Acórdão Nº 0900109-82.2018.8.24.0076 do Primeira Câmara Criminal, 27-05-2021

Número do processo0900109-82.2018.8.24.0076
Data27 Maio 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0900109-82.2018.8.24.0076/SC



RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI


APELANTE: PAULO AFONSO SIMON (ACUSADO) ADVOGADO: THIAGO SILVA SIMON (OAB SC040132) ADVOGADO: EDUARDO ROVARIS (OAB SC019395) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Paulo Afonso Simon dando-o como incurso nas sanções dos arts. 38, caput, e 38-A, caput, ambos da Lei 9.605/1998, em razão dos seguintes fatos:
Em 10 de fevereiro de 2016 [leia-se, 2018, conforme termo de audiência do evento 55 dos autos originários], aproximadamente às 10h00min, na Estrada Geral, localidade de Turvo Baixo, s/n, município de Ermo/SC, nas coordenadas UTM 22J 635620/6795750", nas margens do Rio Itoupava, o denunciado Paulo, livre e consciente, destruiu floresta considerada de preservação permanente e do Bioma da Mata Atlântica em estágio médio de regeneração.
Nas circunstâncias de tempo e local acima descritos, o denunciado realizou corte raso e arranque de material radicular em local de Bioma da Mata Atlântica em estágio médio de regeneração e de preservação permanente, com uso de tratores. A guarnição da Polícia Militar Ambiental localizou as árvores nativas removidas, empilhadas na borda do fragmento de vegetação que ainda não havia sido tocado. Do levantamento, verificou-se a supressão de 1.281m2 (mil duzentos e oitenta e um metros quadrados) de vegetação, composta especialmente por Maricás, Canelas e Tarumãs, típicas do Bioma da Mata Atlântica, nas margens do Rio Itoupava, caracterizado como preservação ambiental nos termos do Artigo 4, I do Código Florestal.
Anota-se que, questionado pelos policiais, o denunciado admitiu ter realizado o corte sem autorização (Evento 13 dos autos da Ação Penal).
Sentença: o juiz de direito Manoel Donisete de Souza julgou procedente a denúncia para condenar Paulo Afonso Simon pela prática dos crime previstos nos arts. 38 e 38-A, ambos da Lei 9.605/1998, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de detenção, em regime inicial aberto, substituída por 1 (uma) restritiva de direito, consistente na prestação de serviços à comunidade à razão de uma hora de trabalho por dia de pena (Evento 76 dos autos da Ação Penal - em 21-10-2020).
Trânsito em julgado: muito embora não certificado pelo Juízo a quo, verifica-se que a sentença transitou em julgado para a acusação.
Recurso de apelação de Paulo Afonso Simon: a defesa interpôs recurso de apelação, no qual sustentou, em síntese, que:
a) o recorrente deve ser absolvido do delito previsto no art. 38 da Lei 9.605/98 por atipicidade do fato, uma vez que retirou somente vegetação de pequeno porte, sendo a autora da derrubada das árvores a empresa CERSUL;
b) deve ser absolvido, também, quanto à imputação do delito previsto no art. 38-A, caput, da Lei de Crimes Ambientais, "levando em consideração que a denúncia não aponta, também, lesão específica à espécie da Mata Atlântica";
c) "tendo o requerido causado lesão à vegetação do Bioma da Mata Atlântica, não pode, ao mesmo tempo, ter causado lesão à "floresta", e assim, consequentemente, ser punido", sob pena de incorrer em bis in idem.
Requereu o conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença nos termos da fundamentação (evento 82 dos autos originários - em 13-11-2020).
Contrarrazões do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, ao argumento de que o conjunto probatório acostado aos autos é firme no sentido de que o apelante efetivamente praticou os atos pelos quais foi denunciado, não havendo falar em atipicidade da conduta ou bis in idem.
Postulou o conhecimento do recurso e a manutenção da sentença condenatória (evento 271 dos autos originários - em 18-2-2021).
Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Marcílio de Novaes Costa opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 9 - em 4-5-2021)

VOTO


Do juízo de admissibilidade
O recurso de apelação preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.
A despeito do preenchimento dos requisitos de admissibilidade, com relação ao recurso interposto pela defesa, cabe registrar que o defensor constituído dos recorrentes reproduziu literalmente nos presentes apelos toda a matéria constante das alegações finais, sem discutir a razão pela qual não concordou com os fundamentos insertos na sentença penal.
O caso, portanto, seria de não conhecer da pretensão por violação ao princípio da dialeticidade recursal, conforme fundamentos adotados por este Órgão Fracionário (Apelação Criminal 0003454-12.2015.8.24.0036, deste relator, 12-04-2018, v.u.).
Pensar o contrário, com a devida venia, seria impor mero reexame necessário da decisão judicial, tornando irrelevante ou, no mínimo, de somenos importância a atuação do causídico em segundo grau de jurisdição.
Além disso, não se mostra apropriado passar ao largo de todo o trabalho adequadamente efetuado na origem para conhecer de recurso que nem sequer minimamente rebateu os fundamentos da sentença, limitando-se a reproduzir de modo literal os argumentos expostos nas alegações finais.
Apreciar questões assim seria, no mínimo, ignorar as regras que regem os direitos penal e processo penal, bem como o caótico quadro de congestionamento de processos aguardando por soluções que se acumulam aos milhões por este Brasil afora. Até porque, eventuais nulidades ou ilegalidades, poderão ser reconhecidas por ações constitucionais de rápida e prioritária tramitação, bem como ações revisionais.
Entretanto, em casos assim, mesmo diante da evidente afronta ao citado princípio, o Superior Tribunal de Justiça tem determinado o conhecimento da matéria por meio de decisões monocráticas, seja em virtude da interposição de Recurso Especial ou impetração de Habeas Corpus.
Um dos feitos cuja análise foi determinada pela Instância Superior diz respeito aos autos da Apelação Criminal 0004147-50.2015.8.24.0018, deste relator, julgado por esta Primeira Câmara Criminal, em 18-01-2018, por votação unânime.
Desse modo, sendo muito provável que o não conhecimento integral dos recursos sob exame possa ter como consequência a aplicação do referido entendimento consolidado na Corte de Uniformização, para evitá-lo, passa-se ao exame da insurgência.
Do mérito
Trata-se de apelação criminal interposta por Paulo Afonso Simon em face da sentença que o condenou por infração aos arts. 38, caput, e 38-A, caput, ambos da Lei 9.605/1998, que assim dispõem:
Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:
Pena - detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade.
Art. 38-A. Destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade.
Esclareça-se que para configuração do delito previsto no art. 38 do referido diploma legal, impõe-se a presença concomitante de dois elementos normativos: a) a floresta; e b) área de preservação permanente.
O art. 38 da Lei 9.605/98 constitui norma penal em branco em sentido lato, pois o conceito legal de floresta de preservação permanente é extraído do Código Florestal, que a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT