Acórdão Nº 0900196-73.2017.8.24.0011 do Terceira Câmara Criminal, 18-04-2023

Número do processo0900196-73.2017.8.24.0011
Data18 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0900196-73.2017.8.24.0011/SC



RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA


APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELANTE: CARLOS ARNOLDO QUELUZ (RÉU) APELANTE: ANTONIO DA SILVA (RÉU) APELANTE: JONES BOSIO (RÉU) APELANTE: ROSENILDO DE AMORIM (RÉU) APELADO: OS MESMOS


RELATÓRIO


O representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina, com atribuição para atuar perante a Vara Criminal da Comarca de Brusque, ofereceu denúncia em face de Jones Bósio e Carlos Arnoldo Queluz pela suposta prática dos crimes previstos no art. 90 c/c art. 84, §2º, da Lei 8.666/93 e no art. 312 c/c art. 327, §2º, do Código Penal; e de Antônio da Silva e Rosenildo Amorim pela prática dos crimes previstos nos arts. 90 da Lei 8.666/92 e no art. 312 do Código Penal, nos seguintes termos ():
"[...] De acordo com o apurado no inquérito civil anexo (06.2016.00008815-0), no final do mês de julho de 2014 Jones Bósio, que à época era Secretário Regional de Desenvolvimento de Brusque, foi procurado por Antônio da Silva, então Prefeito Municipal de Canelinha, o qual lhe pediu um repasse ilícito no valor de R$ 30 mil.
A proposta de Antônio da Silva, plenamente aceita por Jones Bósio, era que o repasse fosse maquiado através da uma licitação falsa, direcionada para o Instituto Catarinense da Moda, entidade que, na sequência, transferiria o dinheiro para o então Prefeito Municipal de Canelinha. Antônio da Silva indicou o Instituto Catarinense da Moda para a realização da fraude porque conhecia o Secretário Executivo do Instituto (Rosenildo Amorim), o qual concordou em usar o Instituto como 'ponte' para a transferência do dinheiro
Fazia ainda parte da proposta de Antônio da Silva, amplamente aceita por Jones Bósio, que a licitação simulada fosse para a contratação de uma empresa que deveria organizar o 'Festival Municipal de Bandas de Canelinha', evento que, na realidade, jamais ocorreu. Na verdade, o único evento semelhante a esse ocorrido em Canelinha foi o Festival do Trabalhador do Vale do Rio Tijucas, promovido extraoficialmente pelo Prefeitura de Canelinhas no mês de maio de 2014, ou seja, 3 meses antes de sequer lançada a licitação em análise (sobre isso, confiram-se os documentos de fls. 602/603, 618/619, 623, 642, bem como o próprio depoimento de Antônio da Silva).
Assim, em 5 de agosto de 2014 Jones Bósio autorizou a abertura da licitação (vide fls. 11 e 15), assinando, na sequência, o edital na modalidade convite (vide fls. 38/36) para 'contratação de empresa para prestação de serviços de organização e estrutura para realização do I Festival Intermunicipal de Bandas do Município de Canelinha, a ser realizado no dias 23 e 24 de agosto de 2014'.
A 'vontade' de lançar o edital era tanta que Jones Bósio ignorou parecer, firmado pelo setor jurídico da Secretaria Regional de Brusque, através da advogada Rosângela Visconti Ristow, recomendando que licitação não fosse realizada na modalidade convite (vide fls. 36/37). A razão para isso é clara: somente através do uso dessa modalidade de licitação seria possível garantir que o Instituto Catarinense da Moda fosse o vencedor do certame.
Na sequência, conforme narrado em várias outras ações penais que tramitam nesta Comarca de Brusque, Jones Bósio determinou que Carlos Arnoldo Queluz, que na época era Gerente de Cultura, Esporte e Turismo da Secretaria Regional de Brusque, forjasse a existência de uma licitação (sobre as várias fraudes perpetradas em licitações por Carlos Arnoldo Queluz, vide os depoimentos de Doloana Gattis de Mello e Lúcia de Oliveira)
Com efeito, Carlos Arnoldo Queluz obedeceu as ordens de Jones Bósio e maquiou a existência de um procedimento licitatório que, na realidade, jamais existiu, produzindo, para isso, documentos e assinaturas falsas.
Conforme a montagem realizada por Carlos Arnoldo Queluz, para licitação teriam sido 'convidadas' três empresas, a saber: Instituto da Moda Catarinense, Associação Esportiva Óleo Grande e Associação Desportiva Brusque (vide fls. 58/60).
Todavia, como se apurou durante a instrução, as assinaturas do representante da Associação Esportiva Óleo Grande (Ademir Schuart) naquela licitação foram falsificadas (vide laudo pericial de fls. 643/653).
Por outro lado, a prova dos autos indica que o representante da Associação Desportiva Brusque (Carlos Eduardo Knies) assinou a documentação da licitação a pedido de Carlos Arnoldo Queluz sem, de fato, ter participado do certame. Afinal, quando inquirido nesta Promotoria de Justiça em outras investigações semelhantes Carlos Eduardo Knies mostrou nada saber sobre o objeto das licitações que participava, dando sempre respostas evasivas sobre o assunto. Não foi possível tomar as declarações de Carlos Eduardo Knies sobre este específico caso, pois ele faleceu recentemente.
