Acórdão Nº 0900097-84.2014.8.24.0019 do Segunda Câmara Criminal, 21-01-2020

Número do processo0900097-84.2014.8.24.0019
Data21 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemConcórdia
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Criminal n. 0900097-84.2014.8.24.0019, de Concórdia

Relatora: Desa. Salete Silva Sommariva

APELAÇÕES CRIMINAIS - DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO (LEI 8.666/1993, ART. 89, CAPUT), CRIMES DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITO MUNICIPAL (DECRETO-LEI N. 201/67, ART. 1º, I, II, IV E XIV) E SUPRESSÃO DE DOCUMENTO (CP, ART. 305) - SENTENÇA PARCIALMENTE CONDENATÓRIA - INSURGÊNCIA MINISTERIAL E DEFENSIVA.

RECURSO DEFENSIVO - DELITO DA LEI DE LICITAÇÕES - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA INTENÇÃO DE CAUSAR DANO AO ERÁRIO - PREJUÍZO AOS COFRES PÚBLICOS NÃO DEMONSTRADO - ATIPICIDADE DA CONDUTA VERIFICADA.

CRIMES DE RESPONSABILIDADE (ART. 1º, I (FATO 1), II E V) - CONDUTAS QUE EXIGEM DOLO - ELEMENTO SUBJETIVO QUE NÃO SE EVIDENCIA NOS AUTOS - ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE - PRECEDENTES - RECURSO PROVIDO.

IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL - ALMEJADA CONDENAÇÃO NAS PENAS DOS DEMAIS CRIMES (DECRETO-LEI N. 201/67, ART. 1º, I (FATO 2), E XIV, E CP, ART. 305) - INVIABILIDADE - CONTEXTO FÁTICO QUE DEMONSTRA A AUSÊNCIA DO ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO - ACUSADO QUE ATUAVA COM BASE NA LEGISLAÇÃO MUNICIPAL E EM OBSERVÂNCIA AO INTERESSE PÚBLICO - RECURSO DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0900097-84.2014.8.24.0019, da comarca de Concórdia (Vara Criminal) em que é Apelante/Apelado Joares Alberto Pellicioli e Apelado/Apelante Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Segunda Câmara Criminal decidiu, por unanimidade, dar provimento à insurgência defensiva para absolver Joares Alberto Pellicioli das condutas previstas no art. 89, caput, da Lei n. 8.666/93 e no art. 1º, I (fato 1), II e V, do Decreto-Lei n. 201/67 e, negar provimento ao apelo ministerial. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado em 21 de janeiro de 2020, os Exmos. Srs. Des. Sérgio Rizelo e Volnei Celso Tomazini.

Florianópolis, 22 de janeiro de 2020

Salete Silva Sommariva

PRESIDENTE E RELATORA


RELATÓRIO

O magistrado Raul Bertani de Campos, por ocasião da sentença de p. 3.643/3.660, elaborou o seguinte relatório:

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Joares Alberto Pellicioli, já qualificado nos autos, como incurso nas sanções do art. 1º, I, II e XIV, do Decreto-Lei n. 201/67; art. 89 da Lei n. 8.666/93 e art. 305 do CP (Fato 1); art. 1º, I, do Decreto-Lei n. 201/67 (Fato 2), em razão dos seguintes fatos descritos na exordial acusatória:

Durante o período de 2005 a 2008, Joares Alberto Pellicioli, na condição de Chefe político do Município de Peritiba/SC, exerceu o mandato outorgado pela população municipal, cujo término deu-se em 31 de dezembro de 2008.

A fim de viabilizar um exame mais claro dos fatos e da prova pericial, vale fazer uma divisão dos fatos criminoso em dois grupos. Assim, tem-se:

FATO 01:

De acordo com o apurado no incluso IC - Inquérito Civil nº 06.2009.00003334-7, o qual é fundado no Laudo Pericial n. 0535556/IC/2010 de natureza Contábil (fls. 3196/3248), o denunciado JOARES ALBERTO PELLICIOLI, consciente da reprovabilidade de sua conduta criminosa e visando benefício particular, em total inobservância aos diplomas federais e municipais, ao menos uma vez por semana ao longo do referido período, adquiriu diversas cargas de areia de empresas particulares, sem qualquer procedimento licitatório, utilizando para tal transporte veículos de propriedade do Município, funcionários públicos e combustível pago pelo erário. Posteriormente, o denunciado eliminava as notas fiscais, efetuava as despesas em desacordo com as normas financeiras e vendia as cargas de areia a munícipes.

Por ocasião dos fatos, o denunciado autorizou a utilização de veículos da Prefeitura (os caminhões de placas MAY 7354 e MER 1428), de funcionários públicos (motoristas) e de combustível pago pelos cofres públicos municipais, a fim de executar várias viagens até as empresas Irmãos Hobi LTDA, sediadas no Município de União da Vitória/PR, local onde logrou adquirir diversas cargas de areia sem o devido procedimento licitatório.

Porém, quando da chegada das cargas de areia, o denunciado Joares Alberto Pellicioli eliminava as notas fiscais e efetuava a venda da mercadoria a diversos munícipes, apropriando-se, dessa forma, da diferença entre o preço da compra (por volta de R$ 20,00 a R$ 23,00 reais o m³) e o da respectiva venda aos munícipes (em torno de R$ 45,00 o m³).

