, entre 10.8.11 e 10.5.12 (Evento 1, doc3 e 6).

Os débitos tributários estiveram sob parcelamento entre os dias 7.11.14 a 22.11.14, 24.11.14 a 1º.7.16 e 18.8.16 a 18.4.17 (Evento 1, doc37-40), ou seja, por 2 anos, 3 meses e 28 dias (conforme também afirmado pelo Parquet na petição do Evento 30).

Analisando a questão, o Magistrado de Primeiro Grau deliberou que "os créditos tributários das notificações fiscais nº 126030021421 e 126030314380 foram inscritos em dívida ativa, respectivamente, em 12/07/2012 e 09/10/2012", de modo que, "entre a constituição do débito tributário e o recebimento da denúncia, descontado o período de suspensão da prescrição da pretensão punitiva por força do parcelamento do crédito tributário", não transcorreu o prazo prescricional (Evento 75). A mesma compreensão foi reiterada na sentença resistida (Evento 157, doc7).

Não há que se falar, no entanto, no dia da constituição do débito tributário como início do prazo para a configuração da prescrição.

A Súmula Vinculante 24 do Supremo Tribunal Federal expressa que "Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo", ao passo que tratam os presentes autos do delito tipificado no art. 2º da mesma norma, que é crime formal.

A propósito, do Superior Tribunal de Justiça:

"O crime do art. 2°, II, da Lei n. 8.137/1990 é de natureza formal e prescinde da constituição definitiva do crédito tributário para sua configuração. Não incidência da Súmula Vinculante n. 24 do STF. Precedente" (AgRg no AREsp 1121680/GO, Rel. Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 21/11/2018) (RHC 114.513, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 27.8.19).

Desta Corte:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. CONDENAÇÃO PELO DELITO DISPOSTO NO ART. 2º, II, DA LEI 8.137/90, POR TREZE VEZES, EM CONTINUIDADE DELITIVA. NÃO RECOLHIMENTO DE ICMS. RECURSO DEFENSIVO. [...] MÉRITO. PRETENSA NULIDADE. AVENTADA AUSÊNCIA DE DOLO. INVIABILIDADE. DELITO COM DOLO GENÉRICO, QUE DISPENSA A INTENÇÃO DE FRAUDAR O FISCO. INVIABILIDADE DE PERÍCIA CONTÁBIL. CRIME QUE SE CONSUMA COM A SIMPLES OMISSÃO NO RECOLHIMENTO DO TRIBUTO. DECLARAÇÕES RELATIVAS AO ICMS QUE SÃO PRESTADAS PELA PRÓPRIA EMPRESA. ADUZIDA A INEXIGIBILIDADE DO SUPOSTO CRÉDITO TRIBUTÁRIO POR AUSÊNCIA DE SEU LANÇAMENTO DEFINITIVO. SÚMULA VINCULANTE 24 INAPLICÁVEL AO CRIME EM QUESTÃO, DE NATUREZA FORMAL (Ap. Crim. 0900018-81.2016.8.24.0069, Rel. Des. Ernani Guetten de Almeida, j. 18.6.19).

Quando o crime tributário é relativo ao ICMS, a prática delitiva ocorre mês a mês, no vencimento do prazo de pagamento do tributo aos cofres públicos.

A Lei Estadual 10.297/96, que "dispõe sobre o Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS", prevê:

Art. 32. O imposto a recolher será apurado mensalmente, pelo confronto entre os débitos e os créditos escriturados durante o mês, em cada estabelecimento do sujeito passivo.

[...]

Art. 36. O imposto será recolhido nos prazos previstos em regulamento.

O art. 60 do RICMS/SC-01 estabelece que "o imposto será recolhido até o 10° (décimo) dia após o encerramento do período de apuração".

O prazo prescricional, nos termos do art. 111, I, do Código Penal, começa a correr "do dia em que o crime se consumou", que, no caso, é o dia do prazo para recolhimento do ICMS.

O art. 109 do Código Penal disciplina, em seu caput, que "a prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final [...] regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime", e seu inciso V prevê o prazo prescricional de 4 anos, "se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois".

Como o preceito secundário do art. 2º da Lei 8.137/90 estipula pena de "detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa", o prazo prescricional para este crime é, em abstrato, de 4 anos (não foram narradas na denúncia quaisquer causas de aumento).

A denúncia foi recebida em 14.5.18 (Evento 9), de modo que todos os crimes consumados 6 anos, 3 meses e 28 dias antes disso (soma do prazo prescricional com o do período de suspensão), ou seja, antes de 16.1.12, foram alcançados pela prescrição em abstrato.

Assim, deve ser decretada extinta a punibilidade dos Apelantes Bruno Degani e Romy Gassert Degani quanto ao não recolhimento do ICMS correlato às operações tributáveis dos meses de julho a novembro de 2011, este último vencido em 10.12.11 (Evento 1, doc3).

Quanto aos meses de março e abril de 2012, uma vez que não transcorridos mais de 4 anos...

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