Finalmente, as assinaturas do representante da própria entidade vencedora da licitação, o Instituto Catarinense da Moda, foram fraudadas. Isso está claro, em primeiro lugar, porque as assinaturas consignadas na documentação da licitação são completamente distintas da assinatura verdadeira de Wanderley Zunino, o representante do Instituto (apenas a título de exemplo, compare-se a assinatura de fl. 123 com aquela de fl. 493). E, em segundo lugar, e mais importante, porque o próprio Wanderley Zunino confirmou que não participou de licitação alguma (vide os dois depoimentos prestados por Wanderley Zunino, um em São João Batista e outro em Brusque). Pelo que consta dos autos, a participação do Instituto Catarinense da Moda na licitação foi toda arquitetada pelo Secretário Executivo do Instituto, Rosenildo de Amorim, que era amigo de Antônio da Silva. Coube a Rosenildo de Amorim não só emprestar o nome da entidade vencedora da licitação para a fraude à licitação, mas também convencer o representante do Instituto (Wanderley Amorim) de que o Instituto Catarinense da Moda receberia, sem licitação, uma verba da Secretaria de Desenvolvimento Regional de Brusque para executar um serviço e que a entidade efetivamente executaria este serviço.
Assim, em uma licitação completamente forjada, na data de 13 de agosto de 2014 foi decretada a vitória do Instituto Catarinense da Moda na licitação, pelo preço de R$ 29.930,00 (vide fls. 125/126).
Em seguida, o próprio Jones Bósio atestou falsamente que o serviço havia sido prestado (vide fl. 423), o que permitiu que fosse transferido o valor de R$ 29.930,00 ao Instituto Catarinense da Moda (vide fls. 417/422).
Após a transferência, o representante do Instituto da Moda (Wanderley Amorim) liberou o valor em favor de Rosenildo de Amorim, o qual, na sequência, entregou, sem a realização de qualquer serviço, o valor de R$ 29.930,00, em dinheiro, nas mãos de Antônio da Silva.
Não há até o presente momento, qualquer prova, a mais remota sequer, que esse dinheiro tenha ido para pagamento da organização e estrutura do I Festival Intermunicipal de Bandas do Município de Canelinha. Pelo contrário, tudo nos autos demonstra que essa quantia foi para o próprio bolso de Antônio da Silva, ex-Prefeito de Canelinha, o que aconteceu com a ciência e colaboração de Jones Bósio, Rosenildo de Amorim e Carlos Arnoldo Queluz [...]" (evento 9, DENUNCIA1).
Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada parcialmente procedente conforme parte dispositiva da sentença, in verbis:
"[...] Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE, em parte, a denúncia para:
a) absolver os acusados JONES BÓSIO, CARLOS ARNOLDO QUELUZ, ANTÔNIO DA SILVA e ROSENILDO AMORIM, qualificados nos autos, quanto à prática do crime previsto no artigo 90 da Lei nº. 8.666/93, em decorrência da aplicação do princípio da consunção, o que faço com fulcro no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal;
b) condenar o acusado JONES BÓSIO às penas de três (3) anos, um (1) mês e dez (10) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e vinte e oito (28) dias-multa, no valor de um meio (1/2) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, para cada dia-multa, corrigidos na forma legal, pela prática do crime previsto no artigo 312, caput, do Código Penal;
c) condenar o acusado CARLOS ARNOLDO QUELUZ, às penas de três (3) anos, um (1) mês e dez (10) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e vinte e oito (28) dias-multa, no valor de um quarto (1/4) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, para cada dia-multa, corrigidos na forma legal, pela prática do crime previsto no artigo 312, caput, do Código Penal;
d) condenar o acusado ANTÔNIO DA SILVA, às penas de dois (2) anos e quatro (4) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e vinte e um (21) dias-multa, no valor de um meio (1/2) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, para cada dia-multa, corrigidos na forma legal, pela prática do crime previsto no artigo 312, caput, do Código Penal;
e) condenar o acusado ROSENILDO AMORIM, às penas de dois (2) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e vinte e um (21) dias-multa, no valor de um meio (1/2) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, para cada dia-multa, corrigidos na forma legal, pela prática do crime previsto no artigo 312, caput, do Código Penal.
Condeno-os ainda, ao pagamento das custas processuais que deverão ser dividas em igual proporção e pagas após o trânsito em julgado.
Diante da reiteração de crimes contra administração pública pelos acusados Jones Bósio e Carlos Arnoldo Queluz, os quais, como antes exposto, já foram condenados em várias ações penais por crimes da mesma espécie e natureza, é certo que não fazem jus a substituição da reprimenda corporal por restritivas de direitos multa ou suspensão condicional da pena, já que constituem-se em medidas socialmente não recomendáveis ou suficientes à reprovação de suas condutas, segundo inteligência do artigo 59 c/c artigo 44, § 5º, e artigo 77, inciso II, todos do Código Penal, de modo que deixo de lhes conceder tais benesses legais.
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