Nesse agir, o ex-Prefeito negava a execução da Lei Municipal n. 967/1955, a qual autorizava o Poder Executivo Municipal a efetuar o transporte gratuito de 1 carga de areia de União da Vitória/PR até a propriedade do agricultor em Peritiba/SC mediante o preenchimento de determinados requisitos, pois aproveitava-se do uso de todo o aparato estatal à sua disposição para eliminar as notas fiscais e posteriormente vender as cargas de areia aos munícipes pela quantia de R$ 45,00 (quarenta e cinco reais o m³), sem qualquer critério, apropriando-se assim da diferença de valores.

Outrossim, o então Prefeito, agindo com a inequívoca intenção de efetuar despesas em desacordo com as normas financeiras determinadas pelos artigos 60 e 63 da Lei n. 4.320/64, autorizou a realização das despesas ora elencadas (aquisição de areia e de combustível para abastecimento dos veículos da Prefeitura com finalidade particular), por diversas oportunidades, conforme Laudo Pericial n. 0535556/IC/2010 de natureza Contábil (fls. 3240/3246), o qual atestou que diversas notas fiscais, mesmo faturadas em nome da Prefeitura de Peritiba, não foram pagas por tal ente federativo.

Em arremate, destaca-se que a condição de Prefeito do denunciado era a garantia da fraude, uma vez que as mercadorias eram adquiridas em nome do Município de Peritiba, com as respectivas isenções tributárias, e transportadas pelos funcionários públicos com os veículos pertencentes ao Poder Público Municipal.

Dessa forma, consoante comprovado nos autos, o denunciado Joares Alberto Pellicioli, em diversas oportunidades, nos anos em que esteve à frente da Chefia do Poder Executivo Municipal, durante o interregno de 2005 a 2008, de forma dolosa e consciente, valendo-se sempre do exercício do mandato eletivo, utilizou-se, indevidamente, em proveito próprio, de bens e serviços públicos do Município de Peritiba, além de apropriar-se, dessa forma, da diferença entre o preço da compra das cargas de areia (por volta de R$ 20,00 a R$ 23,00 reais o m³), sem qualquer procedimento licitatório e posterior destruição das notas fiscais, efetuando despesas em desacordo com as normas financeiras, e da respectiva venda aos munícipes (em torno de R$ 45,00 o m³), em inobservância aos ditames previstos pelo artigo 1º da Lei Municipal n. 967/1995, regulamentada pela Decreto Municipal n. 1119, que dispõe sobre o transporte gratuito de material de construção aos agricultores, e de encontro aos artigos 60 e 63 da Lei n. 4.320/64.

FATO 02:

Igualmente, consoante apontado no Laudo Pericial n.0535556/IC/2010 de natureza Contábil (fls. 3196/3248), o denunciado Joares Alberto Pellicioli, valendo-se das prerrogativas inerentes ao mandato eletivo de Prefeito de Peritiba/SC, apropriou-se de rendas ou bens públicos, em proveito próprio ou alheio.

Na oportunidade, o ex-Prefeito, durante o período de 2005 a 2008, especialmente nos últimos dias do exercício do cargo eletivo, por diversas vezes, em local a ser delimitado na instrução criminal, no Município de Peritiba, apropriou-se, indevidamente, do valor despendido para abastecer o tanque de combustível do caminhão placa MAY 7354 de propriedade do Município de Peritiba, em prejuízo ao erário municipal.

Com efeito, a título exemplificativo e para uma melhor compreensão do tema, observa-se que no dia 17 de dezembro de 2008, o denunciado determinou o abastecimento do caminhão placa MAY 7354 por duas vezes, com diferença de apenas 1 (uma) hora e 9 (nove) minutos, num total de 763,6 litros de óleo diesel, resultando no valor de R$ 1.665,71 (mil, seiscentos e sessenta e cinco reais e setenta e um centavos) a expensas dos cofres públicos, conforme notas fiscais 035335 e 035338 à fl. 2711 (Vol. XIV) emitidas em nome da Prefeitura de Peritiba.

Novamente, no dia 29 de dezembro de 2008, o denunciado autorizou o abastecimento de 305 litros de combustível no mesmo veículo, com o custo ao erário municipal de R$ 749,04 (setecentos e quarenta e nove reais e quatro centavos), consoante nota fiscal 035356 à fl. 2741 (Vol. XIV).

Ocorre que a capacidade de abastecimento do tanque do veículo é de somente 275 litros de combustível.

Ressalta-se que durante todo o período de 2005/2008 em que o referido veículo foi abastecido, somente em 4 (quatro) ocasiões o abastecimento foi realizado dentro do limite possível (de 240 litros), conforme notas fiscais apresentadas às fls. 2628, 2703, 2706 e 2713 (Vol. XIV).

Ao final, arrolou as testemunhas e requereu o recebimento da denúncia, com o processamento do feito.

Presentes os requisitos do art. 41 do CPP e ausentes as hipóteses de rejeição (CPP, art. 395), a denúncia foi recebida em 18/2/2015, após o que o réu foi citado e ofereceu resposta à acusação, alegando nulidade do procedimento, sendo tais teses arguidas rejeitadas pelo juízo, haja vista a inexistência de causas legais de absolvição sumária.

Realizada a audiência de instrução e julgamento, as testemunhas foram ouvidas, seguidas do interrogatório do acusado.

Em alegações finais, o Ministério Público postulou pela condenação do réu nos termos da denúncia.

A defesa, por sua vez, apresentou as derradeiras assertivas, alegando que o acusado agiu pautado na lei, buscando atender as necessidade dos munícipes, e não cobrou pelos serviços ou pelas cargas de areia, razão pela qual pugnou pela absolvição. Alegou, ainda, que nunca ordenou que se destruíssem documentos fiscais ou notas ficais com dolo de acobertas condutas ilícitas, se eram...

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